Continuo
recebendo felicitações, que agradeço a todos os amigos os quais, aproveitando a
incompreensível e inusitada alteração de nome do aeroporto de Lisboa e julgando
ter o meu nome alguma ligação ao General Sem Medo me parabenizam e felicitam,
sem que cabrão algum seja capaz de deduzir ter eu nascido antes do general se
ter tornado famoso em virtude de uma frase proferida, aliás a única coisa que
em vida disse ou fez com tino, a célebre frase:
- Obviamente demito-o,
frase que naturalmente caiu no
goto da populaça, o que tornou o General famoso a partir de 1958, ano em que
aceitou encabeçar uma lista de oposição ao regime do Estado Novo, embora tudo
aquilo não tenha passado de um fugaz flash de esperança, pois Humberto Delgado além
de anticomunista primário tinha participado activamente no golpe de 1926, golpe que
derrubara a República dando origem ao Estado Novo.
Ora
acontece que devo o meu nome a acontecimentos ocorridos muito antes disso, pois
Humberto me chamaram, porque nos idos de trinta, um aventureiro dos biplanos,
ou triplanos, por arbítrio de mágico nevoeiro, trágico fim encontrou ao
despenhar-se de encontro à torre de menagem do castelo de Monsaraz, cousa que
fatalmente muito consternou os moradores, antepassados meus incluídos, tanto
que no baptizado do meu padrinho lhe mudaram o nome de Benvindo para Humberto,
numa solene e compungida homenagem ao louco da máquina voadora, acabado de
perecer no exacto momento em que o tão desejado Benvindo ao mundo vinha. Humberto
ele, Humberto eu anos mais tarde e por sua inteira vontade, tradição que
mantive ao dar por minha vez o mesmo nome ao meu primeiro e único filho. Luís
Humberto. *
Como
podem constatar toda uma sequência de acontecimentos não simultânea nem
paralela à trajectória do General, porém destinados a confundirem-se e a cruzarem-se.
Aliás a trajectória do General é toda ela pouco abonatória e ainda que menos
opaca que a de Sócrates nem por isso é mais louvável. Uma vez mais alguém anda
a querer distrair-nos do essencial entretendo-nos com o acessório e fabricando
mitos tão inconsequentes e inconsistentes como o mito de D. Sebastião.
Neste
nosso Portugal democrático quem não está vale sempre mais do que qualquer vivo,
e aos vivos a preocupação é abatê-los, não os deixando medrar, sobretudo se
colidirem com os interesses instalados. A trajectória do General Humberto
Delgado é contudo pouco abonatória e ainda menos recomendável, não pelo que
quer que eu aqui diga, mas porque ele assim a fez ou construiu.
O
nosso General Sem Medo era admirador confesso de Hitler, e um ainda maior
apreciador e defensor das ideias e ideais nazis, faceta que vulgarmente nos não
é mostrada, apenas o seu lado de opositor ao antigo regime, casual ou
interesseiro, nos é comummente apresentado, porquê ? Porque não nos dizem que o
homem, que era oriundo da arma de infantaria mas também estudara em
instituições inglesas, incluindo militares, sobretudo americanas, e da NATO, da
qual era apologista e onde exerceu cargos, uma instituição nascida da guerra
fria e que nada tem de inocente. Porque não nos dizem que foi procurador à
Câmara Corporativa do Estado Novo, regime que lhe concedeu fama, galões, bem-estar
profissional, social e material, e que provavelmente, a história não é uma
ciência exacta, sobretudo na ausência de provas, pelo que me fico pela
possibilidade, pela hipóteses académica, pela probabilidade de ter anuído a
encabeçar a lista da oposição democrática nas eleições Presidenciais de 1958 devido
a alguma birrinha. Que terá sido que não lhe deram e que tanto o terá feito
zangar ? Ter-lhe-ão negado a Chefia do Estado Maior da Força Aérea ? das Forças
Armadas ? Ou foi-lhe negado ou sonegado tacho maior e mais vistoso, a ele que
tanto gostava de medalhas ao peito ?
Conscientemente
temos que nos interrogar qual a razão pela qual ele sim, vai levar o nome numa
placa do aeroporto e não Henrique Galvão** ou Herminio da Palma Inácio***, que
com factos efectivos, palpáveis, documentados, lutaram seriamente contra o
regime fascista, o segundo com o sobrevoo do país por um avião da TAP que
largou cem mil panfletos apelando à revolta contra o regime, o primeiro com o
desvio do Paquete Santa Maria rebaptizado de Santa Liberdade. Duas acções de
guerrilha que chamaram a atenção do mundo para a falta de liberdades no país
certamente aconselhariam outro nome para o aeroporto da Portela, o nome de
Herminio da Palma Inácio cairia muito melhor, tal como o de Henrique Galvão se
aconselharia para rebaptizar o terminal / doca da Rocha do Conde de Óbidos,
deixo a proposta e o desafio.
Ultrapassada a euforia e a derrota das
eleições falseadas de 1958, e destituído de todos os cargos civis e militares o
nosso homem foi incapaz de harmonizar com a oposição nacional e internacional
um esquema de cooperação e apoio, ou de ataque, e apesar de todo o saber
adquirido não logrou desenhar uma estratégia ou desenvolver qualquer táctica de
oposição e combate na oposição ao regime, fosse guerrilha urbana fosse guerra
aberta, fosse dispositivo de defesa.
Esta
incapacidade como sabemos foi-lhe fatal e sucumbiria às portas de Portugal, em
Villanueva Del Fresno, no ano de 1965, às mãos de esbirros do regime que
irritou mas não matou… (Quem o inimigo poupa às suas mãos morre…). Era um
general sem ideais nem ideias, sem capacidade de esboçar uma estratégia ou
antecipar uma táctica apesar de tantos estudos em academias militares, tanto
que morreu às mãos do inimigo perante uma emboscada de caca...
Nascia
um mito, coisa fácil de construir entre uma população tão bruta e analfabeta
quanto hoje que os novos ismos e ismas continuam fazendo dela gato-sapato. Não
consta tão pouco que Humberto Delgado, o General Sem medo, tivesse alguma vez
contactado os chefes das regiões militares, nem sequer o da sua arma, a força
aérea, no sentido de uma qualquer sublevação contra o regime. Humberto Delgado,
o homem do sorriso franco, aberto, do sorriso de orelha a orelha, do sorriso de
palhaço, não merece mais que o nosso riso, não passava de um produto do regime,
de um pavão emproado que não merece o nome num aeroporto, valha-nos que não o
rebaptizaram de Aeroporto Mário Soares… O Pai desta democracia de merda...
Toma
lá povo um herói mártir e entretém-te, palerma...
Nota: O presente texto foi
elaborado de acordo com os conhecimentos factuais, históricos e documentais
existentes sobre o General Humberto Delgado, naturalmente é sempre possível com
base neles romancear a sua vida e torna-la gloriosa aos nossos olhos, tal como
é possível pegar nos mesmos dados e utilizá-los de modo negativo ou pejorativo.
Limitei-me a eles sem acrescentar o que quer que fosse que não esteja
comprovado, preconceitos que possam detectar no texto e juízos de valor
emitidos sim, são meus, são de minha autoria e conscientemente formulados.
Obrigado.