sábado, 20 de junho de 2020

650 - CHEGA - TROPAS DE COMBATE OU CARNE P'RA CANHÃO * ............

               


Tenho observado o CHEGA desde que apareceu. Surgiu rápido e crescendo depressa, creio não me enganar se lhe prognosticar uma votação considerável no próximo acto eleitoral.

Portanto o CHEGA chegou, encontrou o seu lugar entre uma abstenção composta maioritariamente por desiludidos com os partidos do sistema, os tais partidos instalados, acomodados e incapazes de mudar, um nicho de eleitores considerável, perto dos cinquenta por cento do eleitorado. Mas será o CHEGA capaz de crescer, de os convencer e manter a todos ?

Surripiando votos quer aos desiludidos, quer aos partidos instalados, quer aos abstencionistas convictos e descrentes, o CHEGA cresceu depressa e mais depressa ainda subiu nas sondagens mas, há sempre um mas, quantos mais desses eleitores virá com o tempo a conquistar, a convencer, a fidelizar ou a perder ?



É certo que cresceu depressa, mas as pressas por vezes dão em vagar, o CHEGA por mor dessa pressa com que se guindou à celebridade cresceu desorganizadamente, atabalhoadamente, pisando muitas vezes os princípios que diz defender e não cuidando de acautelar a democracia interna, democracia que portas fora diz querer vender-nos. Tenho observado cuidadosa e acauteladamente o seu percurso, o caminho trilhado e, neste momento diria que o meu prognóstico apontaria para o arame, para a balança ou seja quanto a mim o CHEGA é neste momento mera atracção circense balanceando perigosamente no arame e alvo de potentes holofotes.
  
Manipulando causas fortes e fracturantes de grande efeito mediático, mobiliza as suas hostes mas não toca fundo nos reais problemas do país, ou se toca fá-lo pela rama, nem sempre apresentando as melhores soluções, como no caso da TAP acerca da qual afirmo há muitos anos que dada, oferecida, seria cara para quem ficasse com ela e, se assim já era há anos, o tempo confirmou o dito. O recém-chegado CHEGA não pode limitar-se a perseguir, secundarizando e secundarizando-se, a agenda conjuntural do governo, dos mídia, da esquerda ou da direita e atiçar-lhes os cães danados, o CHEGA tem que propor medidas estruturais de vanguarda e solução para os problemas que compõem o desastre da nação.



Nem o CHEGA pode ser o partido de um homem só, André Ventura e o CHEGA são inseparáveis e indispensáveis mas não chega, o CHEGA não pode ser um partido de breve crescimento e breve existência, como aconteceu com o PRD de Hermínio Martinho, o CHEGA tem que chegar longe porque lhe cabe uma missão quase impossível, pelo menos jamais possível de ser levada a cabo pelos partidos do sistema que à saciedade nos demonstraram não estar interessados em fazê-lo mas somente neles mesmos apostarem ou por eles mesmo fazerem.

Agora corre o CHEGA atrás da inútil causa da esquerda, da agenda da esquerda e do racismo, tendo convocado para dia 27 uma manifestação a decorrer debaixo desse tema. É uma causa perdida, não há racismo em Portugal, nunca houve, isso é coisa dos States e da África do Sul, nós temos focos de violência rácica pontuais, choques localizados, não existe entre nós uma doutrina ou prática racista generalizada e, queixas apresentadas por pretos são-no igualmente por brancos, são problemas do país, radicam no caminho para a miséria que trilhamos, pretos e brancos, e não em quaisquer animosidades de cor contra cor ou de raça contra raça.

Quanto a uma estratégia de crescimento sustentado do CHEGA diria que tarda em chegar, os sound bites lançados até agora têm mobilizado o seu eleitorado básico e instintivo, de revoltados a desiludidos, têm sobretudo apelado à classe baixa, a que mais sofre com os males da desgovernação que há décadas tomou conta do governo da nação. Não vejo o CHEGA preocupado com os problemas estruturais do país e que possam mobilizar a classe média e alta, sabido não podermos sobreviver sem elas, sabido quão elas têm sido também cilindradas pela estupidez que tomou assento no parlamento, nos ministérios, direcções gerais e tutti quanti nos desgoverna.



O percurso apressado do CHEGA não está a construir alicerces ou a prometê-los, está a acicatar as tropas de combate, carne para canhão que lhe garantirá uma vitória ou duas, dois ou três anos de sucesso, mas nunca lhe conferirá solidez para se manter confortável nas sondagens e no poder, criando mesmo um risco acrescido de, entre classe média, média alta e alta, cavar ainda mais fundo a generalizada descrença nelas existente.

A fasquia terá que ser colocada mais alta ou o CHEGA não passará da colheita do breve benefício do populismo que não de todo erradamente tem vindo a ser acusado. Sobretudo não pode continuar sendo o partido de um homem só, terá que convencer, não aliciar mas convencer intelectuais, artistas, académicos, cientistas, investigadores, professores, enfermeiros, carpinteiros, serralheiros, empresários, quadros médios e superiores, e não pode acudir automaticamente a todas as causas pontuais mas dedicar-se sim a problemas globais, estruturais, dando de si uma imagem sólida, eficiente, capaz, responsável, íntegra, e gerar confiança, no futuro, nos portugueses, em Portugal. Nem tão pouco deve acudir ou lamentar a falta de autoridade mas exercê-la, sem medo, quem tem medo compra um cão, e exercê-la é fazê-la cumprir, nem que para isso tenha que distribuir bastonadas à direita e à esquerda, seja sobre pretos ou sobre brancos.  

Abracei o CHEGA mas, em demasiadas situações não me sinto identificado com as suas posições nem com algumas atitudes de militantes seus, de topo e de base, deixando-me por vezes mesmo desconfortável, diria que envergonhado pois quanto a mim o ser humano há muito abandonou as cavernas e, se o adjectivo sapiens que caracteriza hoje o homo significa alguma coisa, é tempo do CHEGA demonstrar a todos que essa sapiência é também uma sua particularidade, quando não será mero epifenómeno e daqui a meia dúzia de anos esquecido para ser meramente lembrado a título de anedota.

Por favor, chega, não me envergonhem, dêem-me causas nobres pelas quais combater, causas pelas quais valha a pena bater-me, batermo-nos, causas que devamos defender, basta de pão e circo, chega de jogos de coliseu.  


* NOTA: Sob o lema CHEGA  ler também os textos, 648, 647, 646, 644, 643, 639a  O CHEGA E A MÁSCARA DO ZORRO... , 635, 631, 630a  CHEGA, O RENASCER DA FÉNIX ...  e outros ....