quarta-feira, 20 de dezembro de 2023

798 - COMÉRCIO TRADICIONAL * public. em 2001


                                        COMÉRCIO  &  DINHEIRO *

 

Prezo fazer as minhas compras no comércio tradicional, só a mercearia adquiro, por razões de estacionamento, comodidade e preço, nas grandes superfícies.

Há muito que deixei, porque me prejudiquei e arrependi, de fazer compras significativas nessas grandes superfícies, como electrodomésticos, material de Tv, áudio e vídeo, mobiliário, roupas e quejandos, pois não podemos contar com qualquer garantia ou assistência efectiva, ainda menos com solicitude, atenção e simpatia.

A título de exemplo digo-vos que a fruta em minha casa é excepcional, tão só porque a vou comprar na Senhora da Saúde, ao lugar da D. Vicência. Claro que desde que o faço nunca mais tive que deitá-la fora, quer porque não prestasse, ou porque apodrecesse de um dia para o outro. Ali a qualidade é garantida. D. Vicência não tem coragem para enganar os clientes, tal seria para ela um pecado inconcebível, como o seria para o Senhor António, que nas Corunheiras vela pela qualidade da carne que consumo em minha casa, carne que ele próprio escolhe, embala, e até identifica com etiquetas, para que mais tarde, congelada, me não engane no que pretendo cozinhar.   

Esmeros do comércio tradicional, que me levam muitas vezes também ao mercado municipal.

Talvez haja algo de triste nestas circunstâncias, mas é assim o mundo de hoje e o de amanhã não augura nada melhor. Quantidade não é qualidade, os hiper´s tudo têm em quantidade, mas falham redondamente na qualidade, em especial dos serviços e do relacionamento humano.

É por isso, e só por isso, que vivendo num extremo da cidade, compro a fruta noutro extremo, e a carne mais longe ainda. Mas vale a pena, como vale a pena manter a amizade de toda essa gente que se esfalfa para nos colocar no cesto das compras produtos de primor, e um sorriso agradecido que nos desarma. Que contraste com as caras que nos hiper´s à mínima reclamação nos pedem o “talão ou a factura”, como quem nos pede o cadastro; Qual talão ? Qual Factura ? Quem não os deita fora até sem dar por isso ? modos de ver o mundo, paciência.

Quando por vezes olho para mim, observando o que me rodeia do alto dos meus quarenta e quatro anos, não posso deixar de pensar como a vida é lenta, tão demorado o tempo para que aprendamos qualquer coisa, e como tantas vezes, por comodidade, nos enganamos a nós mesmas (os).

Foi pois com alguma pena que dei conta das noticias assinalando o descontentamento de alguns comerciantes da nossa praça, insurgindo-se com o eterno arrastar das obras no centro histórico, e às quais atribuem as responsabilidades pela queda das suas vendas. Dei para comigo meditando que algo de grave se passaria, pois só isso justificaria que o comércio tradicional, uma classe por natureza tão recatada e comedida, tivesse vindo indignada para a rua fazer ouvir a sua voz.

Nunca como hoje o comércio tradicional esteve sujeito a um cerco tão apertado, resultado do mundo ter rodado mais depressa do que imaginámos, não disse eu atrás que penso ás vezes como a vida é lenta ? Não é contudo pelo facto de eu o pensar que ela se move mais devagar, e se alguém há a culpar por isso, culpemos Copérnico e Galileu, não foram eles quem nos tirou do centro do Universo ?

Mas não desarmem os comerciantes da nossa praça, começada uma luta, mau sinal seria que a não levassem até ao fim. Até porque as suas armas são difíceis de igualar, a cordialidade de um atendimento personalizado, por um lado, com a qual terão que saber combater a hegemonia das grandes superfícies, e a razão por outro, que já há muito deviam ter esgrimido perante quem lhes anda a comer as papas na cabeça.

Não creio, e bem avisados andarão se não acreditarem, que estejam nas obras as culpas das baixas vendas que apontam, ou não é verdade que outros comerciantes, noutras zonas da cidade que pelo contrário nunca viram obras, se queixem do mesmo mal ? A queda das vendas ?

O problema (e a solução), está na economia senhores ! Ou não viram ainda que esta é uma cidade adiada, e, se teimarmos, sem futuro ? Onde está o dinamismo económico desta cidade ? Não se vende ? Mas como vender a quem tem com a habitação mais cara do país um pesado encargo ? Como vender a quem, por culpa dos ineficientes transportes públicos que temos, é obrigado a encalacrar-se para comprar um, quando não dois carrinhos ? E vender a quem, se por causa do estacionamento (e das obras), o pessoal foge da cidade como o diabo da cruz ?

Vejam com os vossos próprios olhos, o Público de Sábado passado, 18 do corrente, pág. 13 do Caderno Mundo, onde o nosso presidente, admite preto no branco, uma …“preocupação quanto ao desenvolvimento económico, que considera “aquém de outros indicadores”... Outros ? quais ? E só agora se preocupa ? Passados quase trinta anos ? Nessa mesma peça jornalística, o nosso presidente caracteriza este mandato como o da modernização, requalificação urbana e afirmação de Évora, afirmações de que me riria, não fosse o receio de o ofender. É óbvio que o nosso presidente nada fez nem conseguirá fazer, já que nenhum governo o deixa fazer o que quer que seja.

Das duas uma, ou escolhe ele o governo, ou escolhemos nós outro presidente.

 


* Crónica publicada no Diário do Sul, coluna Kota de Mulher, em 24 do 8 de 2001


domingo, 10 de dezembro de 2023

797 - ALTO DE S. BENTO, UM VERO DESASTRE....

 



Porque havia sol e a manhã estava clara e luminosa como não se via há muito tempo, depois da bica dei corda aos sapatos e rumei ao Alto de S. Bento. Depressa me arrependi e a boa disposição que levava levou sumiço num instante.

 À medida que subia a mesma estrada cada vez mais mal enjorcada que calcorreio há sessenta anos fui ficando revoltado até me quedar surpreendido por um sinal de trânsito proibido que, na cabeça dos seus mentores terá sido ali colocado para resolver os problemas e dores de cabeça que o Alto de S. Bento lhes deveria dar.

                

 Na cidade resolvem os problemas de estacionamento colocando pilotes às centenas passeios fora e desfeando-a, ali bastou um sinal, "proibido avançar, só para residentes"... Portanto esquece que o Alto de S. Bento existe e pira-te, vai chatear outro, agora só criancinhas para verem o moinho a trabalhar, a farinha no ar, um museuzinho de brincar, ervas, arbustos, rochas, pedras, mato, e as célebres antenas supremo símbolo e ícone da nossa revolução tecnológica e do progresso de que Évora se arvora.

Aquela mais grossa, maior, mais parecendo uma árvore de Natal vermelha e branca, está lá há mais de 60 anos, era eu gaiato e subi-a, eu e mais uns quantos, quantos por ali deambulávamos antes de ser solenemente inaugurada. Há registo da ocorrência, uma patrulha da GNR fez questão de nos identificar a todos não fossem surgir no ferro do esqueleto inesperados prejuízos de monta, ficando assim a saber-se desse modo a quem os imputar.




Imputar, Input output, décadas mais tarde esse esqueleto haveria de alojar também e para além das que já tinha em cima as antenas parabólicas e outras que permitiriam os sinais da G1 da primeira geração, já vamos na G5 não é ? Pois fiquem sabendo que do varandil que essa antena tem em cima já eu caguei, eu, o Abel, o Bento, o Barnabé e não sei quem mais, já lá vão muitos anos, eu deveria andar pelos meus 14 ou 15 já nem sei, só sei que a panorâmica alcançada lá do cimo é lindíssima e uma cagada feita a partir do céu é divinal !



Foi por estarmos tão alto que vimos, sem ser vistos, a Ana C. e uma meia dúzia deles atrás dela mata acima mais parecendo cães atrás de uma cadela aluada, depois foi encontrar a moita certa e aquilo foi à vez, mas isso a patrulha da GNR não viu. Não viu mas a coisa deu brado e um deles acabou por casar com ela, o primeiro ? O que ela apontou ?  Não sei nem imagino, mas sei que nunca foi um casamento feliz, não houve filhos, ela acabou por suicidar-se sendo então que eu me meti a pensar quanto de todo aquele amor livre ou amor desregrado, ou dado ao desbarato terá sido culpado pelo fim ou desenlace de tão triste história. É bem verdade que muitas vezes o barato nos sai caro …




Quando esbarrei no sinal vermelho de trânsito proibido já me tinha confrontado metros atrás com um outro sinal, azulado e sinalizando um parque de estacionamento, um sinal todo queimado do sol, a cair, esgarçado como quem o pensou, como mal pensado foi esse parque de estacionamento, natural, nascido ali há milhões de anos, agora aproveitado para desenrascar, mal esgalhado, sem piso corrigido, nem marcado, nem tão pouco cuidado, tal qual o cuidado que os visitantes merecem por parte do nosso município.




Tudo ali é mato, tudo é como uma mata porém e apesar disso alguns carros estacionados, em transgressão claro, na ambição de um fugaz e proibido momento de fruição da paisagem, paisagem misturada com contentores de lixo, uma tabuleta apelando ao museu ali atrás, museu também ele conspurcado pelo ambiente que o rodeia, um ambiente pejado de antenas ao Deus dará, plantadas sem o mínimo respeito pelo cuidado com o mesmo e salutar ou impoluto ambiente que querem enfiar à força na cabeça das criancinhas, para além desse espectáculo um céu truncado de fios e mais fios oferecendo-nos uma visão digna das favelas brasileiras. Saibam que é por estas e por outras que me estou cagando para separar o lixo, se os engenheiros e os políticos decisores e as autoridades competentes não se preocupam com o ambiente por que caralho me hei-de preocupar eu ?


Dou mais uns passos e esbarro com mais uma tabuleta, desta vez gritando-me “ Bem vindo ao Alto de S. Bento, hoje serás um protector da natureza” ! Serei sim, mas só se for da natureza selvagem do lugar, um lugar com tantas contradições como a cabeça de quem imagina estas coisas. Em qualquer outro país civilizado do mundo, qualquer edilidade teria aproveitado as vantagens do terreno, isto é as vantagens naturais oferecidas de bandeja pela natureza para as fruir ao máximo, contentando e conciliando natureza e cidadãos, criando parques de merendas, postos de apoio a caminhantes e escoteiros, varandas e restaurantes panorâmicos, parques de estacionamento exemplares, estradas como tapetes, dinamizando o lugar, desenvolvendo a economia local, criando postos de trabalho, gerando riqueza, satisfação e bem-estar, mas não, disso o último exemplo que temos tem mais de 50 anos, o “Parque Municipal de Piscinas Eng.º Arantes e Oliveira” a quem desrespeitosamente tiraram o nome da parede do complexo. O que os encanita é que em 50 anos de democracia ainda não foram capazes de fazer um décimo do que foi feito durante o (menor) período do Estado Novo.




E sabem por quê ? Porque esta gente não tem somente falta de inteligência, tem sobretudo falta de mundo, falta de visão, e tem um acentuado deficit de imaginação e quando falo desta gente quero ser claro, refiro-me a presidentes e técnicos, sobretudo técnicos, classe arregimentada, engajada ao podre poder que nos governa e de onde poucos, muitíssimo poucos se podem gabar de ter escapado ou de não estar com esse poder comprometidos ou a esse poder vendidos. 




É esse o mal de Évora, falta de inteligência, de visão, de mundividência e imaginação, mas há salvação, querendo e sendo capazes, havendo coragem, marquem uma entrevista comigo, uma bica, dois dedos de conversa e sairão outros dessa experiência...

Bom Natal e reformem-se, não nos fodam mais… Na sua maioria são demasiado caros para a merda de serviço que prestam à cidade.

             

ADITAMENTO: Com mais delicadeza ou menos, com mais paixão ou revolta, com mais comedimento ou atrevimento, com mais ou menos educação e modos, passadas que são 11 horas sobre a publicação desta postagem tenho recebido de vários quadrantes diversas criticas (por mensagem privada ou telefonema pois há nas pessoas mais medo de se pronunciarem em público agora que no tempo da outra senhora) diversos apoios e as mais diversas opiniões, às quais, com o bom modo que me caracteriza vou responder: - Sim, depois do 25 de Abril nenhuma obra municipal de vulto foi erguida tendo o parque das piscinas municipais Arantes e Oliveira sido a última delas, inauguradas a 5 de Setembro de 1964.

 

Quer o terminal rodoviário, quer a pista de atletismo junto da Vila Lusitano (à qual falta uma pista pra ali poderem ser homologados records ou ter lugar provas de nível internacional) quer a estação da CP alvo de melhorias significativas são obras de cariz NÃO municipal, tal qual algumas circulares externas do domínio da empresa Infraestruturas de Portugal EP.

 

Na realidade existe um mão cheia de entidades quer públicas quer privadas cuja função é prover à melhoria do nosso bem-estar e nível de vida que parecem não funcionar quando deviam era articular-se de modo rápido e eficiente para responderem às nossas necessidades. Ao invés disso vivem cada uma para si, de costas voltadas e o mexilhão que se foda e espere e desespere. São o Caso da CCDRA da CME do CIMAC Do Instituto do Desporto, da CP, das Infraestruturas de Portugal EP, da EDP, das Águas do Alentejo ou de Portugal, das empresas de telecomunicações, um exemplo dessa demora e falta de articulação parecem-me ser as actuais obras da circular externa do Continente à antiga Siemens e que tantos engarrafamentos e aborrecimentos têm provocado por toda a cidade….

 

O pomo da discórdia assenta no facto da cidade não ter lugares aprazíveis, não ser alvo de melhoramentos e de embelezamentos pragmáticos, ter estagnado no tempo, não ser gerida com rasgo, risco e ousadia, e o facto, grave, de não haver um plano conhecido que para tal aponte. Em 50 anos nações e cidades têm-se erguido do nada para hoje serem estrelas em vários campos.

 

Évora, cidade da cultura, pratica isso sim uma cultura cega, passadista, vendendo a turistas e nacionais um mundo monumental com 2 mil ou poucos menos anos nada tem de novo de que se possa gabar, tem vindo a regredir, a qualidade de vida dos seus cidadãos está pela hora da amargura, ou da morte e, se há 2 ou 3 anos disse a uma eleitora que mandasse fazer á sua medida e nas Caldas da Rainha um candidato à presidência da CME hoje digo sem rebuço que muito eleitor e eleitora eborense deveriam mandar fazer um boneco das caldas no Redondo ou em S. Pedro do Corval e o pusessem num altar perante o qual orassem. Talvez assim a cidade finalmente se livrasse das cataratas que muita gente tem nos olhos. Bom Natal.