Lembrai-vos
do tal fulano que não abria a página a ninguém mas que aqui há coisa de três
meses a escancarou estrategicamente a toda a gente ? Lembram-se com certeza, eu falei nisso por duas ou três vezes.
Vi-o
este fim de semana !
Perdão, quero dizer vi-o no fim de semana passado, de
calças caqui escuras, um polo leve, dos caríssimos ! Ténis de marca, e
contrastando fortemente com a roupita chique um boné rasca na cabeça, um desses
bonés de propaganda dos partidos, o que me fez soltar uma sonora gargalhada por
ser de um desses partidos que até se arrogam a defesa dos pobrezinhos.
Marchava
integrado num grupo, cruzei-me com eles e mal os ouvi, captei algumas frases
dispersas mas não me permitiram avaliar a totalidade do motivo que ali o
juntava, ou os juntava;
-
estender pontes
-
mais unidos e mais capazes
-
contrariar desinteresse politico
-
dar nobreza à politica
- a
vitória é nossa
-
fazer história
-
qualidade de vida dos cidadãos
-
dar tudo por tudo
-
conquistar a maioria
Não
fiquei a perceber se iriam assistir à passagem da volta ao Alentejo em
bicicleta, para isso era cedo demais, pelo que não enquadrei bem quer as
exaltações quer o júbilo de que davam mostras, ou sequer os apelos à vitória,
mas que o nosso amigo anda metido nalguma isso anda, atenção que eu disse em
alguma, e não com alguma, aliás para isso já terá passado a idade ideal,
todavia juro nunca o ter visto tão entusiasmado, ou entusiástico, e já conheço
a figura há bem trinta anos ou mais, que o moverá, que o empolgará tanto ?
Só quem
desconheça o esforço que durante anos este fulano colocou a pôr-se em bicos
dos pés, só quem ignore tanto trabalho desenvolvido, tanto golpe de rins, tanto sapo
engolido é que poderá estranhar esta cena, pelo que confesso ter-me a
curiosidade levado a reduzir a velocidade e encostar o carro, pois já estava quase
parado, e então quando a Gabriela me deu uma cotovelada é que parei mesmso por completo, e também para ouvi-la;
-
Olha quem os espera ! Repara só, pára mais ali.
Encostei
o carro para ver melhor e olhei com mais atenção e vi, gente do piorinho, do
pior que a cidade tem. Anda bem acompanhado o nosso amigo, vai chamuscar-se, ou
queimar-se. Este fulano, que eu sabia já há algum tempo padecer de males sezões
e febres manhosas, coisa escondida pela família que a deixava transparecer somente
ao conhecimento dos mais chegados, pois temia que o estigma da doença afastasse
as pessoas de casa, não era contudo um doentinho, a menos que se considere
doença a pancada para a todo o custo projectar o orgulho, a vaidade pessoal,
coisas deveras íntimas mas para ele muito importantes, talvez mais importantes
que tudo pois só uma atitude assim explicaria as amizades escolhidas, com gente que só pensa nela e que já por duas ou três vezes mandou isto tudo abaixo.
Chegado aqui não consegui conter o riso. Percebi então tudo, ao ver
aquele magote de gente fez-se luz no meu espirito. Este fulano, aquele beltrano, aqueloutra sicrana. É uma questão de esperarmos,
o nosso amigo irá prometer-nos tudo e mais alguma coisa, afinal precisamente o
que todo o grupinho anda fazendo há muito tempo, aliás nunca fizeram outra
coisa. Este fulano arranjou para ele mesmo este hobby, que inseriu no âmbito
dos desafios individuais com que entretém a reforma e a vidinha, daí as fotos
com os amigos, em especial com o arquitecto, e com o povo, em vários ângulos,
poses e situações, a Gabriela também já o compreendeu, quer dizer já lhe topou
o jogo, andar entre aquela gente em bicos dos pés parece ter passado de tempo
perdido a coisa efectiva, nunca acreditei que aquele fulano seria escolhido mas
pelos vistos parece que me enganei.
Está
tudo explicado, é uma questão de esperar para ver, agora percebo porque andava
sempre em bicos dos pés. Com gente desta estamos tramados, e condenados a
trabalhar para lhes pagar as reformas douradas que nada justifica e que nem
mereceram.