segunda-feira, 21 de março de 2022

762 - FLORBELA, A MULHER DE QUEM SE FALA




Vai por aí um grande chinfrim porque a manda-chuva do MCE, Movimento Cuidar de Évora, terá ganho em Beja três concursos na respectiva edilidade e que, segundo os seus detractores, os ganhou com favoritismo por pertencer então aos quadros do PS. Pessoalmente "no lo creio". Em boa verdade ocupou um lugar na cultura, cujo concurso vencera, mas terá até concorrido a mais. Uns ganhou, de outros desistiu e um ou outro perdeu. Digamos que nem todos os jornais nem todos os jornalistas se preocupam com a verdade. Agora então que os tempos vão maus para a liberdade de expressão, tanto a manipulação como a mentira tomaram o freio nos dentes... 

 

Pois bem, supondo que ganhou os três, ainda que só pudesse, naturalmente, ocupar um deles. Mas ocupou algum ? Beneficiou por acaso dos favores do PS como não se cansam de dizer e atribuir-lhe ? Todo este reboliço não passa de suposições. Os cães ladram mas a caravana passa...

 

Ou virou costas a esses pretensos favores e não ocupou nenhum ? E desdenhou de todos ? Podemos interrogar-nos qual ou quais as razões pelas quais o terá feito, serão razões mais que pessoais e não me atrevo a exigir-lhe que me esclareça, o meu pretensiosismo nesse aspecto tem limites, há uma vida privada a respeitar.

 

Resta-me o que se vê do lado de fora e, o que vejo é uma coerente e corajosa tomada de atitude de uma mulher inteligente. Sim, eu sei reconhecer uma mulher inteligente, eu mesmo fui casado com uma, aliás inteligentíssima, coisa com que muitos machos não conseguem lidar nem conformar-se. Temos que reconhecer haver mulheres, e homens, mais ou muito mais inteligentes que nós, temos que estar preparados para isso. É então que me pergunto;

 

- Quantos dos que nas redes sociais lhe criticam os supostos tachos (de que ela não quis beneficiar) estariam à altura de ganhar um só que fosse daqueles três concursos ? Alguns certamente, mas decerto nenhum daqueles cães que, não mordem mas ladram todo o santo dia e a toda a hora, por tudo e por nada, nessas ditas redes que de sociais pouco ou nada têm.

 

Verdade que ela poderia ter usufruído calma e displicentemente de um desses confortáveis tachos, perdão, lugares. Ganhos ou não esses concursos, dados de mão beijada ou não, poderia. Poderia mas não quis, preferiu a incerteza de encabeçar um movimento pela nossa cidade, coragem que todos nós lhe devíamos agradecer.


E para além da incerteza em que se arriscou a navegar, o risco de ficar sem colocação, (que acho não seria por muito tempo pois a senhora tem quesitos e gabaritos) mas sobretudo o risco de enfrentar o PS, partido a que virou costas, provavelmente por não desejar nem consentir ser testa-de-ponte ou marionete de gente pouco ou nada recomendável como tão bem conhecemos dentro do PS, gente que jamais lhe perdoará a ousadia. Dentro e fora do PS já agora.

 

O mesmo poeríamos dizer do candidato Henrique Sim-Sim, ligado à FEA, ao Alentejo De Excelência e ao movimento Fazer o Bem, isto é, suficientemente bem instalado na vida para não ter que se preocupar. Mas tal como a Florbela preocupou-se, e muito, com a cidade, com o país, com o futuro, CONNOSCO !!  E como lhes agradecemos ? Com ingratidão e mal dizer. E digo eu, um povo assim jamais irá longe. Criticar toda a gente sabe, mas tirar o cu da cadeira arregaçar as mangas e fazer, bem poucos se atrevem.

 

Não me vejo a meter as mãos no lume pelos outros candidatos, todos eles há muitos anos comprometidíssimos cada um com o seu partido e com (más) provas dadas do que são capazes de fazer e até onde se julgam no direito de ir… Naturalmente à nossa custa mas não em nosso proveito. 


Basta olhar para o país ou para o Alentejo para perceber isso. Quanto mais nos afastamos do maldito 25 de Abril, o maior logro em que este povo alguma vez caiu, mais fundo nos atolaremos no lodaçal em que transformaram a nossa democracia, lugar onde nada, mas já nada é nosso.

 

A manda-chuva do Movimento Cuidar de Évora é uma pessoa livre, descomprometida, a não ser connosco, com a nossa cidade. Não está engajada a partido nenhum, não tem que satisfazer as ordens e ambições de chefe, tutor, controleiro ou fdp nenhum, tem que nos satisfazer a nós, à cidade, sob pena de perder tudo na aventura em que arriscou coiro e cabelo. A Florbela Fernandes nada mais resta que uma fuga em frente, abraçar o caminho que escolheu, e em que a devemos ajudar, apoiar, e respeitar.

 

Resta-nos estimá-la, pois vai ter que ser a mulher que contará em Évora no futuro e a única hipótese que a cidade terá de mudar. Se estivermos a contar com os partidos do sistema não mudará nunca. Ela, Florbela, só terá que se demarcar em especial do PS e mostrar a toda a gente que é efectivamente uma voz independente. Não ter partido significa que não tem interesses a comandá-la... E isso é uma mais-valia quando sabemos que desde a matrona da prima dona aos restantes donos da cidade de Évora todos querem é mamar. Eles em 1º lugar... Sempre eles primeiro…

 

Tenho-a trazido debaixo de olho, estou a gostar do trabalho dela e, para além disso, antevejo estar ali a figura hierática e matriarcal de que o eleitorado eborense precisa e em quem poderá e deverá maioritariamente rever-se e acreditar. Isto se o pessoal ainda acreditar que Évora tem futuro para nos dar.

 

Acredito que, na essência é possível fazer mais e melhor numa autarquia quando não existam amarras partidárias. Os partidos têm a sua razão de ser, mas não podem ser os prepotentes donos dos cadernos eleitorais e dos seus mesquinhos interesses privados e primordiais. Florbela tem uma outra vantagem, não estando ligada a partido nenhum certamente não quererá servir-se nem do lugar nem do prestígio para lhe servirem de trampolim para a Assembleia da Republica ou um qualquer outro cargo governamental.

 

É por isso que lhes gradeço, quer a ela quer ao amigo Henrique Sim-Sim e à Patrícia Raposinho o trabalho e atenção que dedicam às coisas da cidade, por isso lhes garanti que se a minha presença ou amizade os não comprometerem (os comunistas fizeram de mim um anti comunista ferrenho, um tolerante conservador de direita e um democrata liberal liberalíssimo) poderão dispor da minha pessoa sempre que acharem útil ou necessário, em especial para explicar às audiências haver todos os motivos para votar num movimento não-alinhado, não engajado, não comprometido, independente, ou num candidato igualmente capaz sério e motivado.

 

Obrigado Florbela, Patrícia e Henrique, um abraço.

 



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quinta-feira, 17 de março de 2022

761 QUARESMA, PÁSCOA, TEMPO DE DÁDIVA...

 


Terminámos a Quaresma, período litúrgico significativo pelo que comporta em si. Período de reflexão e preparação para a Páscoa, período que nos deve levar à introspecção, ao recolhimento, à austeridade, especialmente à contenção nesta sociedade de consumo onde nos atolámos.


 Período que nos deve levar igualmente à solidão, tão necessária para repensar o homem e a vida, o outro, o próximo e, naturalmente a frugalidade, o jejum, mas também a superação de nós mesmos. Jesus não se retirou para o deserto sem comer por quarenta dias e quarenta noites antes de iniciar a sua vida pública ? Quaresma é sinónimo de jejum, de abstinência da carne, de mortificação, de caridade e de oração.

 

O homem vive rodeado de tentação, de tentações que não o engrandecem, antes aviltam, a igreja nunca soube fazer entender ao seu rebanho quanto perigo se esconde nestas tentações, no aviltamento a que o rebanho se deixou e deixa reduzir e o apequena, a apequena.

 

É um caso de perfeito divórcio entre doutrina e prática, entre a teoria e a práxis consentida, permitida, diria mesmo convidativa, manipuladora, sedutora, mas jamais redentora, redentora ou demonstrativa da superior racionalidade do homem.

 

Quaresma é esforço, rigor, e um apelo à conversão, um convite a que pensemos e mudemos em nós o que está fora do preceito cristão e racional, o que cai fora do âmbito da dignidade humana, dignidade pela qual tantos homens têm lutado e tombado antes e depois de Jesus, ele próprio cordeiro no altar dos sacrifícios que deviam remir todas as nossas faltas. Respeitemo-lo pelo menos, mas lembremos também a sua redentora travessia do deserto, redentora e purificadora.

 

Os tempos actuais deviam levar-nos a pensar melhor a Quaresma e a Páscoa, pois atravessamos tempos agitados em que a liberdade de expressão é posta em causa e se torna opressão e manipulação em vez de informação e libertação. Quando a emoção se sobrepõe à razão e a guerra mobiliza mais o homem que a paz, é caso para que nos interroguemos se não deveríamos pensar durante quarenta dias antes de agirmos.

 

A tradição cristã é uma regra normativa confluindo para a paz e a concórdia entre os homens, e é-o para todos os homens, mesmo para os não-cristãos, mesmo para os agnósticos, mesmo para os ateus, todos estes porventura até mais necessitados por não encontrarem com facilidade quem lhes aponte algum caminho mais indicado para ser trilhado, percorrido e cumprido para o bem de todos.

 

Os mandamentos de qualquer fé são sempre universais, mas nunca obrigatórios, há caminhos que temos ou devemos percorrer por vontade própria não por Imposição. Ser cristão é percorrê-los mesmo que não aceitemos a submissão a essa ou a qualquer outra doutrina.

 

Ser homem é ser herdeiro de uma tradição que se estende das catacumbas aos nossos dias, ser homem é acreditar que todos somos irmãos, que todos somos descendentes do mesmo mar, não por acaso Santo António pregava aos peixinhos, não por acaso todos temos uma espinha, uma primordial espinhal medula, uma coluna espinhal. Não por acaso o símbolo dos primeiros cristãos após Spartacus (109 ac – 71 dc) foi o peixe, o desenho de um peixe que um bordão iniciava traçando-o nas areias de qualquer chão e outro bordão completava identificando assim secretamente os irmãos entre si.

 

Hoje todos somos irmãos todos conhecemos o mistério da nossa origem. Mas conheceremos o nosso destino comum ?

 

Quaresma, Páscoa, tempos de dádiva, entrega-te.

 

Depois da ressurreição e antes de subir ao Céu, durante outros quarenta dias Jesus instrui os seus discípulos nos mistérios e quesitos da dignidade, faz tu o mesmo em relação a ti próprio e, num recolhimento íntimo, pensa-te, ajuíza-te, avalia-te, e age. 




terça-feira, 8 de março de 2022

760 - A SOLIDARIEDADE COMEÇA EM CASA ...


Há anos que as Finanças e a banca portuguesas penhoram as casas aos casais que têm o azar de cair no desemprego ficando incapazes de as pagar, sendo postos na rua quase a pontapé... (por trás de cada penhora esconde-se uma tragédia).

  Nunca vi na AR uma denúncia desses dramas por deputado nenhum, nem vi alerta ou solidariedade por parte dum só português que lhes acudisse...

 E são gente da nossa, são os nossos...

 “Emigrem se quiserem”, “não se acomodem a situações de conforto” , “nem vivam acima das vossas possibilidades” é isto que lhes dizem, e se não emigrarem que vão pedir esmola e arranjem um barraco onde dormir, ou debaixo duma ponte...

 É assim que tratamos os nossos. Não vou agora receber os de fora de braços abertos, não me peçam isso...

 Claro, que sou solidário com todos os refugiados de todas as guerras, mas se pudesse tb apertaria o pescoço a quem esquece os nossos, começando pelos PMs e PRs que temos tido .....  Ou esses tb não têm culpa ? ...

 A caridade, já dizia a minha avó,  deve começar em casa...

 Abraço apertadinho e solidário :/




 

terça-feira, 1 de março de 2022

759 - MINHA CASA, ESTA MULHER ... * (1942)

                                            Chagal - "Aniversário"


MINHA CASA, ESTA MULHER

POEMA DE SANTIAGO KOVADLOFF  *

  

"Minha casa é esta mulher que agora dorme ao meu lado. Como ela, com ela, tudo ao meu redor descansa.

 

Quando ela acordar, as coisas também. As portas se abrirão novamente, a água voltará a correr, passos animarão a velha escada, a luz voltará a cair sobre as plantas.

  

Voltarei à minha mesa, às palavras, e a sua voz, como uma auréola, rodeará meu dia.

  

Quando ela for trabalhar, levantarei os olhos da página, e uma tapeçaria, um cravo, um amuleto inesperado na cozinha da casa repetirá o nome desta mulher que povoou tudo com sua presença e o sucesso de suas mãos.

  

Ela é a minha casa, a porta principal de acesso ao significado desses cómodos. Se o egoísmo ou a indiferença interrompem nosso encontro, a casa escurece.

 

Como uma dura denúncia de uma solidão irremediável, as paredes estarão carregadas de presságios, a cor de cada coisa retrocederá, a casa esvaziar-se-á, e morar nela será expor-me aos elementos.

  

Minha casa é esta mulher que agora dorme ao meu lado. Quando ela está longe, tudo está longe na casa; sem ela as coisas em meu redor andam aos montes, e estar aqui torna-se uma tortura; assedia todos os lugares, cada passo dói, cantos e objectos tornam-se inúteis.

 

E a casa lembra, num sussurro triste, que um dia soubemos ser melhores. Se a alegria renasce, a casa renasce.

 

Quando a lucidez ou o desejo nos une novamente, a casa se ilumina novamente: meus papéis fazem sentido, cada cómodo é a evidência de um projecto. A casa toda é uma festa e o sopro suave e denso da vida desce novamente a velha escada".

  

* Santiago Kovadloff (Buenos Aires, 14 de diciembre de 1942)



                                         Pintura de RAMON CASAS  

sábado, 19 de fevereiro de 2022

758 - MARGARIT, AVENTURA DOMÉSTICA *


AVENTURA DOMÉSTICA *

 

Sozinho em casa procuro nos armários.

 

Encontro antigos mapas de estradas,

contratos que venceram, esferográficas

que não escreverão mais cartas, velhas calculadoras

sem pilhas, relógios que o tempo derrotou.

 

O passado aninha-se no fundo das gavetas

como um rato triste.

 

Vazios, os vestidos pendem

como velhas personagens que nos interpretaram.

 

Mas de súbito encontro a tua lingerie,

da cor da noite, da areia; fina, com pequenos bordados.

 

Cuecas, soutiens e meias que desdobro

e que me fazem regressar ao brilhante, embora misterioso,

fundo de amor e sexo:

 

é ele que, de facto, dá vida às casas, como os faróis e as luzes

de barcos e cafés a um porto ignorado…

 

        *Joan Margarit – 2018 - AVENTURA DOMÉSTICA