terça-feira, 23 de janeiro de 2018

PENA DE PAVÃO EMPROADO... DEPENADO ...


PENA DE PAVÃO EMPROADO, DEPENADO

Encontrei penando, no chão,
uma pena de pavão,
pisada e repisada,
a um canto desprezada,
abandonada, envelhecida,
estragada.

Não,
não era minha conhecida,
era uma pena, em tempos colorida,
deixando ver ainda, entre mágoas,
cores iridescentes, lindas,
como quando o sol se reflecte nas águas
dos mares, águas profundas, infindas.

Mar caixão de mágoas e penas que tais,
caixão de inocentes, de penas capitais,
como esta ali caída,
num canto do café esquecida,
ignorada.

Ela que já fora colorida,
talvez temida, talvez amada,
talvez dissoluta, talvez depravada,
talvez destemida, talvez odiada,
talvez arrependida, talvez perdoada,
talvez abençoada, talvez redimida,
talvez.

Encontrei-a no café um dia destes,
estava no chão, encolhida, 
no chão, tímida,
estirada num canto, compungida,
ali estava, resignada,
dando pena, a pena.

Peguei nela,
sacudi-a,
dei-lhe vida,
meti-a na pasta,
por onde andou com os lápis,
porque há penas que dão pena,
outras doem se arrancadas.

Depois guardei-a,
entre páginas nunca lidas,
entre páginas virgens,
a que decorei o número,
a que fixei as margens,
não fosse um dia esquecer-me
de a incluir entre as bagagens,
levá-la comigo,
fazer dela minha,
o meu marcador,
entalá-la,
entre o lido e a ler,
entre o deve e o haver,
marcando o lugar,
o tempo,
o ritmo,
o presente e o futuro.

E talvez,
um dia nós dois, sós,
pisássemos o risco,
saltássemos o muro,
e, de mãos dadas,
apesar das penas,
talvez sejam penas que dão para rir,
apesar das mágoas,
dor aqui dor ali como num teclado,
perdendo teclas e algumas penas,
apesar dos anos,
apesar dos ais,
ficássemos olhando os pôr do sol no cais,
infindas madrugadas.

Certo dia um pavão picou-me,
e eu arranquei-lhe as penas quase todas,
tantas quantas lhe deixei,
pois inda escrevo com pena de penas,
de penas, e de mágoas,
mas voltando ao pavão,
agarrei-o p'lo pescoço,
digo-vos, nem molho o pavão na tinta,
obriguei-o a engolir um tinteiro,
inteiro,
hoje sou um bandoleiro,
e escrevo as minhas histórias
c’o o bico dele, e olhando o galinheiro.  


Humberto Baião, in “Chorando Penas” Janeiro, 23- 2018


domingo, 7 de janeiro de 2018

SOPINHA DE SANTAS FLORINHAS ....


SOPINHA DE SANTAS FLORINHAS

Floriu a magnólia na rotunda,
desacelero olhando-a embevecido,
o carro cheirando a pinheiro da Escandinávia,
comprado no chinês por um eurito.

Uma árvore triangular, papel pastoso,
pastoso e cheiroso, dançando pendurada,
também há de nardos, alfazema e anis,
p’ra gente orgulhosa e narizes mui subtis.

Nunca fui subtil, mas conheço, 
o Subtil, e o cunhado dele o Gentil, 
reformados de França, plantavam lavanda,
bons petizes, bons narizes.

Eu amo a sensibilidade, as violetas,
a Violeta, a Margarida, a Rosa, a Dália,
e desde gaiato tantas outras vestais,
desde os passeios entre flores de auracária,
desde quando vi tulipas em postais.

Lembro esses passeios matinais, os madrigais,
p’los campos floridos e grandes quintais, 
colhendo e cheirando os lírios,
os narcisos, as giestas, papoilas, 
os dentes de leão e as moçoilas. 

Inspirando fundo, inflando o ego, 
o Narciso crescendo em mim, 
a experiência c’os feijoeiros,
depois c’as ervilhas de Mendel,   
olhar atento à botânica, a Garcia da Horta
ao quinchoso do avô Darwin,
à flora, à fauna, às espécies,
também a Wallace e Lamarck.

Uma semente enterrada num vaso,  
o milagre no dia dos meus anos, 
o feijoeiro aos onze,
a tulipa aos doze, dum bolbo,
depois um pulo, e eu quase homem,
e aquela tipa, aquelas tipas, 
enfiando em mim borboletas vivas, 
pelas tripas,
até arrotar, até aprender a dizer
gentis senhoras, meninas, moças,
mulheres.

Existem variegadas espécies,
como os talheres, a cutelaria,
a faiança, a ourivesaria, 
mulheres d'oiro a tua tia,
respect,
respect se queres ser respeitado,
e adorado
essa é a verdade rotunda. 

Évora, por Humberto Baião aos 07 E 08 de Janeiro do ano de 2018

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terça-feira, 2 de janeiro de 2018

485 - POIS, LAMBUZEM-SE, E BOM PROVEITO...

Nuno Rolo, Nolo, pintor

           NEW CONCEPT COFFEE & SHOP INTRODUÇÃO AO ROTEIRO DA EXPOSIÇÃO



Em primeiro lugar o New Concept Coffee & Shop desejou-nos a todos um bom Ano Novo, repleto de felicidade e bem-estar. Foi nesse contexto que nos ocorreu desenvolvermos esta pequena exposição, contribuir para o bem-estar dos amigos e clientes, tornar mais agradável a sua estada neste café, mesmo que breve, e em simultâneo tornar este lugar um lugar de maior convívio, quiçá um local de tertúlias e conspirações.

Enveredámos pela escultura/pintura por termos entre amigos clientes  consagrados e amadores em ambas as áreas, e por desejarmos que o novo conceito de café com que fora inaugurado o New Concept se cumprisse. Cumprir é dar também espaço, voz e vez aos artistas locais, dá-los a conhecer tanto quanto contribuir para que sejam conhecidos e o seu valor reconhecido.

Projectada a “coisa” convidámos alguns artistas locais, o primeiro a demonstrar a sua disponibilidade e solidariedade foi o João Concha da “Rusty Place” ter um consagrado como âncora é já uma garantia de sucesso, está exposto no centro do café, p’ra deslumbrar, p’ra surpreender, mas também porque isto da consagração e da antiguidade também é um posto, é um artista conhecido e batido nestas lides, galardoado, bom tipo, terapeuta, pachorrento, bonacheirão, amigo de toda a gente, comedido quanto deve ser um artista. 

          A primeira vez que deparei com a sua obra foi há uns anos quando ao erguer os olhos a vista se me distendeu sobre a praça e vi os bonecos, os bonecos é como quem diz, as suas figuras, dei então comigo pensando quanta beleza e sentimento em cada uma, quanta paixão, quanta arte, quanta inspiração e quanto amor. Peças ali especadas, um pouco espalhadas por toda a praça, idealizadas com tanto carinho, feitas com tanta dedicação e primor. Enterneceu-me a paixão dele por elas ou jamais teriam sido feitas, comoveu-me a entrega que exigiram, o sacrifício de horas em seu redor até que completadas.

A consagração a causas nobres sempre me perturbou, e juntar grão a grão, bocadinho a bocadinho, dia a dia, semana a semana, mês a mês, ano a ano, os materiais p'ra elas é coisa que testemunha um estado de espirito que vai muito pra além da imaginação, quem assim procede é um sonhador, tem um sonho, e esse sonho ou essa causa que o move só pode ser uma enorme ânsia de evasão. Fugirá de si mesmo, incapaz de se aventurar sobre a frágil ponte do desfiladeiro da confiança, sonha, sonha e evade-se, fugindo de si próprio tornando-se por momentos outro, e é esse outro que não ele quem nos oferece de bandeja a beleza da criação, o resultado desses momentos de desvario e inspiração, o resultado dessa ocasião de libertação e grandeza porque raramente o artista cabe no corpo terreno, mortal e limitado que tende a parasitá-lo como uma crisálida.

Além dele ofereceu o peito à solidariedade o José da Fonseca, o nosso Picasso das colagens, também ele já rodado e com muitas exposições no curriculum é outro apoio sólido, como se diz agora, uma mais-valia considerável e nada despicienda, só pode ser um bom tipo, um bom rapaz, ingénuo mas sentimental, sempre desperto à novidade... encerrado na ingenuidade duma criança, olhando tudo como se fosse a primeira vez, com muito por aprender e a quem os horizontes estreitos desta terra nunca permitirão levantar voo ou sonhar mais alto que o Palácio do Barrocal ou a Igreja de S. Vicente, talvez um oitavo de página no jornal da terra e umas imagens partilhadas no Facebook entre amigos para desfastio. 

      Arregimentámos também a Helena Sousa pois merece público, exposição, a arte em certas geografias só tem becos e não auto-estradas, estes dois já o devem ter descoberto por si mesmos. É uma existencialista persistente a Helena Sousa, uma dona de casa exemplar e prendada. Cooptámos naturalmente os manos Nuno Rolo e Manuel Carvalho, em busca da celebridade e cuja história, verídica, deu azo a esta exposição * pois este é o nosso modo de meter as mãos nas tintas, nas cores, no ferro, pois não pode ser só no café, nas sandes e nos bolos, porque a vida só é bem vivida se nos lambuzarmos dela, não é o que dizem?

A coisa começou com dois carapaus disputando a pujança dentro dum grupo de “Amigos Do Pidal” que pedalam. De semana trabucam e ao fds trocam impressões, sentados aqui, na esplanada do New Concept Coffee & Shop, onde esgrimem pedaleiras, calções, carretos, equipamentos, rodados, óculos de vidrado espelhado, pisos, mas também riscos, cores, desenhos, esquiços, pinturas, quadros e visões, sonhos. Foi num destes momentos que os apanhámos, o que foi uma verdadeira revelação, aliás uma grande surpresa. Então não foi que após tantos anos vividos na mesma cidade, sem se conhecerem, as bicicletas os aproximaram? Talvez não devamos dizer aproximaram, talvez devamos dizer ligaram, já que entre eles se descobriram ambos adeptos das mesmas cores, das mesmas tendências, do mesmo gosto pelos lápis, pelo carvão, traço, risco, desenho, pintura, até se descobrirem ambos pintores, artistas da tela e do pincel, das bisnagas, dos cavaletes, tendo-se então olhado bem e descoberto a si mesmos iguais em muitas coisas, até na cor dos olhos e, de descoberta em descoberta, chegaram à conclusão que o pai de um deles assim assado mas também o pai do outro assado e assim, p’lo que apesar de demorada a coisa acabou por ser concluída, eram irmãos ! Digo meio irmãos !

Não foi mesmo uma revelação surpreendente? Ficámos admirados, espantados, pasmados com a constância e exuberância dos genes, dos cromossomas, do ADN.

Claro que depois surgiu naturalmente a pergunta; por que não contar esta linda história? Como contá-la? De que modo a contar? Arranjando uma base, um pódio onde colocar os manos em exposição e com uma pequena legenda por baixo? Vestidos de ciclistas? Nus? De pincel na mão? Como podem ver optámos por uma exposição.

A pintura da amadora Helena de Sousa, sabemo-lo hoje, foi desenvolvida sobretudo num período da sua vivência em que, para calar ou esquecer a dor se apoiou nas telas e nos pincéis como ascese, como prática e causa da meditação e devoção afinal essenciais à superação de si mesma. O produto dessa catarse com que purificou corpo e espírito encontra-se difundido por uma dezena de casas de amizades suas tendo sido possível apresentar-vos unicamente duas das suas obras.


Não diríamos que os artistas sejam poço de devaneios libertários e criativos ou arrastem na consciência recordações recalcadas de que urgem libertar-se apesar desta nossa peculiar democracia, todavia a emoção com que vivem a vida e o sentimento de amor com que à escultura ou pintura se entregam, fazem-nos intuir tratar-se de sacudir uma sofrida repressão de que só a arte os libertará. É notório nos seus trabalhos o afrontamento às dores do viver, e a busca de sensações vívidas que não arrastem padecimento, sofrimento, desgosto, mágoa, pesar, antes lhe tragam paz, bem-estar e prazer.

Optámos por esta exposição, será giro ver, observar como eles vêem o mundo e no-lo mostram. 

            Lambuzem-se, e bom proveito.



















João Concha, escultor

ESCULTURAS  - João Concha:A imagem pode conter: 1 pessoa, óculos graduados, barba e closeupA imagem pode conter: 1 pessoa, óculos graduados, barba e closeup

E6 - Mulher com flor.
E7 - Máscara
E8 - Guitarra baixo
E9 - Quadro com flor
E10 - Médico
Quanto a preços devem os interessados contactar o 962565692


 José da Fonseca, pintor                                                                        José da Fonseca, pintor

PINTURAS - José da Fonseca:

P1 – José da Fonseca – “Paraíso” 2012, acrílico, colagens e spray s/ tela – 200€
P2 - José da Fonseca  – “Almas” 2017, óleo e spray s/ tela – 200€
P3 - José da Fonseca  – “Canela Spirit” 2014, acrílico e colagens s/ madeira, 100€
P4 – José da Fonseca  – “Acção – Sangue frio” 1999, acrílico s/ tela, 300€
P5 - José da Fonseca  – “Beaux Rêves” 2015, acrílico e colagens s/ papel, 250€

QUADROS - Helena Sousa:
Helena Sousa, pintora

30T -  “ A Dor Na Flor ” - pintura a óleo (preço a combinar)
31T - “ Limpa Pincéis “ – pintura a óleo (preço a combinar)

Nuno Rolo – “Nolo” pintor

TELAS - Nuno Rolo – “Nolo”:

1T - Batalha-70/90cm 150€ 
2T - Gritos - 1000/60cm 80€
3T - Vícios - 1000/60cm 200€
4T - Usada - 68/92cm 150€
5T - Desejos - 1000 /70 cm 120€
6T - Secreto - 1036/110cm 250€
7T - Sensações - 1037/90cm 250€
8T - Deep - 1026/1000cm 300€
9T - Molhados 1040/96cm 180€
10T - Desejos Salgados 1026/1000cm 200€ 

PINTURAS - Manuel Carvalho Barão:
Manuel Carvalho Barão, pintor

16T - Salto 1000/80cm 150€
17T - EU 1080/40CM 80€
18T - ALMA 1090/54CM 400€
19T - Abraço - VENDIDO
20T - PRAZER 1080/60CM 280€
21T - Visão 1000/40cm 60€
22T - Oposto - 120€
23T - Incógnito 1020/60cm 100€
24T - Remendos 1000/80cm 250€
25T - Misteriosa 1000/60cm 300€
26T - Desejos Perdidos 1000/80cm 180€
26aT - Linha  90/60cm 80€
27T - Segredos 90/60cm 150€
28T - Acidente 1000/80cm 100€
29T - Procura 1000/1000cm 100€

Todas as pinturas foram realizadas com tinta acrílica