Entreolhámo-nos, como dois
cínicos, cada um ciente da sua verdade. Pé fincado para não ceder.
Não nos olhámos como dantes,
felizes, embevecidos e arrebatados. Desta vez entreolhámo-nos,
porque não já aquela vontade de nos olharmos nos olhos, como quando neles a
esperança, a paz e a harmonia do mundo.
Desta vez foi com pé fincado,
na certeza das certezas absolutas, na firmeza de convicções inabaláveis, como
se o mundo um lugar nosso, onde a nossa voz valesse e, ambos cegos, cegos ao
facto de o nunca ter sido.
O único mundo que criámos e
tivemos foi aquele do qual agora, abrir mão nenhum queria, convictos de
certezas que só o eram, ou foram, enquanto durou aquele mundo nosso, que
construíramos, e que na cegueira do momento julgáramos inquestionável,
inevitável, eterno.
E afinal só fumo, fumo e
arrogância das posições soberbamente assumidas, por nós tornadas irredutíveis,
como se a verdade uma só, e não é, as verdades são muitas, e para cada uma que
agora aceitaríamos, outra que igualmente seria aceite como solução, que não
esta mágoa, esta solidão, este horror a estar aqui, aqui ou em qualquer outro
lugar, pois agora toda a cidade me parece horrível, nada de bom tem para mim,
nem dela espero desde que te foste, odeio estar aqui, porque já não a paz,
porque já não a esperança, porque já não a felicidade à mão, agora perdida,
errante, evadida de nós, como se leprosos, embora já inocentes, já sem
certezas, convicções inabaláveis, irrevogáveis, mas que a saudade transmutou em dúvidas, perdões e
arrependimentos impensáveis apenas há tão poucos dias atrás.
Por isso a saudade hoje me
queima, cresta permanentemente a lembrança, o pensamento, a memória, e já não
certezas, apenas dúvidas, e já não a soberba, a arrogância e a firmeza daquele
momento em que a ferida aberta, mas o perdão, a desculpa, a saudade, o
arrependimento, e agora, que já não oportunidade para isso, a complacência, a
permeabilidade e a disponibilidade para buscar soluções que não houve, que não
encontrámos, cada um ciente e firme nas suas certezas inabaláveis, não o eram,
ruíram como castelos de cartas mal a rotina aflorou e a saudade as minou,
porque não fortes, como nos fizéramos crer a nós mesmos e ao outro, mas o
coração derretendo-se-me como manteiga após o torvelinho, a erupção das tais
verdades irredutíveis, que afinal não o eram.
E agora para aqui lembrando-te,
rogando mentalmente indulgências, num silício que as horas oneram, numa
penitencia que me afoga o pensar, e só a ti não esqueço, esquecendo-me de mim
mas não de ti, onde andarás, que estarás fazendo, serás feliz ?
Eu fumando cigarro após cigarro, pegando num livro para logo largar, porque sem interesse e tentando outro e a mesma sorte, manuseando os CD’s, e nenhum me agradando, antes este silêncio ensurdecedor que só a tua lembrança atenua, e se não eu, que pelo menos tu tenhas encontrado a solução, porque eu não e me flagelo pelas certezas que eram minhas e afinal nem certezas, e agora só dúvidas, e agora só me resta a incredulidade da então teimosia, agora arrebatamento, e desejo, e saudade, agora arrependimento pelo dito e pelo feito, agora a consciência dos excessos no momento da cruel verdade, em que nem tu, nem eu, dispostos a abdicar das nossas razões, as únicas válidas, e afinal sem valor algum que não a soberba do momento, o não querer admitir, o não querer ver, o não querer ouvir, o não querer ceder.
Eu fumando cigarro após cigarro, pegando num livro para logo largar, porque sem interesse e tentando outro e a mesma sorte, manuseando os CD’s, e nenhum me agradando, antes este silêncio ensurdecedor que só a tua lembrança atenua, e se não eu, que pelo menos tu tenhas encontrado a solução, porque eu não e me flagelo pelas certezas que eram minhas e afinal nem certezas, e agora só dúvidas, e agora só me resta a incredulidade da então teimosia, agora arrebatamento, e desejo, e saudade, agora arrependimento pelo dito e pelo feito, agora a consciência dos excessos no momento da cruel verdade, em que nem tu, nem eu, dispostos a abdicar das nossas razões, as únicas válidas, e afinal sem valor algum que não a soberba do momento, o não querer admitir, o não querer ver, o não querer ouvir, o não querer ceder.
Agora toda a cidade me parece horrível, nada de bom tem para
mim, nem dela espero desde que te foste, odeio estar aqui, não sei se para ti o
mesmo, este mal estar por não te saber como, por não te saber feliz, por a
vaidade e a arrogância me não deixarem ligar-te, falar-te, procurar-te ou
ver-te, como nos dias em que sempre sol, sempre uma brisa calma, uma paz de
alma por saber-te ali, e agora nada, e afinal para quê a arrogância ?
Para quê as certezas que nada
de bom garantiram, nem nada me deram, nada nos deram ?
E esta vontade de abraçar-te,
como fazia, de te aceitar como te davas, de me cumprir como sempre sonhara.
Evito passar nas ruas que
calcorreias por temer-me e á reacção que poderia ter, e nem sei qual, se
correr para ti e abraçar-te, olhar-te, se quedado estático, fala perdida,
incapaz de mexer-me, como se num sonho mau acometido por um touro, e as pernas
recusando mexer-se, e eu assustado, temente, acordando no momento do impacto,
em sobressalto, e paralisia nenhuma, e touro nenhum, apenas eu e o meu medo, de
enfrentar, o touro, a ti, a mim, por não saber que fazer, como emendar o meu
erro, como voltar atrás no tempo, emendar a mão, arrepender-me ante ti das
nossas faltas, não te culpo, também as tuas assumo, não o seriam se não eu no
teu caminho, e quero ver-te sorrir de novo, esse sorriso rasgado e contagiante,
o teu cabelo ondulando ao vento, os olhos como contas de vidro, novamente
vivos, vivaços, para que eu finalmente redimido possa dormir, descansar deste
esgotamento que me consome e novamente os dias alegres me encantem.
Queria de novo o sol e um sorriso feliz
afivelado nesta cara onde durante tanto tempo se manteve, e depois, porque
nos entreolhámos como dois cínicos, não nos olhámos, mas entreolhámo-nos, cada
um ciente da sua razão nos perdemos, quando afinal era acharmo-nos que deveríamos, que procurávamos, e perdemos a harmonia do mundo, sem nada de novo
ter sido encontrado, apesar das razões, apesar da razão, que já nem quero nem
aceito, e na qual deixei de crer como irrevogável, infalível, pois tanta razão nos perdeu e
agora, só queria achar-te de novo e contigo adormecer.