quarta-feira, 6 de setembro de 2017

459 - IMPREVISTOS IMPREVISIVEIS .......................


Somente por acidente não recebera um descomunal ramo de rosas. Coisa que lamentou profundamente, pois nunca com tal obséquio tinha sido prendada. Debalde o arrependimento, perdera esse momento mágico e como viria a dizer mais tarde, a estranha sensação de ter-se sentido desejada, nem que por um momento só, pois reconhecera quanto bem isso faria ao ego de qualquer pessoa.

Ele surgira do nada na vida dela, talvez por essa circunstãncia tenha sentido medo, inda que pouco pois nem acreditava em acasos, e nem tempo tinha tido para assimilar a ideia. Para agravar a confusão ele expressava-se de maneira muito romântica, coisa rara de se ver nos dias de hoje, principalmente nos homens, particularmente nesse homem, que já trocara com ela algumas palavras.

Contudo nunca se haviam visto, não se conheciam, sempre tinham comunicado pelo telefone ou outros meios nada pessoais. Nunca suas vidas se haviam cruzado nem na virtualidade do destino. E aquele era o momento em que pela primeira vez se viam. Verdade seja dita, ficaram logo amigos, ambos se viram rodeados por arco-íris e solstícios, ouviram dó ré mis, lás e bemóis não ouvidos por mais ninguém, acreditaram e concordaram que na vida não havia mesmo coincidências.

Ela era agradável, tão depressa ria como mudava de conversa, e, coisa curiosa, tinha um olhar perdido que os olhos dele fitavam, daí, metade do seu olhar clamar aflita, a outra metade como que chamando-o para marinhar. E era um olhar doce, como que encerrando amores prometidos, enleados nuns olhos castanhos apontando ao infinito… abrindo e prometendo caminhos.

Ele mudo e quedo, deslumbrado, lá fora a lua, tão formosa, e ali mesmo a seu lado que coisa gostosa, ele louco de desejo, sonhando o mar e  deitando-lhe um ensejo para, num lampejo voltar a si ficando assim… um pouco tonto, tanto que num fulgor lembrou momentos agradáveis esquecendo os demais.

Virou a cabeça ao céu buscando Deus, talvez Ele lhes estivesse dando uma oportunidade para serem felizes, quem sabe. Não sabiam, eram respostas que ainda não desvendavam. Ela riu, confessou gostar que ele soubesse quanto tinha adorado tê-lo conhecido e logo ali combinaram falar-se no dia seguinte. Ele pasmou, não sabendo se ela estava falando se mirando-o ou fitando-o, cândida, virando a cada minuto e repentinamente a conversa como um sinaleiro, ele pensando e amando tanto que de tanto amor achou que ela era bem bonita e por momentos nem acreditou em tamanha felicidade …

“Nenhum sabia se chegaria o dia em que, desprevenidos ou intensamente, cairiam no chão como dois amigos, se abraçando e beijando com falta de jeito, qual milagre da vida em que suas vontades quebrariam todinhas, e talvez então”... se quebrasse o dilema que desde então o passou a assaltar...

Ele respeitava-a, e mais, sabia não ser o homem que ela buscava e queria, um homem para a vida, um homem que virasse seu companheiro, que com ela viajasse, que estivesse sempre a seu lado, que vivesse consigo, e, querendo ser honesto consigo e com ela, confessou-lhe não ser esse homem que ela procurava. Ela fora simpática, dele gostara e aceitaria o que Deus lhe desse para seu conforto, conformar-se-ia. Nada desejava para ele que não quisesse igualmente para os outros. Ele achara-a muito bela, doce e meiga, e queria retribuir tanta doçura, meiguice. Ele era só um homem, ávido de dar e receber, só isso.

Confusão a dela, imaginam a situação ? Pedira a Deus que lhe aparecesse na vida um homem íntegro, este ano já, que merecesse seu amor, bem, aparecera-lhe aquele, ainda por cima sem o ramo de rosas que ela por acidente não recebera. Aí ela perguntou a Deus o que queria Ele com estas ciladas na sua vida, ou Ele o estaria colocando na sua estrada para ela, quem sabe, para a pôr à prova ?

Para terem um momento de delírio ?

Jamais saberemos, jamais qualquer deles foi visto por estes sítios.

Amem.


Nonocas com o vestido de noiva da avó :D 

458 - ANALOGIAS * by Maria Luísa Baião .................

               
Orã

Tenho um amigo engenheiro de minas que, acompanhando a expansão da empresa em que labuta, tem corrido mundo e se encontra neste momento na Argélia, mais precisamente na cidade costeira de Ourã, onde a empresa desencantou na sua saga expansionista, vai para três ou quatro meses, um contrato vultuoso para construção de um porto de mar, molhes quebra-mar protectores contra a ondulação, acessos, cais de carga / descarga e embarque / desembarque para navios com calado superior a 30 metros e tonelagem impensável, em especial para transporte de gás natural, recurso em que esse país é riquíssimo. 

Trata-se de, como lhe costumo afirmar, da nossa nova diáspora, agora num mundo globalizado com tendência a minimizar ou menorizar Portugal. Mais uma razão para uma expansão nossa, agora em moldes diferentes da época de quinhentos.

Vulgarmente envia-me por mail fotos de maquinaria impressionante pelo tamanho e funções, guindastes, gruas, escavadoras, dragas, e, por vezes, uma ou outra foto tirada por certo do alto de grua gigante, deixando ver os afadigados operários que em baixo mais parecem formiguinhas, em especial se comparados com os blocos utilizados para travar ou reforçar os molhes contra a fúria das ondas, quais colossos trípedes que, enganchando uns nos outros, tanto mais reforçam a coesão quanto mais as ditas cujas tentarem dispersá-los.

Portugal tem sido nos últimos anos um país em obras, nem tantas quanto desejaríamos dirão algumas, nem as que deveriam ser prioritárias, acrescentarão outras, mas isso não tira porém validade à questão nem esperança às obras agendadas. Não descortino a ligação que inferi entre estas obras, que no país vão surgindo ou surgiram um pouco por todo o lado, mais ou menos apreciadas, menos ou mais contestadas, e as obras que esse meu amigo dirige, o que é certo é que cada vez que passo por obras, e são muitas essas vezes, não deixo de lembrar esse meu amigo.

Talvez esta inusitada analogia derive do facto de as obras que vejo, ambas serem obras, já que nada mais lhes consigo encontrar em comum, não sei, não sei explicar, até porque a dimensão de umas e de outras são por vezes completamente díspares, certo é que as ligo em pensamento. Da empreitada que ao meu amigo compete vou dando conta pelas imagens que me envia, a par da descrição da vida na Argélia, país com cidades, hábitos e cultura muito diferentes da nossa e onde, não passando fome, se vê obrigado a dieta forçada que o tem tornado muito mais elegante.

Nas obras que pelo país vou vendo e dou conta cada dia que passa, claro que involuntariamente observo ou aprecio o esforço, o ímpeto, o avanço e o empenho que cada um dos formigueiros aplica no seu mister. Não direi que fico embevecida, mas comove-me o empenho, o profissionalismo e a organização engendrada por essas formiguinhas e que, pouco a pouco, vão dando corpo e realização aos projectos que abraçaram com uma entrega digna de nota.

No nosso país espero que contribuam para enriquecer o património, em especial de equipamentos sociais em que ainda somos tão carentes, infantários, creches, lares, novas escolas e hospitais, mas também outras estruturas, viárias, portuárias e aeroportuárias, empreendimentos turísticos e outros, que criem emprego, serviços e permitam a captação de divisas, que equilibrem a nossa balança de pagamentos, ajudem a colmatar ou a fazer desaparecer o malfadado deficit, que ponham fim a dramas de desempregadas e deslocadas.

Não sei porquê quero, ou desejo que, apesar da desigualdade e dissemelhança entre projectos e obras, de tal modo os intui como análogos apesar de nem eu saber as razões, acreditar piamente que alguma coisa no mundo, ou alguém, os colocou de molde a que os avalie a par e passo e venha a ter o prazer de os achar terminados e acumular motivos para duplamente comemorar e dar por satisfeita.

Terminariam os incómodos a que o aperto de cinto nos obriga e teria em simultâneo o prazer da chegada e visita desse amigo agora longe e que, como sempre, não se esquecerá de me trazer inigualáveis tabletes de genuínas tâmaras, como só naquele país e no médio-oriente se encontram.
Truck, obras, Orã





Orá, panorâmica de rua
Évora, obra no largo de Sertório
Évora, renovação da linha da CP
 * Texto concluído numa quinta-feira, 13 de ‎Novembro‎ de ‎2007, ‏‎pelas 11:14:54h e publicado por esses dias na coluna Kota de Mulher do Diário do Sul - Évora