Não é um
vulgar apaixonado, quando muito um apaixonado invulgar. Depois de umas braçadas
regeneradoras na piscina da Pensão Residencial Horta da Picota, Turismo Rural, adiantaram
o duche, que tomaram juntos, de seguida o principesco almoço após o qual a
canícula da tarde aconselhava uma sesta e como tal se apressaram e se meteram
na cama já que o programa destas miniférias previa que fossem idílicas, nada pois
de anormal que os encontremos bem dispostos e brincalhões, estão deitados lado
a lado, cobre-os um lençol, é fim de Maio e já estão quentes os dias, depois
dum lauto almoço aprestam-se à sesta, uma sesta morigeradora das saudades que
acumularam desde as últimas miniférias de Hermínia, estão lado a lado, quase
nus e conversando, ciciando na penumbra do quarto escuro que os isola do calor,
ele vira-se para ela, corre-lhe o braço por cima, abraça-a, não tarda que hábil
e subtilmente introduza os dedos sob o sutiã e o solte, ou os solte, beija-lhe
as faces, os olhos e a boca enquanto a mão abarca um seio, depois o outro, lhe
titila levemente os biquinhos com a ponta dos dedos, faz que os seios lhe
rebolem nas mãos como, como duas, e ri-se infantilmente, como dois pacotes de leite, é
mesmo leite diz brincalhão, e deixa que a mão escorra pela barriga dela, pelo
ventre, a mão espalmada, sentindo-a, brinca com os pelos da púbis, sob
as rendas os dedos acariciam-nas, gosta do tacto das rendas, sempre gostou, repuxa a
calcinha desviando-a para a virilha, os dedos procurando despertá-la correm
leves, ao comprido, para lá e para cá numa caricia voluptuosa, Hermínia fecha
os olhos e entreabre ligeiramente as pernas, estremece sempre que aqueles
dedos, nota-se um aroma no ar, não de Parfum Printemps Celest antes de fruta
madura, fruta biológica, sumarenta, a maçãs verdes,
Manuel Cesário tacteia-lhe
os lábios carnudos, empurra-lhe a calcinha para baixo e que ela tira agitando
precipitadamente as pernas, beija-lhe o ventre, é sagrado o ventre, todos os
ventres, esqueceu já quantas vezes beijara Filomena da Conceição, grávida ou
não grávida, e enquanto sorve p’las narinas aquele olor inebriante mordisca-lhe
o ventre com os lábios, o ventre, a púbis, as coxas, as virilhas, até
finalmente a beijar enlouquecido, como se não tivesse atrasado esse momento tão
apetecido, beija-a, suga-a, Hermínia trava-o, aperta-lhe as faces entre as
coxas febris, trava-o antes que também ela enlouqueça pois gosta de sentir-se
desperta, de sentir-lhe a barba rude e áspera despontando e arranhando-lhe a
pele, afaga-lhe os cabelos, agarra-os à mão cheia, empurra-lhe a cabeça,
puxa-a, empurra-a de novo contra si, abre e fecha as pernas sem que saiba se
sim se não, arquejam ambos como gaiatos jovens, sôfregos,
de repente Hermínia tamborila insistentemente as pontas dos dedos nas costas dele, é o sinal,
ele conhece-o e endireita-se, estende-se aconchegando-se na concha dela que o abraça
e aquieta aninhando-o contra si e, colando-lhe os seios às costas roça-lhe a
barriguinha nos quadris, mais precisamente na zona coxo-femural embora saibamos
que a precisão é o que menos lhe interessa agora, Hermínia só pensa no desejo
intenso de o trespassar, como fazê-lo não sabe, falta-lhe a grossa vara de uma
picota, por exemplo, e enquanto fantasia afaga-lhe os poucos cabelos do peito,
desce, espeta-lhe o dedo no umbigo pois sabe quanto ele detesta, Manuel Cesário
reage encolhendo-se, ri, ela ri, ele ri, riem os dois, desce um pouco mais e
toma-o na mão enquanto lhe roça a púbis no sacro sabendo quanto isso o excita,
repentinamente volta a lembrar-se que tem na mão a vara duma picota soltando
uma sonora gargalhada:
- Varei-te !
exclama álacre, conspícua e
libertina, varei-te, e quem para dizer o contrário, se até querubins e cupidos
que porventura se encontrassem esvoaçando na penumbra do quarto ou sentados na
alta cabeceira da cama olhando-os o pensariam, ela trespassou-o, que sabem eles
de sexo se eles mesmos não têm sexo, não têm penso eu que não têm, e se
tivessem como seria ? Como o dela ? Como o dele ? Como saber se foi ele
trespassado ou não se de sexo nada sabem os anjos, que por sua vez, e que nós
saibamos, desde Constantinopla e de há cinco séculos a esta parte que o assunto
é discutido pelos sábios sem que seja parida uma solução.
Manuel Cesário e Hermínia
estão-se marimbando para isso agora, e enquanto nos deixam de novo entretidos
com a candente questão do sim ou não, onde e como, de que tamanho e quantos
anjos serão capazes em simultâneo de dançar na cabeça de um alfinete eles sim,
eles pois, eles coiso e tal, e é melhor que nos afastemos, isto é matéria que
não nos diz respeito absolutamente nenhum e uma curiosidade de querubim, ou de
cupido, pode deitar-nos a perder, ser mal compreendidos, ser até tomados por
ofensivos, ou intrometidos, porque agora, precisamente agora que Hermínia tamborila
os dedos nas costas dele numa urgência pré combinada, pré programada, velha, numa pressa de o sentir, de o ter para si, de o fazer seu,
precisamente nesse
momento ele, que vive as suas próprias fantasias, e com quem ela por sua vez fantasia,
não está lá, ou melhor, ele está e não está, está revivendo aqueles momentos
com Filomena da Conceição, que nunca esqueceu e a quem nunca deixou de amar, e
revive-os por intermédio de Hermínia que o ama e a quem ele acredita amar, ou
deseja amar, ou quer amar. Deixemos portanto os pombinhos sós, têm muito que
viver e reviver, e amar, amar é também matar saudades, relembrar, amar é como
deslumbrar-se com o mar, há mar e mar, há ir e voltar, há viver e reviver, há o
ter e o querer e o amor, e o amar é tudo isso e muito mais.
Ela descera um
pouco mais e tomara-o na mão sabendo quanto isso o excitava, lembrou-se ter na
mão a vara duma picota mas foi aos comboios que brincou, manipulou-o excitada, pouca
terra pouca terra pouca terra, apita o comboio, apitou três vezes, e de novo o
sinal, e agora é ele quem tamborila os dedos nas costas dela numa urgência conhecida,
na pressa de a sentir, de a ter para si, de a fazer sua…