quinta-feira, 9 de junho de 2016

349 - É UMA LOJA MÁGICA, Maria Luísa Baião * ...

Pintura de Beatriz Lamas Oliveira

A minha resposta é; - Não sei. Não sei umas vezes, é-me difícil outras, aproveito por vezes restos de conversas, ou bocados das que escuto aqui e ali. Já o tenho confessado mais que uma vez, torna-se por vezes mais difícil em certas ocasiões arranjar tema para uma crónica que decidir que fazer para o almoço ou jantar do dia. Outras saem de jorro, a imaginação correndo apressada à frente da esferográfica, eu fazendo um esforço para não esquecer migalha. Crónicas há cuja inspiração me chegou em sonhos, que em sobressalto me acordaram e me sentaram à mesa, papel e lápis arrebanhados num ápice para não esquecer pitada.

A de hoje vai dedicada a um homem que não tem tempo para pensar, e me confessou o seu espanto pela minha semanal persistência e imaginação. Penso já lhe ter respondido com as palavras citadas, mas, nunca ele pensou, ter-me logo ali resolvido o problema desta semana, o tema ou mote para estas linhas.

Todas o conhecemos, vemo-lo a qualquer hora do dia, desdobrando-se em mirabolante ginástica por detrás do balcão da sua loja, loja recheada de toda uma panóplia de imprevistos e milagres, à volta dos quais a sua vida se vai desgastando. Enquanto pelos quatro cantos do planeta se apregoa o despertar do milénio, naquela loja as clientes parecem entrar em busca da redenção do mundo, e ainda que muitas vezes seja preciso esperar, é um tempo que se aproveita espiando o ir e vir das pessoas.

Não sei se aportou a Évora ou se sempre aqui viveu, sei isso sim que a sua presença transcende já o limite daquelas luxuriantes paredes, atapetadas que estão de toda a quinquilharia que possamos imaginar, mais parecendo soberbos expositores de topázios, esmeraldas, rubis e outras pérolas. Não me entendam mal, não estou a falar de pechisbeque, não estivesse aquele amontoado de milagres indizíveis esperando a sua vez de nos acudir, e que razão se encontraria para que a loja esteja sempre mais cheia que uma missa de meio dia ?

A evolução deste pequeno mundo que é Portugal parece não ser sentida ali, num quotidiano feito não sei quantas vezes de trivialidade, sem espavento, com a simplicidade e a autoridade de quem parece dirigir o destino. O senhor Coincas e a sua loja sobrevivem ao meu espanto, e na certa mais ainda às (aos) amantes das novas catedrais do consumo, os Hiper’s, há alguns anos instalados entre nós, e que parecem causar alguns aborrecimentos ao comércio tradicional.

Mas já que falamos de comércio tradicional, de que sou indefectível defensora, vale a pena recordar; onde ir comprar um nastro, um colchete, um jogo de botões, uma renda, uma peça para lençóis ou cortinados ? Imaginem, ou experimentem, procurar estas singelas necessidades nesses modernos templos sacudidos pelos áureos ventos do nosso novel modernismo saloio, os hiper’s, cujas relações se pautam pela extravagância, pelo impossível e às vezes, a maior parte delas registe-se, pelo desprezo completo pelo cliente, e, na melhor das hipóteses por uma arrogante insensibilidade.

Naquela loja as portas estão sempre abertas, sabemo-lo, para lá nos dirigimos imaginando tesouros que estão muito além da realidade. Mal entramos, de olhos ardentes perscrutamos a escuridão luminosa daquela “gruta”, onde o silêncio parece mais pesado e o tempo dilatar-se fazendo-nos esquecer as pressas. De imediato um cordial bom dia nos chega aos ouvidos, há sempre uma atenção especial para cada uma de nós, sem perder as outras de vista e de mesuras, parecendo sentir por todas um carinho especial, que sentimos vindo de uma figura angélica, intocada pela maldade. Cativa, porque cultiva um temperamento, uma sensibilidade que nos toca, que nos tolhe. Não me lembro de o ver como nunca andou, gravata frouxa, colarinho desabotoado. Por vezes pareceu-me ver uma aura nas suas mãos, enquanto a suavidade dos modos e a solenidade do trato me confortaram a alma, danada com os pecados da criação.

No entretanto o senhor Coincas flutua desafiando o balcão, multiplicando gestos e habilidades na procura do impossível, que, demorando embora mais algum tempo, também ali encontramos. Uma antiquada severidade para consigo próprio fá-lo parecer mais velho, mas na certa é um compromisso de amor para com o seu trabalho. O trabalho eleva o homem, é dos livros, mas não vale o esforço se não nos libertarmos da sua tirania, sob pena de nos enganarmos por despeito.

         Talvez tivesse esperado, sempre, que com os anos viesse a descobrir o veio que alimentasse um abundante filão. Não o imagino rico, mas que aquela loja tem magia, nisso acredito.

* Maria Luísa Baião, pub. no Diário do Sul, coluna Kota de Mulher – Março de 2002


quarta-feira, 8 de junho de 2016

348 - BOLA PRETA BOLA BRANCA .........................



Ainda nem dez e meia da manhã são e a coisa está agitadíssima na esplanada que habitamos. Antes de chegar já eu ouvia o ti ri ri da ambulância dos bombeiros, o que não adivinharia era que ela apontasse para o mesmo destino que eu. Piquei o ponto no momento em que debaixo de fortes convulsões o grande latagão do Luís Honório era carregado e, vendo a minha cara de surpreendido a Aurélia resmungou-me entre dentes com o queixo subtilmente apontado à Lénia:

- Braço partido aposto, ou partido ou estalado no cotovelo, o gajo é pesado como o caraças.

Deixei a poeira assentar, às tantas debrucei-me sobre o seu ombro:

- Ó Aurélia, o braço partido provoca convulsões ?  Desde quando ?

- Ai tu não sabes a história ? É que se não conheces a história não sabes da coisa metade… Acrescentou ela em ar de confidência.

No meio da consternação geral não quis estar a fazer perguntas, não eram nem o momento nem o local adequados a tal, pois a mesa estava cheia. Do Honório soubera ter por duas ou três vezes tentado o suicídio, felizmente tentativas goradas, sabia isso como aliás toda a gente sabia ter ele problemas no quartel, precisamente por isso, ou por causa de uma baixa médica que arrastava há três ou quatro anos, se não mais.

Sentei-me sossegado, o que havia para saber chegar-me-ia aos ouvidos, não valia a pena estar feito cuscas, isso era coisa para a Ermelinda e para o José Pereira, por mero acaso e felizmente ausentes, nesta mesa havia de tudo, desde gentes alheadas da realidade a quem a cavalgasse na onda e na hora, são gentes eclécticas, participativas, e  tanto os há que não comemoram o 25 de Abril ou o 1º de Maio como os há que aproveitam essas ocasiões para os excessos ou todas as que possam para festas de arromba, a Lénia, vim posteriormente a saber, estava neste último grupo.

Desde o 1º de Maio que ela não aparecia ao café, aliás nem em parte nenhuma, vieram depois a dizer-nos que arranjara qualquer complicação que a atirara para a cama. Por ela mesma e nessa manhã veio a saber-se de um qualquer distúrbio ligado à flora e fauna intestinais (o abuso de álcool costuma provocar estes efeitos esclareço eu), e lhe provocara febres altas e perturbações várias, ela própria contara à mesa:

- Esta coisa é terrível, para qualquer pessoa, levantei-me hoje pela primeira vez mas não me sinto a cem por cento, a mim tem-me dado desde náuseas a vómitos, tonturas, má visão, a diarreias ou fezes duras. Ultimamente até me acidificava a urina e depois provocava-me ardor na uretra... E nos intestinos, e no ânus. Ainda esta manhã muito eu sofri na casa de banho, uma vez mais a tentar, a tentar e não conseguia fazer... Uma hora de castigo e só consegui fazer uma bolinha verde escura muito dura imaginem.

- E trazia brinde ? Perguntara o Luís Honório inocentemente.

E foi esta a cena que eu por escassos cinco minutos perdi, a Lénia não achou piada à boca do Honório, sub-repticiamente chutara-lhe o pé da cadeira, o latagão caíra desamparado, ouviu-se o osso a partir embora o problema fosse a vermelhidão que o tomou e o espumar da boca, de modo que ninguém se atreveu a levantá-lo dali, a Lourdes Tripeira (não é do Porto mas tem uma língua de trapo) ligou de imediato ao 112 e este aos bombeiros, pelo que ainda a ambulância que viera ajudar não se perdera de vista na sua urgência e já a Esperança me sussurrava ao ouvido encostando-se sorrateira e maliciosamente a mim:

- A erva acabou com ele, desde os dezoito que tem epilepsia, nem sei como o aceitaram na GNR.

Mais uma que eu nem sabia nem sonhava, realmente não sei da missa nem metade, sorri para ela, atirei-lhe uma piscadela de olho dúplice, para que tivesse a certeza e consciência que eu a entendera e:

- Hás-de explicar-me isso melhor menina, quando puderes.

- Um dia com vagar explico-te, um dia que não haja gente a ver e a ouvir, não são assuntos para serem abordados em público.

Sorriu-me com uma perfídia que a minha insinuação jamais igualaria, e eu para ela:

- Bolinha branca, a bolinha branca é que dá direito prémio não é ? A branca ou a preta, já nem lembro bem.

E desatámos os dois rindo mas varrendo a mesa com o olhar não fosse alguém ter apanhado qualquer coisa no ar e pensar de nós o que Maomé não pensou nunca do toucinho.


Nem sempre o furo dá prémio, quem deve ter acertado na bola certa foram os novos administradores do hospital da minha terrinha, há ali de tudo, até quem não tenha competência p’ra ser admitido como marçano na mercearia dos Andorinhos. É triste que os lugares sejam rateados entre as pessoas ou forças que dominam a política citadina, aprova o meu que eu aprovarei o teu… como que vendo quem o tem maior. Cada um mija com o seu mas são os amigos quem faz o resto, afinal os amigos são para as ocasiões. Alguns sem saberem ler nem escrever… outros nem falar sabem, há ali de tudo e até quem pronuncie “há-dem” e quem em dez palavras diga meia dúzia de asneiras… mas têm os amigos certos… e que pensar dos portugueses que não têm amigos como estes senhores ? E dos que são obrigados a emigrar ? E dos que têm que vender a força de trabalho por tuta e meia ? E dos que nem ganham para comer ? Dos que nunca terão trabalho ? E dos que nunca jamais em tempo algum terão uma casa, um carro, nem uma família quanto mais  filhos. Para uns tudo para outros nada…. E mais que isto que vos conto felizmente eu nem sei… Bola branca lhes saiu a eles…

Antes o Salazarismo de má memória ou todos estes tipos encostados a um muro e fuzilados…. Ou guilhotinados na praça pública… Gostava de acreditar que foram criteriosamente seleccionados ao abrigo do procedimento concursal regulamentado pela portaria nº 83-a/2009, de 22 de Janeiro (Portaria nº 83A/2009, de 22 de Janeiro, alterada pela Portaria n.º 145A/2011, de 6 de Abril) mas mais facilmente sou tentado a apostar ter havido ali ou negociata ou  jigajoga, de que aliás o BE se viu arredado pois ainda é novo nestas coisas e anda entretido, ou o entretêm com utopias como  a dos Concelhos Livres de Armas Nucleares" ou mais hodiernamente com os “Concelhos Libertados das negociatas do TIPP” e das culturas da “Monsanto” como se eles, bloquistas, soubessem minimamente o que andam a fazer. Bola preta.

Não quero ser desmancha-prazeres, mas cheira-me que nas próximas eleições o Bloco vai provar o amargo gerado por todas as idiotices em que se envolveu e todo o bom senso que lhe faltou para ajudar a resolver os enormes problemas em que estamos atascados, e que em parte a ele, e ao tempo perdido com o acessório esquecendo o essencial, também podemos agradecer. Bola preta…

O novel BE nunca percebeu que os novos eleitores teriam que ser conseguidos entre os burgueses mas acomodados eleitores do PS, nunca percebeu que jamais será incapaz de beliscar o ortodoxo PCP, “um valor seguro”, bola branca para o PCP, os bloquistas jamais perceberão o título do livro de Jane Austem, “Sensibilidade e Bom Senso”, o seu eleitorado é composto sobretudo de grunhos facciosos que, também eles começaram há muito a construir a sua quintazinha, a sua capelinha, a sua facçãozinha, fechadinha, quentinha, protegida do diálogo com os demais, de altos muros que evitam o confronto de ideias e de ideais, que lhes asseguram o conforto das suas certezas, da sua infalibilidade, um conforto que lhe permite conquistar quem se deixar conquistar ou quem para ele caminhar voluntariamente mas incapaz de convencer os que contam, os que fazem número, quantidade, volume, densidade e massa critica que lhe permita sair de vez da sua pequenez. Bola preta para o Bloco portanto…


quarta-feira, 18 de maio de 2016

347 - IMPROBABILIDADES, homenagem singela e simbólica a Ana Hatherly*, que pintava com palavras...

 Picture by Catita (Eborense produzindo arte em Berlin) **

Quando me viram de braço dado com a Anna no aeroporto do Galeão já eu a conhecia há pelo menos uns dezassete dias, mais prosaicamente do voo Portugal – Rio, onde eu ia por formação e férias, e ela aguardava ser agraciada pela Academia Brasileira de Filologia com a Medalha Oskar Nobiling. Portanto aquele bilhetinho com um lindo madrigal por mim perdido na fila do chek in, nada mais significava que quiasma entre a sua especialidade e a minha ambição, coisas que somente uma subjectiva fascia desenharia no pensamento de quem nos olhasse.  

Estávamos pois despedindo-nos entre risos que se humedeciam de lágrimas e lágrimas que esmaltavam nossos sorrisos, havendo razões de sobra quer para festejarmos quer p’ra lamentarmos não por nos termos conhecido mas por nos irmos separar, quem não nos conhecesse ficaria às voltas com um pensamento ambíguo suspenso entre mãos, há até quem diga ser a ambiguidade a arte da suspensão.

Ela vestia como uma sufragista e a ideia de regresso a casa fazia-a sorrir, os dentes brancos como teclas, ou antes as teclas de quaisquer bons pianos brancas como os dentes dela, eu desorientado de olhos perdidos e não achados, procurando-os, desfeito em cinzas, ou em lágrimas desfeito de tanto os procurar sem os achar, pois sou um individuo coerente até nas minhas contradições e uma vez enervado, rio-me de um modo trágico, de um modo que só mesmo o trágico provoca.

Passeávamo-nos de braço dado, ondulando ao sabor do desenho da calçada quando ela referiu vagamente sabor por sabor preferir pistácio, automaticamente sublinhei a minha preferência pela baunilha, todavia nem estava calor, aliás dos lados do calçadão soprava uma ventania que nos deixava mais tremidos e torcidos que na noite anterior, em que no Maracanãzinho tínhamos assistido a uma actuação dos Secos & Molhados, tendo ela sentido gelar-se-lhe a nuca apesar de bem abafada por uma quente e impermeável gola de pele, talvez de raposa.

E já que falamos em pistácios, baunilha e morangos Anna, que achaste da actuação dos Secos & Molhados ontem à noite ? 

- "Pouco milho p'ra muito bico, muita caca p'ra tão pouco penico"

respondeu-me ela numa lenta e repentina exclamação que me apanhou de tal modo desprevenido que inconscientemente mas de imediato retruquei :

- Isso é que é uma resposta clara ? !

Sabes meu caro amigo vou ser clara para ti, pegar a faca pelo cabo, a espada pelo punho ou o problema do concerto pela cauda pois já vi que tu detestas o caos, gostas de tudo arrumadinho, na tua idade também eu era assim, depois conclui que todo o conflito imposto pela organização ou arrumação das coisas deriva da multiplicidade dos pontos de vista, é aí que nasce a desordem. Aquele concerto não foi mais que uma panóplia desordenada de canções, diria mais, houve ali pouco objecto para muito objectivo e uma ambição nos objectivos dispondo de bem poucos objectos.

OK está bem, talvez tenhas razão, sempre ouvi dizer a respeito de elogios ser melhor merecê-los sem os ter que tê-los sem os merecer, faltou ali um guião sim, e o espectáculo perdeu velocidade, embalagem, vibração e nesse item não serei eu a dar-lhes o meu rapapé. Isto ia eu falando embalado nas minhas apreciações quando ela me cortou a palavra cortesmente, assim como a quilha de um barco corta as ondas mansas:

- Os espelhos reflectem sem falar, a populaça fala sem reflectir, o concerto foi uma porcaria, mais me pareceu uma reunião de intelectuais, onde tudo soa sempre a falso, os Secos & Molhados já se deitaram à sombra da bananeira, estão vivendo da fama, e o povinho aplaude porque já foi condicionado a aplaudi-los foi o que foi…

- Talvez tenhas razão Anna, sabes, tive um professor de Introdução à Politica que não se cansava de nos dizer, “Se a coacção existe é preciso combatê-la, mas se não existe rapidamente é criada. Na escala dos valores o que não pende, depende“ e eu cada vez que o ouvia lembrava-me daquela do horror ao vazio, tudo tem horror ao vazio e alguém preencherá o espaço que cada um de nós desdenhar. Como se o mundo fosse um tapete, melhor, uma tapeçaria, uma tela gigante, como se o mapa de Piri Reis estivesse ali esperando ser pintado e, se não avanças tu alguém avançará...


- Pois é meu querido amigo, mas tu já estás a exceder-te, a pisar o tapete, já deliras como se fosses num tapete voador e quem vai tirar-te o tapete debaixo dos pés sou eu senão já não te calas, é tarde, arrefeceu bastante, mais que certo o voo ter sido adiado, por mim a conversa do concerto está terminada, a arte é uma brincadeira e o público não passa duma família de larvas.

 Ela tinha razão, além de ser tarde era um daqueles casos em que melhor seria pensar onde cair morto não fosse eu cair num sitio desaconselhável, ou no regaço dela por exemplo, dela porque cerimoniosamente a via como minha mestra, embora me sentisse perseguido até ao complexo de inferioridade e, a menos que ela o quisesse, seria difícil encontrarmos naquela noite a harmonia das esferas que outras ocasiões tinham consentido, pelo que me limitei a ser o cavalheiro que acompanha a dama ao hotel e ao quarto, quando, para enorme surpresa minha colocou o braço sobre os meus ombros com perturbante candura e:

- Detesto a solidão, as sombras arrefecem-me a alma, entra comigo neste quarto minguante, sê o meu sol por um instante.

Dizem que quando nos antípodas as borboletas batem as asas tal cousa pode gerar um tornado deste lado, a verdade é que na presença dela mais fácil seria senti-las esvoaçando no meu estômago, sempre meus olhos por ela tornados indiscretos, me fizeram senti-los como sendo uns olhos de vidro, uns olhos pisa papeis, cor daquele vidro fenício que muitos nem conhecemos, uns olhos poliédricos como os d’alguns insectos, tudo mirando com manifesta intenção de caçar a tal borboleta azul do outro hemisfério. Por mim estava capaz de abrir a alma por ela, rasgando-a na Santíssima Trindade se necessário fosse. 

Certo que ela nunca me dera esperança nenhuma em especial, mas não ter nenhuma em especial para mim significava especialmente que me restavam todas as outras, que todas eram possíveis. Por vezes é preciso que vejamos tudo a uma nova luz, quantas vezes não se torna forçoso ver a luz das trevas ? Comunicar por radiações cósmicas ? Alimentar o mantra, o karma, a aura. Às tantas dei comigo pensando de mim para mim que Anna era linda, de cabelo azul e olhos castanhos ou versa-vice, e igualmente uma fera, uma leoa, tudo isso mas também uma implacável caçadora de homens e, confesso-vos ter sentido alguma consolação ao imaginar-me perseguido por uma mulher nascida sob o signo do Leão, afinal era ela quem repetidamente afirmava:

- “A amizade é um sentimento de difícil definição. Na prática porém todos concordam que ela se traduz acima de tudo por serviços prestados.“

Era claro para mim ser mais fácil concordar com ela que encontrar um nocturno de Chopin às duas da manhã, por isso dei-lhe a mão ao entrarmos no quarteirão do Tropicana Village Hotel o destino dela, e a que ela reagiu graciosamente:

- Obrigado pela mãozinha querido, e como desejas que a faça ? Com grão? Guisada ? Gratinada ? Assada ? À jardineira ?

Rimo-nos ambos da gracinha, rindo alto, demasiado alto para a hora tardia e despertando os ânimos de um rafeiro mimado que se nos dirigiu latindo ameaçador e raivoso.

 - Mãozinha a esta hora não querido, é coisa pesada, mas só para vingar esse rafeiro comerei de bom grado um cachorro quente.

As borboletas primeiro e o cachorro com mostarda depois puseram-me o estômago igualmente latindo por coisa quente. Após comermos retomei a direcção do Tropicana e com a noite minguando bastante dei-lhe de novo o braço e fui para casa com ela, sim, porque ambos dispúnhamos de hotel na mesma rua.

Na noite enevoada Anna inspirava-me porém a mesma ternura de todos os dias, coisa difícil de inspirar a ternura, se o não sabem ficai sabendo-o, é densa e pesada como o nevoeiro. Enevoado eu, sabia não ser um avançado metrossexual, também não era de modo nenhum um cavernícola retrossexual, todavia na sua presença sentia-me, embora constrangido, um sapiosexual assumido aguardando que entre nós qualquer fase harmoniosa, mesmo póstuma, se estabelecesse e nos imortalizasse neste universo em que para tal, depois de Mercúrio deveríamos seguir em frente em direcção ao sol até encontrarmos Vénus de Milo, onde viraríamos então à esquerda.  

Picture by Jorge Sistelo Lx ***

* NOTA: Este pequeno texto foi pensado e escrito como uma pequena, simbólica e singela homenagem a Ana Hatherly, para assinalar a efeméride da distinção por ela recebida da Academia de Filologia no Rio de Janeiro. Idealizei-o tentando ao máximo socorrer-me do seu estilo, da sua linguagem, do vocabulário, de contradições e jogos linguísticos que ela teria usado, ela que pintava paisagens com palavras. Devo ter sido das primeiras pessoas fora da comitiva (ela diria fora da camarilha) a felicitá-la. Paz à sua alma.



https://youtu.be/-zLicyzaH5A

** https://www.facebook.com/wazzupcatita/?fref=ts  a Pequena desta foto é a artista Catita, filha da minha amiga Rosa Gouveia Catita, e que emigrou para Berlin onde se encontra produzindo arte. Felicidades para ela.

*** https://www.facebook.com/Jorge-Sistelo-1706530189571287/?fref=ts


http://observador.pt/2015/08/05/morreu-a-escritora-e-artista-visual-ana-hatherly/


domingo, 15 de maio de 2016

346 - CAVALGANDO AS ONDAS ...............................


A noite estivera enluarada e fresca, por isso a malta entretivera-se a largar os fios da amurada do navio pescando lulas e chocos até altas horas, a bem dizer até que arrefeceu demasiado e todos se recolheram aos respectivos beliches. Nem todos, os que estavam de quarto entraram ao serviço para preparar a largada do navio, o “NRP Pereira da Silva” regressara de uma longa viagem pelo Mediterrâneo e aportara aqui com um problema hidráulico no leme, mas o problema estava resolvido.

Eu cirandava por ali, curioso das fainas de cada um, dormira até tarde embalado pela ondulação da rebentação a que nem a amarração fugia e agora do sono nem cheiro. O frio atirou-me para o quente aconchego da sala do radar, na parte superior das obras mortas do navio, o comandante há muito traçara o destino e recomendara o rumo, que os especialistas apontavam na imensa folha de papel vegetal sem fim que o maquinismo ia fazendo correr na mesa, riscando-o nela com lápis dermatográficos pretos, vermelhos e azuis, uma mistura de cor e cera, não fosse o navio naufragar e a água apagar os vestígios das suas manobras. À falta de caixas negras e equipamento digital, lápis e papel à prova de água davam alguma garantia, desde que não afundasse a mais de cem ou duzentos metros, a partir dali chegar-lhe seria já um desafio.

Quando largámos ainda a ténue claridade da manhã fazia dançar nas águas as luzes de Lagos, ia eu pensando nela por já termos passado manhãs na Praia dos Índios, a Meia-Praia. Quando dobrámos a ponta de Sagres o mar mostrou-se encapelado e o rumo foi alterado de norte para noroeste, havia que fazer frente às vagas com a proa e não levar com elas de través no costado o que poderia tombar o navio. Pensava nela porque aquele contratempo não nos iria permitir chegar a meio da tarde a Lisboa, nem talvez ao fim da noite, e o fim-de-semana que há semanas ambicionávamos, esperávamos e combináramos dezenas de vezes iria uma vez mais por água abaixo, já que de água estamos tratando.


Muito antes da ponta de Sagres já nós apontáramos ao largo, lembrei-me então que seiscentos anos antes incipientes caravelas haviam cruzado estas mesmíssimas águas rumo a Alcácer-Quibir, onde estragaram o fim-de-semana, tal como horas depois de apontada a proa às ondas e rumando a noroeste ultrapassámos a linha imaginária nordeste/sudoeste traçada pela coragem de Gago Coutinho e Sacadura Cabral uns bons anos antes.

Da sala de comando vinha a confirmação das posições que o sextante pingava e os radaristas de serviço anotavam, em relação a elas o equipamento observava varrendo tudo em redor do navio, e que no vegetal da carta era marcado como sendo o centro do mundo, centro marcado por uma luzinha a ele apontando, que o radarista marcava a vermelho, azul ou preto, a partir dali uma mesa mecanográfica calculava azimutes, milhas tragadas, nós galgados, velocidades e posições. Não havia GPS por essa época, nem GPS nem telemóveis nem SMS. Porém para mim o centro do mundo era ela e não aquela sala, a luzinha ou o navio, ou os pingos do sextante, era para ela que o meu rumo e o meu pensamento apontavam, as ondas alterosas só me transtornavam o caminhar, não o destino, sabia-a à minha espera nas Residências da Gulbenkian a Stª Maria, ou, se a deixassem, na Doca da Marinha, onde o navio atracaria. 

Para o adormecer e apaziguar enchi o bucho de azeitonas, salgadas atenuavam as náuseas e o vazio provocado pelos solavancos da embarcação, cuja proa se erguia ao embater frontalmente nas ondas para logo mergulhar a pique no vão criado pelo deslocar delas que num instante levantavam a popa, dando o navio uma queda de vários metros e fazendo-nos sair o estômago pela boca. Era demasiado, a nau poderia até partir-se em duas ao embater desamparada no fundo desse mar cavado, mais parecia um submarino que uma fragata, e as obras vivas, não raro, passavam mais tempo fora que dentro de água, era assustador e tenebroso. O comandante mandara rumar a Sesimbra mal fosse possível, e assim foi. Ali nos resguardámos dos vagalhões e dos abismos do mar, seriam umas onze horas da noite, talvez um pouco mais. 

Alguns de nós fomos a terra numa chalupa, invadimos cafés e restaurantes, todos tinham fome e sede, e a todos custava andar e equilibrar-se, como se o chão firme se movesse. Tentei ligar-lhe mas das Residências não atenderam. Não sabendo quando chegaria comprei num quiosque um postal ilustrado que ali mesmo preenchi e selei, uma cara linda por trás do balcão adivinhou-me o pensamento sorrindo-me maliciosamente.

- Como disse que se chamava menina ? Foi Zéza que disse ? Zézinha ? Bom fim-de-semana Zéza e não se esqueça de meter o postal no correio. Nunca lhe perdoaria !

Beijei o postal, sorri para a Zézinha bonitinha malandrinha marotinha simpatiquinha e pela cumplicidade adivinhada no seu olhar soube que não se esqueceria do meu recomendado pedido. Antes da manhã despertar o mar acalmara tão repentinamente como encapelara e rumámos finalmente a Lisboa e ao Tejo. Deviam ser umas dez ou onze da manhã quando passámos por baixo da Ponte Salazar. Não seria um fim-de-semana totalmente perdido mas, chegar e não chegar, formaturas, dispensas, atravessar o Tejo para a outra margem se atracássemos no Arsenal do Alfeite, antes das três nunca pisaria a Praça do Comércio, apanhar ainda o 32 até à Gulbenkian e jamais lá estaria antes das cinco da tarde, o que significava somente lanche, jantar e talvez uma soirée.

E assim foi, acabámos mão na mão, ombro no ombro, vendo um filme, “O Regimento Vermelho Feminino” * ou qualquer coisa assim, filme icónico e Maoista que era só o que passava no Cinema Universal, ali ao Rego, e onde já víramos “O Couraçado Potemkin” * outro filme de culto, à rua da Beneficência e onde passado o PREC e a euforia dos filmes vermelhos viria a funcionar o “Rock Rendez-Vous“, que tivemos o prazer de inaugurar assistindo ao concerto de Rui Veloso que dali lançaria a figura carismática do Chico Fininho.

Enfim, era uma rua cheia de animação e motivos para tal, onde ainda por cima adorávamos amesendar, quer fosse no “Bem Comer” ou no “Carne Alentejana” que nessa altura eram mais tascas que restaurantes e nem tinham os preços impraticáveis de hoje.

Foi vez única, nunca mais me separei da Luisinha até hoje, curiosamente quarenta anos depois voltei a encontrar a Zéza marotinha, a Zézinha simpatiquinha, bonitinha e malandrinha nada mais nada menos que atrás do balcão dos correios da minha terra, onde é a gerente, e à frente de uma catrefa de filhos, trupe que vai gerindo com parcimónia e harmonia.

Olhámo-nos, talvez demoradamente, eu de carta na mão, ela erguendo o carimbo, e de repente os dois, quase em simultâneo;

- Eu já vi esses olhos !
             - Eu conheço esse sorriso não lembro é de onde !

Quarenta anos passados ... A vida tem cada uma …






terça-feira, 10 de maio de 2016

345 - O PRÉMIO VALMOR ERA EU *…........………



A cena não é fácil pra mim, não que a tenha esquecido, ninguém esquece uma rejeição, ainda por cima coisa única na vida, ainda por cima numa idade tão tenra, ainda hoje não sei como não fiquei traumatizado, revoltado ou mesmo gago. Nem sei que não viu em mim a Quinita Santos para me ter recusado, tal como não sei porque depois disso não dei em incendiário ou bombista ou coisa do género, teria justificação acho eu e Freud decerto explicaria.

A coisa conta-se em poucas penadas, não que me agrade, como disse faço por nem lembrar essa rejeição, por isso nem sei precisar se ela ia no banco detrás ou se entrou na carreira em Montemor, a verdade é que só depois a vi e, não me interessando já nada, nem para nada, esqueci a razão que aduziu para a viagem a Lisboa, a mim, contei-lhe com alguma presunção, tratava-se do abandono desta cidadezinha de província, numa tentativa de encontrar a sorte na capital onde já tinha à minha espera um contrato. Esclareço que com a presunção e vaidade de quem tinha catorze ou quinze anos, no máximo dezasseis.

Arranjara emprego no escritório do Hotel Lys, mais tarde Lis, em plena Avenida da Liberdade, junto aos Restauradores, hotel cujo edifício tinha sido alvo da atribuição do Prémio Valmor, mas mesmo depois de alguns meses de vivência em Lisboa eu não estava elucidado sobre o que era esse prémio, só muito posteriormente vim a saber estar o prémio ligado à arquitectura e não, por exemplo, ao culturismo, que por essa época assolapava a capital e por arrastamento, a mim. Isto devido ao facto das senhoras do chá me chamarem inicialmente por “o nosso alentejano”, ou “o nosso eborense”, e mais tarde cada uma ter tido ensejo de me reclamar como o “seu prémio Valmor”. Toda a minha confusão vinha daí, e demorou tanto tempo a desvanecer-se quanto tinha demorado a instalar-se. A fachada do hotel era linda de estilo, era bonita, porém os funcionários não tinham ordem de entrar ou sair pela porta principal, ordens do senhor Garcia, o gerente velho e rezingão, para nós estava reservada uma entrada de serviço, gente menor, e é possível descortinar nas fotos bem visível à direita do edifício um portãozinho para o pessoal, dando acesso a uma escada exterior afundando até três ou quatro pisos abaixo do nível da rua e onde se situavam os armazéns, a copa, os serviços, as caldeiras, a dispensa dos víveres, que se fosse visitada pela ASAE teria originado um terramoto, e ainda os quartos dos funcionários. O meu quarto situava-se ao lado das caldeiras, quentinho no inverno mas o inferno no verão, até ao dia em que o Éden ou o Tivoli passou uma fita de guerra em que as caldeiras de um navio explodiam sob o impacto de um torpedo aliado e aquela maltinha ficou toda cozidinha. Nunca mais ali dormi.  

Esse insuportável quartito moldou muito do meu estilo de vida em Lisboa, já que tudo fazia para não voltar a ele antes das duas ou três da manhã, altura em que se tornava suportável e a partir da qual conseguia dormir alguma coisa. Depressa magiquei um estratagema, sendo eu quem no escritório controlava a ocupação dos quartos, depois de arranjar nos serviços de limpeza uma chave mestra de que fiz cópia, passei a dormir todas as noites num qualquer quarto vago à minha escolha e que abandonava antes das nove, altura a quem entrava ao serviço e tinha que estar já lavado e comido, a mesma altura em que as funcionárias iniciavam o seu deambular pelo hotel tratando dos quartos que iam vagando. Como eu fui amado, como me amaram lá, como me amavam ! Apesar de grande idiota fui e tenho sido um homem feliz.

Acho que nem chegou a um ano a minha experiência no Hotel Lys, contudo ele e Lisboa viriam a influenciar inclusive alguns dos meus relacionamentos futuros, quer tivesse tido eu neles um papel activo quer esse papel tenha sido meramente passivo, no final o que conta é o saldo, foram relacionamentos que partilhei e vivi, talvez desafiadores, talvez estranhos, de qualquer modo e felizmente sem resultados desastrosos a assinalar (links no final do texto). 

         É que, para me socorrerem ou apoiarem na integração na capital muito se esforçaram as senhoras habitués no salão de chá do Lys, senhoras nessa altura, hoje não lhes chamaria jovens mas senhoras ainda não seriam, era gente à volta dos quarenta, quanto muito cinquenta e com uma pedalada que, não fora a minha frescura e teria custado a acompanhá-las. Uma delas, de entre todas a mais beata e a mais devota tomou-me sob a sua protecção iniciando-me nas noites do “bas fond” alfacinha, onde era rainha e dominadora, a quem acabei por escolher os cabedais, os chicotes, as algemas e outros adereços MILF** enquanto ela me oferecia blusões de cabedal, capacetes com viseira de astronauta, uma novidade na época, coisas que íamos comprar à Butimoto Corba, uma loja para motards ali aos Anjos, na intersecção da rua do Condeça & Ferreira, dealer da Kawasaki, e do Stand Vidal, que vendia motas usadas e novas multimarcas. Eu tinha uma Solex com a qual corria Lisboa em peso e, desde que só mostrasse o blusão, o capacete e as botas à maneira, as miúdas eram um maná. Adoravam o meu look, o cheiro a óleo e a gasolina.

Vem a arenga de hoje responder à Sandra, olhem só do que ela me foi lembrar, Sandra que, já nem sei a que propósito me atirou com um Lys, a que somei uma bocarra provocatória da Zéza, apelidando-me de pinga-amor, a mim, um homem dedicado, com um casamento exemplar e feliz que já leva muito mais de trinta anos. Quem vê caras não vê corações, o mundo é como um carrocel numa feira *** e não pára, nunca pára, umas vezes saltei-lhe para cima outras levei dele encontrões. Não se experimenta incólume um carrocel em andamento, não se mete lá o pé, ou se lhe salta para cima ou se fica vendo-o girar ca de longe. A vida pode ser um chupa-chupa de algodão doce, mas é preciso que nos lambuzemos dela. O poeta disse-o “ Confesso que Vivi”.****

Cabendo-me a mim no escritório os débitos dos clientes, bafejava com ousada condescendência e perdão as contas das amigas do chá das cinco, coisa que elas me retribuíam com mimos e atenções. A desabrida Solex em que corria Lisboa fora oferta de uma delas, e anos mais tarde ter-me dedicado a restaurar uma BSA 250 Gold Star teve muito que ver com o sonho vivido nessa altura, ser boletineiro da Marconi cavalgando essas motas impressionantes distribuindo telegramas por toda a capital, como quem na Feira Popular desafiava a gravidade no poço da morte, calçando umas fenomenais botas de cabedal pelos joelhos…

Essa mota, depois de restaurada e melhor que em nova foi por sua vez posta à venda por mim no Stand Vidal passados alguns anos, a merda das motas inglesas nunca deixaram de babar óleo pela junta da cabeça lixando-me imensos pares de calças caríssimos o que me irritou bastante pois não dispunha de caneleiras até aos joelhos como a malta da Marconi ou a minha amiga D. Senhora Hermínia nas suas sessões de sado masoquismo e MILF das noites quentes e loucas de Lisboa.*****

Verdade que nessa época da minha vida vivi muito, vivi muito e vivi depressa, contudo tive oportunidade de me redimir de todos os excessos e pecados nos anos em que leccionei no Oratório de S. José, Salesianos, gramei dezenas ou centenas de missas diárias logo às primeiras horas de cada manhã, se para outra coisa não serviram ao menos limparam-me a alma.

Desde então não me tenho mantido casto, mas quase.

Capice ?





  
*** https://youtu.be/VEoCAUZSfwA   - Winner of Eurosong in Vienna 1967. Sandie Shaw - Puppet on a String -  em português, " O Amor É Como Um Carrocel "