PEDISTE-ME POESIA
Pediste-me
poesia, sem qualquer noção real do desafio não percebido que acabaras de lançar.
Não perceberas afinal que te andara a enganar. Sempre adorei poesia, mas por
favor entende lá que uma coisa é poesia, outra aquilo que eu fazia.
Não
mais que enfeitar palavras, alinhá-las bem juntinhas, polvilhá-las redondinhas,
pintá-las de fantasia. Quem vê nisto poesia? Tu talvez, porque acreditas inda
haver coisas bonitas em que embalar ilusões e nem reparas que és tu, o embrulho
de emoções em que reptícia me intrometo.
Prometo-te
alegria, agradeces querendo mais, como quem se delicia com a quimera inventada,
a utopia intuída mas que se afunda em abulia como galera perdida na sangria que
é a vida.
Baixela
de pechisbeque, diria para ser sincera, pois mais não julgo esta escrita que a
teus olhos me enobrece. Quem me dera ser poeta, falta-me a arte, o engenho,
contudo a ela me entrego, porque quero, porque gosto, me permite divagar, me dá
gozo e asas de ouro para com empenho chegar ao que tu dizes gostar.
Também
sonho, também almejo alcançar, voando nos céus do desejo o que a essência tem
para dar. Se grande a ânsia, a impaciência, maior a agonia e a demência. A vida
é tormento, náusea, estertor afã e agonia, fulmine-se a apatia, estoire-se com
a anemia em que teimam controlar-nos e, em sôfrego ou vibrante arquejo,
revoltemo-nos, impunhamos o desejo como bandeira adejante, vençamos de rompante
a opressão ímpia e vegetal desta existência brutal vivida no dia-a-dia.
Nunca
dês azo a livranças, letras, rendas e algemas, furta-te a tal tenaz, andanças e
contradanças de quem te faz contumaz, sê ferrabrás desse algoz, qual sado carrasco
atroz que os dias te põe a prazo. Candeia que vai à frente alumia duas vezes,
não deixes escoar a vida como areia em ampulheta, faz finca-pé, não creias
nessa tese, não engulas essa peta, renega essa chupeta.
Dou-me
a mim mesma alforria, ergo cânticos, alegria, ávida de desassossego incito-me
ao sobressalto, agito a perturbação, parto os cântaros, quebro os cânones mas
excito-te o coração. É isso que esperas de mim, confundes com poesia a alma que
eu abro assim. Poesia não é isto, poesia é uma espia de alma bem luzidia e de
mais alta fasquia, o que lês, se comparada é atonia, nostalgia se o quiseres,
de quem, c'a desculpa de afazeres, aspiraria ao que tu queres.
Não
confundas estas palavras cruzadas com emoções bem profundas de inspirações mais
letradas. Quem me dera ser capaz, quem me dera a Primavera e, como a hera,
trepar severa às alturas e canduras daquelas a quem invejo venturas e a quem
num bocejo imito. O que escrevo, não é poesia é um grito, grito que enfeito a
meu jeito, a que dou forma e substância, plataforma para a distância a que me
guindo atirá-lo. Não confundas, não me obrigues a passar pela vergonha de
medonha imitadora de mente alva e criadora.
São
momentos de prazer que daqui tiras ao ler, mas poesia? Isso era sim o que eu
mais queria. Prometo-te alegria, se entendes ver mais que tal garanto-te que é
simpatia e, se assim for agradeço. Só isto, nada mais peço, quem não gosta de
jogar? Que é o que faço afinal. O que não posso dizer, disfarço bem ao
escrever, tão bem que por vezes sucede veres escrito no papel, não o que eu
penso, não o que eu digo, mas o que para ti sabe a mel.
O que
tu gostas, no fundo, é do ar de Carnaval girando em redor dos textos, que nada
tendo de profundo, te retiram por minutos do contexto deste mundo. São jogos de
palavras, nada mais, são modos de te dizer ou perguntar como vais, são como
jogos florais no florir das Primaveras, mas uma coisa podes crer, brincando
brincando verdades te vou contando, porque as palavras são veras, porque as
palavras são tudo e porque saem bem sentidas, quantas vezes doridas, prenhes e,
de um sentimento que folgo atirar ao vento.