segunda-feira, 21 de março de 2011

35 - ELOGIO DE UMA VIDA ...


Olá.
A ti dediquei hoje as minhas horas de insónia.
A ti porque te invejo a força de viver, a condição, a coragem. E apesar disso sorris.

E eu que me julgava uma força da natureza perante ti me quedo, entre outras razões, pelo simples motivo de que me sinto culpado de uma culpa que não tenho.
Sim, Deus joga aos dados, estaria distraído no momento da tua concepção, o universo não será mais que fruto de acasos geridos pelo caos. 

Tantas vezes te lembro, tantas te tento entender e não alcanço.
Como vês tu o mundo?

É difícil para mim chegar tão alto, mas imagino perceberes e sobretudo sentires como a humanidade te vê a ti, e sinto vergonha, como se fora eu a descer tão baixo.

Li o teu texto. Tentei depreender quanto dele alcançarias.
Está-te vedada a verdade. E eu não sou capaz.
Nem jamais apreender como entenderás esse assunto.
Imaginá-lo-ás bom, apelativo, sedutor, de outra forma como explicar tanta gente na terra, não será?

Mas mesmo assim dificilmente imagino quanto alcances pois se, como a mim, ou ao contrário de mim, te são negadas as mais simples sensações que te permitiriam conhecer esse universo.

Por isso eu, que me julgava uma força da natureza, me sinto culpado de uma culpa que não tenho, porque acredito, Deus joga aos dados, e perante ti me quedo, entre outras razões, pelo simples considerando de que nem creio que jamais tenhas experimentado sensações tão humanas quanto as que uma mão macia de homem faria aflorar no teu espírito se, quente e sedosa, te acariciasse o peito, a sensibilidade de uma língua ávida de outra língua ou o bafo quente de um hálito na púbis, desfrutando os grandes lábios e delirando com o teu sabor e cheiro.

Escolheste perceber as pessoas, má aposta, eu teria enveredado pela biologia, ou pela filosofia talvez, mas quem sou eu para me colocar em teu lugar?

Apenas teria fugido das criaturas, nada mais que reles respostas encontrarás nesse conhecimento, nessa busca, o ser humano é, a esse nível, dos mais baixos entre as espécies, mas compreendo a tua sede de saber, de perceber, porque percebo que até a mais onanista e oniríca forma de satisfação te está vedada.

Impossível sonhar o que não se experimentou.

Nem ao menos, como eu tantas vezes fiz, ou faço, no recato de um espaço mas no seio de sonhos vividos, em que me masturbo se acossado pelo desejo, pela lembrança ou recordação, e me manuseio a bel-prazer, e a meu bel-prazer encurto ou prolongo esse tempo de mim e para mim até que, numa explosão impossível já de conter e enquanto a imagem dela parece abarcar-me e o seu nome por vezes grito, num grito quantas vezes calado, abafado, me deleito copiosamente, a boca num esgar de prazer, os olhos rodopiando nas órbitas, até que a indolência me tome e uma sensação de felicidade e amor me envolva e retorne a mim, acorde desse sonho lindo e, atrapalhado, envergonhado, me recomponha e retome a compostura. 

Entendo agora porquê agnóstica, entendo agora porquê a vergonha que te disse, restos de uma catequese que nos condiciona, uma moral que nos confina, e que inconscientemente assumimos, acriticamente, Deus pode jogar aos dados, mas que não O julguemos.


Estou contigo, estou do teu lado, faço um esforço para entender quão tu sofreste a suportar uma moral que ninguém serve, mas ninguém questiona nem ao menos contesta.

Quero perceber na tua condição, a tua coragem.

E compreender por que apesar disso sorris, ajuízas, como vês o mundo apesar de te estar vedada a verdade.
O que é difícil para mim é que te debruces sobre o que te é de todo proibido, inacessível, será vontade de entender?

Mas como?

Alguma vez já, e para não ir mais longe, tu ou alguém ousou ao menos acariciar-te a genitália? Viveste essas sensações?

Se não, como afirmares o que dizes? Perceber-te o escrito?

Alguém o fez? Tu o fizeste já?

Primeiro como a carícia de uma suave e macia pena, depois, a pouco e pouco avançando para uma respiração incontrolada tornada ofegante, as pernas subindo e descendo, entreabrindo-se e fechando-se, a boca procurando uma boca, o torso oferecendo-se, a bacia soerguendo-se numa oferenda a deuses, e já não a mão mas os dedos buscando o teu interior, o teu calor, o teu mistério, já não os dedos mas o dedo, buscando cada vez mais fundo achar o que afinal há para dar e nem tem que ser achado mas tomado, até que se perca a suavidade e o controle, e o mesmo dedo agora não já doce docemente, mas com volúpia e violência revolvendo-te as entranhas, ficares vermelha de amor e raiva, morder, e, quando os bicos dos peitos hirtos, gritares fode-me!

Gritares fode-me querido!

Com todas as tuas forças!

E puxares a ti quem desejas e num passe de contorcionismo e mágica te colocares a jeito e te fundires e afogares em ti mesma e nele, até que o cansaço e a saciedade vos separe, unidos num abraço duradouro e belo que nenhum esquecerá.

Tantas vezes te lembro, tantas te tento perceber e não alcanço, é para mim impossível perceber o modo como vês o mundo, é difícil para mim igualar-te, chegar tão alto, sobretudo sinto uma enorme vergonha do modo como o mundo te vê, vergonha mesmo, como se fora eu a descer tão baixo.

Li o teu texto, está-te vedada a verdade, impossível sonhar o que não experimentaste, tudo porque Deus joga aos dados, e a ordem, o plano infinito, são uma falácia que o caos comprova, a harmonia não passa de um desejo, quando muito uma metáfora, escolheste perceber as pessoas, má aposta, mas estarei contigo, estarei sempre do teu lado, a teu lado, conta comigo, com a minha amizade desinteressada, envergonhada, tímida, a teu lado sou incapaz de me sentir a força da natureza que me julgo, sei que não tenho culpa mas sinto-me culpado, diria que, como Cristo, aceito os pecados dos homens, não fosse eu, como tu, agnóstico, e, melhor que nunca, entender agora porquê.