ANJOS,
ANJAS
A
questão era velha como Freud,
e, enrolados no linho,
ia
sendo desfiada como num fuso,
devagar
, devagarinho,
as
ideias girando tal qual na roca,
a dialéctica
fumegando,
ora
parada, ora avançando,
parada
num desvio da linha,
uma
extensa linha mental
em
que a retórica cavava apeadeiros e estações,
onde
sinaleiros conduziam o fio à meada,
cuja
complexidade constantemente descarrilava.
Eram
desvios colaterais,
e tu
carinha de anjo teimando em bravata de séculos,
os
anjos precisamente,
Tu :
- Quantos
anjos na cabeça de um alfinete ?
Eu,
tentando
trazer-te de volta aos carris,
abraçando-te,
mimando-te,
a
mão subindo as tuas costas,
travada
p’las omoplatas salientes,
quais
raízes onde dantes as asas,
eu
mais que tu, fervendo,
quente,
quiescente, aquiescente,
quase
no ponto e,
repentinamente,
nova
acometida,
- Terão
os anjos sexo ?
Sim ?
E qual será o sexo dos anjos ?
O
comboio reduzindo a marcha,
a
polpa de tomate engrossando,
nós
gulosos na avidez do doce,
da
compota,
o
caramelo ameaçando queimar,
e eu
:
lembrando
a colher de pau da avó Inácia,
mexe,
mexe !
O
comboio retomando lentamente a marcha,
devagar
, devagarinho,
mexe,
mexe !
gozando
o travo agridoce a maçã verde.
O comboio
agora ganhando velocidade,
mais
depressa agora !
Mais
depressa, mais depressa, mais depressa !
Nós
entretidos com o caramelo, a compota,
a
polpa de tomate derramando,
pouca
terra, pouca terra, pouca terra…
Não
pára !
não
páres agoraaaaaaaaaaaaa !!!!!!
mais
depressa, mais, mais, mais, maisssssssss !!!
agora
mais devagarrrrrrrrrrrrrrrrrr…
Oh !
Deus !
não
sei se há anjos,
mas há
céu,
eu
vi o céu,
o
céu, o céu, o céu, o céu, o céu …