PEDRAS, COM TODAS FAREI UM CASTELO …
(poema anotado em meia dúzia de guardanapos de papier.)
Atirar a pedra, esconder a mão,
como não,
nada mais havendo a atirar,
ou a tirar, retirar,
nem uma simples ilação.
Como não esconder a mão
que nada tenha para dar,
que nada esconda p’ra te enfeitiçar,
como não retirar essa mão.
Essa mão recusando reduzir-te,
a objecto, a dejecto, abjecto,
assim,
ficará apenas o acto,
a pedra atirada
p’ra que te saibas admirada,
quiçá amada.
Tu, que muitas pretensões satisfarias,
certamente as mais nobres pretensões
seriam preenchidas às mil maravilhas,
mas,
por nada mais restar que admirar-te,
entretive-me a picar-te,
a provocar-te,
atirando as pedras,
retirando a mão,
pousando-a sobre o coração.
O mesmo heart que te atiraria um dia,
que te daria um dia,
e nem imaginas o que eu faria
um dia,
em que pedras não tivesse e pudesse,
nesse dia,
atirar-te p’ra cima boas intenções,
um coração vermelho,
encarnado,
ensanguentado, desesperado,
por não poder, não ter podido,
deixando-me perdido porque encontrado,
e manietado, limitado,
limitada,
por quotas,
por ações,
em comandita,
anónima,
expedita,
como esta ânsia abrupta há anos desperta,
há anos (in)
contida,
apontada, focalizada,
personalizada, pessoalizada,
inaudita, e que,
hoje impossibilitada,
tira pedras da calçada,
retira pedras do castelo,
pedras encontradas, pedras a mim atiradas.
E amontoadas,
esperando a ocasião de serem atiradas,
e a mão recolhida, escondida,
feliz, divertida,
por ter-te provocado,
depois de mirado,
analisado, comparado, admirado,
e reduzido a um coeficiente,
a um número primo, a um algoritmo,
soma, resultado, equação, resolução
chave, solução,
paixão.
Reduzida a uma matriz,
um quadro de referências, cânone,
a sonho e paciência, a palavras cruzadas,
segredo e mistério, sacrifício e redenção,
ou não te chamasses tu Anunciação
by Humberto Baião – Quinta-feira, 14-06-2018, pelas 11;19h - Évora