quinta-feira, 12 de julho de 2018

516 - PROTECCIONISMO, SIM, NÃO OU NIM ? ...



A coisa começou porque o Quim Zé, para além de calçar 43 e estar constantemente às caneladas a todos, lançou uma das suas provocações, curiosamente logo ele que até costuma ficar sempre calada ou demasiado calado, mas desta e a propósito duma foto qualquer que o jornal trazia em destaque atirou a dele: Porque é que as pessoas em Portugal defendem as politicas anti-protecionistas, quando ao mesmo tempo assistem à perda de competitividade das empresas nacionais, e consequentemente ao seu fecho e ao aumento do desemprego ? Estarei eu a ver bem o problema ?

A mesa do café é ecléctica ainda que seja de alumínio, as de dentro são de sólido carvalho nacional mas na esplanada é material importado, barato, prático, leve, fácil de lavar e sobretudo fáceis de prender com uma corrente o que é suficiente para que fiquem amontoadas na rua sem ninguém as levar durante toda a noite, o pessoal quer é anéis e relógios de marca, importados, caros. Mas sendo o pessoal amesendado em redor da távola q.b. heterodoxo e mui ecléctico, como vos dissera já, a questão caiu como uma bomba, até se ouviram as chávenas tilintando nos pratos, e foi precisamente o Pires, um ortodoxo, quem ganiu primeiro enfiando uma carapuça de ar sofredor. Está aposentado mas fora sindicalista, portanto carregara a cruz em defesa do operariado explorado e de imediato atirou culpas ao lóbi imperialista/capitalista, mas todos fizeram orelhas moucas como vai sendo habitual e calmamente aguardámos que tanta verve lhe passasse.  

O amigão Pratos, perdão Prates, do centrão, alvitrou que tal se deveria ao facto de existir na sociedade portuguesa uma doutrina antitética, e dual, que na generalidade a cabecinha das pessoas não está capaz de analisar ou separar. Mas é coisa fácil continuou o Prates, não proteccionismo significa concorrência, logo competição, logo evolução, o que implica modernismo, vanguarda, actualidade, liberalismo, liberdade. Pelo contrário proteccionismo é sinónimo de apadrinhamento, de protecção ao antigo, ao que está desactualizado, do obsoleto, do que não é competitivo, do marasmo, do engonha. Ainda no sábado li um artigo duma reitora universitária apoiando a transferência de vagas das universidades de ponta de Lisboa e do Porto para as universidades e politécnicos do interior, dos quais os alunos fogem por nunca terem tido mérito algum, ao contrário do que acontece com algumas faculdades de ponta lisboetas e portistas que se já encontram entre as melhores cem do mundo.*

Ora quem arrisca apadrinhar o obsoleto ? Ou identificar-se com o engonhar ? Todos queremos modernidade, e na voragem da modernidade cuja crista de onda desejamos cavalgar como no canhão da Nazaré, soçobramos todos incapazes de pensar que a cada estágio evolutivo corresponde um estado de proteccionismo ou de liberalismo que lhe está associado, lhe é inerente, de que é inseparável sendo cada um deles o conveniente para um dado momento... É o que dá não comer espinafres nem beber óleo de fígado de bacalhau quando se é pequenino...

Pois é meus amigos, não deixam de ter alguma razão, quer um quer outro mas isso é pouco, é redutor, é só uma face do cubo e eu vou ser breve na minha achega porque estou com pressa e ainda tenho que ir almoçar umas migas a Cuba com uma amiga das Honduras, mulher dura mas tão permeável quão persuasiva enquanto vocês são uns coirões.

Pronto lá está ele, este Baião tem a mania que é sabichão e mais santo que toda a gente, despacha lá isso e poe-te a milhas quanto mais depressa melhor, é preciso ter pachorra p’ra aturar este tipo irra, nem sei como a Luisinha te atura há tanto tempo, francamente.

Pois é pazé, eu tenho a mania mas não aprendo nada contigo e tu devias pagar-me as explicações diárias que levas desta mesa de qualquer modo se não estás bem muda-te, há anos que andas aqui feito melga, bem podias meter a língua na caixa em vez de… Bem deixa-me calar que a Laurentina não é para qui chamada e tenho-a por boa pessoa, como ela te atura a babuje é lá com ela, e contigo claro.

O problema é que o país é pequeno, pequeno em diversas dimensões, falta-nos mercado interno, a baixa demografia e os baixos salários tornam-no praticamente inexistente. Como se não bastasse ser quase inexistente e apesar dos baixos salários estes ainda são maioritariamente canalizados para consumos supérfluos vindos sobretudo da UE ou Américas, o que não ajuda a senão a afundar-se. Verdade que a UE nos tem metido a mão por baixo, está a mamar e cuida da sua teta, mas a UE falhou redondamente e mais dia menos dia dará um estoiro. Não é e nunca foi uma união de estados como acontece com os EUA faltou-nos e falta-nos muita coisa para uma união. Esta UE não cumpriu o seu papel de forçar a igualdade dentro da união, bem pelo contrário sempre se portou em modo cada um para si e, quando é assim os mais fortes phodem quem ficar por baixo, geralmente os mais fracos, é dos livros.

Quer Portugal quer a UE nunca sofreram uma verdadeira guerra da independência, nem de secessão como aconteceu com os States, nem tão pouco sofremos com a IIGG. Estes sofrimentos, estas dores de parto pariram uma nação coesa, uma identidade única e a sociedade rica que são os EUA, o país que mais e esforça por atingir a supremacia, o país onde ter o céu como limite foi teoria feita doutrina e práxis. Lembrai-vos de Kennedy. A nossa velha europa não, nunca teve pais fundadores, empenhados na justiça, na igualdade, na liberdade, na democracia, a UE teve estadistas sim, o último foi Jacques Delors, depois dele começou o deserto, deserto de ideias.

 Como se não bastasse falta-nos uma constituição livre, liberal, no sentido de liberalismo, de liberdade, a nossa constituição é invasiva da liberdade do cidadão, invasiva e cerceadora, é impositiva, controladora, foi desenhada por controleiros. Está virada para o passado e para quem colheu, colhe e goza de benefícios, está gizada para manter o status quo, o establishment, e em tempo de crise e de vacas magras torna-se um obstáculo e não um escape, uma oportunidade ou uma garantia. Se és jovem experimenta avaliar as garantias que em relação ao futuro esta constituição tem para oferecer aos jovens como saída desta crise a não ser impostos e mais impostos que garantam os direitos adquiridos manhosamente pelas classes que deles beneficiam ?   

A verdade é que se instituirmos o proteccionismo perderemos mercado, e não tendo Portugal mercado interno que lhe valha ou que valha alguma coisa que possa garantir o país em pé e o investimento acelerado temos que nos pendurar do mercado europeu, mais de duzentos milhões de consumidores, faca de dois gumes pois esses consumidores também produzem e também desejam exportar para aqui, e fabricam melhor e mais barato, têm a energia e quase todos os custos de produção mais baratos, o pessoal mais treinado, produzem mais, são mais rentáveis por unidade de tempo apesar de ou mesmo por isso, ganharem à hora três ou quatro vezes mais que o operário médio português. A produtividade ora aí está, como dizia José Mário Branco já em 1979 **

Optar pelo proteccionismo ou não, não é fácil, que vamos proteger se pouco fabricamos em volume, em qualidade, em diversidade, em valor ? Maioritariamente importamos tudo ou quase tudo, tomar atitudes proteccionistas depressa estas se virariam contra nós mesmos, são um pau de dois bicos. Proteger exige estabilidade governamental, olho para o negócio, digo para governar, é que já não temos as colónias onde ir buscar baratas as matérias-primas, nem colónias para onde vazar toda a merda que produzíssemos, a clientela europeia e global é mais exigente que eram a pretalhada e os branquelas. Mas ninguém diz isso a este povo que pensa caírem as coisas do céu. Nem essa nem tantas outras verdades. Verdade que temos uma ZEE (Zona Económica Exclusiva, mar) enorme mas sem meios para a explorar de nada nos vale, e ninguém explica a este povo que há 40 anos e com menos mar a nossa frota mercante era enorme, das maiores do mundo, nem contam como o almirante Tenreiro, esse fascista, era fascista mas era um fascista nosso, ia longe buscar os milhões de toneladas de bacalhau que agora importamos. E se enchermos esse mar de aventoinhas já saberão quem irá ganhar com isso. Quem senão "eles os outros" terá dinheiro para lá as plantar ? 

Com tempo democracia e leis laborais seriam instauradas, a revolução foi o pior que nos podia ter acontecido, olhai os políticos e as politicas que temos, olhai o futuro e fazei contas… A Comunidade Europeia, a UEFA a OCDE vinham exigindo e o país cumprindo o caminho que levaria à democracia sem revolução. Não que as revoluções em si sejam más ou coisa má, a nossa é que foi um desastre que temos dificuldade em admitir e negamos a pés juntos, realmente não foi um desastre, tem-se mostrado uma verdadeira calamidade.

Propositadamente deixei para o fim a perda dos dedos e dos anéis, das toneladas de ouro do tempo do fascismo, para que possais olhar a situação deste país, é que agora estamos aqui acantonados, sem seguros, sem banca, sem dinheiro, e os lucros dessas entidades faziam um jeito de morte para o investimento de que carecemos e não temos, dinheiro esse que, agora que nada é nosso é feito à nossa custa mas voa para todo o mundo, aqui é que não poisa, portanto não haverá, ou haverá cada vez menos dinheiro para escolas, hospitais, estradas, pontes, portos, estamos de tanga, estaremos atolados num pântano por mais trezentos anos e já nem sequer conseguiremos manter-nos orgulhosamente sós, o tal orgulhosamente sós que passámos quarenta anos a denegrir.

Estes democratas enterraram este país bem enterrado e nos próximos quinhentos anos, acreditem, estamos mesmo sem nada, nem esperança de mudar de vida…