Empurraram-me para isto, p'ra uma ida á praia ... Foi o que foi ...
- Baião, tens que conviver, sair, bla bla bla...
E francamente ou eu escolhia inscrever-me na “universidade” dos velhos, coisa que não suporto, ou alinhava com eles pelo menos uma vez numa das ida á praia, daquelas que o Grupo de Viagens GTI organiza (em tempos fui nalgumas viagens e foram óptimos passeios de grupo) ou os aturava o resto da vida pelo que anui e inscrevi-me numa dessas idas, mas nem tão pouco levei calções de banho…
Tudo pk lá na ideia deles fiquei viúvo há relativamente pouco tempo e não posso continuar sozinho nem a isolar-me ou ainda viro eremita e bla bla bla bla… Aceitei, inscrevi-me, esperei o dia da ida e lá fui num belo autocarro daqueles a que só falta multibanco… Para ser sincero ainda não tinha decorrido meia hora de viagem e já eu concluíra não estar preparado para estas coisas, nem para estas nem para ingressar na tal “universidade” dos velhos, nessa então muito menos !!
Passeio pela vila ou cidade de Ericeira, bonita mas alcandorada numa falésia e com muitas escadas, ladeiras e subidas, tudo coisas demasiadas para velhos, e para novos, até p'ra mim que estou n meia idade, nem desci á praia…. Com tão excelsa companhia não me apeteceu matar a criosidade quanto a essa vila de contrastes, por isso apesar do passeio da manhã ser livre rumei a uma praça apinhada de gente, a maioria velhos, a maioria velhos de excursões como a minha mas oriundos das mais variadas zonas do país, a Ericeira tem mais turistas velhos num dia que ouriços tem o seu mar... E eu a pensar que o negócio dos "mata-velhos" tinha sido das melhores idéias que alguém tivera...
Pelo que para afastar o calor entrei numa das gelatarias que me pareceu menos cheia, pedi um gelado de taça, que me saiu caríssimo, ia ficando sem os olhos e, sentei-me a comê-lo quando … snif snif snif …. Cheirava a merda que tresandava, não era o WC, confirmei, só podia ser um dos velhos ou velhas que por ali abundavam de bunda nas cadeiras em volta das mesas… portuga ? english ? franciú ? bosch ? marroquino ? tailandês ?? Fugi dali a sete pés nem acabei a merda do gelado….
Depois rumámos ao autocarro que
nos levou ao almoço, uma marisqueira daquelas que desistiram de fazer
casamentos e baptizados por já não os haver mas que se reconverteu a dar
almoços de marisco aos velhos turistas….. E ás tantas dou por mim a pensar :
mas que faço eu aqui ? Que faço eu no meio disto tudo ?
Cada mesa levava dez “turistas”, contei as mesas, eram à volta duns 600 os comensais, portanto muita gente de outros autocarros, de outras terras, e eu ali no meio daquele mar de gente velha, eu novo, 71 acabadinhos de fazer, novinhos, ainda a brilhar, e nem uma velha jeitosa, nem uma que valesse a pena levar a dançar, ou a apalpar, ou a engatar, uma coisa para o futuro que o amanhã a Deus pertence e eu tinha que satisfazer os cabrões que me meteram nesta alhada, que lhes vou dizer ? Que tenho má boca ? Que sou esquisito ? Eu a fugir dos olhos gulosos delas, dos perfumes baratos de há 50 anos, dos fedores nauseabundos dos cremes da cara que me fizeram lembrar a minha avó Inácia que Deus tem à sua guarda há 40 e muitos anos….
Sim porque havia música e músicos, de quinta categoria mas havia, eram todos cançonetistas de terceira, e o tal povo que Almada Negreiros tão bem categorizou;
“ O Povo completo será aquele que tiver reunido no seu máximo
todas as qualidades e todos os defeitos.
Coragem portugueses, só vos faltam as qualidades.”
Havia música e mesas bem recheadas com tudo, e bem servidas, muita gente a servir, nada de esperas, fartura de tudo mas meu Deus eu estava rodeado de velhas e velhos, algumas mais novas mas ainda assim mais velhas que velhas… Eles idem, só grunhos, broncos, e parvos, até que desbastadas as entradas e o primeiro prato a mesa foi recheada de frutos do mar, do camarão mais pequeno á lagosta maior, da conquilha pequenita à vieira mais grandita, caranguejos, santolas...
Parecia a mesa das bacantes, quando
repentinamente dou por eles todos levantados, de telemóvel na mão p’ra registar
o momento, parece que nunca tinham visto marisco, ou comido marisco, impressionou-me
a atitude, eu que nem aprecio nem um nem outro além de camarão, e eles numa
atitude pasmada e generalizada, de todos sem falta focados no centro da mesa, no rei marisco, não neles, não uns nos outros, mas no ídolo do momento, no que lhes iria tirar a barriguinha de misérias, afinal o 25 de Abril valeu a pena, ali estão eles manducando o manjar dos ricos, é a igualdade prometida cumprindo-se ….
E eu para com os meus botões, isto ainda vai demorar ? Felizmente a velharia cansa-se depressa e daí a pouco, todos felizes, todos de bandulho atolado de marisco, babando-se mas rumando, ainda que aos encontrões para o autocarro, eu olhando-os com pena e trocando sorrisos maliciosos com a guia, às tantas um piscar de olho, a coisa promete, a ela o espectáculo também a diverte…
ela disse-me que têm programas muito variados e dessas coisas percebe ela, há casos em que o melhor é a gente deixar-se levar, o universo tem mistérios que a gente nem sonha nem sabe desvendar…. Além disso o meu futuro ta escrito na palma da minha mão garantiu-me ela, pelo que nem valerá a pena eu esbracejar não acham ????
O pior foi mesmo o regresso, o autocarro
no regresso cheirava mais mal que a tal gelataria, alguém estava borrado mas mesmo borrado, agora com aquelas cuecas para a incontinência cagam-se todos e só o
cheiro sai de mansinho, mais nadinha de nada, mas olham todos uns para os
outros sem que ninguém se descaia e é aí que está a piada…. Alguém viaja
confortavelmente em cima de uma almofada de merda e nem diz nada…
Depois, depois a toda hora caem, perdem-se, cada vez que o autocarro faz uma paragem na volta chegam atrasados, finalmente entram e depois ou antes de entrarem vomitam-se e mijam-se, se sentados e em andamento nunca se calam, nem sabem o que dizem nem dizem o que sabem, não têm maneiras mas têm suores frios, guincham e falam gritando desaustinadamente, palitam os dentes com a unha, desmaiam quando menos se espera, têm uma admiração mórbida por igrejas e santos, não sabem nada nem conhecem nada nem ninguém, que terão andado fazendo uma vida inteira ?
Eis o que me espera, tou com 71 e
para lá caminho… para lá do inferno …. Ainda não estou preparado para estas cenas…………….
HUMBERTO BAIÃO
AVENTURAS E DESVENTURAS DE UM
VIÚVO INEXPERIENTE ...