ALVO VÉRTICE PONTO MOUCHE
Tu em
pé, altiva e hirta,
eu de
joelhos, abraçado a ti,
mirando-te,
olhando-te
de baixo para cima,
admirando-te
as colunas de Hércules,
o olho
de Ciclope,
o olhar
trespassando-te,
o
desejo latente,
ante ti
eu, um lactente sedento,
olhando
o Paraíso, a maçã,
o fruto
apetecido e eu,
de novo
eu, sempre eu.
Homem
amadurecido,
sucumbindo
à tentação,
ao
fruto proibido, trepando,
p’las marmóreas colunas acima,
agora abertas,
agora
convidativas,
dando
passagem a minha nau,
acolhendo
o meu rumo,
e eu
sedento,
e tu o
sumo.
E além,
o Farol
de Alexandria
assinalando
a noite,
marcando
o ritmo, o dia,
policiando
as águas agitadas
como
dois lençóis em desalinho,
e entre
sedas e linho,
o cálice
! o cálice !
quero-o
!
a
cicuta, a cicuta,
a mim !
anseio
matar esta sede,
este
desejo, fantasia, ambição,
sonho,
melodia, delírio.
Tremem
as colunas de Hércules
ante
meu gatinhar sôfrego e,
de tão
fortes oscilam sob tensão,
tangem,
vibram como cordas,
viola,
violina, violão,
fado,
destino,
vibrando
hesitantes,
dissonantes,
cunha
cravada entre querer e não querer,
entre o
dar e o haver,
saldo,
preço, conta, sacrifício,
razão e
emoção, quem vence ?
O
coração,
que
tacteias com a mão e
abres
como pétalas em flor c’os dedos teus,
e o
néctar, o néctar, agora meu,
e tu, e
eu, e nós,
e em
minhas faces o mármore gelado
das
colunas quentes,
ardentes,
a
cicuta bebida num trago,
avidamente,
o Farol
no máximo.
A luz
omnipotente,
as
estrelas, só estrelas,
tudo
estrelas,
as
colunas fechando-se e
o meu
abraço cingindo-as,
enlaçando-te,
e tu,
qual Ciclope,
tacteando-me
os cabelos,
puxando-me,
empurrando-me
contra
ti.
O olho
do Ciclope dado,
dando-se,
abrindo-se,
extasiado,
surpreendido,
estupefacto, e
finalmente
fechando-se,
sossegando,
dormindo,
e eu
num abraço
arrebanho contra mim o mar,
Mediterrâneo,
Atlântico,
velando
as tuas águas,
o teu
descanso até
ver em
meu redor mar chão,
ouvir o
canto das sereias,
divisar
ao longe o galeão.
Onde
dessedentados
partiremos
rumando
um novo rumo,
construindo
um novo mundo,
redescobrindo
arquipélagos,
enseadas,
portos, abrigos,
e de
novo o amor,
o mesmo
outrora tão temido,
ora
perdido, ora encontrado,
agora o
passadiço,
passado
é passado,
subimos
ambos,
devagar,
tu à
direita eu à esquerda,
a
espada balançando na cintura,
o
galeão ondulando na maré,
o
espartilho,
corpete
dando-te forma,
um
camarote real,
baldaquino,
dossel,
o amor,
o amor,
o
galeão avançando,
navegando,
balançando
como um carrossel…
NOTA : …..
O corpo humano, no todo ou em parte, pode ser visto sob vários prismas, desde
os mais objectivos até àqueles altamente subjectivos.
A verdade é que eles
existem, os prismas, desde o mais baixo, o alarve, popular ou pornográfico, no
geral ofensivo, existindo a contrabalançar o prisma estético, ligada ao belo, à
beleza, à pintura, à escultura, ao desenho ou à fotografia.
Já o nobre prisma ou a
nobre perspectiva ética defendem que o corpo humano é para respeitar e não é
para vender, violentar ou violar por exemplo. Na perspectiva artística
defende-se desde há milhares de anos que (em especial o corpo feminino) o corpo
seja alvo de admiração se estimado, trabalhado, mente sã em corpo são,
admiração que está na origem dos cânones clássicos inda hoje mui considerados.
Naturalmente não esquecemos
a perspectiva médica, o corpo é um sistema de órgãos muitíssimo complexo. Mais
complexo que um automóvel, um avião ou um computador, e deveras muitíssimo mais
sensível e melindroso.
Isto para não falar das
perspectivas ou abordagens mais subjectivas que a literatura lhe dedica, em
prosa ou poesia, geralmente duma beleza ímpar, e que infelizmente não estão ao
alcance de toda a gente por razões compreensíveis.………………………..