terça-feira, 5 de abril de 2011

37 - DESCULPEM, TOMEM LÁ UM MANGUITO!!!


E agora que me cansei de aturar idiotas, tachistas, oportunistas, mentecaptos, sindicalistas, políticos e toda a tralha de inúteis que durante mais de trinta anos alimentei querem eleições ?
Agora que me tiraram os sonhos, a força e a vontade de fazer algo por pequeno que seja querem eleições ?
Desculpem mas tomem lá um manguito !
E os mesmos que me travaram e contiveram o ímpeto, os mesmos que, quais colaboracionistas se deram de braço dado aos mesmos que me tramaram a esperança, que me confundiram e usaram, agora querem eleições ?
E querem eleições os mesmos que me coarctaram direitos e ambições ? 
Que me deram uma Europa para que soubesse o tempo que faz em Kiev, Praga, Varsóvia, como se a Europa fosse isso e somente isso ?
Como se me revisse nessa Europa que os engordou enquanto em mim emulou os dias, os anos, toda uma vida ?
Não ! Desta vez não me enganarão !
Como há anos não me enganam mais, cansado de vós agiotas !
Agora sou livre !
E tornei-me aquilo que mais detestais !
Um corporativista, um fascista, um salazarista !
E espero ardentemente que um dia apareça um homem providencial, daqueles que ditosas pátrias só de cem em cem anos conhecem, para que o aplauda, para que o exalte, para que o sirva, para que seja o seu braço direito e faça por ele o que ele não puder, onde ele não chegar, porque sempre terá que haver mandantes e executores, e aí lhe provarei as minhas capacidades, o meu mérito, do que sou capaz, e por ele vos encostarei a uma parede, a muitas paredes, a milhares de paredes, e darei a ordem, e darei as ordens que vos metam finalmente na ordem, e faremos disto de novo uma nação, um só corpo, uma só vontade, e livrai-vos de recordar o vosso nome, o vosso rosto, porque farei listas, e vos mandarei buscar a casa, e nenhum de vós escapará, nenhum que tenha tido com a politica dos últimos trinta e oito anos alguma coisa por pequena que seja, e sereis de novo cordeirinhos, e sereis de novo bem mandados, e pensareis de novo antes de actuardes, e vereis de novo entre vós o mérito, e haverá empregos para todos e não só para alguns !
E teremos de novo uma frota pesqueira que nos orgulhe, uma agricultura que nos alimente, uma economia que a todos sirva e aguente, uma saúde preventiva e não este atamancar de soluções sem solução, e uma educação com gente que saiba, professores que saibam, e não esta tropa fandanga que nos enche escolas e ministérios e se aboleta que nem porcos em quartéis !
E seremos de novo um povo orgulhoso dos seus feitos e das suas contas pagas a tempo e horas, das suas famílias numerosas e felizes, e não veremos miséria, nem fome, nem fartar a uns o que faz falta a outros, e a solidariedade será uma palavra honrada, mesmo que para isso, valas e valas tenham que ser cheias e tapadas, balas desperdiçadas, cordas em árvores dependuradas, cabeças cortadas, o mal cortado pela raiz.
Meditai, meditai e dizei-me o que pensais, e acompanhai-me, ajudai-me, ajudemo-nos a alijar esta canga que nos puseram em cima, com que nos submetem e cavalgam, submissos e envergonhados.
Levantai-vos portugueses !!!!
Levantai-vos heróis do mar !
Levantai-vos nação valente e imortal !!!!!
Erguei-vos de novo minha gente e pisai com força a cabeça á serpente !

segunda-feira, 28 de março de 2011

36 - PROJECTOS DE VIDA, SONHOS...


Caminhávamos e falávamos em surdina, ombro a ombro.
 - Tu sonhas-te, mas não te sonhas envolta na tristeza dos dias que te maceraram o espírito inquietando-te o futuro. Sei que não. 
Sonhas-te uma dádiva de entrega e partilha. Aprendeste há muito, como eu aprendi, que o mundo não é de cada um de nós, que o mundo é grande, que o mundo somos todos. 
Apraz-me saber que a dor que te crestou o passado não te diminuiu a esperança, sim, a esperança, essa ultima meta que desejamos atingir sem que nunca percamos de vista e que mesmo após cumprida, queremos sempre mais longe e à qual tornamos a cada dia a fasquia mais alta, para que nunca se perca, para que jamais deixemos de a ter como fim, como meta, como alvo, como uma razão de vida, e, nisso já serás mestra.
 - Tens razão sim, sei que sim. - A dor e o sofrimento passados não te roubaram a esperança, deram-te alento, o alento do qual todos deveríamos fazer uma bandeira, um estandarte de luta pelo cumprimento de nós, dos ideais que nos animam, de projectos e até de ilusões.
Ah ! Ilusões ! 
Quantas sofrestes e te marcaram os dias ou inquietaram as noites ?
 - E quem não as tem ou não teve ? 
A arte é sobreviver-lhes, aprender com elas, usá-las em proveito próprio para que os ensinamentos delas retirados nos fortaleçam. Aprender custa, e nem sempre somente tempo ou dinheiro. As maiores lições das nossas vidas, quantas vezes não são pagas com lágrimas e sangue ? 
Frustrações, desilusões, sonhos desfeitos ? 
E o mundo não pára, trucida e nunca pára, não nos deixemos soçobrar, façamos com que o que nos não mata nos torne mais fortes. Resistamos, seguremos com esperança a esperança, quantas vezes ela a única mão amiga que nos resta e à qual nos agarramos, não com o desespero que nos tomba mas com o ímpeto que impele à vida, ao futuro, à superação.
 – Exacto ! Palavra-chave essa, superação, da dor, do sofrimento, das mágoas e traumas com que os desaires da vida e desilusões nos confrontam. Ergamo-nos a cada queda, esperançosas, lancemos mão de novo vigor e atitude perante as experiências com que a vida nos confronta.
 – Tal e qual, acreditemos que há sempre algo ou alguém que partilhou vivências idênticas, dores mesmas, e estará disposto e precisado igualmente de mão amiga, compreensão no sofrimento e entreajuda na empatia tão exigida como imperiosa para o levantar do chão e fazer frente à vida rumo a novos ideais.
 – Adoro-te, ao ouvir-te acredito que nunca estamos sós, nunca estaremos tão sós como quando numa concha pseudo protectora nos isolarmos do mundo que nos rodeia, dos demais.
 - Afinal entendes-me, não por acaso o “homem” é um animal social, cujo ideal de convivência é o clã, as interligações pessoais, não fora assim e há muito a humanidade se extinguira, de tédio, na incapacidade de juntos construirmos o devir, teria sucumbido no confronto ás adversidades sempre presentes e sempre constantes, ou, em último grau, num manifesto desinteresse na reprodução da espécie. 
Abraçados caminhámos sem rumo nem tempo, e, sem sabermos como nos vimos, nesse entardecer de fim de verão, passeando neste bosque que, do Convento dos frades cartuxos leva ao cabeço de S, Gens, local e mirante de onde a vista abarca toda a cidade. Subimos a encosta de mãos dadas, sorrindo, gracejando, amparando-nos mutuamente como se toda a vida estivesse à nossa frente e dependente deste apoio, destes sorrisos e graças. Do cimo contemplámos as luzes da cidade que, alternadamente, se iam acendendo nos vários bairros visíveis, como estrelas coloridas numa noite de fogachos de artifício.
Lembro que, no alto, ao lusco-fusco do entardecer, uma brisa soprava indolente, e tu, que somente envergavas leve blusa plissada, sentiste o ar frio roçar-te a pele sedosa como quem te afaga levemente, e, aproveitando os meus braços estendidos, tentando abarcar toda a cidade visível, terna e meiga neles te acolheste, pareceu-me assim desejares ficar eternamente.
Senti em ti o tremor frio que te arrepiava os braços nus, o calor das coxas que contra mim comprimias na busca da excitação do meu corpo, que somente o rubor no rosto denunciava, mas que, mordido pela sombra do anoitecer, eu escondia.
Docemente, levado pelo odor que de ti emanava, mordisquei-te a orelha, rocei na maciez da tua face a minha face e, quando já nem ouvia os murmúrios exalados pelos teus lábios vermelhos de cor e tensão, aceitei a boca que me oferecias procurando com a língua a tua língua cuja ânsia e avidez denunciavam quanta estabilidade paz e amor sonhavas.
Na tontura do mesmo abraço senti hirtos os bicos dos teus seios, e, não sabendo se do frio se de tanta ternura derramada nessa noite de ilusão, contra mim te apertei e acariciei até que, os caracóis dourados do teu cabelo, que a noite entretanto derramada transformara em véu de odalisca, na minha barba há muito escanhoada se prenderam.
No tempo suspenso do infinito nos quedámos e, sob a protecção da miríade de estrelas com que o universo nessa noite nos prendou, um no outro nos acolhemos até que, as ilusões de ambos separar-nos se negaram, nuvem alva nos envolveu e, se numa alvorada fresca do fim do verão observarmos, ver-nos-emos decerto na aurora dos dias, sobre a névoa matinal, fugindo ao sol que desponta, nessa nuvem ténue e imperceptível em que nos acolhemos, eternizando ilusões e sonhos, a qual recusamos há séculos abandonar, recolhidos no último reduto e promessa das vidas impossíveis de cumprir neste mundo em que, lógica e racionalidade respondem por todos os pecados, atrocidades e males de que apesar da tentação nos desviamos mas onde jamais deixaremos de cair.....




segunda-feira, 21 de março de 2011

35 - ELOGIO DE UMA VIDA ...


Olá.
A ti dediquei hoje as minhas horas de insónia.
A ti porque te invejo a força de viver, a condição, a coragem. E apesar disso sorris.

E eu que me julgava uma força da natureza perante ti me quedo, entre outras razões, pelo simples motivo de que me sinto culpado de uma culpa que não tenho.
Sim, Deus joga aos dados, estaria distraído no momento da tua concepção, o universo não será mais que fruto de acasos geridos pelo caos. 

Tantas vezes te lembro, tantas te tento entender e não alcanço.
Como vês tu o mundo?

É difícil para mim chegar tão alto, mas imagino perceberes e sobretudo sentires como a humanidade te vê a ti, e sinto vergonha, como se fora eu a descer tão baixo.

Li o teu texto. Tentei depreender quanto dele alcançarias.
Está-te vedada a verdade. E eu não sou capaz.
Nem jamais apreender como entenderás esse assunto.
Imaginá-lo-ás bom, apelativo, sedutor, de outra forma como explicar tanta gente na terra, não será?

Mas mesmo assim dificilmente imagino quanto alcances pois se, como a mim, ou ao contrário de mim, te são negadas as mais simples sensações que te permitiriam conhecer esse universo.

Por isso eu, que me julgava uma força da natureza, me sinto culpado de uma culpa que não tenho, porque acredito, Deus joga aos dados, e perante ti me quedo, entre outras razões, pelo simples considerando de que nem creio que jamais tenhas experimentado sensações tão humanas quanto as que uma mão macia de homem faria aflorar no teu espírito se, quente e sedosa, te acariciasse o peito, a sensibilidade de uma língua ávida de outra língua ou o bafo quente de um hálito na púbis, desfrutando os grandes lábios e delirando com o teu sabor e cheiro.

Escolheste perceber as pessoas, má aposta, eu teria enveredado pela biologia, ou pela filosofia talvez, mas quem sou eu para me colocar em teu lugar?

Apenas teria fugido das criaturas, nada mais que reles respostas encontrarás nesse conhecimento, nessa busca, o ser humano é, a esse nível, dos mais baixos entre as espécies, mas compreendo a tua sede de saber, de perceber, porque percebo que até a mais onanista e oniríca forma de satisfação te está vedada.

Impossível sonhar o que não se experimentou.

Nem ao menos, como eu tantas vezes fiz, ou faço, no recato de um espaço mas no seio de sonhos vividos, em que me masturbo se acossado pelo desejo, pela lembrança ou recordação, e me manuseio a bel-prazer, e a meu bel-prazer encurto ou prolongo esse tempo de mim e para mim até que, numa explosão impossível já de conter e enquanto a imagem dela parece abarcar-me e o seu nome por vezes grito, num grito quantas vezes calado, abafado, me deleito copiosamente, a boca num esgar de prazer, os olhos rodopiando nas órbitas, até que a indolência me tome e uma sensação de felicidade e amor me envolva e retorne a mim, acorde desse sonho lindo e, atrapalhado, envergonhado, me recomponha e retome a compostura. 

Entendo agora porquê agnóstica, entendo agora porquê a vergonha que te disse, restos de uma catequese que nos condiciona, uma moral que nos confina, e que inconscientemente assumimos, acriticamente, Deus pode jogar aos dados, mas que não O julguemos.


Estou contigo, estou do teu lado, faço um esforço para entender quão tu sofreste a suportar uma moral que ninguém serve, mas ninguém questiona nem ao menos contesta.

Quero perceber na tua condição, a tua coragem.

E compreender por que apesar disso sorris, ajuízas, como vês o mundo apesar de te estar vedada a verdade.
O que é difícil para mim é que te debruces sobre o que te é de todo proibido, inacessível, será vontade de entender?

Mas como?

Alguma vez já, e para não ir mais longe, tu ou alguém ousou ao menos acariciar-te a genitália? Viveste essas sensações?

Se não, como afirmares o que dizes? Perceber-te o escrito?

Alguém o fez? Tu o fizeste já?

Primeiro como a carícia de uma suave e macia pena, depois, a pouco e pouco avançando para uma respiração incontrolada tornada ofegante, as pernas subindo e descendo, entreabrindo-se e fechando-se, a boca procurando uma boca, o torso oferecendo-se, a bacia soerguendo-se numa oferenda a deuses, e já não a mão mas os dedos buscando o teu interior, o teu calor, o teu mistério, já não os dedos mas o dedo, buscando cada vez mais fundo achar o que afinal há para dar e nem tem que ser achado mas tomado, até que se perca a suavidade e o controle, e o mesmo dedo agora não já doce docemente, mas com volúpia e violência revolvendo-te as entranhas, ficares vermelha de amor e raiva, morder, e, quando os bicos dos peitos hirtos, gritares fode-me!

Gritares fode-me querido!

Com todas as tuas forças!

E puxares a ti quem desejas e num passe de contorcionismo e mágica te colocares a jeito e te fundires e afogares em ti mesma e nele, até que o cansaço e a saciedade vos separe, unidos num abraço duradouro e belo que nenhum esquecerá.

Tantas vezes te lembro, tantas te tento perceber e não alcanço, é para mim impossível perceber o modo como vês o mundo, é difícil para mim igualar-te, chegar tão alto, sobretudo sinto uma enorme vergonha do modo como o mundo te vê, vergonha mesmo, como se fora eu a descer tão baixo.

Li o teu texto, está-te vedada a verdade, impossível sonhar o que não experimentaste, tudo porque Deus joga aos dados, e a ordem, o plano infinito, são uma falácia que o caos comprova, a harmonia não passa de um desejo, quando muito uma metáfora, escolheste perceber as pessoas, má aposta, mas estarei contigo, estarei sempre do teu lado, a teu lado, conta comigo, com a minha amizade desinteressada, envergonhada, tímida, a teu lado sou incapaz de me sentir a força da natureza que me julgo, sei que não tenho culpa mas sinto-me culpado, diria que, como Cristo, aceito os pecados dos homens, não fosse eu, como tu, agnóstico, e, melhor que nunca, entender agora porquê.

domingo, 20 de março de 2011

34 - LOUCURA ........... MADNESS ...........................



34 - LOUCURA....    34 - MADNESS....

 

( ATTENTION ! TRANSLATED IN ENGLISH AT THE END OF THE PAGE )



Culpa da Isa que me pediu que escrevesse sobre a loucura. Louca ela que nem faz ideia da dificuldade em que me meteu. Parvo eu que aceitei sem ter pensado no que me metia. Mas como de sábios e de loucos todos temos um pouco, caí !

 

Estou aguardando o espectáculo dos “Mão Morta”, loucura tem sido sempre o seu cartão de visita, desta vez o móbil é o lançamento de novo CD com base nos “Cantos de Maldoror”, obra bem antiga que esteve na berra há umas décadas, li muito novo e me obriguei a reler mais tarde, já com outra maturidade.

 

Estou curioso, “Adolfo Luxúria Canibal” não costuma deixar por mãos alheias todo o mal que lhe possa ser assacado.

 

Não vai chover, nem fazer frio nem calor, ter vindo de moto não me vai incomodar e já ganhei, no tempo, no estacionamento para o qual não tive dificuldade e na distracção, pois p’ra mim andar de moto é respirar, viver !

 

Os preparativos enervam-me, estão fazendo propositadamente, querem apanhar-nos com os nervos tensos ou em franja, faz parte do ritual, só avançarão quando “sentirmos o bafo a morte de cão no pescoço”, esta atitude demencial já é minha conhecida e peculiar a este grupo.

 

Relembro outros espectáculos, a propositada tristeza das cores, o facto de aqui poder sorrir sem parecer louco, que não haverá regras nem limite e podermos gritar à vontade, expressar desordenadamente a decadência do coração, redimir ou exprimir o que de pior há em cada um de nós, tanto faz, por isso vos pergunto, onde a não ser num espectáculo dos “Mão Morta” poderemos gritar a verdade e rir de tudo e de todos, até de nós mesmos ? Isto é uma festa !

 

E à porta fechada vivemos o infernal delírio da exaltação do mal, quanto a isso só vos posso dizer que o “Portugal Conection” não foi poupado e aconselhar-vos a que vejam o próximo “live”, que isto é como uma irmandade.

 

São agora duas da manhã num bar de má fama em Alfama, vou p’ra casa que Évora ainda está longe, tão longe e tão perto, tão perto e tão longe que tudo o que ouvi cantar e dizer lhe assenta como uma luva, não vivemos pois no paraíso, mas no éden o que é diferente, porque nele tudo está por fazer e acontecer.

 

Pego na moto, já me despedi das amizades velhas, conspícuas mas também promíscuas e conspirativas que ao longo dos anos por estas lides tenho amealhado, dirijo-me à portagem do Pragal, pois dali a casa é um saltinho, um pulinho.

 

Entre mim e o céu nada, só tu estranho amor que de repente me entraste no pensamento e pronto, cá estou eu a lembrar-te, não me sais da ideia e me forças a esboçar um sorriso em tua glória, acelero, sinto todo o mundo por desbravar à minha frente, a velocidade e o murmúrio do vento segredam-me mistérios incontáveis e inconfessáveis, passo dos 150 aos 200, 250, 300 e o olhar turvasse-me, só o pensar continua apostando num desígnio de vida, quando nada se tem a perder desafiar a morte é uma sorte, quantas vezes o fiz já, nem lembro.

 

ESTOU FARTO DE MIM !

 

Ouço vozes murmurando, segredando, o pensamento ainda ecoando as passagens mais mórbidas do espectáculo, preciso aliviar a tensão, acelero mais e mais, tenho o diabo no corpo, este é mais um de tantos e tantos desafios em que não há lógica, somente absurdo, poderá ser uma viagem mortífera, uma aposta, quem ganhará, quem perderá ?

 

Sobre mim o efeito desta luta e do júbilo conseguido em sobreviver enquanto a morte me embala com o seu canto e eu, em vez de remorsos, penso em tremoços, lindas coroas funerárias, flores em plástico, destroços, e para me distrair enquanto devoro kilómetros, praguejo e trauteio blasfémias !

 

A velocidade embrutece-me e extasia-me, a falta de nicotina derivada do abandono do tabaco aumenta a adrenalina, isto não é casual nem efémero, tornou-se-me há muito um vício, será eterno !

 

Nem é a brincar, é a sério !

 

Dói-me a alma, olho os manómetros, controlo a temperatura e a euforia, passo ao largo do Montijo, cheira a merda, cheira sempre a merda nesta passagem, e o que é que isso interessa ?

 

Nada !

 

A auto-estrada, que de carro é uma recta, a esta velocidade tem curvas que mais parecem ter 90 graus !

 

Domino a cólera, isto não dá mais ?

Deliro com o espectáculo !

Poisa-pés raspando o chão !

 

Desafio-me a mim mesmo, cai ! cai ! fiz a curva a rapar o pavimento e esta merda não caiu !

 

Foda-se !

 

Vejo o céu estrelado, só depois reparo serem faíscas que o metal da moto foi deixando no ar ao raspar no chão ! O ar que respiro, o fogo que respiro, alimentam-me a fornalha da cólera e da agitação !

 

Imagino selvagens perseguindo-me, esporeio a montada, sinto-me como um dos últimos colonos perseguido pelos índios ! Ou o primeiro de um batalhão de cavalaria !

 

Sou Custer ! Grito desvairado !

 

Minha alma vagabunda lembra que só tu amor, doce amor, terás um dia o segredo do meu medo ! De repente entraste-me no pensamento e pronto, cá estou eu a lembrar-te. Não vejo, não olho, não miro, não vejo mais que belas imagens, sonhadas, imaginadas, ouço um acordeão, ou parece-me ouvi-lo, ora aí está um instrumento que serviria e adoraria às mil maravilhas ter no meu funeral !

 

E isto não dá mais ?

Olho os manómetros, controlo a temperatura e a euforia.

Esta merda não dá mais ?

 

Ai ! ai que vai cair ! vai cair ! olha a curva ! a moto a raspar ! olha o chão ! cai ! cai ! não caíu !

 

Foda-se ! inda não foi desta ! já me safei !

 

O céu estrelado ! Deixem-me gritar ! Sorrir sem que me chamem louco !

 

Pus-me à prova e venci uma vez mais ! Isto é uma festa ! Deixem-me rir de mim ! De tudo ! De todos ! Que lindo !

 

Vinte minutos Lisboa aqui !


Boa ! Haja quem faça igual ou melhor !

Estou em casa! Cama !

 

Amanhã pelas nove lá tenho que estar, casaco e gravata, como quase sempre, sempre a mesma merda !

 

Serve-te Isa ? Este pedaço de loucura ?

 

Se não p’rá próxima virás comigo à pendura, terás então uma outra visão das coisas, oferecer-me-às ao menos uma amarga flor, talvez uma negra flor, o ideal para levar a qualquer funeral, não ?


                 34 - MADNESS....


Blame Isa who asked me to write about madness. She's crazy, she has no idea of ​​the trouble she's gotten me into. I was silly that I accepted without having thought about what I was getting into. But as we all have a little bit of wise men and fools, I fell!

 

I'm waiting for the show of “Mão Morta”, madness has always been their calling card, this time the mobile is the release of a new CD based on “Cantos de Maldoror”, a very old work that was in the rage a few decades ago, I read it very young and forced myself to reread it later, with a different maturity.

 

I'm curious, “Adolfo Luxúria Canibal” doesn't usually leave all the evil that can be blamed on him.

 

 

It won't rain, it won't be cold or hot, coming by motorcycle won't bother me and I already won, in time, in the parking lot for which I had no difficulty and in distraction, because for me riding a motorcycle is breathing, living!

 

 

The preparations unnerve me, they are doing it on purpose, they want to catch us with tense nerves or fringes, it's part of the ritual, they will only advance when "we feel the breath of the death of a dog on our neck", this demented attitude is already known to me and peculiar to this group.

 

 

I remember other shows, the deliberate sadness of the colors, the fact that here I can smile without looking crazy, that there will be no rules or limits and we can scream at will, disorderly express the decadence of the heart, redeem or express the worst in each of us. It doesn't matter about us, so I ask you, where, if not at a show by “Mão Morta” can we shout the truth and laugh at everything and everyone, even at ourselves? This is a party!

 

 

And behind closed doors we live the hellish delirium of the exaltation of evil, about that I can only tell you that "Portugal Conection" was not spared and advise you to watch the next "live", that this is like a brotherhood.

 

 It's now two in the morning in a disreputable bar in Alfama, I'm going home that Évora is still far away, so far and so close, so close and so far that everything I heard singing and saying fits him like a glove, no we live in paradise, but in Eden what is different, because in it everything is to be done and to happen.

 

I take the bike, I have already said goodbye to the old, conspicuous but also promiscuous and conspiratorial friendships that I have accumulated over the years through these tasks, I head to the Pragal tollbooth, because from there the house is a short hop, a hop.

 

Nothing between me and the sky, only you strange love that suddenly entered my mind and that's it, here I am reminding you, you don't get out of my mind and force me to sketch a smile in your glory, I accelerate, I feel all the world to open up in front of me, the speed and murmur of the wind whisper countless and unspeakable mysteries to me, I go from 150 to 200, 250, 300 and my eyes clouded over, just thinking continues to bet on a life plan, when nothing if you have to lose, defying death is lucky, how many times I've done it, I don't remember.

 

 

I'M SICK OF ME!

 

 

I hear voices whispering, whispering, the thought still echoing the most morbid passages of the show, I need to relieve the tension, I accelerate more and more, I have the devil in my body, this is another one of so many challenges in which there is no logic, only absurdity , it could be a deadly trip, a gamble, who will win, who will lose?

 

 

On me the effect of this struggle and the joy achieved in surviving while death lulls me with its song and I, instead of remorse, think of lupines, beautiful funeral wreaths, plastic flowers, wreckage, and to distract myself while I devour kilometers , I curse and I hum blasphemies !

 

 

Speed ​​dulls and excites me, the lack of nicotine derived from quitting tobacco increases adrenaline, this is neither casual nor ephemeral, it has long since become an addiction for me, it will be eternal!

 

 

It's not a joke, it's for real!

 

My soul hurts, I look at the pressure gauges, I control the temperature and my euphoria, I pass by Montijo, it smells like shit, it always smells like shit in this passage, and what does that matter?

 

 Anything !

 

The highway, which by car is a straight, at this speed has curves that seem to be 90 degrees!

 

 

I dominate the anger, this doesn't work anymore?

 

Delighted with the show!

 

Footpegs scraping the floor!

 

 

I challenge myself, fall! falls ! I made the turn scraping the pavement and this shit didn't fall!

Screw this !

 

 

I see the starry sky, only then do I notice sparks that the metal of the motorcycle was leaving in the air when scraping the ground! The air I breathe, the fire I breathe, fuel the furnace of anger and agitation!

 

 

I imagine savages chasing me, I spur the mount, I feel like one of the last settlers pursued by the Indians! Or the first of a cavalry battalion!

 

I'm Custer! Crazy scream !

 

My vagabond soul remembers that only you love, sweet love, will one day have the secret of my fear! Suddenly you entered my mind and that's it, here I am reminding you. I don't see, I don't look, I don't look, I don't see more than beautiful images, dreamed, imagined, I hear an accordion, or it seems to me to hear it, well here's an instrument that would serve and I would love to have at my funeral!

 

 

And this doesn't work anymore?

 

I look at the gauges, control the temperature and the euphoria.

 

This shit doesn't work anymore?

 

 There ! oh it will fall! will fall! look at the curve! the motorcycle to scrape! look at the floor! falls ! falls ! did not fall!

 

Screw this ! it still wasn't this one! I got away!

 

The starry sky! Let me scream! Smile without being called crazy!

 

          I put myself to the test and won once again! This is a party! Let me laugh at myself! Of everything ! Of all ! How beautiful !

 

 

Twenty minutes Lisbon here !

 

Good ! Let someone do the same or better !

 

I am home! Bed !

 

Tomorrow at nine I have to be there, coat and tie, as usual, always the same shit!

 

Does Isa serve you? This piece of madness ?

 

If not next time you will come with me hanging, then you will have another vision of things, you will offer me at least one bitter flower, maybe a black flower, the ideal to take to any funeral, right ?


terça-feira, 15 de março de 2011

33 - EM REDOR DE ALGUNS GINS TÓNICOS ...


Sobrei da história de meus pais como algo inesperado numa idade e época para eles pouco propícia a surpresas. Como tal, mais que um sonho, representei nos augúrios da família um estorvo desde o início.

Para trás fora deixada por minha causa, uma fazenda no colonato da Cela a sudeste de Luanda, em Angola, que meu pai já há muito e mentalmente havia dividido em parcelas para algodão, tabaco, cacau, café e gado, generosa oferta do governo de então e cujo objectivo, na retorcida lógica Salazarista, seria contrapor à guerra colonial então despoletada, um povoamento das vastíssimas planícies sem dono e em que a colónia era fértil e cobiçada desde tempos anteriores à querela do mapa Cor-de-Rosa.

Nunca distingui se o olhar de meu pai, perdido na minha contemplação, me admirava os predicados ou se vogava nas intangíveis caçadas aos leões, perdidas por minha causa nas matas de Gorongosa. Lembro vagamente conversas de carabinas e zagalotes certeiros entre os olhos das ferozes feras, fulminadas pela destreza do caçador exímio que era por cá com lebres e perdizes.

Depois disso faltam-me dessas recordações, recupero-as nos acordos de Alvor, na descolonização e independência dessa colónia, no 25 de Abril, dos retornados, entre eles os dos colonatos abandonados. Infelizmente já não tenho pai, e talvez agora, mais que nunca, se veja ainda embrenhado nas vastas savanas, caçando ou atento às cotações agro-pecuárias, desesperado com prazos de entrega, guias de embarque e exportação, esquecido de mim, como sempre.

Ele não soube, talvez nunca tenha sabido, mas adorava-o. Outras razões não houvessem e bastaria o facto de lhe ter frustrado na força da idade tão grandiloquentes planos.

- Bebemos mais um? Ou é tarde para ti ?

- Ficamos, adoro estar aqui, nem a minha história é muito diferente da tua, quantas vezes não me imagino filha de um mundo raro que nunca chora o passado. Quantas vezes dou por mim, olhar fixo num horizonte indistinto, como tendo vivido num mundo de mistério do qual guardo um segredo sabido, mas que provoca em mim uma exaltação no peito que mais parece uma tormenta e faz com que o coração anseie, como sabes, por dias felizes.

- Gosto de estar contigo, mau grado a consciência da enorme distância que nos separa, nestes momentos fecho os olhos e vejo-te como nunca, nem durante o dia te vi. Talvez efeitos do gin, ou então como que o despertar de um sonho, acordada de uma ilusão sob este céu inteiro pois numa fogosa cadência me lembras das cores das auroras, e imagino roçar a minha face pela tua e estremecer.

- Onde vou eu inventar estas palavras? Primaveras sei que invento ! - Será que enlouqueci ? Que fazer ? Como posso ? – Não, não enlouqueceste, eu sei que não. Próximo de ti é como se soubesse a história de amanhã e nunca antevisse o deserto. - Fala baixo, será que eles nos vão ouvir ? - Obrigado por ficares, tornas esta noite diferente das outras. Assim evito passar vezes sem conta à tua porta.

- Também eu, quantas vezes imaginei meus dedos como pente acariciando o teu cabelo, segurando-te a nuca e beijando-te.

Sei que não, que nunca, juro a mim mesmo que sim mas não, e continuo pela rua pensando como tudo seria bom, poder gritá-lo, poder gritar este amor como dourado ! Autêntico emaranhado de emoções e sentimentos, um novelo de frustrações. Verdade que sim, há muito és para mim motivo de agitação e cólera, vontade temor e receio.

– Acredito, sei-te incapaz de numa floresta assustares os pássaros dormindo. - Vais morrer de riso mas, quando estou contigo, como agora, é fogo que aspiro, sei como tu respiras, e respiro baixo, parece-me viver do ar que tu exalas, é só o que posso dizer e não me cansarei de o fazer.

Eu falo, tu falas, lado a lado, mas sinto que não escuto e não ouço, será que um dia partirás ? Deixarás de ser meu amigo ? Deixaremos de estar lado a lado ? Seria a morte.

Senti-me um intruso, mal pude sentei-me num lugar entretanto vago na ponta do balcão.

Enlearam as mãos, encostaram as cabeças, eu paguei a minha conta e fui-me, cabisbaixo.

Quem desejaria ali comigo não estava e, desde há muito tempo, senti-me só como jamais imaginara.  

       Pintura de Coskun Cokbulan