Já
lá vai o tempo em que os estados civis se resumiam a três, e, se vida e
cronologia não interferissem, eram comummente e salvo raríssimas excepções
vividos pela seguinte ordem; solteiro, casado e viúvo. Idem para o género
feminino.
O
problema é que a sociedade entrou em ebulição tão acelerada quanto o progresso
no estudo da fissão e fusão do átomo e se reflectiu na evolução do estado da
matéria que, da clássica categorização em terra, fogo, água e ar, passando
agora pela designação elementar de sólido, líquido e gasoso passou a apresentar
mais um patamar, plasma, matéria negra ou outra qualquer coisa do domínio do
imaterial.
Estou
a falar bem ou não senhor engenheiro ? Não estou a safar-me mal atendendo à
minha ignorância na matéria pois não ?
Isto
a propósito de mais um estado que o dito civil passou igualmente a apresentar,
divorciado, (a) não falando nos intermédios mais ou menos densos ou de duvidosa
densidade de, numa relação, aberta normalmente, separada, unida de facto, algo
confuso ou vivendo maritalmente.
Lembram-se
dos cinco maridos da prima do meu marido, a Michele ? Ou será que já não ?
Bem,
voltando à prima Michele que com um, ela foi casada, de outro está
divorciada, portanto separada, com um terceiro viveu uma relação de facto,
desisti de saber se aberta se fechada e que
tipo de relação existe agora, ainda que tenha adivinhado que se aproxima de
concretização mais uma vivência marital, (mais uma experiência ?) desta vez com
um marinheiro entradote e reformado que, a julgar pelas cores que começou a apresentar,
consumado que está apenas um mês dessa relação, dará à Michele o conhecimento
do, ignoro se ambicionado mas pelo menos até agora não experimentado estado de
viúva.
Aposto
que redundará numa viúva-alegre e por pouco tempo, conheço-a bem melhor que ela
a mim.
O
problema, nem meu nem dela, mas de muita gente actualmente, é não se adaptarem,
conviverem mal com os nuevos e hodiernos estados que, fermentados e fomentados
pela crise tanta gente englobam já, refiro-me à separação e ao divórcio.
Não
vou falar-vos do ponto de vista masculino, bem sei quantos gostariam mas coíbo-me
de tal enquanto houver homens a preencher aqui perfis e a saber disso muito
mais que eu, medida sensata não acham ? (prova de que nem sou tão parva quanto
me julgam).
Do
ponto de vista das mulheres, e bastantes amigas tenho divorciadas ou separadas, é
outra coisa, e para já vos garanto que tudo que vou afirmar é inventado e
jamais lhes ouvi o que quer que seja, mesmo quando chorando ao meu ombro, baba
escorrendo pelos cantos da boca, olhos vidrados e mais amarelos que um
eléctrico da carris, debitam vinganças, arrependimentos, saudades, amores, perdões,
e tudo e todos culpam da situação, menos a elas próprias que, quanto a mim e a
julgar pela fasquia do que tenho ouvido, de tudo serão bastas vezes as únicos culpadas.
Nunca
soube se depois de etilizadas me confundem com um gigolo, ou o bar com
um lupanar, visto em nada se parecer com qualquer confessionário já por mim
visto, nem eu tenha cara de madre Teresa de Calcutá ou por hábito desnudar os ombros.
Mas
a questão de hoje resolve-se com poucas explicações, e deriva, toda ela, do
facto de, segundo eles, a mulher “dever” ter capacidade de encarnar três estados, não civis,
não físicos, antes psicológicos, filosóficos, quânticos, tântricos, teatrais ou
metafísicos, capacidade que a faltar-lhes as coloca debaixo de um mau-olhado, e
péssimos karma ou chacra se à altura de tão compreensível quão inusitado
desempenho se não mostrarem.
Pois
bem, o mal ou a coisa, é que me apercebi que, de modo largamente maioritário,
os meus amigos aspiram a uma mulher tripla, coisa que, pelo menos no que me
toca, não conheço, não há, nunca vi, embora tenha ouvido falar bastante, como
dos unicórnios, do ciclope, do abominável homem das neves ou das sereias...
Pois
fiquem V. Exª.s sabendo que, para manter um matrimónio, segundo opiniões de
gente respeitadíssima, tão respeitada quanto a de um digníssimo coronel
reformado que tive como vizinho, sempre apalpando as criadas que por isso não
lhe paravam lá em casa até que uma mais afoita o levou ao altar, vivendo agora
da reforma generosa que o Ministério da Defesa não recusa a nenhuma viúva de
qualquer dos seus graduados, medalhados ou não. Para sobreviver há que sofrer como ela sofreu, palavras dela mesma.
Ia
eu dizendo que a mulher tripla que tanta gente pretende, deverá ser
exemplarmente casta e ofuscantemente linda aos olhares dos amigos, para orgulho
do maridinho, dona de casa exímia, incansável e aplicada, cursada em lavoures
(não confundir com louvores), e na cama, que deverá ter largura qb, possuir a
experiência de uma grandessíssima puta, pois não havendo causa sem efeito, (ou
o contrário ?) proporcionará ao queridinho um superior êxtase de sensualidade e
prazer.
Ora
digam lá vocês se este paleio de merda terá algum fundo de verdade, batidas que
serão em aturar asnos destes, pois é precisamente por vossa culpa e devido às
vossas incapacidades e incompetências que todas as sextas feiras as aturo eu,
bêbedas que nem cachos, e calhando uma destas noites, chamando-me à pedra por
este escrito e esmurrando-me o focinho. É um risco que corro só por querer
demonstrar-lhes por A mais B que estão melhor assim, separadas ou divorciadas, e
nem culpas devem carregar nas suas consciências atormentadas, tormentos de que
tanto me custa vê-las perecer.
As
que estão casadoiras que se preparem pois por vezes para sobreviver há que
sofrer como a outra sofreu. Depois não digam que ninguém as avisou.
Nuno
!
Saem
mais seis imperiais!
Em copo de vidro fininho não esqueça !
* by Maria Luísa Baião e publicado no Diário do Sul, coluna Kota de Mulher em data incerta.