Mãe
babosa me enviou notícias de prisão afectuosa e nesse preciso instante me
lembrou momentos que, quando o vagar permite, por distantes, saudosa e de
rompante acodem ao meu espirito. É um bem-estar infinito e prolongado este
mister, de, sendo mãe se prolongar o querer, se amar por vezes calando fundo a
dor, de não regatear nunca nem a ambição nem o amor. É isto ser mulher.
Incontida
força de vida nos assalta. A cada momento traçar metas mais altas nos leva esse
milagre, porque alimentamos nos peitos ufanos chama que arde desde os primeiros
instantes, até que Deus nos guarde. A cada dia que passa lutamos mais e mais
por essa nova razão que carregamos nos braços, nos enche o coração, nos envolve
como mago manto que tantas e tantas vezes nos serve igualmente p’ra esconder o
pranto.
Sim,
é verdade que a vida nos tornou mais sorridentes, que a toda a gente mostramos
vaidosas esse torrão bonito que nos prolonga o sorriso deixando ver os dentes.
Receosas o guardamos mesmo quando a brisa do amor nos pinta o lar e, rodopiando
à nossa volta, etérea e volátil do perfume das rosas nos esparge.
É
nesses momentos que, cavalgando delirantes sonhos de tudo e para tudo nos
sentimos prontas, nos tornamos capazes. Como esta menina que sua mãe envaidece
outras houve já que mulheres audazes se tornaram. Uma, vinda de Espanha se
casou em Elvas e nossa rainha veio a ser, pois quis a tradição que de D. José
viesse a ser mulher. Que tempos esses em que não a razão mas o interesse ditava
cartas, calava lamúrias, forçava ao dever. Foi essa espanhola trocada pela
nossa D. Maria Bárbara quem, nesse mesmo dia hora e local desposou D. Fernando,
Príncipe das Astúrias, para onde foi viver.
Ganhámos
nessa troca que na história não foi única, D. Vitória Mariana de Espanha veio e
nos trouxe qual tesouro de filigrana o amor ao Teatro, às Artes e à Música.
Mas
Mariana não é nem nome nem caso isolado no passado. Já Fernão de Magalhães
jovem dotado, com esse nome baptizara por motivos que não sei, um arquipélago
de ilhas no Pacífico e que resolveu oferecer ao nosso rei. Homem de guerra,
imagino-o, com saudades de Portugal e de alguém mais que não confessa pois
poder-lhe-ia ser fatal. Consta que ao avistar no mar esperança de terra e,
antes provavelmente que a razão se sobrepusesse ao coração, logo se apressa a
dar-lhe tão querido nome que levaria pregado na lembrança.
No
mesmo mar oceano cujo fundo é de certeza abismal, alguém pôs ao sítio em que a
maior profundeza registou, o nome de alguma Mariana que por certo uma vez na
vida amou. Amar amar amou Soror Mariana Alcoforado, a um oficial estrangeiro
afrancesado, Marquês de Chamilly, que por nós lutou nas guerras da Restauração.
A ele dirigiu cartas de amor cujas palavras, por terem saído da sua própria
mão, a levaram a tornar famoso o Convento da Encarnação, em Beja, em terras
aqui tão perto e que ela por amor nunca viu como um deserto.
Que
a esta Mariana que ora aqui chamo, porque ainda não há uma semana fez um ano e
sua mãe por certo embala embevecida Deus conceda muitos e muitos anos de vida,
tenha tantos motivos para ser amada como as outras de que reza a história e
atrás foram chamadas. Que nunca sobre ela caiam as suspeitas que tornaram
mártir uma outra Mariana, esta esposa do tão odiado rei Herodes “ o Grande “,
da Judeia, o qual por razões com mais de dois mil anos conhecidas o tornaram
tristemente grande e célebre entre os grandes homicidas.
Que
a nossa Mariana possa ter quem a ame e estime com grandezas tais que dela se
possa dizer o mesmo de “Mariana”, decerto por amor tornado nome de cidade
brasileira em Minas Gerais, cuja história não conheço, mas a quem por ter nome
de mulher dou grande apreço.
* By Luísa Baião, escrito terça-feira, 27 de maio de 2003, pelas 15:09h e provavelmente publicado no Diário do Sul, rubrica "KOTA DE MULHER" nos dias seguintes.
** https://pt.wikipedia.org/wiki/Mariana#Funda%C3%A7%C3%A3o