Nas últimas
semanas, ou mês, a comunicação social, mormente a escrita, tem-se debruçado
sobre as tentativas, intenções e legislação preparada para, segundo o governo, se
proceder durante o corrente ano a uma verdadeira descentralização de competências
cuja responsabilidade passará a recair sobre os municípios. A começar pela gestão dos fundos europeus Portugal 2020.
O governo
alega em defesa da sua boa-fé, esgrimindo como argumentos o facto, verdadeiro,
de nunca terem sido delegadas nos municípios questões ou áreas, digo responsabilidades de tão manifesta importância, coisa de que os mesmos se
deveriam orgulhar, pois finalmente este governo reconhece as capacidades dos municípios
e atribui-lhes condicentes obrigações, numa atitude de desconcentração
de poderes sem paralelo na nossa história.
Os municípios
mui naturalmente estranham a fartura, e claro, acusam tão grandiosa quão boa
intenção de regionalização encapotada, o que de facto parece estar a acontecer,
e ainda de o governo lhes atirar para cima áreas e situações, razões e
problemas que ele governo nunca foi capaz de cabalmente resolver. Para tudo
piorar fá-lo sem o acompanhamento de uma justa compensação financeira, digo
dinheiro, de sobra preferencialmente, sempre ele, o dinheiro, dando de barato
em relação às propostas do governo que de boas intenções estará cheio o
inferno.
Não irei aqui
terçar armas nem por um lado nem pelo outro, cada um procura gritar mais alto, cada
um procura esconder a realidade fazendo-se crer mais lúcido, mais competente e responsável
que o outro, quando no fim de contas ambos escondem a pilhéria que sempre foram
e de que não passam nem passarão.
Se há
quarenta anos atrás tivesse havido a coragem de descentralizar a fundo, ou
regionalizar, eu teria compreendido a atitude, atitude que evitaria que hoje cada
região sacuda a água do capote e atire com as culpas do seu atraso para cima
dos vários governos, de todos os governos. Como sempre a culpa é dos outros e
nunca nossa. Embora o país não seja grande, diz-nos a história ser dificílimo de
governar, e há quarenta anos, com incipiente rede fixa, uma baixa densidade de
telefones instalados entre a população, cuja cobertura estava longe de cobrir 50%
das residências, sê-lo-ia ainda muito mais. Sem modernices como faxes, sem
satélites ou rede móvel, a Marconi, os telegramas e os estafetas eram então a
realidade pré-histórica em matéria de comunicações na qual vivíamos mergulhados.
Poderes regionais teriam superado com maior facilidade estes constrangimentos
naturais, agregando da região uma imagem que o longínquo Terreiro do Paço teria
mais dificuldade em apreender.
Decorridos
quarenta anos, e depois de termos errado e falhado todas as visões e decisões, praticamente
em tudo que nos propusemos fazer, resolvemo-nos finalmente deitar mão da regionalização
/ descentralização. Com a verdade me enganas diz o povo e mui acertadamente.
Por detrás das boas intenções algo se esconderá de maléfico, negro, e maquiavélico,
digo eu, senão vejamos:
Durante
quarenta anos em que a Europa e o mundo estiveram relativamente em paz e
poderíamos ter feito alguma coisa de jeito sem sermos incomodados, quiçá até
ajudados, nós dormimos, fechámo-nos em guerrinhas intestinas e politiquices mesquinhas
tal qual o cigano a quem o mano não deixava molhar a sopa e que por isso levou
uma galheta do pai. Nós fechámo-nos na nossa maniazinha de grandeza, como
fizera a China que se isolou do mundo dentro das suas muralhas, e que ao
acordar deu por estar duzentos anos atrasada desse mundo exterior de que se
afastara e com quem não quisera partilhar os seus segredos e o seu avanço.
Todavia, é
precisamente agora que o mundo entrou em ebulição, agora que o mundo não vai
tão depressa parar de ferver, agora que esse mundo nem vagar terá para olhar
para nós quanto mais auxiliar-nos, agora que estão reunidas todas as condições
que desaconselhem fazer o que quer que seja é que nos chegou a vontade de fazer
alguma coisa. Não nos iludamos, de um modo ou de outro, com ou sem
descentralização ou regionalização o país vai regredir, vai definhar e
empobrecer ainda mais. Durante quarenta anos foram cavados fundo os alicerces
da nossa miséria, como sempre 8 ou 80, e agora estão fundos e sólidos, fortes,
ninguém será capaz de mover ou demover o que quer que seja e está garantido o
mergulho na miséria e na pobreza desta democracia de pechisbeque que ardilosa e
arduamente a estupidez ergueu. Tudo que tenha pés de barro afundar-se-á, e tudo
tem.
Só não vê quem
não quer, agora que os meios de comunicação, a informática, o digital, os chips,
os pixéis, os gigabytes, os circuitos integrados, a robótica, a inteligência
artificial, as videoconferências, a condução autónoma, os telemóveis de última
geração, o Google Earth, os processadores, os algoritmos, os dados estatísticos
vomitados em segundos aos milhões, agora que o terreiro do Paço está a um
clique de distância de Sidney, agora que dispensámos a Marconi e qualquer dia
os CTT, agora que alguém numa salinha pode através de satélites ter uma
panorâmica completíssima e em tempo real deste pequeníssimo país e gerir,
governar em conformidade, é precisamente agora que querem dispersar os poderes
decisórios descentralizando-os, regionalizando-os, entregando-os nas mãos de
quem em quarenta anos não foi capaz de tornar cada região uma região única no
mundo, avançada, moderna, responsável, dinâmica, produtiva, planeada, guindada
ao sucesso. Portugal ainda tem todas as condições para ser o Paraíso da Europa, senão do mundo, mas com os mesmos portugueses que têm vindo a gerir a coisa só o inferno estará garantidamente garantido.
Deus nos
ajude. Isto não é mais que o último fôlego das luminárias.
Rapaziada não
se deixem enganar, o que esta atitude diz claramente é que o governo assume não
ser capaz de governar eficientemente o país, como outros antes deste não foram. E quem não estiver bem que se mude...
- Tomem lá esta
merda e desemmerdem-se !
Este é o grito
ocultado que se está atirando aos municípios, e parece em boa verdade ser o
vero discurso oficial, um discurso destinado ou dedicado a alijar a carga e a responsabilidade
de quem até aqui não acertou uma, não acertámos uma, em tudo e durante todo
este tempo este país tem obtido um resultado deplorável que só nos deixa como
opção fazer a trouxa e zarpar, e cada vez são mais a fazê-lo.
Claro que
mais uma vez os municípios não saberão nem conseguirão desemmerdar-se, ou não
tivessem eles até aqui feito outra coisa que não merda. Duvidam ? Olhem para o
estado de cada concelho, de cada distrito, ou para o país.
O sucesso de quaisquer políticas mede-se pelos resultados obtidos. Está tudo à vista.
Dança Can Can dos Coça Barriga.
http://bh1.fpc.pt/Nyron/Library/Catalog/winlibimg.aspx?
skey=55F84C358C5C424282CF825A3D8FB743&doc=10160&img=2929