Este
domingo podia ter sido bem melhor passado, não tivessem sido aqueles grandes camelos,
mas nem o problema foi de monta nem deixei que gente tonta me estragasse o dia.
A coisa teve porém a sua graça pela ignorância que
demonstra e põe à vista, e não somente ignorância como falta de visão, falta de
mundo, de viagens, quando nem teria sido necessário ir a Paris, Roma, Londres
ou Madrid, bastava ter dado um salto a Arraiolos, Montemor-o-Novo ou Portel,
falo pelo que vi e vivi.
O quid pro quo conta-se em poucas penadas e menos palavras ainda, pois quisera o destino
que eu visitasse mas não visse a Mostra de Doçaria das Alcáçovas, doçaria que
aliás abunda por todo o Alentejo e por todo o país, mas que ali funcionará como
chamariz para a paróquia, ou para a Freguesia, sendo que a ideia até não está
mal pensada. Estará até melhor idealizada que a especulação com os misteriosos
e duvidosos Segredos do Endovélico ou o mirabolante aproveitamento de colocar à
noitinha os pategos todos olhando para o céu mirando as estrelinhas como se faz
na minha terra.
Doces
ao menos alegram-nos a alma e confortam-nos o estômago, não é por aí que o gato
vai às filhoses, mas foi, para mim aquilo não passou duma louvável iniciativa
parcamente pensada e porca mente organizada. Curiosamente já vai na 20ª edição,
longa vida lhe desejo, mas por mim evitarei passar pelas Alcáçovas nos próximos
50 anos ou mais, pelo menos enquanto lembrar os jograis medievais que pensaram e
deram corpo à iniciativa. Tirando isso, os doces, a comezaina, que mais tem as
Alcáçovas para oferecer a quem lá vá ?
Chocalhos,
mas já lá iremos.
Organizara
o meu passeio de modo a aproveitar bem o domingo, visitar a Mostra de Doçarias,
comprar algumas iguarias, almoçar e regressar a Évora a tempo de terminar a
jorna como a tinha premeditado porém, há sempre um porém, um todavia, um
contudo, a Mostra só abriria nesse dia, não de manhã mas pelas duas da tarde.
No problem,
invertem-se os termos, almoça-se primeiro e visita-se a Mostra depois, qual o
problema ?
Absolutamente
nenhum. Vamos ao almoço.
E
foi aí que começou o todavia. O pessoal era mais que muito, os restaurantes nem
eram assim tantos, e com uma soberba estranha para meio tão modesto corriam com
quem não tivesse mesa marcada pois os comensais eram mais que as encomendas.
Não
somente eu e a minha Fátima corremos tudo como tudo nos fechava as portas, a nós
e a muitos outros, a todos, num deles a quase totalidade das mesas estava
reservada à Câmara Municipal de Viana do Alentejo.
Nada
contra, a câmara lá há-de ter os seus colaboradores, afilhados, boys, tios,
sobrinhos e outros multicores a quem agradecer, a quem homenagear, a quem
honrar, a quem pagar, a quem engraxar etc etc e tal, ninguém leva a mal,
estamos em Portugal e mais tarde ou mais cedo, mais hora menos hora a câmara
há-de pagar e é entidade que não se pode hostilizar.
Brinco
é certo, mas não lhes nego o direito, nem à câmara nem ao restaurante, embora
ache que a vida não são dois dias nem o Carnaval três, o ano tem mais 362 ou
363 dias em que há que pensar e sobreviver.
Triste,
faminto, esfomeado, revoltado, regressei a Évora onde também se come bem ou
melhor ainda, também Évora é digna dos melhores doces. Voltei pois á minha
terra, virei as costas às Alcáçovas onde jurei nunca mais meter os pés nem para
mijar, jurei eu e juraram provavelmente mais umas largas dezenas ou centenas de
visitantes.
As
últimas semanas têm sido um corrupio, fui á Mostra Gastronómica de Arraiolos, exemplarmente
organizada e onde ninguém ficou sem almoçar, aliás almoçou-se num espaço digno,
capaz, acolhedor, depois passei pelo Festival de Sopas de Montemor-o-Novo onde
igualmente e num espaço idêntico, e de idêntica forma os restaurantes da zona
estavam representados, tinham o seu lugar reservado e próprio, tal como as sopas,
doces e vinhos, ninguém ficou em pé, ninguém ficou sem almoçar nem ninguém teve
que andar correndo e saltando procurando onde o fazer e toda a gente certamente
terá jurado voltar. Lá, não às Alcáçovas.
No
fim-de-semana passado calhara-me a Feira do Montado em Portel e também aí, numa
tenda enorme foram acolhidos os restaurantes da terra e dos arredores, que encheram
a barriga aos visitantes com maravilhas e doces, não tendo dado por ninguém se
queixar, todos almoçaram, todos visitaram a Mostra e todos saíram fartos e contentes.
Contudo
em Viana e nas Alcáçovas optou-se, por ignorância, desconhecimento,
incompetência, falta de originalidade e de visão por correr a pontapé os
visitantes famintos, e eram muitos. Ora não havia nexexidade. Como diria o padre
do Herman, o diácono Remédios.
Se
em vez de passarem a vida na terrinha os organizadores da Mostra de Doçarias
dessem de vez em quando uma voltinha pelas paróquias vizinhas só teriam a
ganhar e nem gastariam muita gasolina. Nem todos na Junta de Freguesia de Alcáçovas
ou na Câmara Municipal de Viana do Alentejo serão culpados, mas aos que o são
deviam pendurar ao pescoço de cada um deles um chocalho bem pesado e bem
lustroso, para que todos nós soubéssemos quem eram as alimárias e luminárias
cuja cabecinha não merece nem de perto nem de longe o pecúlio que nós,
contribuintes, lhes pagamos mensalmente. E sempre era dada à freguesia uma
outra e original oportunidade de as Alcáçovas mostrarem os seus famosos
chocalhos.
E eu
que tão empenhado tenho andado em mostrar à minha Fatinha as belezas e as
maravilhas do Alentejo, vi-me naturalmente compungido e comprometido, pelo que só
me restou pegar nela e levá-la dali daquele pesadelo quanto mais depressa
melhor, o que fiz enquanto fui rabujando e praguejando;
Perdoa-lhes
Fatinha que não sabem o que fazem… Fazem uns belos chocalhos p’ra vacas, bestas,
cavalgaduras, mas faltam-lhes polimento, etiqueta, modos, formação, educação,
consideração pelos forasteiros e boas maneiras…