Estas
duas últimas semanas foram em cheio. Para qualquer lado que me virasse a
retórica era sempre a mesma, até a Micas que, dando-me com um qualquer jornal
na cara, modo de expressão claro, me atirou:
- Ponha
aí os olhos senhor professor (eu fora professor de um enteado seu, seu dela,
não dela) oito por dia ! oitenta em dez dias, oitocentos em 3 meses, três mil e
duzentos por ano, 32.000 em dez anos ! Mas os meus impostos sobem mais que os
da gasolina apesar de me afugentarem os clientes isso ninguém vê !
Evidentemente
a revoltada referia-se ao seminário da Associação Alentejo de Excelência,* que
decorrerá a 25 de Fevereiro sobre a temática do abandono e desertificação do
Alentejo e de que um jornal Elvense faz alarde.**
E
ainda eu não me recompusera desta surpresa encontro a Floripes na padaria, que
não me esfregou outro jornal na cara por não o ter ali à mão mas que estava
zangada estava, e que usava e abusava dos resultados das reflexões da Cáritas
Diocesana e dos Salesianos, coincidentes no diagnóstico da situação do país, “continua
a haver miséria e não cessam os pedidos de apoio” gritava a Cáritas, enquanto a outra
se mostra agradecida a todos quantos ao longo dos anos permitiram, com as suas
dádivas e o seu mecenato manter de pé a obra Salesiana, pelo menos foi o que li posteriormente no cabeçalho dum jornal local.
-
Aqui temos, um país inteiro rendido, dedicado e virado para a miséria ! Está encontrado o grande desígnio nacional !
Realmente
fica-se sem resposta, pois nunca será por muito lhe acudir que a miséria
desaparecerá. Ao longo dos últimos quarenta anos os portugueses foram bem
enganados por demagogos e deixaram-se conduzir para o cadafalso sem um pio, tal
qual os cristãos para a arena há quase dois mil anos.
Talvez
conscientes disso não existam hoje municípios que não dediquem especial atenção
à sua área social, atacando os sintomas mas esquecendo as causas, outros
lembram as causas embora as escondam, e vêm agora criar parques tecnológicos, parques
e centros de inovação, ninhos de incubação de empresas, agremiações de ciência
e tecnologia, todos virando-se para as empresas, para as pequenas e medias
empresas, para a juventude, camuflando ou disfarçando uma vez mais a verdade, e
a verdade é que esse esforço devia ter sido iniciado há trinta ou quarenta anos
atrás, pois demorará outros trinta ou quarenta anos a surtir efeito e a
reflectir-se no tecido social e económico o que, portanto, deve atirar as
esperanças neles depositadas lá para o ano de 2050, se ainda houver alentejanos
e portugueses por essa época, isto é se não tiverem já emigrado todos.
Aos jornais
que há décadas têm aplaudido o poder local enquanto grande empregador
deveríamos deitar fogo, o poder local que se encheu de funcionários e que agora
todos nós temos que alimentar é o mesmo que abafou e atrofiou a economia local,
essa sim a que poderia produzir e criar riqueza, empregos duráveis, sustentáveis,
mas a quem a burocracia a politiquice e a cegueira travaram, combateram e
mataram.
Os
alentejanos e os portugueses não abalam, não emigram por gosto ou por prazer,
fazem-no porque as nossas esclarecidas elites, as que nos governam, a nível
local regional e central o fizeram com a barriga, com os pés, mas nunca com a
cabeça, se é que a têm. O
despovoamento do Alentejo e do país, a miséria em que Portugal caiu não é um
azar, não é uma inevitabilidade, é sim uma causa da acção desses senhores,
desses democratas tão demagogos quão ignorantes, porém cheios de certezas e
ainda mais de arrogância.
Palavra
de honra que, se vir um dia à minha frente um kosovar o mato, ou não serão eles
os culpados do nosso miserabilismo ? Toda esta miséria que sobreleva em
Portugal mais não é que a ascensão da ignorância de um povo e dos seus líderes,
a mesma ignorância que sataniza Salazar e diviniza Humberto Delgado, nem um era
o diabo nem o outro o herói que nos querem fazer crer. Uma vez mais
manipulam-nos, mentem-nos, enganam-nos, não fosse a ignorância deste povo tão
grande e jamais se atreveriam, fruto de uma péssima educação, outra coisa que
não aconteceu por acaso…
As
fatalidades que nos atingem não são obra do acaso, têm nome, ou melhor, têm
nomes, e têm uma extensa lista deles de há quarenta anos para cá, fossem
colocados ou inscritos num monumento e lá estariam os nomes de todos os nossos
presidentes da república, de todos os ministros, de todos os secretários e
subsecretários de estado, deputados, reguladores e gestores públicos,
presidentes, vice-presidentes e vereadores dos trezentos e tal municípios que
pululam que nem cogumelos inúteis por todo o país apesar de tão pequeno. Uma
lista a que há que acrescentar todos quantos se calaram, de directores gerais e outros boçais a militares e economistas, de papistas a seminaristas…
Desde
ignorantes a presidentes de república é um nunca mais acabar de nomes em lindas
letras de reluzente bronze, destacando-se no negro do granito monumental onde
julgam viver. Cada região, ou mesmo todo o país, que é tão pequeno como muitas
das regiões da Europa, nunca teve nem nunca terá um Plano A, quanto mais um
Plano B, como a UE exige, e bem. Somos artistas do improviso, mas o improviso
teve a sua época alta lá pelos séculos XV e XVI, pelo que andamos ligeiramente
atrasados. Mas no entretanto o que fizémos com a mais bem preparada geração da nossa história ? Atirámo-la borda fora, como no tempo dos descobrimentos se fazia com os revoltosos e os párias...
Como
costumo dizer não passamos de dez milhões de atrasados mentais, pense cada um o
que quiser. A obra de todos, de todos aqueles que têm o nome gravado no triste
e negro monumento está à vista, um Portugal de treta, ou de pechisbeque, que
nos envergonha e condiciona, que nos torna escravos e condenados. Querem melhor
exemplo da gigantesca fraude que essa lista nos legou ? Portugal é bem o espelho e a prova da iluminada
ignorância de uns tantos. O próximo lance ? A regionalização.
A regionalização
será a última desculpa / justificação que nos apresentarão como milagreira para
colmatar a penúria de resultados dos últimos quarenta anos. Ainda haverá quem
acredite nisso ? Haverá quem acredite que um pequeno país, que de uma pequena
região não passa, vá encontrar nessa micro-divisão a bola de cristal que busca sem
proveito há tantos anos ? Não, serão só os demagogos incompetentes e
irresponsáveis que se agarrarão a esta última tábua de salvação para tentar
explicar o inexplicável, nessa altura não serão somente aldrabões, serão também
mentirosos, trapaceiros, flibusteiros e marinheiros que tudo farão para
alcançarem a sua própria salvação…
Creiam-me,
para satisfazer clientelas, muitos defenderão a regionalização deste pequeno
país, ele mesmo e já por si uma pequena, depauperada, explorada e triste região…
Vá lá, ao menos riam e alegrem-se :D