Quando foi finalmente dado à estampa
um CD do meu grupo favorito, os “Kumpania Algazarra”, que eu em finais de 2005
trouxera a Évora, depois de os ter ouvido ao vivo no Porto, nem hesitei. São
uma banda eclética, natural de Sintra, mais parecidos com uma fanfarra, enfim,
foi uma doce recordação dos meus tempos de menino em que corria atrás das
bandas filarmónicas nas festas da minha aldeia.
Despertaram em mim um reviver saudoso
quando os ouvi pela primeira vez e naturalmente até dos bailes no varandil
sobre a milenar cisterna de Monsaraz me lembrei, e claro, dos meus primeiros
amores !
Ah vida ! Ah grandes artistas !
Mas a minha paixão por eles é bem
justificada, os seus ritmos enlouquecem-me, e o corpo baila-me ! Esqueço a
inibição que nunca tive e fico no extremo de mim mesmo ! Solto ! Livre !
Porque ouvi-los é ficar em festa,
viver uma folia que só aos boémios é consentida, ou não replicassem eles uma
miscelânea das sonoridades dos Balcãs, das bandas filarmónicas mais populares,
da música árabe e magiar, dos timbres eslavos mas igualmente orientais, tanto
como africanos e latinos, em ritmos que ora nos arrebatam ora desconcertam, mas
jamais nos desiludem ou deixam cair o astral !
A sua presença em palco, o seu som, é
uma autêntica dissonância, contrastando com a suavidade das cadências e a
alternância voluptuosa de toadas em espiral que nos tocam sentimentos e
sentidos, num fulgor inimaginável de repentinos acordes e altos, na meiga
suavidade da língua inglesa, nexexidades da globalização, da
internacionalização, que certamente buscam e merecem, daí o espanhol, francês e
português, comprovando um exotismo de raízes na mais perfeita e harmoniosa
simbiose de estilos que uma magistral coordenação e aproveitamento dos recursos
nos momentos exactos e dos vários instrumentos e acordes proporciona ao feliz
ouvinte das guitarras acústicas, dos saxofones, das vozes, dos coros, bombos,
trombones, trompetes, clarinetes, congas, darbukas, percussões, contrabaixos,
bateria e acordeão, não esquecendo as mirabolantes flautas. Por vezes mais nos
parece um cenário da música de intervenção legitimamente portuga e que
guardamos inconscientemente no fundo de cada um de nós.
O que mais me arrebata cada vez que os
ouço, e procurei e procuro ouvi-los sempre e de preferência ao vivo, é o
contraste entre a suavidade de algumas letras com a afirmação firme e decidida,
ou assumida da sua música, que faz com que nos sintamos como se a vida fluísse
daquela musicalidade vívida ! Todo o espectáculo se compõe de girândolas de
sons que nos aturdem e em simultâneo atiram para uma exaltação empática com os
que nos rodeiam e com o mundo. Simplesmente maravilhoso !
É uma festa permanente este CD ou as
suas actuações, as suas músicas ! Eles e eu ! E nem temo escandalizar os
vizinhos com a aparelhagem no máximo, ou, se no carro, atravesso as ruas e
avenidas como se fosse o preto do rádio de pilhas ! É que aquilo sou eu ! Eu estou
ali ! Eu sinto-me ali ! Eu sou eles !
E com eles me ergo em espirais de
música, saltando degraus em exaltação na busca do êxtase que me liberta do
formalismo das 9 às 5, do fato e da gravata quando calha e me faço tornar a
mim, à minha loucura à minha libertação ao meu desprendimento.
Conheçam-me porra ! Ouçam-nos !
Rodas de música giram em grande
velocidade como se de rodas de fogo-de-artifício se tratasse !
E eu adoro ! E eu extasio-me ! E eu
liberto-me ! Experimentem !
Entra o clarim !
Até das touradas e das procissões em
Monsaraz me recordo !
Vivam ! Vivamos ! Viva eu !
Eles são uma festa !
Agarrem-me ! Deixem-me ! Soltem-me !
E danço… E contorço-me na fúria do
ritmo, do som, dos passos dobles e boleros mais adivinhados que sentidos !
Dançai ! Suo, aplaudo-me, é festa ! O
clímax atingiu-me em pleno ! Aqui ! Enche ?
Chega cheio ! Dá cá a mão ! E a espiral de som e volúpia rodopia e
suga-me para o seu interior, subo a 4 e 4 os degraus que imagino ou sonho,
estou nas nuvens ! Abandonei o meu eu ! Sou outro ! Sou este ! Sou isto ! Olhem
! Cá para cima ! Estou aqui ! Aqui nesta ilusão ! Vamos fazer uma festa………… e
dançar ! A alegria de podermos cantar !
Sem barreiras na maneira de pensar ! Dá cá a mão ! Vem a mim ! Abraça-me ! Faz
do teu o nosso caminho !
Ninguém como eles conseguiu até hoje a
desconstrução do expectado, a exaltação das capacidades humanas e das
possibilidades e potencialidades dos sons e dos instrumentos, no fundo, a
subversão do óbvio ! Eles são a concertina que desconcerta !
A exímia musicalidade que despertam e
soltam em mim o melhor que tenho, uma empatia infinda que vos dedico e
distribuo igualitariamente, tanto que por momentos parece que o mundo se ergue
comigo p’rá luta ! E penso-me Spartacus guiando as hordas, hostes ? de escravos
gladiadores na direcção da liberdade ! E da justiça ! O que mais jus faz à
minha máxima; faz que te levem a sério, mas nada leves tu com seriedade, pois
neste país não vale a pena, aqui nada mais vale a pena a não ser dançar ou
fazer orelhas moucas ou de mercador...
Atention please ! Came on ! Are you ready ? Be
free ! Keep our eyes ! Every body came on ! Open your eyes ! Open your mind !
Baila que baila !
Festa, foguetes, dança do ventre, funk
latino, fanfarra, humor nas actuações ao vivo.... É musica do mundo e tocam
p’ró mundo, e são temas de uma riqueza...
jazz…
Já agora obrigado a todos, aos que tiram a
roupa no final dos espectáculos ao cosmos à mãe-terra à vida boémia e a todos
os peace workers.