domingo, 13 de fevereiro de 2011

17 - QUIMERA .................................


Estou habituado a vê-la no ginásio.
Seria mais uma entre tantas, e teria passado mesmo completamente despercebida não fossem os gestos, parecendo estudados, parecendo exagerados, parecendo assépticos.
Calhou-lhe ficar mesmo à minha frente e uma tripla tentativa para colocar a toalha em sítio que nunca lembrara a ninguém.
Foi só então que a notei, os modos cerimoniosos, quase teatrais, o nojo em tocar c’os cabelos onde toda a gente toca, a repugnância em apalpar c’as mãos as pegas dos instrumentos tocadas por todos nós.
E imaginei-lhe a náusea sentida pelo suor dos outros, como suportaria ela respirar o mesmo ar ? 
Pisar o mesmo chão?
Normalmente não reparo nas mulheres cuja prática é simultânea com a minha, quer por serem tantas e a atenção se dispersar, quer por ser gente normal, fazendo como eu a sua manutenção, como eu cuidando da sua saúde e beleza.
Não haja facto invulgar e não será despertada a mínima curiosidade. 
Claro que não posso dizer o mesmo de uma cuequinha de cor impressionante ou impressionista estrategicamente deixada à vista precisamente para não lhe sermos indiferentes, (aqui as opiniões do meu grupo de ginastas dividem-se e ainda não chegámos a um consenso), ou de um corpinho divinal deixado mais destapado que tapado num mais que propositadamente escolhido fatinho de treino, ou de um fio dental que mais depressa nos lembra o hálito que possamos ter naquele momento do que estar para começar a Primavera.
São factos a que uma pessoa não consegue ficar alheia, tal a impressão que causam precisamente por pretenderem causá-la.
Não era o caso. 
Esta senhora, chamemos-lhe assim, agia motivada por um excesso de repúdio na partilha de um espaço que é de todos e cujo asseio jamais ocorrera a alguém colocar em causa. 
Havia ali uma nada aparente anormalidade.
São estes extremos que, no “cantinho do suor” põem a malta a falar, eu explico melhor, são estes casos de realce e dignos de nota que, no espaço predominantemente ocupado pelos aparelhos de musculação, num canto do ginásio, onde o pessoal, maioritariamente masculino, nas pausas a que o esforço da prática forçosamente obriga, são estes casos dizia, que debatemos à exaustão e por vezes com algum gáudio e sátira à mistura, debalde as minhas constantes tentativas para elevar a qualidade dos diálogos.
Improvisam-se anedotas sobre o tema ou a personagem em que se “casca”, e já aconteceu, por mais que uma vez, ter que os moderar com base na minha idade, musculatura e inerente autoridade, pois o riso não parava havendo quem se babasse alarve e copiosamente. 
Não podemos consentir tal, a nossa integridade posta em causa.
Mas aquela senhora, decididamente não sabia o que era um piolho, nunca teria apanhado uma pulga, muito menos uma carraça ou um chato e então um homem nem pensar ! 
Por certo nunca tivera as canelas arranhadas pelas unhacas de um macho menos atento a esses pormenores ! 
À volta dos quarenta anos, peitinho cheio e ainda firme e redondo, as ancas levemente descaídas, mas não por defeito, sim por feitio, só os pés de galinha emergindo dos cantos dos olhos e a flacidez das carnes pendendo ameaçadora dos braços lhe traíam a jovialidade aparente, ou simulada, há muito perdida e naquele momento vítima das apostas dos presentes.
Virgem, não virgem, tia não tia, alguém um destes dias confirmaria o lado ganhador.
Não sei se a dita senhora terá irmãos ou irmãs, sobrinhos ou sobrinhas, que ali estava uma verdadeira tia, concordei plenamente. 
Aquela senhora jamais cheirou homem, acordou ao lado de uma boca sabendo a pautas musicais e ressacada, segurou a testa de um amor ébrio, esparramado no chão e vomitando a casa de banho toda, incapaz de acertar na sanita, ou se engasgou atrapalhada com a aflição causada por um pentelho entalado na garganta, (para o que há remédio santo, qual… já vos ensino). 
Estávamos perante um “casus rarus” cuja observação dissimulada nunca mais será deixada ao acaso, pode até ser que de tão observada a senhora arranje marido, se é que o quer ou quis alguma vez, mas aquele corpinho tão bem desenhado e em acelerada queda merecia ser aproveitado enquanto vale a pena, ou enquanto é possível.
Não nutro contra as professoras qualquer preconceito, registem, o que ela me pareceu ser. 
Mãos e unhas extremamente cuidadas, uns modos afectados de quem nunca na vida buliu o que quer que fosse, uma boca denunciando imperceptíveis rugas provocadas por quem, qual peixe, a esteja sempre abrindo e fechando, portanto mais habituada a dar ordens e falar que a servir para outras coisas, como sugeriu o Adelino, mas toda a maralha sabe que ele é um porco desbocado. 
Aquela mulher já foi extraordinariamente bonita, e, além de ainda o ser, tem um corpinho e uma postura que o atestam e ainda não a deixam ficar mal. 
Recordo que nem o Euro 2008 congregou por aqueles dias tantas atenções naquele canto de ginásio onde o futuro era ontem !
Pratique exercícios físicos ! 
Que espera ?

(P.S. não esqueci o remédio santo; experimente meter na boca meio papo-seco, inteiro, mastigue-o mal e force-se a engoli-lo assim. Vai ver como leva tudo à frente, não há pentelho que resista ! )

Oh ! Por Deus ! 
Não tem nada que agradecer !