É
quarta feira, está um sol maravilhoso e a esplanada desde cedo regista uma
inusual animação o que, tendo em conta a debandada que os dias frios tinham
provocado é um regresso de louvar.
Ontem
deitara-me tarde, ficara vendo o debate na Tv com todos os candidatos, e depois
deste terminado, brigando com a Luisinha sobre as virtudes e virtualidade, ou a
falta delas em cada proposta presente. Sim, recordo que Maria de Belém não
estava, mas nada se perdeu, era já sabido que assinara o pagamento das
subvenções e que se furtara de modo matreiro à interpelação de um jornalista
sobre as ditas cujas, a senhora já mostrara igualmente de véspera não entender
o país em que se move nem o partido em que milita, exigira mesmo ser a
candidata oficial do seu partido, que lhe fez orelhas moucas e uma vez mais se
ficou pelo habitual e costumeiro NIM, nim Belém nim Nóvoa, o povo que escolha. Invocar
a morte de Almeida Santos para se furtar a uma campanha que lhe estava a ser
penosa também não achei bem, até por o falecido ser, sem sombra de dúvida, um
dos grandes portugueses a quem devemos o Portugal próspero e moderno que temos.
Aquele
partido é mesmo assim, sempre assim foi, em casos decisivos tolhe a liberdade
de voto, em assuntos de lana caprina concede-a, estou a lembrar-me dos
referendos sobre o Aborto e sobre a Regionalização, e com o mais que nem me
ocorre agora, lembro os mais candentes, aliás foi assim, por estas e por
outras, que Cavaco e Silva lhes ficou agradecendo duas presidências.
Nóvoa
desfez, e bem, as dúvidas que se tinham gerado em torno da sua licenciatura em
artes do teatro, e uma coisa lhe concedo, ele tem efectivamente sido
escrutinado ao longo da vida, mas devia desde o inicio das dúvidas ter-nos
informado que aquela formação teatral não era a sua licenciatura principal,
porque à data que foi feita nem concedia tal grau. A sua licenciatura principal e única é em Ciências da Educação, ou seja, na prática, em nada... Foi conseguida em dois anos, na Suiça, inclusivé através de entrevistas avaliadoras, (segundo o método Relvas) admitiu o próprio ao CM.(a) Em países como Portugal tais licenciaturas dão p'ra fazer curriculum e subir na carreira e na vida, mais nada...
Contudo
todavia mas porém o que muitos portugueses não sabem é que nem só as formações
nas artes do teatro foram, muitos anos mais tarde, consideradas licenciaturas,
existem dezenas e dezenas de áreas, para não arriscar centenas, em que
formações do mais variado teor, algumas bem
mexerucas, ou de base bastante rasca, a par de outras de notável valia,
foram consideradas por decreto e a partir de uma determinada data, equivalentes
a licenciaturas. Uma questão de fraquezas governativas, conivências sindicais e
direitos adquiridos.
Isto
passou-se naquelas áreas, artes do espectáculo ou teatrais, mas também nas
áreas de enfermagem, áreas técnicas ligadas à saúde, e no ensino, onde existem
mesmo casos caricatos como o dos antigos mestres de oficinas, carpinteiros,
serralheiros, electricistas, a quem algumas universidades “ofereceram” de
acordo com decretos ministeriais e exigências sindicais, ofereceram dizia eu,
cadeiras avulsas que haviam de habilitar esses mestres oficinais com o grau de
licenciatura, alguns nem sabendo assinar o seu nome. Todavia logo a seguir ao
25 de Abril o novel ensino de massas exigia professores como pão para a boca, e
desta forma se forjaram situações provisórias que, como é habitual neste país
se tornaram definitivas e atiraram para o desemprego licenciados de verdade
para proteger os “licenciados à força” pois que estes últimos estavam
sindicalizados…
As
nossas estatísticas sobre os graus de habilitações literárias da população
estão todas elas aldrabadas, não só pelo facilitismo das novas oportunidades,
ou pelos diplomas dados com passagens administrativas ou sem avaliações no
ensino básico e no secundário, pois essas mesmas estatísticas não reflectem o
analfabetismo funcional, nem a iliteracia, nem o número de professores cuja
ignorância comove, que não lêem, que não compram um livro, que fogem a todas as
discussões e assuntos que não a gastronomia, o futebol, a doçaria, conventual
ou não, as novelas, o Paris-Dakar, as motas, as bonecas, o ciclismo, as modas,
incapazes de analisar uma situação, perspectivar um problema ou formular uma
solução, uma grande maioria carrega uma ignorância confrangedora e constrangedora, quantas vezes,
muitas vezes, demasiadas vezes na sua própria área de especialização entendem ? Por isso não falam, calam-se a tudo...
E
depois ? E depois, por exemplo, quando me vêem, mudam de passeio, evitam os
cafés e as mesas que frequento, evitam-me nas redes sociais, afobam-se e
afogam-se nas suas banalidades, o que até agradeço pois restringe e selecciona
automaticamente as minhas relações, filtrando somente os bons, os melhores, o
que contudo não deixa de ter a sua piada. Enfim, uma cambada de ursos e ursas a
quem o saber não comcita mas assusta… Não há-de o país ser o que é...
Quem
não achou nenhuma piada a estes decretos reguladores regularizadores e
promotores da cultura nacional foi o meu, o nosso amigo Alpalhão que há três a
quatro anos atrás entrou em depressão, deixou de frequentar a nossa tertúlia,
mas se curou com um salto para o Brasil, e os favores de uma brasileira que era
criada de servir em sua casa e do qual tivemos noticias há bem poucos dias.
Está em Angola, já refeito, já curado, desta vez pelo feitiço de uma preta que,
diz quem nos contou e afiançou, o pôs em pé e na perfeição.
Mas
quem é e a que propósito meto aqui a história do Alpalhão ? O meu amigo
Alpalhão, nosso amigo, era um engenheiro muito conceituado e respeitado na
cidade e na sua rua mas a quem a crise e o último governo não deixaram a vida
correr de feição.
Num
repente soube-se que afinal o Alpalhão não era engenheiro, era somente agente
técnico de engenharia, qualquer coisa assim como se fosse bacharel, e como
nenhum decreto o salvou, como acontecera com os carpinteiros, serralheiros e
electricistas, e nem o amigo Alpalhão completara os dois ou três anos que lhe
faltavam no curriculum para ser engenheiro a valer, acontece que foi
ultrapassado pelas normas da União Europeia, viu gaiatolas passarem-lhe à
frente no serviço estatal onde se refugiara havia mais de trinta anos, passou a
cumprir ordens ao invés de dá-las, viu o vencimento estagnar e o horário
alongar, de um dia para o outro viu-se impedido de entrar às nove e sair às
nove e meia para ir para casa fazer projectos por sua conta em regime de
private travel, e como se todo este azar não bastasse, na rua onde morava
passaram a ignorá-lo, a esconder-se quando ele surgia, a não lhe falar primeiro
e a desrespeitá-lo depois, até em casa as coisas passaram a andar tremidas, o
caldo sempre entornado e, cereja no topo do bolo, quando o bom do Alpalhão foi
chutado para o quadro de excedentários e os serviços encerrados ele não
aguentou a pressão entrando em depressão profunda da qual só sairia com ajuda
da empregada doméstica que tinha em casa a qual estivera por um triz para
despedir, uma mulher dedicada que por ele manteve um exemplar desvelo até, já
em Campinas, para onde o levou, ter descoberto que o Alpalhão não tinha diploma
com equivalência no Brasil e não lhe serviria para nada, pelo que na última
consulta o deixou no posto médico com a indicação de:
-
Agora faça por você mêu menino pois você já me enganou que chegue, e nem pense
se aproximar de mim nem de minha porta ou te meto meus primos no encalço e te
partem essa carinha de parvo…
Aqui
a história do Alpalhão regista um enorme hiato pois só voltamos a saber dele em
Luanda, apaixonado por uma preta, imagine-se, ele que por cá tratava os pretos
a pontapé nas obras que dirigiu enquanto o supuseram engenheiro.
A
vida tem destas coisas, amigos comuns que se piraram de Cabinda por causa da
crise do petróleo trouxeram-nos noticias dele, é chefe de oficinas no
importador dos camiões Volvo para Angola, tem dois lindos rebentos mestiços, a
Mingas e o Zulu, crianças adoráveis que ora o tratam por paizinho ora por
avozinho, refez a vida e, ele que sempre apreciou bumbuns (levaram-no ao
Brasil, lembram-se?), é amigado em segundas núpcias com uma preta lindíssima,
lindérrima jura o Barrenho, que já a viu, que afiança ter peito e rabo de
descaroçoar qualquer um por isso a malta o sabe curado e feliz, cagando para o
país e para as eleições e candidatos, se calhar se cá estivesse votaria no Tino
de Rans que também não tem diploma
Quanto
ao resto do debate eu recomendo a quem votar Nóvoa que comece uma petição para
lhe oferecer um smartphone, o homem é um indeciso e um coninhas que vai
precisar de telefonar a toda a hora ao Costa dos comandos, Costa assino ? Costa veto ? Costa
apoio ? Costa promulgo ? Por mim torci por Henrique Neto, socialista e meu
candidato, porque em cada três afirmações que faz acerta em quatro e a Luisinha
torceu por quem de direito e, mesmo discordando, e zangados, opinámos e
concordámos que o Marcelo tem uma pedalada e um savoir faire que dá para os
embrulhar a todos e se dúvidas havia deixou de haver, vai ganhar à primeira
volta.
(a) Ver Correio da Manhã de 21- 01-2016