quinta-feira, 23 de junho de 2016

................................... COTA 36 .....................................

“ art by Ichiro Tsuruta “ 

COTA 36

Sim, sonhei-te na amurada do meu prédio
sob as estrelas, sob a lua feiticeira
teus cabelos despertando em mim o génio
eu encostando à minha a tua cabeleira

Foi quando te abracei e segredei
dando-te dentadinhas na orelha
beijando-te a nuca
sussurrando-te,
num zum zum de abelha
cingindo-te a cintura num abraço
acariciando-te levemente o regaço
e tu
num insólito instante
de polegar em gancho repuxaste o cós
inspiraste em molde a encolher o ventre,
pegaste-me na mão, e, conduzindo-me
numa voz de fada me disseste:

- Mete a mão meu querido,
acaricia-me com doçura...

- Claro que com doçura,
que encerram carícias que não ternura ?

O pulso no teu ventre e palpitações nele
os dedos buscando onde escorregar
a carne macia, o calor quente, o deslizar
teu rosto encostando o meu
o torso contorcendo-se, bamboleando
encaixe em conchinha
o abraço apertado
segredo sussurrado
o trinta e seis sustido
e,
muito baixinho, muito leve, um gemido
gemido gozado, não sofrido
mão em concha na origem do mundo *
os dedos buscando-te em lugar profundo
profundo e profano
sou anjo bramindo
bramindo faminto
faminto do tu, de ti
tu te ti tigo
contigo
contigo no paraíso

Não, não esqueci, nem esqueço
é só o que peço
quem não pede não ouve Deus
quem não offshora não mama
mama, auréola, biquinho
sim, beijinho, devagarinho
em círculo, circulozinho
degavarinho, somente os lábiozinhos
apaga a luz
puxa o lençol
vamos brincar

desvairadinhos…

A origem do mundo”, de Gustave Courbet *
“ art by Ichiro Tsuruta “

* Em 1865, Gustave Courbet escandalizou a sociedade com "A Origem do Mundo". Este quadro realista do órgão genital feminino é considerado por alguns o mais ousado da história da pintura. Um século e meio depois, no início de Junho de 2014, a artista luxemburguesa Deborah de Robertis ganhou fama mundial ao realizar uma controversa performance perante o quadro de Courbet, exposto no Museu d'Orsay de Paris. A arte da protagonista consistiu em mostrar o seu sexo diante do sexo pintado. Por ter exposto a sua vagina diante daquele quadro, Robertis foi presa por «exibição sexual no espaço público». A arte que denominou - "Espelho de Origem" - gerou polémica, censura e notoriedade mundial.


* A origem do mundo”, de Gustave Courbet  

quarta-feira, 22 de junho de 2016

354 - AMOR, LIÇÕES PARTICULARES * ….............


À candente questão que tanto nos tem preocupado nos últimos tempos, ensino público ou ensino privado ? privado ? público ? privado ? Ninguém deu uma resposta cabal, qualquer dos lados nos atirou com areia aos olhos deixando intocável o que deveria ter sido revirado, os resultados desse ensino. Temos melhor ensino ? Privado ou público temos melhores cidadãos ? Melhores condições, melhor nível de vida, melhor desafogo económico ? Sim, porque isto anda tudo ligado, e o que vemos é uma massa de lumpemproletariado ignorante de quem os mais oportunistas se aproveitam. Oportunismo que se aprende na escola ao deixar em aberto o lugar das filosofias, da moral, da educação cívica e até sexual, da honra, do mérito, pormenores só aparentemente despiciendos e que andamos por acertar vai para quarenta anos. 

Quer queiramos quer não uma vez cá fora os nossos meninos serão avaliados a cada minuto, e, desabituados que vêem da escola, aliás até virão é mal habituados, marram no muro da realidade virtual que governos sem princípios constroem meticulosa e pacientemente há quarenta anos e onde os enrolam para depois paparem como caramelozinhos. Escola que não avalia e onde os que avaliam não se deixam avaliar nada vale, nem ela nem os que por lá andam, aprendendo ou ensinando, o resto são peanuts…

Do meu vício pela leitura de Biografias* de vez em quando deparo com tesourinhos inimagináveis, desta vez a bola branca calhou a Thomas Edison, que em criança frequentara os dois tipos de ensino e nos dois fora infeliz. Pouca gente sabe, eu confesso só agora o ter sabido, Edison acabara expulso da escola aos nove anos sendo a sua educação terminada pela mãe, uma ex-professora de origem canadense (do pai sabe-se que era oriundo da Holanda), mãe que lhe escondeu ter ele sido expulso da dita escola, que lidaria mal com alunos extrovertidos, irrequietos, curiosos, bla bla bla e ainda por cima diferentes, o catraio era mouco, tudo pormenores abundantes na personalidade do pequeno Edison. Um dos professores chegara mesmo a admitir aos pais do miúdo "ter ele bichos-carpinteiros no corpo, ser um coca-bichinhos estúpido que não pararia de fazer perguntas custando-lhe imenso aprender". 

             Parece pois que o mouquinho se acomodava mal ao estereótipo do mundo redutor e silencioso que lhe estaria destinado, há quem afirme ter ele inventado o fonógrafo devido ao facto de lhe ter ocorrido ainda criança, que a informação nem somente pelo som se podia difundir e a partir daí ter inventado com as latas de feijões um telefone, por achar que a linguagem binária de inputs ponto traço traço ponto com a qual brincava não entusiasmava. Na ocasião poucos lhe deram crédito, contudo veio a inventar e a aperfeiçoar o microfone e milhentas outras coisas que hoje damos por certas e banais, o que fez durante toda a vida e, como todos sabemos, a um ritmo completamente alucinante.

Sua mãe, em vez de lhe comunicar a expulsão confessou-lhe o quanto ele era inteligente, não podendo por isso andar naquela escola, prejudicando e arrastando os demais, obrigando-os a acompanhar o seu ritmo, e que doravante a mãezinha se encarregaria das lições dele. Acabou como todos sabemos registando ao longo da vida milhares de invenções e patentes, tudo porque a escola não lhe atrofiou o cérebro e a sua mãe, mais que ensinar-lhe inglês, gramática ou religião o ensinou a pensar, a ver, a meditar, a observar um problema e a equacioná-lo. O petiz aprendeu bem a lição e devoraria em pouco tempo toda a biblioteca que sua mãe possuía, em especial os livros sobre ciências. O resto da história já todos mais ou menos a conhecemos, ter sido o primeiro "cientista" a montar ou instalar um laboratório e a dedicar-se à investigação pura e prática de forma organizada e metódica, o que diz muito sobre ele ...

Depois da mãezinha morrer, isto passados uns bons cinquenta anos sobre o episódio em que ela, sem ele o ter sabido descaradamente lhe mentira, no rescaldo do funeral, enquanto arrumava as coisa dessa carinhosa e falecida mãe, Edison encontrou numa gaveta uma caixa com jóias de pouco valor e uma carta que nunca vira, pertences que a mãe guardara certamente por envolverem alguma recordação ou nutrir por eles qualquer especial carinho, entre eles e muito amarelecida a carta a expulsá-lo da escola, a carta com a verdade. Só então Edison se apercebeu da dimensão da vida e do amor que sua mãe lhe devotara... 

O meu obrigado a Nancy Elliott Edison, que provou ser uma professora de verdade, e o meu reconhecimento a Thomas Alva Edison seu filho, um aluno exemplar, tal qual as nossas escolas, o nosso ensino e os nossos catraios não acham ?????? 

* http://mentcapto.blogspot.pt/2013/11/171-o-sabor-da-maca.html
http://canalhistoria.pt/blog/biografia-de-nancy-elliott-edison/

sexta-feira, 17 de junho de 2016

353 - DEZ RÉIS DE MEL COADO ............................


DEZ RÉIS DE MEL COADO

(poema esdrúxulo)

Persignei-me a teus pés como ante alma divina,
para, logo depois, numa fé arrebatadora,
gizar genuflexão destrambelhada desta devoção,
abraçar-te pelas pernas, que te tremem,
martirizando-me, escutando-te o sagrado ventre,
farejando fruto sabido saber a maçã verde,
suponho que verde de madura,
de casca ligeiramente grossa, levemente ácida,
a tal que entre todos os pomos e pomares prefiro,
fruto maduro e proibido com que deliro,
para mim delicioso, maturo, primo,
fruto sagrado, pesado, quilo, quimo, chymo,
qui provoca avidez, sofreguidão, na digestão,

E tu, luciferina ? tu sobre mim ?
serei o docinho que apregoas ?
sou mel ? gostas de mel ?
ok, está bem, senão…

- P’ra ti dez réis de mel coado !   

Humberto Baião, Évora 15 de Junho de 2016

quinta-feira, 16 de junho de 2016

352 - SENO, COSSENO, TANGENTE, BISSECTRIZ

             Foto do meu amigo César Almeida, Torre Mirante de Geraldo Sem Pavor

Os nossos caminhos estavam traçados. Por isso ainda antes de nos conhecermos uma bissectriz marcou-nos a sina. Soubemo-lo somente muitos, muitos anos depois, todavia tudo aponta para a hipótese dos nossos destinos terem sido marcados nesse dia e tocados à tangente, pelo que calculo terem os astros traçado nos céus órbitas e revoluções de raio envolvente, girando tresloucados em torno de um eixo imaginado que nos arrastou a ambos num turbilhão cujo perímetro, de diâmetro ajustadíssimo, fora desenhado singularmente para nós por uma revolução candente no cosmos infinito. Atesta-o o produto final e algoritmo extraído de senos, cossenos, catetos e hipotenusas deste teorema que unidos levamos de rompante e vivenciamos.

Dois anos depois desse breve e incógnito encontro, dessa Secante cuja Corda esticaríamos até ao limite, um fantástico e vero choque de Titans e para estas duas alminhas a amplitude duma epifania, a vida alterou-se-nos com a brusquidão que somente um Buraco Negro pode forçar. De um ângulo obtuso passámos a recto, depois agudo, agudíssimo, um ângulo notável apesar de tudo e das circunstâncias, lançando-nos vogando ao sabor do acaso no céu estrelado e nesta Láctea galáxia, fundindo numa duas vidas próprias, doravante integradas num sistema ponderado pela mediatriz a que apesar das fugas, dos trejeitos, dos sólidos rombos e dos rectângulos equiláteros nos submetemos com amor.

Não lembro já que fazia eu no Castelo de Geraldo Sem Pavor naquele dia de martírio do Senhor, lembro que descia as apertadas e helicoidais escadas em diagonal, enquanto ela, em passo compassado de compasso, era uma das estrelas duma miríade de escoteiros, lembro-a tal como se hoje fosse, não exclusivamente a ela, antes toda a constelação, o Chefe de Quinas, o Piteira, vermelho então, vermelho inda hoje e que alvoroçados essas escadas subiam enfileirados e apressados. Ela tocou em mim, ombro no ombro, cotovelo no cotovelo. Por isso a lembrei sempre afincada e vagamente como uma Anã Vermelha pois assim a vi desde o primeiro momento, como Próxima Centauri, cujo fulgor se incendeia há mil milhões de anos, ao passo que eu, lembro e relembro, confiro e reafirmo esse encontro de Cometas cuja áurea ou halo haveria de partilhar e de onde nasceria este improvável par de Quarks Top, sim, porque destinados a casar, como realmente casámos e a ser felizes como todos os amantes são se da nossa dimensão fizermos fé.

É portanto a união destes dois Quasares, a quem o alinhamento dos astros nas suas trajectórias elípticas favoreceram e abençoaram que quero celebrar hoje, dois Quasares unidos numa Super Nova cuja duração e brilho desde o início geraram. Afirmo-o agora com legitimidade, livre de suspeitas e de infundadas dúvidas. Tal como Copérnico, Giordano Bruno, Galileu, Kepler, Newton, Einstein e tantos outros haviam de profetizar, as leis do universo são para serem cumpridas e se cumpriram, são universais e nós, pó das estrelas, duas vidas que se cumprem e testemunham o que lendo estais.

Louvado seja o Senhor.

fotos minhas :(



                       
             
       



terça-feira, 14 de junho de 2016

351 - SONHO ENEVOADO ........................................


SONHO ENEVOADO

Pois foi, sonhei contigo
foi quase um sonho molhado
entre risadas, lavava-te o umbigo
tê-lo-ia lavado, não tivesse ele acabado.

Ele o sonho, não o umbigo
como só num sonho acontece, ubíquo...
avançava rindo, destravado
no fim forçado, parado, como um veiculo.

Brincávamos ensaboados
tu bem disposta, e bem roliça
formas redondas, lugares sagrados
eu p’ro alarve, pela derriça…

Precisamente porque parou
tu, ou eu; agora não, não não, não pares
foi aquele não pares, que me acordou
pois, pára de me acordares...

Humberto Ventura Palma Baião - Évora, 14 de Junho de 2016