domingo, 4 de julho de 2021

719 - MARTELO, MARRETA, E MARRETADA …

 

 É Natal e como sempre faço um balanço do ano que termina. No que a ti toca notei desvanecendo-se entre nós uma amizade que prometia, as tuas notícias são agora mais espaçadas e mais raras, como de quem já nada espera deste lado e pensará, muito justamente,

 

- Isto foi chão que já deu uvas.

 

Tu tens razão. Eu tenho culpas.

Dá voltas e voltas a vida e, quando pensava dar uma à minha, quando me preparava para monopolizar o teu sorriso permanentemente alegre e contagioso, quando contava com a tua eterna simpatia, empatia, e meiguice, quando sonhava pentear com os dedos os teus lindos cabelos em perene desalinho, abraçar-te, pousar o queixo no teu ombro, meter as mãos por baixo dos teus braços e sentir nelas o um coração batendo tanto quanto o meu, quando os dois, olhar fixo no horizonte sobre as ameias do castelo, colado a ti, a minha face na tua, tu aninhada num abraço sem fim protegendo-te do vento, do frio e dos olhares enquanto sonhava ver-nos flutuando sobre o espelho de água do Alqueva, até aprendermos a voar juntos, a flutuar juntos, uma, duas e muitas vezes, sempre. Todavia contive-me, para que não viesses a julgar-me oportunista, aproveitador, sacana ou traidor.

 


Eu lembrando uma manhã azarada e cumprindo palavra e promessa dadas ao Gouveia, morrendo no meu colo clamando p’la mãe, chorando a Fátima, forçando-me a juras que demorei quase cinquenta anos a cumprir, não esquecendo ter nessa mesma tarde tido a minha sorte ou o meu azar e quase o acompanhar. Não fora ela e hoje não estaria aqui sonhando-te, rangendo os dentes de raiva por o destino se ter atravessado no meu caminho quando menos esperava e p’ra ti já apontando, nada mais me restando que lembrar-te com carinho, o mesmo carinho que em ti encontrara, que de ti esperava e cuja perda me deixou em desespero.

 

Com inusitada frequência olho as tuas fotos, para que se não esfume em mim a imagem de alegria eterna que em ti vive e de ti guardo na memória pois dizem que na velhice é dela que nos alimentamos, de algum café, e pouca coisa mais… Deus te guarde assim alegre até ao fim, apesar das desilusões, dores e padecimentos que certamente também terás sofrido. Como daríamos valor aos bons momentos se não pudéssemos compará-los com os piores ? Na sua infinita sabedoria Deus deu-nos tudo, para que tudo possamos valorar e apreciar, comparar, e discernir.

 

Guardo comigo um lenço grande, comprido e colorido o qual por vezes bem apertado enrolo ao pescoço, como se alguém me abraçasse e, enquanto a caldeirada esfria, fecho os olhos e abandono-me absorvendo o seu odor. E sonho.


Há sonhos lindos. Há sonhos que podiam ter sido lindos.


Nunca esquecerei.               



                                                                                                                                                                                                                    


sexta-feira, 2 de julho de 2021

ESSA HISTÓRIA DO IMI NO CENTRO HISTÓRICO

 


      718 - ESSA HISTÓRIA DO IMI NO CENTRO HISTÓRICO

              # TEXTOS POLÍTICOS 24 #


Afivelei um sorriso rasgado quando atirei os bons dias p’ra cima da mesa do café, mesa à volta da qual todos conspiramos e cascamos tanto nos assuntos do dia quanto uns nos outros e em especial em quem não está, ou mais precisamente em quem nem está.


 O motivo da conversa do dia surpreendeu-me, pela algazarra, mas também e sobretudo por todos quebrarem em uníssono o hábito dos últimos tempos, calarem-se a tudo que metesse ou cheirasse a politica, porém o IMI, e as repercussões da aplicação do coeficiente de localização, isto é a avaliação do valor dos imóveis para efeitos de tributação, aqueceu os ânimos, ali todos eram proprietários de habitação própria sendo alguns senhorios, daí a celeuma levantada e as expectativas em redor da questão do IMI.

 

Agastado com o tema sentei-me e nem abri boca, quedei-me para ali a ouvi-los; que o IMI iria baixar alardeavam uns, que o IMI subiria alvitravam outros, puro eleitoralismo chutou um terceiro, quando mexem nalguma coisa nunca é para descer ó parvalhões, ajuizou um quarto. Alguns municípios nem o poderão descer mesmo que queiram, por estarem submetidos a programas de recuperação financeira como o PAEL lembrou a Anicas, enquanto me olhava como que pedindo a minha concordância ou confirmação, colando a coxa à minha numa atitude tão displicente quão desinteressada ou distraída, sabendo eu não dar ela ponto sem nó, desde que há meia dúzia de anos o Albertino a deixara viúva e ela paulatinamente recuperava os modos, o viço e a fogosidade de quando era muito mais nova (mau grado a prótese que lhe sabíamos na anca), com resultados muito positivos diga-se com toda a franqueza e em abono da verdade.

 

Fingindo não perceber a coisa e evitando cruzar o olhar com ela, eu ia ouvindo uns e outros enquanto cofiava a barba, quer dizer o queixo bem escanhoado, gosto da barba feita à lâmina com a velha Gillette e de me perfumar depois p’ra ficar bem-disposto, disposição que nem o tema do dia logrou retirar-me, há gente que nem sabe o que perde por não ficar calada, enfim, parvoíces.

 

- E tu Baião ? Que achas desta dança do IMI, p’rá i tão calado, diz lá à gente o que

 

- Acho bem, nem poderia achar de outro modo, os que podem aos que precisam, isto já nem é IMI, é mais uma taxa de solidariedade, pelo que vou comer e calar, até porque é como tudo o resto, a tendência será sempre para subir e não descer, solidariedade meu, sabes o que é ? Faz a tua parte e cala-te.

 

- Eu fazer faço Baião, faz tu também o favor de levares isto a sério, e isenção de IMI no centro histórico o que dizes ? Também é coesão ? Também é solidariedade ?


- Olha que são, ainda que em princípio te diga que todos os impostos sejam uma violência, porém necessária nas sociedades que se querem civilizadas contudo, a partir de determinada percentagem passam a ser não somente autênticas obscenidades como acabam por desmotivar quem trabalha e quem investe, prejudicando a economia. Essa isenção no centro histórico é mais um erro disfarçado de solidariedade para com os desgraçadinhos. Qualquer casa localizada no centro histórico vale mais que quaisquer outras em idênticas condições mas fora dele. Já vale mais, já é uma mais-valia para o seu proprietário, quer a venda quer a arrende, rende sempre mais. Por quê isentá-la ? Porque não se isenta o outro desgraçado fora do CH ?  Isentar os prédios localizados no CH será meter os outros desgraçados a pagar por quem já é mais beneficiado.

 

- Desculpa lá Baião mas és um insensível, uma besta, por acaso sabes que há velhotes que nem dinheiro têm para recuperar as habitações que possuem no CH ? Velhotes para quem essas habitações, a pagarem IMI ou mais IMI se tornariam um encargo insuportável ? Algumas tão degradadas que nem conseguem arrendá-las nem ao menos repará-las, as rendas nem para isso dão…

 

- Olha filho, quem não pode arreia, não tenho que ser eu nem tu nem os demais contribuintes a patrocinar quem tem mais bens ou bens mais valiosos que o cidadão normal, vendam a quem possa recuperar os prédios, metam o dinheirito no bolso e não se encavalitem nas nossas costas. Esse tem sido o mal deste país. Quem beneficia é que deve pagar, e pagar mais que os outros, e não menos. Desde que o que haja a pagar seja justo claro e não o roubo habitual. Até por haver que estar atento a campanhas de fundos europeus destinados à reconstrução e recuperação de cidades ou zonas citadinas degradadas para nos candidatarmos a eles, de outra forma não vejo como possamos fazê-lo pobre como é o país e a maioria das autarquias. Autarquias que para guiar os idosos nesses meandros deveriam abrir gabinetes próprios que abrangessem projectos de arquitectura, financiamento, orçamentação e adjudicação a empresas que quisessem entrar no “negócio”. 


Boas vontades contam muito. Salvo erro foi assim que a câmara do Porto há uns anos recuperou toda a zona ribeirinha, e se não me engano também Vila Nova de Gaia trilhou idêntico caminho e hoje essas zonas estão um brinco ! 

 

- Olhem a conversa deste cabrão hoje, acordaste com o cu destapado foi ? Tas sempre mandando postas de pescada contra tudo e todos e hoje deu-te para a sobriedade e solidariedade foi ? Se fosses…

 

       Não acabou a frase nem teria sido necessário, percebi-o claramente e volto a dizer de mim p’ra mim não se poder dar confiança a esta gente, a Anicas adivinhando-me o pensamento fez-me saber estar do meu lado e, encostando mais a perna, com qual por três vezes consecutivas fez mais pressão sobre a minha, deu-me um sinal que eu entendi perfeitamente. Para ser sincero a vontade que me deu foi dar-lhe um leve toque de cotovelo para que saíssemos dali deixando a canzoada a ladrar sozinha, quer dizer falando sozinha. 


Vontade não me faltou, e tenho a certeza que nem à Anicas faltaria, mas um homem tem que manter a sua honestidade, coerência e integridade, um homem tem que saber estar e saber comportar-se, que diriam todos da nossa atitude ao ver-nos abalar os dois ao mesmo tempo ? Só quem não os conheça errará a resposta, e quem os não conhecer que os compre…

 

Refreei-me evitando polémicas e nem respondi ao alarve.

 

- Vejam ali na Tv. a nota de rodapé que está passando, alertou com urgência o Faustino, «o desemprego mantêm-se em 9,4%…», e enquanto se mantiver alto, e mesmo baixo que seja, se não produzirmos mais os impostos jamais descerão, IMI incluído, o país, os ministérios e os municípios, estão pejados de funcionários públicos aos quais é preciso pagar, e depois de se lhes pagar não sobra um tostão nem para mandar cantar um cego, isto meus amigos, pagar impostos, é solidariedade como disse e bem o Baião, contando que essa solidariedade dê também para o que é sumido nos bancos falidos, na divida cega, na fuga aos impostos, na corrupção generalizada de que ninguém tem provas nem culpas, nos milhões que a incompetência queima e a irresponsabilidade faz desaparecer…

 

- Ora, mas ao menos consomem, mantêm a economia funcionando, não é o que se diz agora ? Que é necessário aumentar o consumo interno ? Estes consomem, ao menos consomem, se estivessem desempregados seria duas vezes pior, repenicou a Teresa do alto do seu poleiro e que o facto de ter sido sindicalista lhe consentia e a obrigava.

 

- Ó minha menina, naturalmente tens razão, condescendeu o Faustino já agastado, desempregados seria duas vezes pior, então do mal o menos, e sempre seriam mais dramas quando eles nem são culpados da trampa em que os nossos políticos nos atolaram a todos, mas se fossem funcionários do sector privado estariam a produzir e igualmente a consumir, estás vendo a diferença ? É que o óbice da coisa ou das coisas é precisamente a não produção !

 

- Ora essa, então não produzem ? Voltou a Teresa à carga.

 

- Claro que produzem sosseguei-a eu, pouco e mal embora a culpa não seja deles, eu diria que o funcionalismo público funciona “abaixo da capacidade instalada”, mas sim, produzem, ou induzem, algures a montante e a jusante sempre ajudarão a algum consumo, e a alguma produção, mas com o investimento público e o privado quase inexistentes que têm para fazer ? Os homens ainda se podem dar ao luxo de coçar os ditos cujos, e elas ?

 

Foi demais, fui longe demais e talvez a tenha ofendido, virou-me as costas sem retrucar e desandou…

 

Mas é a verdade, não por sua culpa mas alimentamos um funcionalismo público pesado, quantas vezes burocrata, ineficaz, que por vezes complica em vez de aclarar, e cujo consumo, tal como o privado, não poucas vezes é canalizado para fábricas alemãs, francesas, italianas e japonesas de automóveis e motas, material para fotografia e reprografia, consumíveis e uma plêiade de importações que nos afogam, é a nossa sina, a nossa solidariedade funcionando e o estrangeiro agradecendo...

 

Contradição ? Mas se o país vive delas, está cheio delas ! Que dizer quando na Tv. nos apresentam a recuperação do ramo imobiliário como se de sucesso ou de construção civil se tratasse ? São compras e vendas, na sua maioria especulações, comprar por cinco e vender por dez, aplicar o dinheiro que foge aos juros e que no banco não rende, ou a ser sumido nos bancos falidos e nos que irão falir, o imobiliário é não somente o novo IEFP mas é sobretudo o colchão do aforro luso, são aplicações ou investimentos financeiros destinados a dar segurança ao capital.

 

          Essas aplicações de capital não passam de subtis ou declaradas fugas à irresponsabilidade e incompetência dos nossos políticos e gestores e, qualquer dia, nem um porquinho capitalista meterá um tostão furado neste mealheiro à beira-mar plantado... Alguém acredita por exemplo que o incremento na venda de automóveis, especialmente verificado nas marcas premium seja um sinal de pujança da economia ? Contudo é assim que nos vendem estes factos…

 

Anda daí Anicas, tá na hora de almoçar e estou fartote de aturar estes palermas.

 

Temos que falar…



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quinta-feira, 1 de julho de 2021

717 - ORADA, NA PLANÍCIE DOURADA * ..........



ORADA, NA PLANÍCIE DOURADA *

 

No penúltimo Domingo quilometrei até Orada, pacata freguesia, esquecida e escondida na prestes dourada planície alentejana. Palmilhei mais do que queria, má sinalética, não lembrando nem fazendo jus àquela poética freguesia de cheiros, paladares, manjares e, me deixou ir embalada, até me ver perdida, quase em Messejana.

 Um amigo e um marido me arrastaram, mau grado o tempo, que os Deuses nesse dia escureceram e molharam. Perderam, pois não dei nem o dia nem o passeio por malfadado. Lamentei não ter podido molhar a provadeira num azeite que cismava, contemplado em duas enormes taças, por ele douradas, por ele abençoadas, fazendo crescer em nós água na boca, quedei, sem meio de molhar a sopa e degustar, tão rico paladar que só no Alentejo nos é dado apreciar.

 Mas vinguei-me e tive apesar disso e para isso esquecer, querer, vontade e poder para me empanturrar. Foram glórias, foram bolos, foram doces, queijos, vinhos, foram enchidos, foram vitórias, foram pastéis, foram rissóis, foram sóis. Fartei-me, deliciei-me, até quase arrebentar. Nem botei quantia astronómica para ensacar recordações que, verdadinha verdadinha, nem duraram quinze dias, mas me doiraram a cozinha, com cheiros e néctares de dar a volta à cabecinha.

 Gastronómica foi a lição, pois assim a queria um Guarda Verdades que, sabedor dos segredos que quer ver guardados por todas, nas nossas mãos pôs o pão, também esse, como os doces, velhas receitas de abadias e conventos que, novas técnicas e novos hábitos em advento, queriam, teimam, atirar ao esquecimento.

 O Guarda Verdades sabe o que muita gente ignora, que a gastronomia alentejana nos põe a andar à nora, somente porque, e não mente, as ervas alimentares e aromáticas, são coisa emblemática, que não só enriquecem os pratos, como fazem bem aos asmáticos.

 As ervas são pois coisa prática, enriquecem a merenda, curam a ciática, a úlcera hepática, a gripe asiática e, coisa enigmática, curam sorumbáticas, fleumáticas e, não sei se não farão igualmente bem a gente fanática.

 A história do Alentejo está pejada de misérias e pilhérias e, o alentejano, rei do improviso, do definitivo provisório ou do provisório definitivo, há muito aprendeu a dourar a pílula, misturando aos catacuzes e outras ervas tais, sabores e cheiros que, se numa primeira fase o ajudavam a comer o pão que o diabo amassava sem ter que fazer cruzes, acabaram tornando a nossa gastronomia digna de manjares reais.

 Cardos, beldroegas, espargos, foram mágica e eficazmente salpicados com orégãos, poejo, louro, qb de hortelã da ribeira, miscelânea de sabores, cheiros ou odores e amores.

 Numa coisa o Guarda Verdades se enganou, ele não promoveu só uma terra esquecida, promoveu em simultâneo, e espero que continue a promover, uma ciência olvidada, uma terrina pejada de tradição e prazer, que no fundo será o mesmo que dizer, não ao fast food, enquanto houver para comer qualquer gamela d'Orada.

 Que o Alentejo é terra rica, todas há muito o sabemos, quem queira beber da bica limpando ao lenço o suor, é mais difícil achar, porque os tesouros desta terra dão mais trabalho a desmatar que ir ao fundo das minas p’ró mero ouro arrancar.

 Actividades, emprego, crescimento sustentado, desenvolvimento integrado, investimento, finanças, coisas fáceis de dizer, mas, perguntem ao Guarda Verdades, que anda metido nestas danças em que andanças se meteu. Por certo mais trabalhosas que no campo arrancar mato. Descobrir um património, fazer de um gentio campónio ou guardador de rebanhos, que são coisas para antanhos, nem que lhe acenem com panos, com riquezas, com proventos, porque escolherá atalhos que o conduzam à cidade mesmo que o levem ao chão.

  Já não há moralidade e, nem Garcia da Horta e sua imortalidade o convencem da verdade. Para o ano lá estarei, com comitiva a preceito e sabedora que os "serviços" vão estar muito mais a jeito.

 

By Maria Luísa Baião, escrito terça-feira, ‎11‎ de ‎Maio‎ de ‎2004, ‏‎pelas 22:10 h e provavelmente publicado nos dias seguintes no Diário do Sul, coluna Kota de mulher.


quarta-feira, 30 de junho de 2021

716 - DESPESA BOA, OU DESPESA MÁ ???????????



716 - DESPESA BOA OU DESPESA MÁ ...

# TEXTOS POLÍTICOS 23 #


Devia ir um reboliço na AR por causa da dívida, mas tal parece nem apoquentar os nossos deputados. Só me admira que quer as premissas quer as projecções para o nosso crescimento não sejam mais altas, mais optimistas, com tantos idiotas quantos ignorantes por lá, admira-me que não nos prometam o céu e a terra. Este governo tem sido sobretudo hábil, e lábil, em adoçar a pílula e fingir que faz, não fazendo. Para ajudar à festa o Covid tem costas largas e serve para tapar toda a incompetência do Costa, o pior nos quarenta e sete anos que esta trapalhada já leva….

 

Mas que devia ele fazer que tanto receio tem em fazê-lo ?

 

Despesa. Cortar na despesa, nos gastos da república.

 

Toda a gente clama haver necessidade de cortar na despesa, nas gorduras, e certamente haverá muito por onde cortar, mas onde ? Quem ?

 

E é aqui que a porca torce o rabo.

 

Cortar despesa implica em grande parte dos casos despedir pessoal, à bruta ou com indemnizações, (geralmente a coberto de um qualquer programa de nome pomposo e virtuoso) qualquer das opções conduz a mais despesas, em rescisões, subsídios, etc. etc. etc. para além de arrastar à colecta de menos receita, menos contribuições para a SS, menos impostos, IRS, IVA etc. etc. etc. Quem não recebe não gasta, e quem não gasta não paga impostos, nem directos nem indirectos, ou passa a pagar muitos menos, enquanto por outro lado pode vir a ser beneficiário de isenções ou subsídios diversos.

 

Por aqui se vê que reformar implicará desgraçar ainda mais o país, o que o partido no governo não quer, o país já está exangue que baste e reformar a parte que não obrigue a despedimentos exige inteligência, precisamente o que este governo não tem. E seja dito em abono da verdade que reformas exigidas pela realidade há anos, ninguém as promoveu.

 

E então ? Não há soluções ? Não há reformas ? Verdade verdadinha é que este governo não tem desenvolvido nenhumas, ao contrário do que apregoa. Tem-se limitado a medidas pontuais e esporádicas, em especial na área do confinamento sanitário e das machadadas na economia, ainda por cima mais das vezes com pior resultado que o pretendido.

 

Há soluções. Mas tb há que ter em conta padecermos de muitos outros males e, quem quer que pegue nisto terá que conjugar economia, moral e ética, e um mix de educação, motivação e saúde que nos ajude a sair do buraco. Rezar a Nossa Senhora pode convir mas não é condição sine qua non.

 

Tão simples assim ?

Não.

Complicadíssimo até.

 

Porque o país está moribundo. Carente de reformas há mais de quarenta anos. Descapitalizado. Vendemos os anéis mas as dívidas continuam, os dedos estão seriamente ameaçados e é inegável a necessidade de diluir a dívida no tempo. Dívidas assumidas no fim da monarquia, princípio da 1ª república, foram final e totalmente pagas somente e já neste milénio, há não mais que uma dúzia de anos, sem que aparentemente nada tenhamos aprendido com isso.

 

Há que forçar o crescimento. Só o crescimento do PIB, da economia, nos pode salvar e tirar do buraco. Para isso é urgente começar a premiar o mérito e a assumpção de responsabilidade, apoiar as empresas, e em especial as PME que garantem emprego a 98% da nossa população, apoiar os empresários com medidas fiscais e financeiras, indexar os salários, o seu crescimento e a redistribuição de riqueza aos ganhos de produtividade e ao crescimento do PIB, tudo clarinho e preto no branco num contrato social envolvendo e assinado entre as partes, para que todos ganhem e todos saibam quanto têm a ganhar se o país evoluir. Mobilizando-os…

 

Há que dignificar o trabalho e a inovação, tal desiderato passa por permitir que sejam melhor remunerados os ganhos do trabalho que os ganhos financeiros, o que não acontece actualmente, em que o rendimento obtido pelas aplicações de capital estão claramente acima das obtidas com trabalho mental ou suado, o que é um mau sinal.

 

Temos que premiar o empreendedorismo, penalizar a inércia e a inacção, oferecer aos empresários condições que lhes permitam capitalizar-se, ou recapitalizar-se, a fim de que actuem antes que os chineses comprem isto tudo e encham o país de chinocas trabalhando 18 horas por dia por meia dúzia de patacas, yuans ou renmimbis.

 

Haverá que taxar fortemente o financiamento ao crédito e consumo de bens supérfluos e de luxo desmotivando-o, incutir razoabilidade moralidade e educação neste povo, promover uma profunda reforma politica e social, (social, de mentalidade civil, cívica) definir regular e reformar o sector empresarial estatal e a respectiva gestão, estabelecer objectivos, prazos e metas responsabilizando as pessoas e exigindo o seu cumprimento não se permitindo jamais que a culpa morra solteira, estabelecer criteriosamente as áreas de actuação do sector público empresarial estatal e do sector privado, a fim de evitar promiscuidades e tentações pecaminosas.

 

Há no horizonte tantas soluções possíveis como cabeças pensantes, mas teremos que estabelecer um despique saudável entre distritos, incluindo nele responsabilidades sociais assumidamente um dever de todos, particulares e empresas. É inaceitável que não cuidemos dos velhos, ou que deixemos abalar os mais novos, ou que chantageemos jovens mães para que não engravidem, tem que ser estabelecido um contrato social abrangente, onde todos se sintam incluídos.

 

Exigir-se-á moralidade e bom senso a todos, para que sejam desbloqueados milhentos processos parados, boicotados ou travados em ministérios e municípios, por burocratas e técnicos incompetentes e excedendo ou exorbitando funções, querendo impor uma visão e agenda pessoal aos contribuintes e munícipes sem que para tal tenham sido eleitos, o que terá que ser feito quer desburocratizando quer simplificando procedimentos e castigando os comportamentos negativos e reincidentes.

 

Poderiam ser estabelecidos rácios para orçamentos camarários e para os quadros de pessoal do funcionalismo publico, enfim, moralizar-se o viver neste país, por agora todo ele enleado em enganos em que metade de nós sobrevive de esquemas precários ou parasitando o aparelho de estado e em que a outra metade simplesmente não aceita pagar os excessos inúteis. As gorduras…

 

É dos livros, temos que crescer, ou crescemos todos ou morremos todos, estamos ligados umbilicalmente. Como estamos só nos resta sobrecarregar cada vez mais de impostos os poucos que ainda trabalham ou desenvolvem uma área de negócio, e no dia em que forem só dois ? É notório que só o crescimento permite obter valor e riqueza para fazer face ás despesas que temos, e que temos que controlar e valorizar.

 

A título de exemplo, o Ensino Público ou o SNS não podem ser buracos onde simplesmente se despeja dinheiro, é dinheiro nosso, de todos, que custa a arranjar e faz suar, o seu consumo tem que ser moderado, fiscalizado, mas sobretudo valorizado, rentabilizado. São valores inestimáveis e sagrados.

 

É forçoso remunerar bem as poupanças, e permitir que as aplicações de capital obtenham mais valias não especulativas, incentivando estes mecanismos através de isenções ao reinvestimento de capital e penalizando proporcionalmente a distribuição de dividendos.

 

Todos temos que ser mobilizados, que fazer parte da solução, e todos temos o direito (cumpridos que estejam os deveres) de esperar ser justamente beneficiados quer pelo esforço quer pela mudança. Qualquer português que se negue a este esforço repartido não merecerá a consideração dos demais. Um burocrata ou um técnico que boicotem um processo estão a contribuir para a eliminação do seu emprego e dos demais. Se o processo não andar não criará riqueza nem emprego, não se pagarão impostos, os tais impostos que no fim do mês lhe pagarão o ordenado ou vencimento, e que, quando todos pagarmos, calhará pagar menor parte a cada um, enquanto por outro lado deixaremos de exaurir subsídios, de desemprego e outros que tais, permitindo o seu uso em áreas mais reprodutivas.

 

E por falar em reprodutivos, lembremos o termo “dívida virtuosa” porque tb existe tal, dívida virtuosa é aquela que permite multiplicar por 2 ou 3 ou 4 ou 5 ou 10 cada unidade aplicada, o que decididamente não tem preocupado os nossos decisores nos últimos 40 anos, em que não se fez um único negócio rentável. É hora de acabar com as PPP e lançar as O.C.F. simplesmente “Obras de Compromisso com o Futuro” …

 

Parece ser já pacífico para os portugueses que os diversos governos e a generalidade dos deputados, desde o 25 de Abril, se preocuparam excessivamente com os respectivos partidos, ou as respectivas pessoas, deixando para as calendas gregas o governo da nação e o bem estar e futuro dos portugueses. Agora que a dívida nos aperta apercebemo-nos terem sido demasiado bem pagos para a pouca produtividade alcançada, tudo está por fazer, e em “N” aspectos nada se avançou de então para cá e casos há em que regredimos mesmo.

 

Não temos uma fiscalidade atractiva para o investimento, temos uma justiça digna da idade da pedra, o ensino teima em não proporcionar as condições de formação nem as especialidades ideais, e fico-me por aqui. Isto parece o oeste selvagem, é o salve-se quem puder, sendo que padrinhos e cunhas se substituíram ao justo fruir da igualdade que a AR deveria ter acautelado para todos.

 

Em Portugal o Poder Local parece sofrer na generalidade do mesmo mal, partidarismo, clientelismo, e um rácio de funcionários muito superior ao que seria natural e ideal, disso nos deu conta a divulgação de uma completa e meticulosa infografia. (link para consulta no final do texto).

 

De uma média ideal de funcionários por cada mil habitantes exorbita-se para números carentes de toda a lógica. (Évora 21,1 por 1.000 habitantes, aconselho a que veja o gráfico cujo link se encontra no fim do texto).

 

E nem são mais eficientes nem menos custosas para os munícipes estas equipes de gestão da coisa pública, demasiadas mantêm um grau de despesismo elevado, muitas câmaras estão endividadas, e raras se distinguiram na criação de condições para o desenvolvimento de uma actividade económica salutar e geradora de emprego. Ao invés e enganadoramente tornaram-se o principal empregador da sua área. Com o inerente peso burocrático e financeiro. Um município não gera riqueza ainda que para ela contribua criando, quando cria, condições para que tal ocorra...


Sendo em simultâneo um foco de despesa, há que gerir muito bem os orçamentos municipais para que não se tornem um peso excessivo. Estrangulador. Todas as câmaras intervencionadas foram obrigadas a aumentar, para o escalão máximo, taxas e derramas, o que decididamente não é da simpatia do investimento ou da criação de emprego. Nem dos munícipes. No entretanto que fizeram as Assembleias Municipais para evitar este descalabro ? Eu digo-vos, nada, calaram-se e não fizeram nada, pactuaram com os resultados, são cumplices na desgraça que vivemos.

 

Do exposto resulta que os municípios podem ter uma importância transcendental na captação de investimento, na criação de condições para que o desenvolvimento económico aconteça, e para que o desemprego se mantenha baixo. Podem, mas o que os números nos indicam é que não conseguem. Porquê deixo à consideração de cada leitor pois cada um certamente conhecerá o seu concelho melhor que eu. Contudo arrisco avançar que nem todas as responsabilidades caberão ao presidente ou aos vereadores, a existência de boas equipas técnicas é fundamental. Sem elas o resultado obtido é igual ao obtido por um bom primeiro-ministro rodeado de ministros bananas, incapazes.

 

Parece ser já demasiado evidente para todos nós que estamos no mesmo barco e que só sairemos daqui produzindo, produzindo muito, produzindo bem e depressa, não há outro modo de se obter criação de riqueza e de emprego para todos. Claro que a par disso muita coisa mudará, mas o essencial assenta na organização colaboração e produção. Cada um que faça o melhor no seu posto. A bem ou a mal, alegres ou contrariados só nos resta produzir urgentemente, de modo que os ganhos supram os custos, de modo que não haja necessidade de despedimentos nem de encerramento de serviços empresas ou fábricas.

 

É tudo por hoje. Obrigado pela seca.

 

http://www.jornaldenegocios.pt/economia/detalhe/infografia_saiba_quantos_funcionaacuterios_trabalham_na_sua_autarquia.html

 




 

terça-feira, 29 de junho de 2021

A DÉCADA PERDIDA E O VOO CEGO DA FÊNIX...

                     


715 - CHEGA, A DÉCADA PERDIDA E O VOO CEGO DA FÊNIX


Primeiro foi o júbilo, genuíno mas descontrolado, nada era demasiado bom para ser verdade e aquele momento tinha sido esperado, ansiosa e pacientemente, por isso ali não havia exagero. O exagero viria depois, depois de consolidado o júbilo, depois de consolidado o poder. 2021 será um ano para festejar.


Agora era hora de festa, a meditação viria aos tropeções, como quem acorda de um sonho e demora algum tempo a processar a realidade. Até porque com tantas guerras que travaram já nem sabem fazer as pazes.


E a meditação, na pastelaria ou não, viria coberta não de chantilly mas de uma ânsia revanchista, inata e animalesca, quase simiesca e, um a um a turba foi engrossando, as mensagens passando-as de mão em mão ou em surdina, sendo então que me ocorreu o déjà vú, as montras pintadas ou partidas, a impunidade medrando, o medo instalando-se. Os mais argutos fizeram as malas e cavaram, os que acreditaram foram honrados com uma estrela amarela no peito e não partiram, nem ficaram, simplesmente desapareceram.


Um arrastão tomou conta do jubilo, não um tsunami, nem um tornado ou furacão, mas um arrastão espontâneo, explosivo, e montada nele a raiva e a inveja de muitos anos e, sob ele, como um tapete rolante, ajudando-o na deslocação, no movimento de progressão, um resquício velho e fermentado de chauvinismo e vingança, um desejo irracional abafado há décadas, surdamente alimentado por reformas que não tiveram lugar mas lhe mercaram o destino como se marca de véspera um bilhete na ópera, ou no cinema, uma reserva, que nunca foi gasta, nem consumida, mas alimentada e agora explode neste arrastão espontâneo mas que esperava mudo, há anos, há décadas, e agora tomou o freio nos dentes e ninguém sabe como o parar, como o suster, como o enfrentar, como o resolver, como solucionar.

 

Depois não foi Mao quem pontificou, foi antes um mau momento, digamos que uma sequência de maus momentos, sequência tão longa quão durou a Revolução Cultural, essa sim de Mao, essa sim muito má, muito mazinha, não um tufão, nem um tornando, nem tsunami, nem arrastão, antes caos, catástrofe, cataclismo, como se alguém tivesse puxado o autoclismo e toda a China tivesse borbulhado num turbilhão redentor cujo sacrifício e sangue mártir a tivesse lavado e preparado para a festa que se seguiria, por isso hoje ela de fato e gravata, varrendo para debaixo do tapete pesadelos como Tiananmen, surgindo impoluta na frente do G15, na frente do mundo, vanguarda vermelha liderando rumo ao Big Brother total e incontornável, marcando agenda e tapando a merda, e por falar em merda lembrei-me quantos merdosos irão ter ainda veras saudades de Salazar, um menino de coro, Homem com H como canta Ney Matogrosso, quantos o recordarão com saudade, se tiverem tempo, se tiverem oportunidade, se viverem para isso, se viverem para tal e ponto final.


A euforia deu então lugar à confusão, como quem acorda de um bebedão e não acredita, não crê no que vê depois da festa, da euforia, da alegria, de uma década de confusão e atropelos, tropeções e desmazelos, será preciso que lhe digam;

 

- é o fim da festa pá.

 

Como disseram ao outro,

 

- os russos estão em Berlim.

 

e só então ruiu o castelo de cartas pois tudo tinha sido armado no ar como as barracas e ele, A.V. o “Pé Leve”, afinal tinha pés de barro e ficara siderado olhando os estragos e não crendo, não acreditando que tão poucos tivessem provocado tantos danos, os malvados, os danados, esquecendo a velocidade furiosa a que correra, as orelhas moucas que fizera, as peças de dominó que levantara aprumadas, agora caindo uma a uma numa sequência inexorável e aprimorada deixando atrás um rasto indizível de surpreendente e inexplicável destruição que nenhum oráculo quis antever primeiro, muito menos comentar depois. 2031 será a cúspide de uma década que ninguém esquecerá. 


Sabemos apenas de ciência certa que este povo tão mortificado quão estupidificado teria feito e fará como sempre, limitar-se-á a encolher os ombros, a olhar para o lado esperando resignado o próximo passo, o próximo fado, ignorando propositada e galhardamente a inexistência do homem da guitarra, do sábio da viola e, assim como até ali de tudo se alheara numa indiferença secular, assim fará doravante pois não está, nunca esteve e jamais estará para se maçar.


Assim como assim alguma coisa há-de aparecer, alguma coisa estará para acontecer, qualquer coisa que devia perceber, o melhor que há a fazer é o que sempre fez, o melhor será virar- -se para o outro lado e adormecer…

 

https://www.youtube.com/watch?v=bL9VLWae1AI



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