terça-feira, 27 de abril de 2021

“EU VOS ACUSO E CONDENO À PENA CAPITAL “


692 “ EU QUE SOU DE ÉVORA VOS ACUSO 

E CONDENO À PENA CAPITAL “

# TEXTOS POLÍTICOS 7 #

 

É tarde e não durmo. Volto-me e revolto-me na cama e não durmo. Acordo de novo. Impossível. Tantas são as preocupações que não prego olho. O dinheiro não chega para tudo. Estica-se mas não chega. A manta é curta. Tapo os ombros destapo os pés e vice – versa. É uma situação horripilante.

 

Nas veias o sangue ferve (-me?)

Um último esforço.

Pedem-me um último esforço.

Hão-de acabar comigo um dia.

Mas rio-me.

Só posso rir-me desta corrida alegre para o precipício.

 

O meu dinheiro ! Mas por que não hei-de ser eu a dizer como gastar ou não o meu dinheiro ?!!

 

E são estacionamentos e buracos, e a manta curta, e os pés ou os ombros, e discutem, não o futuro mas os comboios, e um dia não querem mas no outro já querem comboios, e amanhã ninguém sabe se quererão ou não, e hospitais e capitais da cultura e não sei que mais…

 

E só vejo desperdício e apostas no desperdício… E a manta curta.

 

Ele são hospitais para tudo menos para mim e para este coração que embolia...  E o médico que no SNS não me dá vaga de manhã é o mesmo que depois de almoço na Misericórdia… e á tarde a desoras na sua clinica privada … á noite na urgência… e só para mim, embolado, o dia tem vinte e quatro horas e ninguém que me acuda, e ninguém na urgência, e nenhuma urgência em me pegar ou me pagar, em me ocupar…

 

A mim só me vêem para pagar.

 

Só me vêem para pagar e eu pago, eu pago, eu paguei e irei pagar a vida inteira. E eles nada, nem um obrigado, nem um incómodo, nem uma consulta, nem lugarzinho para estacionar, ou um buraco, um buracão onde me enfie e ponha fim a este tormento.

 

E queixo-me. E ouço que agora é que é. E queixo-me e repetem-me de novo a mesma cantilena de há mais de quarenta anos, vá lá só mais um, vá lá um último esforço.

 

E eu acabado, e eu amargurado, e eu embolado, e eu para aqui apertado e eles sorrindo, sempre sorrindo, e gordos, cada vez mais gordos, e saem uns para entrar outros e sorriem. E eu caído e eles atropelam-se e sorriem, e gordos, entrando e saindo cada vez mais gordos.

 

Eu caído e desfalecido e eles só mais um esforço… e desta é que é, apostámos vivamente na contracção e no endividamento por isso desta é que é. Apostámos como nunca se viu nos últimos quarenta anos na austeridade e na redução, nunca cortámos assim, por isso acredita meu totó, desta é que é…

 

… E desta é que é, um último esforço vá lá rapazinho, temos que ter a força de vontade que sempre tivemos, a ambição que sempre tivemos.

 

E eles sempre mais gordos, mais vorazes, menos capazes, e desta é que é, e já nem os ouço, e já nem a dor, e já nem me mexo, e nada, agora é que é e nada, nunca foi, nunca será, e só quero dizer uma coisa… eu só queria pedir-vos que parassem para pensar um pouco antes de o gastarem e onde, e como, e me perguntassem a mim se sim, se não, e agora já nem vale a pena.

 

Agora já nem os ouço nem os posso ver. E vejo-os sorrir, saltar, mudar, engordar, mas a ninguém já ouço, nem aos gordos, nem sequer aos magros…

 

E eu nada, eu só queria e agora já nem isso, agora já nem vale a pena. Agora já não os ouço, agora já nem os vejo, agora são os mesmos, sempre os mesmos a rebentar com isto, os da esquerda, os da extrema esquerda, os da esquerda central, os do digital, os do Salão Central, e a cidade sem pinga de sangue e eles a esmifrar, a esmifrarem-me a mim e a ti, a todos, é urgente o capital, o tal que abominam mas sem o qual nada é igual… 


É uma pena, é uma pena não os condenarem à pena capital, serem afogados no capital, na capital, em Paços de Ferreira, capital do móvel, vinte metros abaixo de um pesado imóvel …

 

Ó Évora, Évora, se fosses só três sílabas de plástico, que era mais barato...



segunda-feira, 26 de abril de 2021

691 - OS SINDICATOS, UMA IDEIA DE CIDADE .....

                     


“ OS SINDICATOS “

# UMA IDEIA DE CIDADE #

 

Texto 9 de 12, escrito em 29 de Junho de 2000 e publicado no Diário do Sul em 20 de Setembro de 2000,  antecipado por mor do 1º de Maio.

ATENÇÃO ESTE TEXTO TEM VINTE ANOS !

 

É comum em Portugal o recurso a diminutivos para caracterizarmos tudo o que nos calha à mão. É a bicazita, o cigarrito, o pastelinho, o almocinho, a queridinha etc. etc. Quem se vê à brocha é o estrangeiro que pensar já dominar a nossa língua.

 

Mas o diminutivozinho tem evidentemente uma função denotativa, não a conotativa que lhe anda normalmente associada e, no presente caso, correndo talvez o risco de atropelar a gramática, o sentido que lhe dou é o condicional, pois saibam que pequenez e timidez são condicionalismozinhos que surgem em Portugal, e em Évora, associados ao sindicalismozito.

 

Perguntar-se-ão os leitores que têm os sindicatos a ver com o desenvolvimento da cidade, ao que eu responderei, MUITO.

 

Não são eles os representantes das classes trabalhadoras nas suas múltiplas actividades ou profissões ? Não são eles quem dialoga, discute e estabelece com os representantes das classes empresariais os acordos que maioritariamente têm como preocupação fundamental os salários ?

 

Pois bem, e além desta quase única vertente, os salários, já houve alguma vez notícias de que tivessem analisado os motivos pelos quais o subdesenvolvimento crónico não arreda pé da região ?

 

Se tal aconteceu admito a minha ignorância e culpa mas disso não tive conhecimento, e sou bastante atento ás mais pequenas notícias da comunicação social.  Se aconteceu, isto é se analisaram esses motivos que concluíram ? Que medidas tomaram para os contrariar ?

 

Para mal dos nossos pecados é vergonhoso que o movimento sindical acorde negociar, e aprove tabelas salariais cujos valores a maioria das empresas acaba por superar, pagando salários muito acima dos acordados. Por quê ? Porque se nivela por baixo… Os sindicatos não hesitam em prejudicar a grande maioria dos trabalhadores aceitando tabelas salariais baixas, só porque meia dúzia de pequenas empresas não tem condições para pagar salários mais elevados.

 

Se não têm condições encerrem, não fazem falta, além de constituírem concorrência desleal para as outras empresas aos ser-lhes permitido dessa forma beneficiar de custos mais favoráveis na produção.  Essas empresas não são sinónimo de desenvolvimento, antes pelo contrário, e a realidade é que mais cedo ou mais tarde acabam mesmo por sucumbir, prova que não devem ser artificialmente mantidas.

 

Mas o pior nem é isto, no estrangeiro, em especial na Europa, com quem os nossos sindicatos muito têm a aprender, o sindicalismo é forte e ele mesmo detentor de empresas, de bancos, de seguradoras, de fábricas, ou de posições e participações em empresas cujos dividendos aproveitam, enquanto em simultâneo concorrem para o desenvolvimento e para a manutenção e criação de postos de trabalho.

 

Casos tem havido em que têm sido os sindicatos a tomar posições em empresas condenadas a morrer e que posteriormente fazem delas petiscos muito apetecidos. Calculem-se os benefícios dessa forma de actuação, não preciso certamente enumerá-los aqui.

 

E por cá ? Contestam-se as dificuldades ou o encerramento de qualquer unidade, fabril ou não, através de atitudes inconsequentes, sem procurar saber dos motivos que constrangeram os seus responsáveis a essa posição, tantas vezes (nem sempre) fruto de factores endógenos a essas unidades, a alterações de hábitos de consumo, à concorrência de outras marcas mais dinâmicas, à perda ou extinção de clientes etc. etc.

 

O nosso sindicalismo não é nem dinâmico nem inovador, é estático, e também ele não deu ainda a devida atenção à qualidade dos recursos humanos, à qualidade dos seus quadros, distraído e enfeudado como tem andado a forças políticas tão distraídas quanto ele da velocidade a que o mundo roda.

 

Entretanto cada vez menos trabalhadores hoje neles confiam, menos se associam, sem que sindicatos e centrais sindicais deixem de alegremente repetir slogans, manifestos e modelos há muitos esgotados.

 

Quando veremos em Évora sentados á mesma mesa, sindicatos e empresários, na busca de soluções que lhes são por força das circunstâncias comuns e que lhes deveriam há muito ter dado consciência da ligação umbilical que os une, quando ? Não viram ainda sindicatos e patronato que o seu percurso é indissociável, que é a sua própria sobrevivência que está em jogo ? A nossa própria sobrevivência ? Não reconheceram ainda que já não está nas suas mãos o poder de decidir ? Que é a nível mundial que as decisões são tomadas e que do impacto desse embate resultam maiores ou menores estragos consoante a força e a unidade que apresentarmos ?

 

Quando deixam os sindicatos de ver na classe empresarial o inimigo a abater ? Quando deixam de ver em cada empresário um fascista sem escrúpulos ? E quando deixam os empresários de ver nos sindicatos uma fonte de problemas ? Um bando de ladrões ? Um grupo de arruaceiros ? Quando é que ambos tomam consciência de que são parceiros sociais, actores do drama que liberalização e globalização nos obrigam a encenar ? Claro que nem todos os empresários são uns santinhos ou todos os sindicalistas um modelo de virtude, mas o mesmo se pode dizer de qualquer outra classe profissional ou funcionário. Não confundamos a floresta com a árvore, a excepção com a regra.

 

Quando soube que se sentaram à mesma mesa, sindicatos, associações patronais e empresariais, câmara municipal de Évora, Centro de Formação Profissional, Instituto do Emprego, Ange e outras entidades com responsabilidades no nosso desenvolvimento fiquei feliz. Começa finalmente a compreender-se que só a união de esforços, a convergência de opções estratégicas, poderá contribuir para a obtenção de resultados que a todos interessem. É que há tantos campos em que parcerias entre todas as partes envolvidas podem ser trabalhados, e que são caminho possível para que Évora possa emergir do marasmo em que sucumbiu que não podem ser descurados.

 

A autarquia certamente já concluiu, ao ter clamado em recente encontro por mais e melhor democracia, participação e transparência, que lhe cabe um importantíssimo papel no desbravar dos caminhos do futuro, que não pode fechar-se sobre si própria, sobre a sua muito pessoal visão do mundo. Que com isso só motivará o desinteresses e o alheamento de muitos, resignadamente à espera que caia de velha, como aconteceu com o muro de Berlim, e que no entretanto o tempo se dissipa sem proveito para ninguém.

 

Já agora, a titulo que conclusão, porquê a simbiose nada aconselhável, que se tem verificado ao longo de anos entre as posições da câmara e dos sindicatos eborenses ? Que procuram ? Que ganham com isso ? Que perdem ? Não são os seus papéis distintos ? Nunca ouviram dizer que trabalho é trabalho e conhaque é conhaque ? Nunca lhes passou pela cabeça que nem todos os trabalhadores comungam das mesmas opções políticas ?

 

Para que Évora e o Alentejo possam um dia vestir a camisola amarela, terão primeiro muitos eborenses que despir a camisola do preconceito e envergar a que diz “orgulho de ser Alentejano” Ah !  E arregaçar as mangas…

 


ATENÇÃO ! NOTA ! Esta crónica, antecipada mor do 1º de Maio,  foi escrita em 29 de Junho de 2000 e publicada no Diário do Sul em 20 de Setembro de 2000 - ATENÇÃO ESTE TEXTO TEM VINTE ANOS ! QUALQUER COMPARAÇÃO COM A ACTUALIDADE SERÁ MERA ESPECULAÇÃO !!


sábado, 24 de abril de 2021

O ABRIL DE MISÉRIA QUE A ESQUERDA CRIOU

                  



690 “ O ABRIL DE MISÉRIA QUE A ESQUERDA CRIOU “

# TEXTOS POLITICOS  6 #

 

 É hoje mais que sabido não ter sido o 25 de Abril uma revolução, foi antes um arrastão que levou tudo e todos na frente. Em relação a essa época o que mais se apregoa é o facto de termos ganho liberdade, sobretudo liberdade de expressão e não estarmos sujeitos à anterior opressão, são factos objectivos na sua totalidade os quais porém se revestem para cada um de nós de uma subjectividade própria, pessoal, avaliada segundo o nosso prisma, a nossa experiência. Pessoalmente acho que continuamos vivendo numa ditadura encoberta e bem disfarçada sob a capa duma falsa sensação de liberdade. Tão falsa é essa sensação que facilmente a podemos comparar, não existe mais liberdade de expressão agora que havia dantes, hoje podemos gritar à vontade, dizer tudo que nos vier à cabeça, é verdade, mas ninguém nos ouvirá, ou calar-nos-ão não nos dando os meios p’ra nos fazermos ouvir, as leis de imprensa e da rádio não por acaso têm trela curta.

  

Naturalmente a opressão actual é diferente, mais subtil, este tipo de opressão, actuante mas subjectiva, socorrendo-se e escondendo-se nos conhecimentos da psicologia, não tem culpados, só sofredores. Atenção, eu não digo que dantes é que era bom, eu sou dos que também viveu nesse antes, para além disso estudei-o e continuo a estudá-lo, não era contudo tão mau como o pintam, o escondem e se escusam a discuti-lo. Se Salazar é acusado de jogar com a nossa ignorância, a democracia actual continua a alimentá-la e a cultivá-la. O que eu digo é que, quando o ensino podia e devia ser bom, não existem razões de força maior para ser mau, é péssimo, não produz saber, o ensino de massas resultou num fiasco onde os contribuintes despejam demasiado dinheiro para os parcos resultados obtidos, dinheiro que nunca terá retorno.

 

 Questões de desorientação ou desorganização que nunca superámos, depois do ano 2000 e após recebidos biliões estamos cada vez mais longe da Europa, divergimos em vez de convergirmos, um paradoxo, um lugar onde os jovens não ganham o suficiente para arrendarem uma casa, nem ganham para casar nem para ter filhos, condenando-nos a um inverno demográfico fugindo daqui a sete pés, atitude incompreensível para um primeiro-ministro bem-intencionado e incapaz de compreender e aceitar quem não veja este país como um paraíso...

  

Existe desde 1974 uma “união sagrada” em torno da memória do golpe. A esquerda, nostálgica mas ignorante vive esta data como um momento poético do passado, e a direita, caceteira, seja ela astuta ou manhosa nunca percebeu que Abril poderia ter significado mais do que um novo começo da nossa história. A nossa direita, carregada de reumatismo, vivia acomodada e de braço dado com privilégios e valores anquilosados que uma justa, moderna e actual hierarquia recusaria, hierarquia que ainda não tem.  O devir foi obrigado a seguir um caminho que como sabemos passou pela revolta, sucede que embora não duvidemos da generosidade dos revoltosos também não acautelámos o seu cinismo nem a sua incompetência e irresponsabilidade para tomarem conta do país.

  

Não houve revolução, houve um arrastão, um movimento “sociológico” de massas, porém político, sem projecto e sem direcção. A nossa Abrilada do dia 25 não foi mais que um movimento de contestação, inventaram-se umas palavras de ordem, palavras enganadoras, sabemo-lo hoje, e não se pensou em mais nada, de concreto havia que repor as regalias que a tropa ia perdendo com o recurso aos oficiais milicianos, sabemos agora como a guerra era um negócio e os instalados nela estavam a ficar mal... As coisas ultrapassaram o esperado, houve barricadas, manifs, e os militares viram-se com uma revolução nas mãos que nem tinham desejado, imaginem que até os pides tiveram que prender, quem teria imaginado tal desiderato ?

 

 Daí para a frente conhecemos a história, ganharam os oportunistas, os videirinhos, os arrivistas, ganhou a ignorância, a irresponsabilidade, a incompetência, isto só pode acabar mal, mas como o meu temor é que fique tudo na mesma, pois que acabe quanto mais depressa melhor.  Por isso hoje temos o partidarismo, a corrupção, os direitos adquiridos sem contrapartidas, faltando-nos assistir ao fim, à decadência, sem jamais assistirmos a uma mudança de sensibilidade ou a quaisquer mudanças estruturais.

 

Sobra-nos sim até demais essa nova sensibilidade, essa nova transversal e consensual tendência, o sectarismo. Passámos do antifascismo para o bairrismo e para o partidarismo de onde nasceu o sectarismo, numa deriva semântica e ideológica doentia de que todos ou quase todos acabamos por sofrer, que nos fecha em nós e na nossa panelinha, que como uma lapa agarra os instalados aos lugares, que trava o crescimento a modernidade e o desenvolvimento. O problema é que Abril não mudou o Estado, não mudou nada, continuamos com as mesmas estruturas herdadas do Estado Novo, agora mais débeis, mais enfraquecidas, a ausência de reformas mata-nos.  

  

Hoje os estrangeiros e as multinacionais são donas disto tudo, nada temos de nosso além da divida e dum futuro negro, ficámos escravos na nossa própria terra, claro que podemos sempre votar com os pés, abalar, mas terá sido para isso que o 25 de Abril foi festejado ? Salazar teria enfiado sem contemplações toda esta gentinha corrupta em Peniche ou no Tarrafal, e não seriam bem metidos ? Bem engavetados ? Ele não era santo, são os de hoje quem faz dele santo ao serem bem piores, sim os de hoje, os mesmos que nunca foram capazes de o apear, foi uma cadeira velha quem acabou com ele, não foi a contestação burguesa ou operária, uma vergonha que nos acompanhará história fora.


 Não, não me peçam para festejar Abril, há que ter coragem e hombridade para recusar este Abril, convidem-me para um novo Abril, isso sim, vai ter que acontecer, mais tarde ou mais cedo, com menor ou maior violência. Andam a gozar-nos e a cagar-nos em cima, coisa que nem Salazar se atreveu a fazer.  



quarta-feira, 21 de abril de 2021

689 - O JULGAMENTO DAS ESQUERDAS ..............

                

  689 - " O JULGAMENTO DAS ESQUERDAS "

 # TEXTOS POLITICO 5 #

 

Mal vai a coisa quando meia dúzia de gatos-pingados, cabisbaixos, esmorecidos, tão compenetrados como num velório inauguram nas traseiras dum teatro com mais de um seculo um estacionamento de superfície, obra meritória sem dúvida, mas sem mérito algum pois representa para uma cidade ávida de lugares de estacionamento menos que gota de água no oceano, sendo obra que não enche a cova de um dente.

 

Quando a cidade precisa de lugares de estacionamento como de pão para a boca, e quando naquele lugar poderia ter sido construído um moderno Silo, enterrado no chão dois ou três andares, com mais dois ou três acima da superfície e cuja volumetria não colidisse se vista do exterior das muralhas com a linha de construção tácita e regulamentarmente aprovada, já que de resto seria escondido pelo edifício do teatro e por um dos prédios adjacentes salvo erro com 4 pisos.

 

Silos modernos que movimentam os carros como na farmácia um robot automático percorre as prateleiras para ir buscar aspirinas ou Rennie, Buscopan, Xanax, Viagra ou Brufen.

 

Bem negociado, concessionado, não nos custaria um tostão e resolveria o problema do estacionamento não com 78 lugares mas com duas ou três vezes 78 baias, e a longo prazo seria nosso. Aliviaria a pressão sobre a cidade, traria gentes ao burgo, seria mais uma mão salvadora do comércio tradicional e local.

 

É forçoso que sejamos ambiciosos, é urgente que não nos contentamos com pouco, é imperativo usar a cabeça para resolver de vez problemas com décadas, seria elegante que as soluções fossem procuradas e encontradas entre todos e não decisões unilaterais para contentar eleitores militantes.

 

Tentei ver quem, quantos e onde estaria a massa humana que assistiu àquela triste, envergonhada e vergonhosa inauguração, acabei por desistir quando alguém me disse que não teria havido mais de uma dúzia de assistentes e convivas batendo palmas, entre eles um fotógrafo, um motorista da casa, o cônjuge de um ou outro dos personagens visíveis na cerimónia, talvez um filho ou filha, um homem da rádio, outro dos jornais, meia dúzia de irrevogáveis seguidores, dois ou três militantes mais activos e comprometidos. Já vou em 15 pessoas assistindo à cerimónia, fico-me por aqui, não quero pecar por excesso.

 


 Uma obra verdadeiramente exemplar e demonstrativa da capacidade, volume, alcance e visão de quem nos governa, uma obra à qual falta cosmopolitismo, visão do mundo e audácia, uma obra atestando que quem nos governa tem horizontes muito limitados, nunca terá saído do Alentejo, provavelmente ter-se-á ficado entre Évora e Montemor a vida inteira.

 

Uma obra que foi concebida sem rasgo, sem contestação, sem uma interrogação ou observação sequer sobre o futuro. Aquela obra é uma antevisão do nosso futuro que ali está nitidamente plasmada. Certamente um ror de gente e uma catrefa de gabinetes estiveram implicados em tão arrojado projecto, é bom que os eborenses saibam com quem contam e com o que contam. O tão conhecido quão engraçado e divertido Portugal dos pequeninos ainda nos invejará.

 

Portugal, o Alentejo e Évora estão arruinados e amordaçados, 46 anos de governos de esquerda conduziram-nos ao desastre, desde esta cidade ao pico da governação e do país, resultados ? Tudo passado a pataco, vendido ao desbarato a estrangeiros, já nada é nosso a não ser uma colossal dívida.

 

Os culpados deste descalabro, de deputados municipais aos nacionais, de governantes a directores gerais deveriam ser julgados como traidores da pátria e ladrões do futuro de muitas gerações, deveriam ser julgados e condenados civil e criminalmente mas, sendo essa tarefa impossível pois souberam resguardar-se, julguemo-los nas urnas, derrotemo-los com o voto, não permitamos que no futuro, sozinhos ou de mãos dadas, artolas ou caranguejolas venham a ter nas mãos o nosso futuro. Isso mesmo ! Matemo-los com o nosso voto antes que nos roubem o pão da boca, a dignidade, o emprego, e acabem por nos matar à fome com a sua irresponsabilidade, com a sua incompetência !

 

Abaixo artolas e caranguejolas !

 

Um abraço

 

NOTA: Este projecto, esta magnifica obra resultou da candidatura apresentada pelo Município ao Programa Operacional Alentejo 2020, no âmbito do PEDU – Plano Estratégico de Desenvolvimento Urbano, através do qual obteve financiamento a 85%. 

O dinheiro, sempre o dinheiro, a CME só teve que colocar do seu bolso 15% do capital investido. Compreendo agora mais uma razão para não se ter ido mais longe, a dívida colossal e limitadora que a CME carrega, que todos carregamos às costas e pagaremos com um palmo de língua fora. Não só temos que gramar os ossos, as sobras, os restos pois para mais não há, como ainda temos que gabar quem nos estende a gamela. Tivessem acordado a sua construção concessionada e nem um tostão teria sido necessário para erguer um moderno e exemplar estacionamento. 

O liberalismo é sublime, liberta a inspiração, a criatividade e a iniciativa que há em nós, mas é o capitalismo que é extraordinário, incomparável, inigualável e tem resposta para tudo, mecanismos financeiros para tudo desenrascar, até a China comunista o adoptou para sobreviver. Já a doutrina de economia centralizada é castradora do intelecto, opressora da vontade, dominadora do querer, centralizadora e integradora à força nas ideias do partido único, é o azar, é o diabo, é a escuridão e não vingou nem na terra onde nasceu …

Eborenses abram a pestana, andam sendo comidos por parvos há mais de quarenta anos… Ah ! E o telhado até suportaria os tais painéis solares de que o meu amigo Óscar tanto gosta. 


688 - "CIGANOS ÉVORA" #TEXTOS POLITICOS 4#

 

“ CIGANOS - ÉVORA “

# TEXTOS POLITICOS 4 #


Muito frequentemente a questão dos nómadas, a questão de gente diferente, dos ciganos, vem à baila em Évora, em especial nas redes sociais.


Hoje mesmo, um desses elementos, um desses perfis lançava a seguinte questão e desafio:


- “ Será que os candidatos às autarquias da região de Évora terão força e não medo de acabarem com os benefícios que a câmara dá aos ciganos ? “


Convenhamos que a pergunta enferma de vários óbices, para não lhe chamar erros e não ofender o articulista. Mas lá iremos, primeiro há que responder a homem tão curioso e a quem ou p’ra quem os ciganos serão o maior problema desta cidade, ou o maior problema que enfrenta. Homem feliz portanto, só tem um problema, deduzo eu.


Apresentei-me, sou um dos candidatos em Évora, podia ignorar comodamente a sua pergunta mas não o farei, nunca deixei quem quer que fosse sem resposta. Aliás a resposta a essa questão já a dei numa entrevista de âmbito nacional, consulte-se o semanário Expresso do dia 11 do corrente.


Mas a esse caro amigo, ou caro perfil, não veio à memória ou não lhe ocorreu o facto da pergunta envolver uma série de óbices ou erros, começando por estar mal dirigida. Não será aos autarcas mas sim aos deputados municipais, aos membros do Parlamento Municipal, vulgo Assembleia Municipal (onde por inerência todos os presidentes de juntas de freguesia estão representados, ocupam um lugar) quem terá e tem capacidade legal para se debruçar sobre tão candente assunto e dizer de sua autoria o que o Presidente deverá fazer.


É que o tal Presidente a quem ele se dirige apenas preside, a Assembléia Municipal é que é o órgão executivo, o Presidente executa o que a A.M. lhe ordena ou autoriza, sanciona, e é a esta A. M. que cabe não só a responsabilidade como a resposta à questão, ao problema ou à solução do problema que os ciganos eventualmente represemtem e que tanto o preocupam.


Naturalmente quaisquer presidentes terão a sua opinião acerca do tema, opinião que para o caso nada vale, a não ser que seja atirada para o debate numa reunião, numa assembleia da AM e esta a apoie, a adopte e a aprove, isto é que a assuma, que se responsabilize por ela.


Logicamente essa comunhão de interesses, competências e responsabilidades seria a situação ideal, mas como sabemos muitas vezes o ideal é inimigo do excelente, ou o suficiente do bom, ou o bom do óptimo... Infelizmente na grande maioria das vezes é o Presidente quem manda na Assembleia Municipal e lhe dá ordens (o que está completamente em desacordo com o consignado na lei) subvertendo a lógica do regimento da mesma e da própria democracia. E por falar em democracia adiantarei que não chegaremos a lado nenhum com ela a funcionar nestes moldes...  


No que concerne aos ciganos sei que a CEE reconhece o seu estatuto apátrida e respeita-o, respeita-os. Atendendo a esse facto envia-nos anualmente milhões para os integrar e os socializar caso eles aceitem aceitar a integração. Esse bolo, esse montante de milhões que lhes é destinado e por eles deveria ser distribuído como subsídios alimenta contudo centenas de académicos cuja vida tem sido dedicada ao estudo dos ciganos, da pobreza, etc etc etc ... Estudos que os têm enriquecido...


Tão admirável bolo alimenta ONG’s diversas, uma miríade de organizações governamentais ou não, departamentos universitários, instituições insuspeitas, associações que grassam como cogumelos, milhares de técnicos das mais diversas naturezas, dando emprego a milhares de portugueses de norte a sul, etc etc etc … Digamos que quem mais beneficia com os valores ou verbas destinadas aos ciganos, curiosamente somos nós… 


Talvez dez por cento do bolo chegue às mãos dos ciganos, às mãos daqueles a quem se destinam, e mesmo esses dez por cento desejaríamos para nós se pudéssemos deitar-lhe a mão… 


Haja calma bom senso e um travão à cupidez, é provável que se tanta narda lhes chegasse às mãos os ciganos nos deixassem os ténis em paz, e as calças e camisas deixadas esquecidas continuando corando no arame…


Mais a mais imaginemos que de repente lhes chegava a todos, todos os ciganos, uma vontade de trabalhar indomável… Quem ? Qual de nós lhes daria emprego ?


E já agora por falar em emprego, em empregos, onde estão eles, mesmo aqueles que deveriam ser p'ra nós ? Onde estão esses empregos ? Onde está o desenvolvimento que há décadas apregoam à boca cheia ?


É caso para meditarmos e nos darmos regularmente ao cuidado duma introspecção, há-de valer a pena, talvez até aprendamos algo. Ganharemos no mínimo uma oportunidade para olhar para nós mesmos, coisa que deveríamos fazer mais vezes.


Um abraço 




sábado, 17 de abril de 2021

687 - O DIFÍCIL ESTACIONAMENTO EM ÉVORA


“ O PROBLEMA DO ESTACIONAMENTO EM ÉVORA “

# TEXTOS POLÍTICOS 3 #

 

Independentemente dos muitos problemas que a cidade / concelho de Évora apresenta, três deles pelas suas características e implicações / ligações ao todo económico e social ganharam lugar de charneira nas preocupações da minha candidatura;

 

- A ECONOMIA, a variável mais fraca e ao longo de décadas a menos cuidada apesar dos enormes reflexos que tem nos mais variados aspectos de vida da comunidade. Economia significa empresas e empresários, e do sucesso destes depende o sucesso do emprego, das oportunidades abertas à juventude e à sua fixação e futuro, depende afinal o sucesso do nosso bem-estar e qualidade vida.

 

- O COMÉRCIO TRADICIONAL, com o foco principal no estacionamento, calcanhar de Aquiles duma cidade construída quási antes do inventar da roda e cujo espaço intramuros é disputado de tal forma que um erro na sua gestão condenará alguns a favor de outros. Da má gestão dos espaços dedicados ao estacionamento poderão resultar consequências altamente nefastas para a existência positiva do comércio tradicional, do emprego, e de vida e morte para a própria cidade.

 

- O ESTACIONAMENTO, mais estacionamento significará mais clientes, mais vendas, mais emprego, mais gente no centro histórico. Centro histórico agora prestes a passar à história pois tem sido alvo de uma tão grande devastação que erros de gestão e crises governamentais têm provocado que, enormíssima percentagem do comércio tradicional se viu obrigado a fechar as portas. O que significa menos riqueza, mais desemprego, menos rendas, enfim, um calvário de que somente a ignorância e a cegueira têm tirado proveito, se é que daí se tira proveito algum.

 

Para mal ou para bem dos nossos pecados a civilização deu-nos o automóvel, e antes que sejamos clientes ou compradores, antes mesmo de sermos peões deambulando pelas ruas e arcadas da cidade mirando as lojas, somos automobilistas. É ao volante do nosso carro que maioritariamente nos dirigimos ao centro histórico, entre outras coisas para efectuar compras. O contínuo bater com a cabeça na parede, isto é, uma, duas, três e quatro vezes não encontrando espaço para estacionar leva-nos a abandonar a ideia de entrar na cidade velha, logo a não comprar, a não a habitar, a ignorá-la, a virar-lhe as costas. Inconscientemente estamos a matá-la, e com ela ao comércio tradicional, ao emprego, ao arrendamento e ao nosso futuro.

 

Todos ficamos a perder, então que fazer ? É simples, aumentar os espaços de estacionamento, discuti-los entre peões e automobilistas, levar a que ambos façam cedências, um pouquito de espaço a menos para os peões, que também são automobilistas, conduzirá ao reavivar da cidade, do comércio tradicional e do emprego a ele afecto. É propósito desta candidatura alterar radicalmente a gestão existente e quadruplicar os espaços de estacionamento durante os anos da sua vigência.

 

Problema candente em toda a parte, o estacionamento, exige soluções tendo em conta o automobilista, mais que o peão, pois este antes de sair do carro e ir a pé onde deseja, sai de casa ao volante do seu carro e tudo o que procura é um lugar onde estacionar. Nenhuma cidade evoluirá sem o problema do estacionamento resolvido, Comércio Tradicional e turismo poderão nunca medrar por falta de estacionamento… O Alentejo é grande, o espaço é muito, por que razão parece termos as vistas curtas ? Nunca haverá cidade turística sem estacionamento, não o esqueçam, eu nunca tal esqueci.

 

Em Évora há que saber aproveitar a antiga garagem/estação da RN, com estruturas capazes, para nela erguer um silo de estacionamento dentro da cidade e sem ferir o visual citadino. Debaixo de jardim Diana existe outro belíssimo espaço a aproveitar, no largo da Igreja da Misericórdia outro, e no próprio largo da autarquia. Se queremos salvar o Comércio Tradicional e a cidade teremos que arranjar lugares onde cada automobilista possa estacionar. Condicione-se o estacionamento de que forma seja, criem-se contudo lugares, muitos mais lugares que os que há e a cidade e todos nós ganharemos.

 

Neste sentido urge agora não perder uma oportunidade de ouro, “transformar” a antiga estação da Rodoviária Nacional num silo para estacionamento, o que seria conseguido sem lhe estragar a fachada e aproveitando esse enorme espaço intramuros em benefício concreto da cidade, do turismo e do comércio. É agora a hora de fazer essa opção, nem se devem acerca desse espaço fazer quaisquer opções antes das eleições e da escolha de um novo executivo pelos cidadãos.

 



sexta-feira, 16 de abril de 2021

O TURISMO EM ÉVORA, TEXTOS POLÍTICOS 2

               

 686 “ O TURISMO EM ÉVORA “

# TEXTOS POLÍTICOS 2 #

 

Herdámos uma cidade impar, herdámos em monumentalidade uma riqueza inigualável, há muito amortizada, e cujos custos de manutenção, os únicos que temos com esse património, representam uma ínfima parte do rendimento que poderão proporcionar-nos.

Cuidar da cidade património mundial, mais que um dever é uma obrigação lógica, não temos minas de oiro nem poços de petróleo, mas temos sol e uma arquitectura monumental que nem temos sabido explorar devida ou convenientemente.

Dar nova vida a essa monumentalidade é fulcral, obter através dela novo fulgor, vigor e mais rendas para a nossa cidade, para todos nós. A preocupação e a atenção a pequenos pormenores aparentemente insignificantes como o estacionamento são fundamentais.

Não encontrar espaço para estacionar leva o turista, o visitante a abandonar a ideia de ficar ou recomendar a cidade. Logo não ficando não compra, ignora-a, virar-lhe as costas.

Não inconscientemente mas com plena consciência deste facto estamos a matar a cidade, e com ela o Turismo, o Comércio Tradicional e tudo quanto em redor deles volteia. Neste sentido urge agora não perder a oportunidade de “transformar” a antiga estação da Rodoviária Nacional num silo para estacionamento, o que seria conseguido sem lhe estragar a fachada e aproveitando o esse enorme espaço intramuros em benefício concreto de cidade, do turismo e do comércio.

É agora a hora de fazer essa opção, nem se devem acerca desse espaço fazer quaisquer opções antes das eleições e da escolha de um novo executivo pelos cidadãos.

É já mais que tempo para se tirarem conclusões, passaram anos sobre o fenómeno, a cidade morre, a cidade afunda-se social e economicamente sem que lhe acudam. Se queremos uma cidade com vida, amiga do turista, uma cidade viva e inclusiva onde os cidadãos e os visitantes se sintam bem acolhidos e melhor recebidos, se queremos manter vivo o comércio tradicional e apostar no turismo não podemos expulsar o turista, antes cativá-lo, fazer com que se sinta aqui bem, bem acolhido.

Pequenas atenções revigorarão o turismo eborense, muito centrado na hotelaria e restauração, quando há imensas possibilidades e potencialidades esperando a sua oportunidade.

O desenvolvimento do turismo poderá efectivamente, e não potencialmente, não gosto de trabalhar sobre ideias vagas mas sim sobre coisas concretas, iria contribuir para a criação de imensos postos de trabalho e para o aparecimento e desenvolvimento de muitas empresas das mais diversas especialidades que, ainda que a ele ligadas indirectamente se encontram dele dependentes, quer a montante, quer a jusante, e que sem ele nem surgirão nem vingarão.

Évora, a cidade que se quer bater com outras cidades como cidade da cultura é todavia uma cidade hostil, uma cidade que exclui, que segrega, que empurra para fora, que não nos quer no seu seio. É uma cidade simultaneamente agreste e agressiva, pontilhada de pilotis, proibições, condicionamentos, quando pelo contrário deveria ser uma cidade inclusiva, que nos desse atenção e onde nos sentíssemos abraçados, acolhidos, amados.

Por exemplo, os bloqueios ao estacionamento no Largo da Misericórdia e no passeio fronteiro a um determinado Hotel são verdadeiros instrumentos de tortura medievais. Admito que cumpram a sua função, mas é precisamente essa função que está errada, o resto mais não é que o seu reflexo material, bárbaro.

Um turista chega e, deslumbrado com a cor das acácias no Largo da Misericórdia ou com a lindíssima alva matinal alentejana ao chegar ao hotel, em qualquer dos casos distrai-se, a roda embica num desses instrumentos medievalescos, o pneu rasga ou rebenta, aí estão umas férias estragadas e uma cidade que jamais lhe sairá da memória pelas piores razões… Rico turismo…

Ou turismo p’ra ricos desafortunados…


Pintura de Fátima Magalhães, "Monte Alentejano" acrilico sobre tela, 30x30




685 - " ÉVORA E O CÉLEBRE CORREDOR AZUL "

685 - " ÉVORA E O CORREDOR AZUL "

# TEXTOS POLÍTICOS 1 #


Estava eu limpando a despensa quando ele me apareceu, todo de azul, aliás aparece de vez em quando. Sim, real e frequentemente a comunicação social do burgo o tráz à fala como sendo uma das potencialidades de Évora e do Alentejo, o célebre (porque muito martelado na imprensa) CORREDOR AZUL. Basta dar uma vista de olhos na net para nos depararmos com dezenas ou centenas de entradas incensando esse tal corredor ligando Lisboa/Setúbal a Elvas e ao Caia, logo a Badajoz e à Europa. Acabei de consultar a NET e encontrei 121.000, cento e vinte e uma mil entradas em somente 9 páginas… Não acham conversa a mais para tão poucos resultados ?

O problema do celebérrimo CORREDOR AZUL é que apenas tem alimentado os areópagos de políticos bem-falantes, dos tais que nos enchem a cabeça de promessas por cumprir e de ideias aparentemente radiantes. Mas onde estão os investimentos, as fábricas, as empresas, os produtos, os empregos, onde está o produto que necessitaria, exigiria o recurso ao CORREDOR AZUL ?

 Simplesmente não está, não há, nada mais houve ou há que conversa balofa para inglês ver e enganar papalvos. Quem e quantos dos municípios envolvidos se empenharem no apoio a empresas e empresários, no apoio ao emprego, no apoio à criação de riqueza que corresse ou escorresse pelo tão badalado corredor ?

A captação do investimento que alimentaria o CORREDOR AZUL por parte de todas as autarquias por ele “atravessadas” de Lisboa a Elvas, com passagem por Évora, parece ter falhado redondamente.

Como tantas outras coisas no Alentejo e no país o CORREDOR AZUL é mais um bluff, um logro cujo fim tem sido unicamente conquistar votos para continuar não fazendo nada…

Sim, porque pra fazer estamos cá nós,

Nós e o CHEGA, para fazer o que ainda não está feito…!




quarta-feira, 7 de abril de 2021

684 SOBRE O VIVER E O PENSAR by Luísa Baião *

             


684 - SOBRE O VIVER E O PENSAR by MARIA LUISA BAIÃO *

 

Vi-a vasculhando um caixote, depois outro. Virava e revirava os conteúdos, seleccionava os frascos, cujas tampas abria e, cheirando-os, com os dedos magros e sujos aproveitava o pouco ou nada que podia. Caía uma chuva miudinha, daquelas que não incomodando nos repassa se distraídas, a roupa e a alma.

 Era lusco-fusco, os faróis dos carros acesos, redondos, projectavam-se rectilíneos e infindos no piso molhado, espelhado, sem poças. Não a incomodavam já os olhares de quem passava e menos ainda de quem, como eu, sentada à mesa e à janela, caneta e papel na mão esperando motivo e inspiração para mais uma crónica, a olhava surpreendida primeiro, compreensiva depois.

 Que esconderiam aqueles andrajos? Aquela sofreguidão por algo que pudesse levar à boca? Aquela quase insolência para com o tempo, o desdém por quem a olhava? Não proíbem já a mendicidade como dantes parece, pelo contrário, estar a democratizar-se a pobreza.

 Globalizámos a pobreza e a miséria. Não precisamos mais das imagens do Sudão, da Etiópia, de Darfur. A globalização galopante e impante dos nossos dias coloca-nos à mesa queijo francês, frutas tropicais, vinhos internacionais. Mas igualmente na nossa peugada, os chacais de cujos restos os velhos e novos pobres aguentam os dias e os ais.

 São vidas preenchidas de tédio, mergulhadas em hábitos de limos que os ventos, em lamentos sibilantes, sopram em nossa direcção entristecendo-nos, envergonhando-nos. Sobre os ombros um xaile coçado. Pensei ter sentido o cheiro desse xaile.

 Um mistério naquela rua sombreada, com pouco movimento. No céu, escuro, brilharam relâmpagos, ecoaram trovões.

 A mulher vasculhava, vasculhava, como se a sua sobrevivência estivesse em jogo. A mim assaltavam-me náuseas, angustia. Via-a e ouvia-lhe o silêncio do esgaravatar no lixo, a silhueta débil, como se a vida lhe fosse estreita e estranha, por certo não lhe permitindo extravagâncias.

 A noite caía na directa proporção da mágoa que me crescia na alma. A sombra que a mulher é agora entreolha, espreita, faz-me calafrios. Estou petrificada perante essa sombra cujo rosto não diviso. Ela ignora que lhe invado os segredos, lhe traço mentalmente o carreiro do destino, lhe percorro o fado. Olho-a daqui, deste meu castelo onde habito segura. Sinto vontade de chorar. A vergonha tolhe-me.

 Que fazer com esta sombra que se multiplica na minha consciência a ponto de parecerem já mil, dez mil sombras, dez milhões?

 Terá alguma vez sido cliente da PT, provável consumidora da EDP, tido porventura conta na CGD, consumidora fiel da GALP, ficado com dívidas a alguma seguradora? Aproximo-me da sacada e vejo a rua negra e, na sombra, essa sombra que se arrasta e ameaça dissipar-se na névoa que se espalha.

 Um vazio entorpece-me, sinto esse vazio nas ruas desertas onde, em que, a madrugada irá mitigar esta angústia. As histórias de pobreza e de miséria repetir-se-ão, como miragens de horizonte em horizonte e retornarão às minhas horas atrás da janela olhando as ruas distantes, porque não as sinto já minhas mas de uma multidão de indigentes, crescente, vindos, nados, nas prosperidades de outras gentes que não eu, que me envergonho deste progresso que criei, que criámos. 

Aqui fiquei, assim fiquei, nesta solidão escura de minha casa onde, em sobressalto o coração bateu. Não fugi, não reagi, não dormi, nem a vontade se impôs contra este sobrenatural desvelo com que à valeta encostamos os novos e os velhos.

 O silêncio quedou-me, sussurrou-me verdades nada atreitas às amenidades burguesas de que desfruto, há muito atormentada, agora em luto. Silêncios que encobrem esquecimentos, desinteresses, recusas. O silêncio arquitectou-me planos, deu-me argumentos contra o sofrimento infligido por aqueles que não jogam limpo. 

Silenciar este silêncio incómodo é gritar aos quatro ventos quanto sou, quanto somos cúmplices dessas vidas que o não são, que não ouvimos, que não vimos, que não dizem nada, nada mais do que nos conta uma expressão magoada, lágrimas, choro, vergonha.

 Olhares sombrios de amargura, momentos tristes de vidas que o foram, agora em suplício, em despedida, em medo, em indiferença a nós votada. Sucesso, prazer, reconhecimento, status, graça, alegria, dinheiro, fama. Vãs glórias que não escondem a pobreza fingindo existências surdas, mudas, cegas aos nossos olhos bem pensantes.

 “Tenho tanto sentimento que frequente / me persuado de que sou sentimental / Mas reconheço ao medir-me / que tudo isso é pensamento / que não senti, afinal / Temos, todos que vivemos / uma vida que é vivida / e outra vida que é pensada / e a única vida que temos / é essa que é dividida / entre a verdadeira e a errada / Qual porém é verdadeira / e qual errada / ninguém nos saberá explicar / e vivemos de maneira / que a vida que a gente tem / é a que tem que pensar “  **

 
* Maria Luísa Baião, editado em 07-04-2012 no Facebook

** Fernando Pessoa – 1933 – “Sobre o Viver e o Pensar“