Como
dizer-te quanto te amei e amo, se os olhos se me embotam marejados de tristeza
e me dói saber-te perdida, imaginar-te ali, levantar o olhar e deparar-me com
esta nova e estranha solidão. Um
insólito e inesperado desespero o destes dias, tornado mágoa para mim, pois para
ti foi libertação, evasão de ti, do teu sofrer e deste meu egoísmo que te peava.
Miro
as águas de uma qualquer poça e em todas elas pressinto teus olhos mirando-me,
duas pérolas forçando o desejo e querendo abrir-me os caminhos sem fim que
levarão a ti, pérolas reflectindo o olhar parado que fixei na hora da tua
partida, os quais pressenti ansiosos por trilharem caminhos já não deste mundo
mas outros caminhos, os caminhos do destino, da sina, da ausência.
Melhores
dias virão, que se cumpram por agora as orações, e se cumpram as promessas
feitas sobre desejos cismados, quais sonhos vogando ao luar e me deixaram o
coração em sobressalto quando jurados. Egoísta
eu, continuo como me sabias então, hesitante entre a tua libertação, a minha perda e avidez de te prender à vida, egoísmo cego, puro egoísmo, perdoa-me. Avareza não
almejada cuja assumpção e arrependimento me remeteu a este pranto.
Renego
essa indelicadeza fútil e egoísta, essa minha insegurança tornara-me lapa de ti, ostra
mareando na corrente, palpitando de impaciência num mundo que se finou, se não cumpriu,
um mundo girando todo ele à tua volta. Tudo
posso ver nesses teus olhos se os olhar bem no fundo de cada poça reluzindo ao
sol e que não piso, como se pressentisse ou temesse receber reflectido esse sorriso
tão
bem recordado que é o teu e me visse a mim em pesadelos, fugindo de ti
e de quanto me tem custado esta inconcebível escuridão inesperadamente derramada, qual cruz fadando esta minha pobre vida.
Escondi este rosto olhando os destinos rodando em sentido contrário aos meus anseios.
Miro-me nas montras sem o orgulho e o garbo que outrora eram os meus. Volta,
vem dar-me novamente a mão, anseio ver-te de novo brincando, sentir-te o
coração batendo, o peito arfando, então pedir-te-ei que sorrias, encostarei à
tua a minha face, roçarei uma e outra vez nos teus os meus lábios sem olhar
desconfiado as sombras que em silêncio te arrastaram para longe de
mim e da vida que ambicionámos.
Arvora
um sorriso e vem, para que de novo sejamos festa e a harmonia reine. Volta,
para que esta minha solidão não seja condição, condenação, destino,
determinismo, fado. Teus
olhos têm fundo e dão vida, olha-me no rosto, percorre de novo com o indicador as
linhas traçadas nesta mão, p’ra que eu rejubile e minh’alma não se esconda, para
que o eco do depois nada tenha que ver com o antes, que seja outro
tempo agora, e tu de novo com as faces como duas rosas, irradiando o inesquecível
perfume que é o teu, e que de novo brilhes, bonita, linda, confiante.
Ergo
as mãos ao alto, em prece, e creio, acredito em ti, vives, acredito em cada
ilusão de ti, em cada miragem de ti, vivo como um eremita e sonho-te, vejo-te
sorrir,
pairar sobre este mundo e eu, qual pássaro de asas cortadas, de
novo sem vergonha nem pudor ergo para ti os olhos porque para mim tu vives, tu
revives, tu existes, tu és, eu é que não.
Não
sinto, não vivo, mas anseio e não desistirei de voltar a ser gente se
tu a
meu lado.