Trabalhar para quê e
para quem ? Nao sendo transcendente a questão que Margarido
colocava era pertinente e, ora porque não tivessem argumentos para a
rebater ora por não quererem alimentar polémicas com o personagem,
mor das vezes deixavam Margarido com a pergunta no ar, sem resposta,
e até sem conversa, simplesmente não lhe aparavam as jogadas por
estar sempre do contra ou usualmente rebuscar uma qualquer
perspectiva que regra geral nem lembraria ao diabo.
Razão tinha-a ele de
sobra, e o que sobejava (desculpem a redundância) era mais que
suficiente para se tornar incómodo para qualquer um, com elas não,
porque elas pareciam ter mais paciência para o tolerar sendo até
mais abertas e dispostas a contra argumentar, todavia, o facto de
noventa e nove vezes em cem ele ter razão, perdia-o. Ninguém estava
para o aturar. A verdade, como todos sabem, incomoda muito, a razão
incomoda muito mais.
E a verdade é que
durante quarenta anos este bom povo se tinha esmifrado, e suado, para
construir grandes empresas, nas comunicações, nos transportes, nos
seguros, nas energias, na saúde, na banca, e agora, nem em meia
dúzia de anos, de uma penada e por tuta e meia passavam para mãos
estranhas. Logo agora, que estavam maduras e eram rentáveis é que
eram passadas por meia duzia de patacos mal contados. Outros lhes
sugariam o tutano, cabendo-nos a nós continuar a dobrar a espinha, a
amouchar e calar.
Margarido tinha razão,
alguma coisa falhara e não fora ele, que além do amor pátrio e do
prestigio nacional nada mais perdera, pois nunca trabalhara, (ver
texto nº 208 – ATIREI O PAU AO GATO...) e agora muito menos
contassem com ele porque nunca se sentira com vocação, costela de
colaboracionista ou traidor. E, como não se cansava de dizer, ainda
por cima trabalhar para pretos ou chinocas como estava a acontecer em
grande escala, para nosso desprimor.
Ali onde o viam todos os
dias, na linda esplanada do 44 r/c, na Pastelaria Alegria, à praça
do Imaginário, ele meramente assistia e esperava o dia em que tudo
desse um grande estouro e um maior espectaculo. Tal como ele, julgo ser
pacífico para toda a gente que nos estampámos. Um autocarro
conduz-se agarrando o volante com unhas e dentes, um avião
pilota-se sobretudo acrescentando miolos, um país dirige-se
a partir do gabinete do primeiro ministro e dos ministérios das
finanças e economia. É obvio que nos
últimos quarenta anos esses lugares estiveram desocupados, ou pelo
menos não o foram por gente capaz de os exercer. Da AR já nem ele
falava, duzentos e trinta inúteis abanando a cabeça em assentimento
e fazendo pela vidinha em permanência.
Se ao menos a
administração pública funcionasse exemplarmente, ia perorando, mas
nem nisso tivémos sorte, pejada que estaria de quadros médios e
superiores que nem faziam uma idéia pequena que fosse do que era
chefiar, comandar ou administrar. Falta-nos, como na tradição
francesa, uma escola superior de administração pública o que,
aliado ao mau hábito de atribuir lugares de responsabilidade a
politicos irresponsáveis, incultos, incapazes e videirinhos, tem
feito de nós a nação que somos, exangue, exausta e exaurida.
A nossa longa história,
de quase novecentos anos (isto aprendeu o Margarido comigo) bem nos
tem demonstrado que só evoluimos quando debaixo de poderes coesos,
unos e fortes, razão tinha Manuela Ferreira Leite, mas não
necessitamos somente de seis meses, nem sessenta, mas de outros
quarenta e oito anos. Afonso Henriques, D. Dinis, o Infante D.
Henrique, D. Manuel, Fontes Pereira de Melo, Salazar, a história é
testemunho de que democracia e paninhos quentes nunca nos levaram a
lado nenhum. A primeira república foi um regabofe em que os dois
principais partidos deixaram resvalar a situação para além dos
limites do aceitável, tal qual como agora. Em 1926 os militares,
descontentes com a corrupção desenfreada e tementes que lhes
faltasse o pré, tomaram nas mãos o poder que os democratas tinham
sugado até ao tutano e convidaram Salazar a endireitar esta merda.
(sic, palavras ouvidas ao Margarido) Quem teremos que convidar desta
vez ? Quem nos salvará agora desta mortífera democracia ?
Desgraçadamente o
Portugal de 1910 – 1926 tal como o de 1974 – 2014, só serviu
para enriquecer não se sabe bem como, meia dúzia de democratas bem
instalados. Em simultãneo o país regride, o povo é explorado e
vilipendiado, a suspeição envolve a maioria das gradas figuras
nacionais que, quanto mais sobem mais se lembram de si mesmas e
melhor se amanham, sendo que democracia acaba por ser sinónimo de
oportunismo, amiguismo, compadrio, partidarismo, falta de isenção
e de transparência, o oposto do que devia ter sido, e ser.
A impreparação e
inconsciência de muitas chefias da nossa administração pública é
gritante, e a ignorância acerca do mundo em que se inserem e
movimentam confrangedoura. Não duvido que arvorem altos diplomas, em
economia, gestão de empresas, arquitectura ou engenharia, mas do
ponto de vista social e humano algumas são verdadeiras nódoas e do
ponto de vista cívico e político um zero à esquerda, não enxergam
mais que uma Capivara (estou a lembrar um dito do meu amigo Carlos
C.).
Após o términus das
licenciaturas, muitos deles (e delas) deveriam ser obrigados a
frequentar qualquer curso de administração pública (e estes
obrigados a existir) afim de tomarem conhecimento e consciência do
reflexo das suas atitudes e posturas a montante e a jusante das
decisões que, tantas vezes (demasiadas) cega e impensadamente tomam.
Portugal não está assim
exclusivamente devido aos péssimos politicos que elegemos, as
decisões do dia a dia a nivel micro também contam. É certo ser a
força da gravidade o sustentáculo do universo infinito, a nível
macro, mas ao nível do ínfimo, entre electrões e protões que
rodeiam o átomo encontramos a mesma e misteriosa força
aglutinadora. Temos a nível macro um PR, um PM, governo, ministros e
secretários de estado, mas a nível micro os concelhos, as
freguesias, os seus representantes eleitos, e também os chefes de
repartições, de serviços, de secções, de departamentos, enfim
uma miríade de decisores, de fautores e de gente cuja opinião é
ouvida, partilhada e seguida, gente que falhou rotundamente. E não
me venham dizer o contrário, porque o país é efectivamente um
buraco sem fundo, e isso vê-se ao longe, até um cego repara, tal a
dimensão da tragédia.
Jamais haverá impostos
que cheguem para sustentar esta desgraça, a única saída é o
crescimento, a produção, a criação de empresas e emprego, de
riqueza. Facturar, facturar, facturar vai ter que ser o nosso alfa e
ómega. Sem isso todas as soluções serão estéreis e inúteis ou
demagógicas e é bom que todos, repito todos, nos consciencializemos
disso e comecemos desde já a colaborar uns com os outros, ao nível
macro e sobretudo micro, pois que ninguém que não nós virá em
nosso auxílio, quando muito emprestará dinheiro a juros de agiota
para que nos endireitemos, mas seremos sempre nós quem terá que se
endireitar, seremos sempre nós quem terá que fazer pela vidinha.
Será assim tão dificil de perceber ?
As nossas posturas
reactivas estão a empobrecer-nos, somos nós quem se empobrece uns
aos outros. Não culpem a Merkel, não culpem a Troika, saberá você
que me lê haver milhares de projectos parados em ministérios,
comissões de coordenação, direcções gerais, câmaras municipais,
há dez, quinze, vinte ou mais anos aguardando deferimento ?
Inviabilizamo-nos, destruimo-nos, combatemo-nos.
A nossa postura para com
quem nos procura ou ante quem atendemos terá que passar a proactiva,
teremos que deixar de nos escudar em burocracias ou excessivos e artificiosos legalismos e
ajudar o “outro” a encontrar a solução para o problema que o
trouxe até nós, a ajudá-lo a superar as dificuldades e a
concretizar os seus desígnios ou sonhos, que também terão que
passar a ser nossos, que gerarão empregos, induzirão outras
soluções, pagarão impostos que nos suportarão e contribuirão
para pagar a saúde, o ensino, a defesa, o bem estar de todos... O
montante e o jusante são uma mesma realidade, nossa, são duas caras
da mesma moeda, indivisíveis, tocam-nos no âmago, teremos que
ultrapassar a demagogia, preconceitos, os juizos de valor e até as
melhores boas intenções...
Quando das eleições
autárquicas de Setembro de 2013 todos os municípios alardearam num
clamor gritante o seu interesse, defesa e protecção do investidor,
do empreendedor, do inovador, do promotor. Há poucos dias, por
razões que não interessam agora ao caso, dei uma volta pelos sites
dos municípios do Alentejo e verifiquei com tristeza que tudo aquilo
não passara de paroli paroli paroli... Contam-se pelos dedos de uma
mão, e não a esgotam, os que, depois de tanta conversa fiada alojam
no site uma página que seja, ou até um mero apêndice dedicado à
temática, tal comportamento não nos diz tudo, mas diz-nos muito
mais que mil discursos ou boas intenções...