Hoje
é dia de “finados”, dia de lembrar os mortos, as queridas e os queridos, as
amigas e os amigos e as conhecidas e os conhecidos que já se foram. Ontem foi
dia de “todos os santos”, em memória de boa gente que se pensa ter alcançado o
céu. Quer um quer outro foram dias de muito significado para mim, tanto mais
significado que relembro quem sempre lembro, ou quem sempre guardarei na
memória, como a minha querida Luisinha e alguns de que aleatoriamente me
recorde, caso do amigo José de Fonseca, que lembrei por me ter cruzado com ele
no dia em que foi pintada esta caixa eléctrica da EDP.
Calhou a encontrarmo-nos e quase esbarrámos um no outro, eu quando vou dedicado à minha caminhada só a marcha me importa, olho em frente mas só vejo a passadeira vermelha ou o sofrido alcatrão da Ecopista. Mas o boneco pintado suscitou conversa e eu, cujo passeio frente a casa está sempre pejado de tralha dessa, trotinetas abandonadas ao calhas e incomodando toda a gente, não me contive:
- Não há maricas que não tenha uma coisa dessas !
- Tu não Baião, toda a gente sabe seres tu um santo !
O Zezinho
atirou-me a matar, mas essa verdade toda a gente a sabe, até por eu mesmo
costumar afirmar, na brincadeira claro e somente junto do meu círculo de
amizades íntimas, que sou um santo. E nem me admira que não abram a boca de
espanto, conhecem-me…
Dei-lhe como resposta o que digo a todos eles tantas vezes, que somente não uso a auréola, não porque a não tenha, mas por ser incómoda, por demasiado pesada e me ficar ligeiramente apertada, o que ao fim do dia se torna extremamente doloroso, mas sobretudo por ser demasiado exuberante e dar imenso nas vistas, razão pela qual a guardo na bagageira do carro para não enferrujar, mas estar sempre à mão.
- Com a verdade me enganas Baião !
Ninguém desconhece quantas vezes ser a brincar que as verdades se dizem, retrucou o Zezinho, ouvi-o com a assertividade aconselhada ao momento, os amigos são para mim tão importantes quanto o melindre da questão o exige, por isso fui condescendente com ele, até por eu mesmo estar convencido do facto, em tantas ocasiões uma mera suposição é afirmada que se converte numa verdade aceite, absoluta, sobretudo quando sou eu mesmo quem melhor me conhece as virtudes e os defeitos e cujo saldo reputo de singularmente positivo e me incita a continuar e a superar-me a cada dia que passa.
-
Sim Baião, por vezes, muito remotamente, uma ou outra alma lá reconhece pública
ou pessoalmente que sim, que se não és santo andarás lá muito perto, adiantou o
Zezinho sorrindo melifluamente para o colega fazendo com que a conversa se
estendesse e viesse a dar pano para mangas...
Agradeci, intui a responsabilidade inerente, que assumi ou assimilei e continuarei a minha saga procurando não desiludir quem quer que seja mostrando-me digno da confiança em mim depositada passando a responder ao Zezito, um rapazito capaz de ser meu filhito, que me considero à altura do repto, digo da santidade, por ter já há muito constatado não primarem as pessoas, na generalidade e actualmente, por predicados que bons anos atrás faziam parte da formação ou do saber de qualquer um.
A
maioria das pessoas hoje em dia não conseguem ter uma conversa, uma atitude
correcta, agir em conformidade no momento próprio, resumindo, não sabem ser nem
estar, não sabem o que dizer ou fazer perante uma qualquer situação por mais
banal que ela seja. As pessoas actualmente não agem, reagem, reagem não
emotivamente mas emoticamente, cagam
likes e emoticons. Agirão como quem depois de olhar em frente e p'ra trás vai largando marmelos enquanto marcha ecopista adiante, para se vingarem e aliviarem do stress do
dia.
Posso não ser o santo que pensam, mas sou coerente, resoluto e até convencido, sou seguro de mim e acredito piamente vir um dia a ser canonizado. É que há muito me dei conta que, pelo lado masculino (não exijo que sejam santos) infelizmente existe um deficit de cavalheirismo, de etiqueta, até de romantismo, para não dizer de educação e formação, coisa que mal nenhum faria a que homem fosse e por certo deixaria as damas felicíssimas.
Mas não, isso não acontece e, ao invés, infelizmente, chegam-me quotidianamente aos ouvidos notícias de falhas de educação raiando a alarvice, o que, convenhamos, nada dignifica os machos das nossas urbes.
Não
vou aqui discutir feminismos nem machismos, igualdades de direitos ou de
géneros, santos ou anjinhos, apenas evidenciar um pensamento e os inerentes
comportamentos, atendendo a que estão em causa os caracteres e personalidades
dos envolvidos, elas e eles ou eles e elas, para o efeito qualquer ordem ou
prioridade serve perfeitamente.
É certo que eles também protestam quanto à falta de feminilidade actual do sexo oposto, ao deficit de sensualidade, ao abuso pelas mulheres de atitudes, poses, posturas, vestuário e terminologias pouco dignas do seu estatuto e da etiqueta, enfim, penso que também eles nos merecem compreensão.
Mas que o Zezito tenha que se socorrer de mim, e eu dele, é indicador preocupante do modo como o nosso mundo se encontra e, tal atitude vinda dele, se bem que me honre, mostra-me sobremaneira o estado de desespero em que se encontra e o desânimo que sobre o mundo se abateu. E ele confessou-o, é cada vez mais difícil encontrar alguém inteligente com quem simplesmente se possam trocar dois dedos de conversa.
Por mim aqui declaro por minha honra estar disposto a continuar tentando manter a paciência, esperando a esperança (não a Esperança) a ser tolerante e compreensivo, enfim, pegando ou dando continuidade às palavras do Zezinho, um incréu assumido, ter fé e aguardar um milagre.
É
que do mal que ele se queixa também eu padeço, infelizmente depois de ficar viúvo parece-me todo o mundo
ter ruido em meu redor, tenho além disso uma desagradável sensação de que vivi
p’ra nada. Ao desaparecer um elemento da equação a estrutura colapsa, casais
amigos, amigos, familiares, amigas, família, casa o prédio, os carros (das
motas já me desfiz), ficou-me a sensação de ter passado anos a construir algo
de raiz que repentinamente se foi.
Senti então e pela primeira vez na vida um enorme vazio dentro de mim, tornei-me
azedo para com as pessoas, indiferente, alheio, sem paciência para as ouvir,
para as aturar, suportar, acho que para estupidez basta-me a minha.
Mas contudo, todavia, porém, para além do tesouro que perdi continuo adorando uma jóia que ficou, a minha gata Mimi, esta noite deixei-a dormir aos meus pés. Fiel desde o início, desde pikinina, fiel que nem um cão... Enfim, tenho-a a ela, resta-me ela, fora escolhida ainda pela dona na sequência de uma outra que morrera de cancro e à qual é quase igual. Ela a dona, e a Mimi, tal como muitas e gratas recordações são o que me resta de tantos anos de construção duma família e dum casamento tão sólidos quanto possível.
Passei nesses tempos não tão longínquos mas que nem quero lembrar a interrogar-me diariamente mas sem
esperar pela resposta, nunca esperei nem esperarei, confiei no tempo, o tempo, como sempre, se encarregará de
preencher o vazio, de instalar a ordem no caos, de colocar a coisa
certa no lugar certo e na hora exacta. Construção de quê interroguei-me ? Que
andei eu construindo ? Quem ocupará o vazio que ficou ? Quem se julgará capaz
? Quem se atreverá ? Quem avançará ? Quem se arriscará ? Nunca tive a ousadia de pedir uma igual,
queria somente uma igualmente inteligente, tenho esse direito ou não ?
É que se assim não fosse ………………….. e
acabou-se !!
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E para cúmulo do azar até tu te foste,
até tu partiste, tu com quem eu poderia desabafar, contar-te dos meus segredos, com quem podia falar dos nossos mistérios como tu te referias a esses choques sociais e aos teus problemas,
aos teus difíceis equilíbrios, à tua tortura, instabilidade, erosão, desgaste,
stress, inadaptação, inconformismo,. Como eu te compreendo melhor agora Zezito, que
falta me fazem agora aqueles tempos, aquele tempo, aqueles minutos em que,
desabafando expurgávamos o fel acumulado, limpávamos a alma, e eu me ia com a
sensação de ter puxado o brilho à auréola, a sensação de ir à minha vida com a aura
limpa, e agora só saudades, saudades dela, saudades de ti, Deus vos guarde.