quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

108 - QUE ESPERAR DE TUDO ISTO ? NADA ! ....




Tenho uma dívida de gratidão para com os meus amigos mais chegados. Não imagino por que carga de água levam-me a sério e assolam-me pontualmente com questões que só me honram. Por me serem colocadas mor das vezes num ambiente de conspiração, de secretismo, como se eu fosse o detentor da verdade.

 

Envaidecem-me e enobrecem-me. Como não gostar deles sabendo vós quanto gosto de ser considerado, que sou um homem de paz e que desavenças não são comigo, salvo um diferendo que se arrasta há anos no Registo Civil, já que teimam não autorizar-me a mudança de nome por motivos nada justificados, sabido ser que nessa cena toda a razão me assiste.

 

A questão é simples e explica-se em poucas palavras, eu quero desistir do nome de Humberto e passar a chamar-me Narciso, nome mais bonito, sonante e conforme o meu modo de ser, mas aqueles burocratas não aceitam a mudança. Mais fácil é, segundo me parece, mudar de sexo. Quisesse eu ser Miquelina e tudo me seria facilitado por aquela gentalha.

 

Desta vez a questão que  os rapazolas e amigos me colocaram foi crucial: 


- “Que nos espera enquanto portugueses” ?

 

Nem tive que pensar, resposta fácil:

 

- Nada.

 

- NADA? Exclamaram incrédulos em uníssono.

 

- Nada, repeti e confirmei.

 

- Mais uma bejeca César, copo gelado, tenho os neurónios por excitar, os gaiatos hoje nem dão para começar.

 

- Não nos lixes Baião, tu tens sempre uma teoria qualquer sobre tudo que seja, e agora vens-nos com essa ?

 

- Mas os meninos pensam que sou bruxo ou quê ? Que as invento ? Que sou o oráculo de Delfos ? Nem sequer tenho idade p’ra vosso pai mas saibam que se fosse haviam de passar mais vinte anos na escola ! No mínimo ! E nem sei se vinte anos chegariam, do modo que as coisas estão, calhando nem valeria a pena.

 

- E tu Brites? Que é daquela tua mulatinha ? Vamos começar por ela ?

 

- Vai-te lixar devasso do camandro, pensas ke tou pa te aturar ? Porque não deixas a moça em paz ? - Nem aqui está !

 

- Calma rapaz ! Só falei nela porque tudo começou mais ou menos aí, em África, há bué de anos. Sabes qual é o mal menino ? É que vocês levantam o pelo com facilidade mas só têm olhos para a FHM, a Play Boy, a Carla Matadinho, as mamas da Elsa Raposo e merdas dessas, e nem lêem nem quem, nem o que deviam, e depois a mim é que colocam de serviço para duas ou três explicações breves né ? Pagam-me ?

 

- César, aponta todas as que beber na conta destes moleques e eu falo a noite toda, de contrário nada feito.

 

- E tu mete a mulatinha no cu porque nem estava sequer pensando nela, nem preciso ouviste ? Mete isso na cabecinha e não me dês lições que dispenso e nem preciso, e se tiveres que me dar alguma coisa, pois que seja essa mulatinha linda ! kkkkkkkkkkkkkkkk !!!!!!!!!!!!!!!!!

 

- Fogo que ainda se arranja aqui uma guerra !

 

- Merda ! Porra ! Então não é ela que vem entrando pá ?

 

Fogo ! E quem ia adivinhar ?

 

- Acabou a tourada caraças, caluda ! Respeitem a senhora tá ?

 

- Voltemos ao assunto, que aliás é fácil de rematar, vocês do secundário não recordam Orlando Ribeiro, Fernando Pessoa, António Sérgio, Agostinho da Silva, ou tipos mais recentes, Eduardo Lourenço e o seu “Labirinto da Saudade”, o excelso jornalista escritor Fernando Dacosta, que entre muitos outros publicou “O Viúvo”, ou o nosso mais recente e ilustre filósofo, José Gil, um moço um nico mais velho que nós ?

 

- É que eu sou um curioso do catano e não só pela mulatinha do Brites…

 

- psssshiu ! Falem baixo porra ! A gaja inda ouve e vem-me aqui lixar o juízo, sabem bem como ela é, um qualquer complexo, ou o caraças, qualquer merda pensa logo que a estão a desvirtuar.

 

- Se fosse a desvirginar ainda admitiria a gritaria … mas onde é que isso já vai…. Caluda.

 

- Olhem que o Brites ouve porra ! Ou ela, o que é pior !

 

- Bem, agora só lembro os gajos que vos referi, haverá mais, outros, mas todos eles são unânimes, duma forma ou de outra, a explicarem as razões da nossa razão como povo, ou melhor, das nossas características, o que quer dizer que explicam o porquê da nossa falta de razão, de racionalidade, da nossa incapacidade.

 

Todos sabemos ter Portugal dado mundos ao mundo, a gesta das descobertas e das especiarias, os entrepostos de Malabar, Mina, Ormuz, Benin, Arzila, Goa, Damão e Diu foram apenas momentos e pontos da nossa grandeza e riqueza. Um tempinho pa emborcar esta né César ?

 

Como o foram mais tarde, Ambriz, Cabinda, Molembo, Angola, Moçambique, Cabo Verde e toda a costa ocidental de África no tempo do comércio triangular com o Brasil e mais tarde com a América do Norte, continente que povoámos de escravos cuja venda nos enriqueceu.

 

Não estou a inventar, está nos livros, mas saberão vocês que o reino que Portugal era então, não contava mais que três milhões de almas ?

 

E como foi que tão poucos fizeram tanto ?

 

Simples. Na generalidade foram embarcados nas naus os pedintes, alcoólicos, vagabundos, ladrões, presos, condenados e toda a escória possível de imaginar que, livres e com possibilidade de enriquecimento rápido, se tornaram tão ferozes que tomaram praças sem um único tiro, já que nem perdiam tempo a tirar os anéis e pulseiras ou fios preciosos aos vencidos, a quem de imediato cortavam um ou mais dedos, um ou os dois pulsos, o pescoço, levando tão longe nessa época o horror aos portugueses como hoje o manifestamos quanto à responsabilidade, à solidariedade, à produtividade, à seriedade.

 

Aventureiros por natureza, com o reino cheio de escravos, que chegaram a constituir grande parte da população, em algumas zonas um terço, noutras por vezes mais, o país caiu no laxismo, os costumes no abastardamento, na licenciosidade, na falta de disciplina e de valores morais, na ociosidade, enfim, aí começaram os nossos males, os quais se estenderam como devem aperceber-se, até aos nossos dias.

 

Isto é ciência certa meus moleques, pois a escravatura só foi abolida em finais do séc. XIX, pelo que o que nos espera é nem mais nem menos o que a história já nos revelou sobre civilizações clássicas assentes no esclavagismo, os egípcios, gregos, os romanos e a queda desse império a que pertencemos, e se julgava imortal.

 

Creiam-me, os homens de valor, como os Castros, os Almeidas e os Albuquerques por lá ficaram, pela estranja, por cá o reino ficou povoado de ociosos, dos quais descendemos e cujo nome honramos, pelo que, caros amigos, não querendo ser escravos mas esperando fazer dos outros tal ou que como tal se comportem, resta-nos orgulhosamente fenecer-mos ás nossas próprias mãos.

 

Sendo uma opinião muito minha, baseia-se contudo em factos verídicos do nosso passado próximo.

 

Somos oportunistas por natureza, corruptos por vocação, malandros por opção, tachistas devido a um forte instinto de compadrio e sobrevivência, (noutros povos é a coesão social a garantir este aspecto das suas vidas), insensíveis por ambição, calculistas devido a ausência de escrúpulos, más-línguas por puro prazer e maldade, velhacos, biltres, calaceiros, daí a minha resposta quando colocada a questão;

 

- Que nos espera ?

 

– Nada - Pois nem eu acredito que Deus seja tão distraído que nos assegure o futuro sem que tenhamos que, como todos os outros povos, pagar as favas pelo pecado que O levou a expulsar-nos do Paraíso.

 

Vá, agora contestem-me se tiverem razões.

 

César, mais uma e bem fresquinha que a garganta me secou amigo…






quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

107 - UM POLICIA COM OLHO DE LINCE...


É bem conhecido de todos aquele ditado que nos diz que “há que estar com um olho na mula e outro no cigano”, o que eu nunca pensei foi que tal se me viesse a aplicar, de um modo que nem tempo tive para perceber se era eu o cigano. 
Rodava um destes dias na periferia da cidade quando ouvi zunir o telemóvel, não estive com meias medidas, fiz o que todos, ou quase todos fazemos, puxei do dito e atendi a chamada. Apercebi-me de repente que em sentido contrário, se aproximava de mim um polícia em potente moto, o que me levou a gritar alterado; 
- Albertina ! Vou desligar que vem aí a polícia ! E, acto contínuo, desliguei o telemóvel e joguei-o para debaixo do banco do carro. Mas o maldito polícia, que tinha olho de lince ! A mais de cem metros de distância já se tinha apercebido que eu ia falando ao telemóvel ! Ainda não se tinha cruzado comigo e já me mandava encostar, o que fiz, e foi só o tempo dele virar a mota, colocar-se ao meu lado, cumprimentar-me cortês e cordialmente, e com a mesma presteza afirmar peremptório; - O senhor estava falando ao telemóvel ! - Quem ? Eu senhor guarda ? Mas se eu nem tenho telemóvel ! Eu ia era coçando a orelha porquanto uma dor de ouvidos não para de me afligir senhor guarda, razão pela qual me teria visto com a mão no dito cujo. E estávamos nisto, ele sem acreditar em mim, eu pensando nas insondáveis razões que me levavam a querer aldrabar um polícia, logo eu que por muitas razões não o deveria fazer. Há quem trema só de um polícia lhe chegar ao pé, ou ao ouvir uma sirene troando, a verdade é que ainda hoje me interrogo sobre aquele meu inusitado procedimento. Contudo a história não acabou aqui, o melhor estava para vir, já que enquanto dirimíamos argumentos, o maldito telemóvel recomeçou a tocar lá do fundo para onde o tinha atirado ! Imaginem a minha atrapalhação ! Tentei dar-lhe um pontapé, calá-lo pela violência ! Mas nada, o maldito objecto teimava em comprometer-me ! O polícia ria, disfarçadamente mas ria, devia pensar para com ele que se apanha mais depressa um mentiroso que um coxo, o que não deixava de ser verdade. Até que às tantas me disse; 


- Vamos lá ! Atenda homem ! Pode ser uma coisa urgente ! Agora está parado, não há problema ! 
Atrapalhado engoli em seco, acabei por admitir o delito, pedir-lhe desculpa, envergonhado, dizer-lhe não compreender a minha reacção instintiva, que tão grosseiramente me levara a mentir, o que ia contra os meus próprios princípios. 
- Passe lá a multa senhor guarda, o senhor tem toda a razão, e muita sorte tenho eu, porque se fosse multado cada vez que ao volante pego no telemóvel, não haveria dinheiro que me valesse. Eu fui (então) sincero, e ele até foi simpático, numa multa que podia ir a mil euros, jogou pelo valor mais baixo, acreditou no meu sentido arrependimento. Ali ficámos depois falando um pouco disto e daquilo, ficámos até amigos, creio, rimos mesmo do sucedido, indo depois, cada um à sua vida, embora eu ainda hoje me interrogue das razões inconscientes, freudianas, que me levaram a tal atitude. 
O certo é que por mais introspecção que faça não encontro resposta para a minha esperteza saloia. Que me ajudem as almas das psicólogas que, curiosas mas mudas e caladas, nunca deixam de espreitar estes meus ditos. Passados poucos minutos, estacionado numa estação de serviço, liguei à Albertina a quem contei a história, e a quem apresentei a conta pela chamada comprometedora que me veio a custar cinquenta euros... 
- Foi simpática, como o polícia, mas nada feito, e de igual modo acabámos os dois rindo do ocorrido. 
Que mais havia a fazer ? Pagar a multa e seguir em frente. 
E agora que me perdoem, mas esta crónica fica por aqui, mais curta que o habitual, pois tenho o telemóvel de novo a tocar, estou cheiinho de pressa, desculpai-me se o tempo é escasso, mas as amizades são tantas !...


terça-feira, 31 de janeiro de 2012

106 - AMAR, SONHAR......................





      José Couso tinha acabado de almoçar. Vigiara a máquina colocada no tripé, regulara pela enésima vez a objectiva, sempre temente que qualquer desfocagem lhe traísse a limpidez de uma cena que desconhecia mas aguardava com impaciência.

        Que algo haveria de acontecer sabia-o de antemão, com tanta coisa a passar-se nos trezentos e sessenta graus em seu redor e mesmo ao pé da porta, era uma questão de espera.

        O que o traía era a constante tensão a que estava submetido, não seria contudo o constante afinar do mecanismo da sua Nikon que lhe devolveria a paz e o sossego por que ambicionava e havia muito não o deixava dormir um momento descansado.

        As saudades de Pilar também mexiam com o seu íntimo. Mais que da família era dela que constantemente se lembrava, a tal ponto que, certas necessidades psico-fisiológicas regular e atempadamente satisfeitas quando na Galiza, o traziam agora num estado de espírito que lhe toldava a concentração.

        Não havia dúvidas que um homem se completa numa mulher, talvez por isso milhões de homens em Bagdade, mantivessem apesar da guerra, uma calma que chegava a invejar. Mais a mais, e se era como se dizia, teriam bem guardadas em casa duas, três ou quatro para cada um, o que só podia redundar numa calma exagerada, mais a atirar para o cansaço, pois estas coisas de alcova também têm os seus custos energéticos.

        Com o estômago já habituado à frugalidade própria do lugar, José deixou-se afundar lentamente no sofá do quarto, mais para dedicar a Pilar alguns momentos oníricos de que andava precisado, que propriamente para descansar, embora desse modo almejasse juntar o útil e necessário ao agradável. Não dormia, como pensaria qualquer um que o visse assim descontraído e de pálpebras fechadas.

        Sonhava, sonhava acordado, sonhava com o seu amor e os descampados por onde comummente se passeavam, e tão nítida lhe parecia a lembrança que julgou sentir a humidade do chão nos cotovelos e joelhos, tal qual como quando pelo mesmo se rebolava, arrastando Pilar no abraço estreito com que aconchegava a si o seu peito, numa esperança incontida de fusão a que por norma punham cobro com uma prolongada comunhão.

        Tão concentrado estava na ilusão, que nem o barulho dos colegas logrou desviar noutro sentido o seu pensamento. Ademais, a confusão reinante, acabou por se confundir até com os gritos das crianças numa escola que, quando na volta do prado, costumavam ver e ouvir brincando no adro. 

           Acordou, contudo tão excitado e molhado, que ficou um pouco embaraçado, um pouco mudo, e com a imagem desse feliz momento, disfarçou o tormento acorrendo uma vez mais à varanda, uma vez mais desnecessariamente da objectiva em demanda quando, um clarão enorme precedeu o ribombar de um trovão e lhe roubou ali, naquele mesmo instante, a imagem querida e vibrante que segundos antes o maravilhara e elevara aos céus.

        Ouviram-se gritos e labéus, as objectivas destroçadas, janelas estilhaçadas, por todo o quarto uma sinistra pintura de sangue, apercebe-se de vários feridos e, jazendo no chão, inanimado junto de si, Taras Protsyuk da “Reuters”.

        Todo o hotel em alvoroço, gente entrando e saindo gritando, só então se deu conta que também estava sangrando. Quis levantar-se mas não, a perna pendia-lhe, presa ainda por um tendão, fora isso e não seria sua.

        Esvaía-se-lhe a vida e a alegria, alguém o socorria sem lograr estancar o sangue que corria, - um garrote depressa !, qualquer um gritou, - não que isso importe, - outro rematou, tal era a ferida de que padecia.

        Vieram amigos acudir, cada um deles, sem esperança, acabando por fugir daquele inferno, cedendo lugar a bombeiros e enfermeiros.         Uma maca, uma ambulância, uma corrida. Um corpo chegou quase sem vida ao hospital.

        Ali ficou, ali se finavam vida e sonhos enquanto lembrava os filhos, pequenos, pois por um daqueles azares medonhos em que ninguém quer crer, no meio de uma contenda e na cidade das mil e uma noites, os hospitais nada têm que a qualquer um possa valer.

        O que matou José Couso, ali, naquele idade, foi tão só o facto de não estar naquele momento numa qualquer outra cidade, onde por mais modestas que fossem as urgências, por certo teriam ao dispor as competências banais e necessárias para acudir a casos tais.


in "A Guerra No Iraque" A Experiencia Inesquecível de um Voluntário de Paz Na Tomada De Bagdad” - Humberto Baião " - Ed Nosso Futuro - 2005 - ISBN 972-9060-31-2 --- 6390

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

105 - DEDICA-TE À POESIA…................................. *



Ora toma ! Aí tens ! 

Desesperavas pela resposta dela e agora chegam-te todas de chorrilho ! 

É a porcaria da Net que te está a lixar não é ?

Valeu mesmo a pena o bucólico ou romântico, ou lá como o chamaste, deve ter sido sobretudo enervante o tal passeio de domingo olhando as amendoeiras !

Parvo, já não tens idade para isto, tas a ficar senil !

O excesso de sensibilidade afectou-te. Tas contente ? Tas ? E agora ?

Como é que descalças a bota sacana de merda, aí está ela a provocar-te de novo e tu feito maricas, pensando-te um valente não é ?

Vá ! Diz-lhe agora o que andaste para aí remoendo !

Mulher de força ! Mulher única, e coiso e tal !

E as mensagens que não passavam, e as que perdeste, e a incerteza de terem ou não ido, a revolta por não teres reconstruído a que perdeste, a inspiração ? Pensas ser coisa divina ? De momentos ?

               Toma mas é juízo pá, e porque ela estava logo ali do outro lado do monitor, e porque o perfil a dizia online, e tu sem saberes o correio electrónico dela, e tu agarrado ao monitor, beijando o monitor… 

Tas parvo ou quê ?

Toma mas é tacto, não viste que é uma mulher inteligente ? Não ?

Põe-te mas é a milhas enquanto podes ! Depois não te queixes !

Desesperado pela resposta dela, por veres a reacção dela, e agora que já viste ? Levaste na tromba ! Palerma !

Nove quintos da resposta ela dedica-os à filha, ao tesouro dela, das duas uma, ou baixou a guarda e só lembrou defender a filha, ou, numa contrita manhosice que devias ter por natural, fez-se despercebida, esquecida, fez-se de pequenina, que é coisa que ela não é nem tem nada, deu-te a volta parvo, e agora vais ter que perguntar-lhe quando haverá um outro passeio de moto, ou convidá-la para tomar uma Seven Up na esplanada do kartódromo, com palhinha, otário, ela sabe mais que tu, ela sabe mais a dormir que tu acordado, não viste ?

E agora já sabes, a filha não é fruto de nenhuma desilusão, desilusão apanhaste tu meu palerma, nunca mais deixas de ser parvo, só um parvo é que se põe para aí feito oráculo, a inventar adivinhas, e depois cagaste o pé todo, e ela, c’a desculpa de não saber escrever tão bem, sabe-a toda, vai-te regando o pezinho e dando a volta, vai contando a história dela, aproveitando para dar realce ao que realmente lhe interessa, é mais esperta que tu, palerma, deixa passar ao lado a conversa que não lhe interessa, quer lá saber do teu sentimentalismo meu parvo, mulheres inteligentes há muitas, tu é que não sais aqui da parvónia, não conheces o país quanto mais o mundo, e, para ser franco, que mulher no gozo das suas faculdades mentais vai dar-te conversa meu mentecapto ?

Quem ?

Não vês que a fasquia dela está demasiado alta para ti, não vês porque cegaste, apareceu-te uma mulher com M grande e desaparafusaste, entraste em órbita, vê lá mas é se compões as coisas, se lhe pedes desculpa pelas tuas parvoíces, que disso não passam, pareces um adolescente imberbe, idiota, vê lá mas é se ao menos ficam amigos, farta de aturar parvos e xico-espertos está ela, e dá-te por contente, já não perderás tudo, e vai-te iludindo que já é bem bom, e atina meu ! 

Atina !

Não queiras ser mais um parvalhão que se lhe atravessa á frente, deve estar farta disso, come-os ao pequeno almoço e risse deles, ao menos evita que se ria de ti, o que já nem seria mau, e dá-te por contente.

Faltava-me esta, não se poder rir para ti, porque é inteligente, porque é lutadora, porque é de força, porque é única, e depois ?

Que obrigação tem de te aturar ?

Já não tens avós que te gabem meu artola ?

Se alguém sabe disto é um gozo !

Inspira-te mas é nos astros e dedica-te à poesia, que é boa para entreter sonhadores, e toma juízo, entra nos eixos, não faças figuras tristes, orienta-te que já tens idade para isso, retoma a tua figura, mostra-te normal meu anormal e atina, ATINA ! Atina parvalhão !

Que ela disse mais pelo que não disse que em tudo o que escreveu !

Parvo.........

Dedica-te à poesia............

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

104 - A LIBERDADE AO VIVO.........


Ammã é linda, muito parecida com Évora nas ruínas romanas que também ali ainda se conservam de pé, as ruínas de Jerash, o próprio espólio da cidade velha, são de uma beleza incríveis.
Ficámos no Hotel Faraó, no centro da velha cidade, mesmo no centro da baixa, cosmopolita como poucas cidades do médio oriente, simultaneamente moderna na parte alta, mesmo muito moderna.
O hotel era barato mas acolhedor e muito asseado, ali voltei a encontrar muitos outros companheiros de Bagdade e também Haniko, ainda zangada com o mundo.
Matámos saudades enquanto embalámos e preparámos cuidadosamente, para uma viagem de quase dez mil quilómetros, um presépio artesanal iraquiano que eu trazia, de propósito, para um homem bom cuja colecção de presépios, mais de mil, de todo o mundo, é uma das maravilhas da terra.
Ficámos somente os dias necessários à obtenção de visto para entrar na Síria, os bilhetes de avião tinham o regresso marcado a partir de Damasco, pelo que o tempo urgia, havia à nossa frente mais quinhentos quilómetros para fazer em contra relógio e com o dinheiro a escassear nos bolsos, então sim seria uma aventura não ficarmos pelo caminho.
Apanhar um avião de Ammã até Damasco estava fora de hipótese e fora do orçamento, um carro, um táxi seria muito mais barato mas muito mais lento, na fronteira seríamos por certo retidos mais tempo que o que fôramos pelos americanos quando entrámos na Jordânia, as probabilidades de perdermos o avião eram enormes, a minha esposa tinha entrado no Hospital do Espírito Santo, em Évora, para ser operada, e eu sem qualquer nave espacial à mão.
Valeu-nos Alá, que na pessoa do Counter Agent da Air France em Ammã, o Senhor Suhail Halaseh, Senhor com letra grande, nos salvou de todas essas vicissitudes, por gentileza sua e da companhia aérea, na qual procurarei viajar o resto dos meus dias. Depois de saber a nossa história, colocou-nos num avião direitinho a Paris, sem escalas nem pagamentos suplementares. A esse homem e à Air France, os meus mais sinceros e maiores agradecimentos, nunca o esquecerei.
Foram mais de doze horas de viajem até aterrar em Lisboa, onde me esperava o meu filho, a namorada e dezenas de órgãos de informação.
A todos cedi uns minutos, para me arrepender nos minutos seguintes. Ainda as palavras não me tinham saído da boca e já estavam a ser deturpadas. Fiquei para sempre com a sensação que os repórteres são capazes de cortar palavra por palavra o nosso discurso, voltar a colá-las e colocar-nos na boca coisas que nunca sonhámos dizer.
Por essa e por outras parecidas é que hoje tenho, da comunicação social, a imagem que tenho, por essa e por outras é que a minha luta só terminará quando este livro vir a luz do dia, estou curioso em saber como vão reescrevê-lo.
Quando parti, meti férias e vi-me forçado a uma adaptação repentina a uma situação que nunca imaginara, uma coisa é o que vemos na Tv, outra, completamente diferente, a realidade. A diferença entre o que nos deram a conhecer e a verdade foi, neste caso, abissal. Hoje, refeito dessa surpresa, confesso não me ter adaptado ainda e de novo a este mundo. Estou muito mais calmo, sou quase outro, não sou decerto o mesmo.
Apesar deste testemunho, por hábito, não comento nem partilho a minha experiência com ninguém, não vejo necessidade disso, as mentiras sobre a guerra, que começaram muito antes dela, e as contradições em que mais tarde ou mais cedo todos os mentirosos acabam por cair, farão esse trabalho por mim. Limito-me a contar o que vi e vivi, em vez de armas de destruição maciça, miséria, muita miséria e um tirano destronado por Bush, um vencedor cem vezes mais perigoso que o vencido.
Hoje os iraquianos resistem, chamam-lhes terroristas, não digo que não haja por lá terroristas, decerto muitos mais que haveria antes da guerra, mas haja a coragem de lhes chamar, pelo menos à maioria, patriotas ou nacionalistas.
È certo que parti para o Iraque com o espírito de um militar, disposto a aguentar contratempos e contrariedades, não foi uma vida de lorde mas não passei fome, nem sede, não senti necessidades prementes. Como a re
stante população, que por não ter dinheiro não tinha vícios, nem com que os alimentar se os tivesse, também eu não achei falta do que não esperava encontrar, em compensação sobrou-me muito com que não contava, e isso, folgo em repartir convosco.

Humberto Baião in "A Guerra No Iraque" A Experiencia Inesquecível de um Voluntário de Paz Na Tomada De Bagdad " - Ed NossoFuturo - 2005 - ISBN 972-9060-31-2

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