Quando
determinado facto entra na nossa vida é impossível de imediato conjecturar,
projectar, prever ou antecipar até que ponto, como, de que modo ou maneira,
quantitativa ou qualitativamente irá afectar-nos ou influenciar os nossos
destinos.
Entre
as muitas coisas com que o meu filho, a minha nora e netinha me prendaram no
Natal passado incluo, por inesperado, um Bonsai, uma daquelas árvores
japonesas em vaso cuja finalidade é mantê-la parecida com uma árvore comum, mas
sempre em miniatura.
Lembro-me
bem de, no entusiasmo do momento, apenas me ter acudido à memória a
originalidade da coisa. Uma árvore-anã, que original, etc e tal, sorrisos,
beijos, agradecimentos, trocas, votos de felicidade e prosperidade, a ceia, a
cabeça pesada, o sono dos justos. Tal e
cal por esta ordem.
Arrumado
o Bonsai no sítio mais indicado da sala, dele somente me lembro quando o vejo,
ou durante a ronda às flores ou na hora de estender carpetes e tapetes na
janela e dar ar à casa. Só hoje, volvido quase ou mais de um mês, o Bonsai me
trouxe ou conduziu àquele estado de meditação oriental que é suposto induzir em
nós se nos cabe apaziguar uma alma, a nossa ou a de outrem.
Isto
porque me acodem presentemente preocupações que não imaginara agora que, mau
grado a minha dedicação à fauna e flora caseiras, o Bon-Sai está com folhas
amarelas. Que fazer ? Falar-lhe ? Acarinhá-lo ? Dar-lhe mais sombra ou mais luz
? Água não ! O meu filho bem me recomendou que facilmente se “afogavam” ! Mas
que ideia estapafúrdia teria sido aquela da oferta do Bonsai ? Não escolhemos
as prendas inocentemente não é ? Sobretudo tratando-se de um Bonsai ! Que é
visto como uma terapia em que a pessoa cuida da árvore e por indução de si
mesma. Será como que uma extensão da jardinagem. Ter-me-á o meu filho julgado
necessitada de algo que me acalmasse ? Vai daí uma preocupação que me preenchesse
os dias que, a ser válido o argumento, seriam vazios, aborrecidos, capazes de
(ou na mente dele já) criarem em mim alguma apatia, aborrecimento, desencanto
pelo viver, frustração, doença, morte, para não descartar qualquer hipótese
possível.
Bom, mas se assim foi, o melhor é preparar-me
para que qualquer dia me trate com a mesura própria de uma neurótica ou hipocondríaca.
Vai mal a coisa. Já não estou a ver bem o Bonsai. Por outro lado temos ou
devemos ser condescendentes e dar a todos o benefício da dúvida. Será que a
árvore-anã me foi oferecida por motivos completamente contrários ? Mas vá lá
saber-se ! Serei para ele uma mãe que difunde calma e harmonia ? Tranquilidade,
bom senso e empatia ? Fico na dúvida mas, a ser assim, quem melhor que a mãe a
pessoa indicada para tratar o que merece mais atenção e cuidados que uma menina
de colo ?
Difícil
de deslindar este mistério, pois se para ele tenho sido simultaneamente dura e
dócil, forte e frágil, complacente e impositiva, calma e agressiva, só
dependendo o meu estado de alma das trapalhadas em que se metia, ou das
alegrias que me trazia para casa, ou dava.
Mas
não será a educação isso? Uma mistura bem doseada e caldeada com um pouco de
tudo q.b. para restabelecer o equilíbrio das coisas, ganhar e dar confiança,
carácter, personalidade, auto-estima e segurança a um ser em formação e que
exige muito mais decerto que todos os cuidados com que possamos contemplar,
dedicar, dar a um Bonsai ?
Não
vou dizer-lhe nada, nem esperar que veja as folhas amarelecidas da árvore-anã,
não. Seria deselegante da minha parte. Mas com a vida ocupada como tenho, onde arranjar
tempo, mais tempo que aquele que agora dedico à sua original prenda ? Será que
terei que comprar um daqueles livros sobre a “Arte do Bonsai”, ou um qualquer
outro sobre filosofias orientais e meditação transcendental ? Acabarei fazendo
yoga ? Na ! Vou mas é esperar que alguma amiga ou amigo lhe chamem a atenção
para estas linhas e aguardar que me apareça em casa, resoluto, disposto a resolver
o problema que me angustia e disturba a existência, já que foi ele que mo
arranjou !
* By Maria Luísa Baião,
escrito em 19 de Janeiro de 2007, pelas 09:51h, provavelmente publicado no Diário do Sul, rubrica
"KOTA DE MULHER" nos dias seguintes.