Se há alguém que conheço muitissímo bem é o meu
marido. E ao contrário do que é normal, chegar a casa sem grande alarido,
tornou uma destas sextas-feiras excitadíssimo, mostrando um espanto pouco
habitual.
Logo
ali quis saber o motivo de tanta euforia, tirar-me de cuidados, para isso me
bastara o dia, por certo para tal alguma razão forte haveria;
- Não
acreditas ! Me disse;
-
Acabei de ver num militar a rebeldia !
E lá me
contou, como foi capaz, ofegante que estava, estupefacto;
-
Assisti agora mesmo a uma linda batalha pela paz !
O que
vira ele então, que o deixara em tamanha excitação? O testemunho de um
guerreiro, de uma vida dedicada a tácticas e estratégias militares, de um duro,
que trilhara outro carreiro. Nada mais nada menos que a história de uma vida
coroada de estrelas mas trilhada a pulso, a que o destino, talvez por capricho
ou impulso, “tocara” como em suave milagre.
Essa
vida, essa carreira militar, tornara-se repentinamente álacre, a julgar pelo
facto, constatado, e pelo adiante visado comprovado, de que não há regra sem
excepção. “Dar de Si antes de pensar em Si“, palavra de ordem ou
divisa do julgado, foi um lema pelo próprio completamente adulterado, alterado,
foi norma por ele magistralmente subvertida.
Acredito
que, quando em algum momento da sua vida aquela maravilhosa colecção foi
concebida, o terá sido pensando em si mesmo, de forma egoísta e atrevida, mas
nem por isso menos querida, como tantas de nós, que nuns ou noutros aspectos não somos
menos egotistas e circunspectas. Pois o bom homem terá por certo descoberto que
não valeria a pena amealhar o que não pudesse partilhar. Vai daí, e sem
qualquer pudor, “tocado” que foi talvez pelo Divino, abriu-nos os braços
deixando escoar por eles essa torrente de amor que lhe tolhera o caminho.
Não é
caso único, conta a história que, já em remotos tempos, Constantino,** homem
certamente menos pudico, reunira todos num abraço, tão temerário que o tornou
Magno, também conhecido por Valério, e cujo gesto, não imaginário, traçou de
novo nos mapas um antigo império.
“Entrai
Pastores Entrai”, é uma excelsa colecção de presépios a decorrer nas igrejas de
S. Vicente e do Convento da Graça, sobre o que é considerado o símbolo apaziguador
do Natal e mostra-nos presépios artesanais de todo o mundo. Expressão da “alma
dada às pequenas coisas... Que podem ter a dimensão de uma noz ou de uma estrela,
e que nós simples mortais... ”Partilhamos com enlevo”.
Desde
presépios em madeira de choupo ou salgueiro, de tal modo rendilhados que mais
parecem filigrana, a outros construídos dentro de lâmpadas ou frasquinhos não
maiores que o meu polegar e que por certo exigiram paciência de marinheiro, de
tudo há nesta exposição, que mais parece viveiro de um milhar de fulgores p’ra
nos encantar.
Um
catálogo de excepcional qualidade, que só peca por não ter mil páginas, tantas
quantos me pareceram os presépios, ilustra a capa com uma representação
orbitando em torno do amor dos pais pelo Menino que veneramos, concepção de
artistas eborenses realizada na “Oficina da Terra”, a mesma terra de onde
provém o barro de que é feita a obra.
Parabéns
a todos os intervenientes no evento. Para o senhor Major General F. Canha da
Silva, um beijinho solidário pelo carinho mercenário com que conquistou para a
nossa terra o seu mundial mostruário.
* Publicado por Maria
Luísa Baião em 06-01-2003 no Diário do Sul, coluna KOTA DE MULHER
** Constantino
I, Constantino Magno, César Flávio Valério Constantino Augusto. Deu liberdade
aos Cristãos, o nome a Constantinopla e reunificou o Império Romano cerca de
300 d.C.