segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

743 - EM TENTÚGAL OU EM PORTUGAL ...



                                                   PORTUGAL


Como em qualquer outro lugar

moscas poisam sobre merda,

rodeiam-na, sobrevoam-na,

tecendo sobre ela considerações várias,

individualistas,

invariavelmente párias.

 

Pronunciam-se, opinam, aconselham,

ordenam sem referências nem consequências,

mera questão de competências,

todos falam,  todos cagam,

sem saber de quê ou porquê

sentenças e postas de pescada.

 

Nunca por nunca almejando ver a causa,

vêem o monte, a bola, a bosta,

a consequência chega-lhes,

são estas as moscas da minha terra

seja ela Portugal, Évora ou Tentúgal.

 

Quanto ao país esse, não ata nem desata,

nada, regride alegremente, cegamente,

e testa-se inconscientemente,

sem pensar, nunca.

 

Aqui nada mexe, nem um neurónio

desde que há quinhentos anos

Pedro Nunes inventou o Nónio…

 

Humberto Baião – Évora – 27 / 12 / 20231





 

segunda-feira, 20 de dezembro de 2021

742 - ETAPAS, UMA (E)TAPA DE CADA VEZ ........

 


          Quando entrei entrou comigo uma alegre disposição, primeiro porque nada de lacados, de Pladur, de aglomerados, de fórmica, de parece que é mas não é. Ali tudo é real, tudo evola qualidade, classe, distinção e diferença. Depois fui surpreendido pois se me meteu na cabeça aquela cantilena do

- Alecrim, alecrim aos molhos …. blá, blá , blá

https://www.youtube.com/watch?v=BKxUxyQxBog

nem podia ser de outro modo e ainda nem tinha franqueado a entrada já um olor me acicatava os neurónios como um físico excita os átomos. Era uma vera curiosidade o que ali nos levava, já que por uma questão de meia dúzia de dias falháramos a inauguração. Mas vera dizia eu e confirmo, a vera verdade, e não a minha prima Vera, nada de confusões, não me metam em trabalhos já agora e por favor…

Ia eu dizendo que além de para lá irmos correndo, ainda parecia pairar por ali uma espécie de génio da lâmpada que nos pegava pelos narizes e nos atirava portas dentro,




maravilha, foi quase como entrar na caverna de Ali Babá, não que fôssemos para roubar o amigo Alexandre Barahona, aliás um perigo, o melhor mesmo é tê-lo do nosso lado, na mesa, digo na cozinha, e já agora numa qualquer contenda pois o homem sabe o que faz e melhor ainda por onde há-de pegar-nos.

A caverna é realmente convidativa, tão convidativa que fiquei ali com eles e com a Fátima até muito depois do almoço, discutindo aquela questão do Platão, se viria se não viria, se veria se não veria. O problema metafisico das sombras e da realidade durou e durou, muito mais que as (e)tapas que o Alex nos propõe em doses, de 3, de 5, não sei se de mais porque cada uma é melhor que a outra e ninguém tem tanta barriga assim, embora a coisa nos regale os olhos, e muito mais ainda o palato. Mas o culpado de tanta oratória terão sido os vinhos, alentejanos quantos estavam na mesa e foram muitos aqueles com os quais honrámos os deuses.

O espaço não é grande, mas é ideal, é intimista, barrado numa cor quente que nos agasalha, e está extraordinariamente decorado com requintadíssimo bom gosto. Olhei para cima, para baixo, para os lados, e nada me chocou, tudo se conjugava harmoniosamente. As mesas, as cadeiras, ali não há imitações, tudo é genuíno, fixem esta palavra, genuíno. Todos os pormenores vincam a sacralidade do lugar e efemeridade da vida, a necessidade de travar, de parar, de pensarmos em nós.

Não vou massacrar-vos com o inventário extenso, lato e aborrecido do mobiliário ou da decoração, basta que se fixem nos pormenores, a iluminação, os bibelôs de que vos falarei, das paredes ao chão que pisamos tudo se conjuga, tudo emparelha, não havendo contrastes que nos choquem, antes uma aura de paz e harmonia que nos convida a entrar, a ficar e a voltar.

 

     Foto da entrada do ETAPAS, situado nas traseiras do antigo Rest. Taco.

 

Sim porque ali tudo é diferente, da comezaina ao mais pequeno pormenor. Nem vos conto como fiquei deslumbrado com os sabores que me assaltaram o palato, sabores e odores que me trouxeram recordações de quando eu gaiato e não só, dos meus “passeios” por África e pelo Médio Oriente, salsa, tomilho, pimentão, coentros, gengibre, erva-doce, ou não estivesse ali subtilmente todo o Alentejo, o mundo, a história trágico marítima, pimenta, funcho, pimenta rosa, canela, noz moscada, pimenta branca, as hortas do meu pai em Monsaraz, a meio da Guadiana uma, agraço, alecrim, rosmaninho, e em S. Miguel de Machede outra, há mais de cinquenta anos, e num repente todas essas lembranças ali no prato, poejos, açafrão, orégãos, hortelã, sálvia cebolinho, tudo ali nos excitando olhar e paladar.

Farto de enfardar procurei a casa de banho, pequena mas asseada, e, surpresa ! Um pormenor a dar-lhe aquele toque pessoal que o Alexandre, tal qual Midas, deixa em tudo que toca. Fiz, sacudi, voltei para a mesa e sussurrei-lhe:

 - Alex, quando andar aqui por estas bandas e me apertar a vontade não estranhes, a casa de banho está tão bonitinha que virei cá só p’ra dar uma mijinha !

 


Verdade verdadinha !! Ele são as folhas de palma frente aos teus olhos enquanto te alivias, os caracóis de loiça subindo pelas paredes enquanto almoças ou as borboletas de porcelana esvoaçando por aquela banda se calhou escolheres a mesa do canto, em boa verdade nem só a comidinha te alegra o dia, tudo foi pensado ao pormenor e tudo foi tido em conta.

Isto as conversas são como as cerejas ou as cerejas como as conversas, e eu escrevo como quem está de novo almoçando naquele Palais Du Plasir pois à memória me chegam as sensações então sentidas e hoje concluo que aquilo não foi um almoço porque ali não vamos empanturrar-nos como bons alentejanos que somos, mas sim viver uma experiência sensorial única que através do palato estimula umas células que eu nem sabia ter. Mas o Chef sabia, sabia e sabe, vai daí andou brincando com as minhas células de Langher, umas células que mexem com a sensibilidade e que alguns animais têm muito mais desenvolvidas que nós, são umas células gustativas que eles e nós humanos temos, que explicam a sensibilidade na boca e que o Chef, com a sua matreirice, as ervas aromáticas, condimentos e especiarias nos troca as voltas.




As células de Langher estão comprometidas com a sensibilidade táctil e térmica, o que na boca faz toda a diferença, aliás eu já disse que o que distingue o “Etapas” dos outros restaurantes é precisamente a diferença, o pormenor, a experiência sensorial, o ambiente anormal, inusual, no sentido em que é acolhedor, mais que acolhedor amoroso, tivesse eu menos cinquenta anos e tinha saído dali p’ra ir fazer filhos creiam.

Até a sobremesa tinha que ser diferente ! Doce caseiro, feito em casa, fait à la main. Já não se via nada assim desde o rapaz do cubo mágico. Toques, malabarismos do Chef, pormenores que nos tocam o coração e nos deixam com a lágrima ao canto do olho por tanto amor à cozinha, à restauração, à profissão, aos clientes, ao trabalho, que não é vergonha, antes liberta como todos bem sabemos.

Sublime foi a sobremesa. Não sei bem o que era mas era bom, tão bom que até estalava na boca, soube-me muito bem, confesso que soube, e sorri, foi então que os malandros, ao ver-me sorrir, trouxeram uma bolsinha de veludo preto como aquela onde normalmente guardo as jóias e, naturalmente fiquei estupefacto ! Claro que agradeci ! Não esperava a surpresa, mas como estamos no Natal e em maré de ofertas…

Mas não, não era p’ra meter ao bolso, era para abrir os cordões à bolsa, porém, ao contrário do que temi foi uma agradável surpresa, vivi uma experiência do caneco, num ambiente requintado, diferente, atento ao pormenor, cuidado, verão depois o esmero com que cada prato vos é apresentado, um milagre em pleno centro histórico, uma ilha paradisíaca rodeada por todo um continente de restaurantes onde se cozinha mais do mesmo de sempre, e acreditem, não paguei mais por isso.

Só fiquei com pena de não ter trazido a bolsinha de veludo, tão macia tão macia quase tão macia como as caricias que tinham acabado de me mimar o palato.

 


https://www.youtube.com/watch?v=Da_K59BeHWw

https://www.facebook.com/alex.barahona.319

https://www.facebook.com/etapasrestaurante

 










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terça-feira, 14 de dezembro de 2021

741 - MUDAR ? AS COISAS JÁ ESTÃO TÃO MÁS...




002 /

« Mudar para quê, se as coisas já estão tão más ?  »


Évora é bela, mas não é a mais bela cidade do mundo, Évora é pobreza e caos, Évora é ilusão para turistas.

 

Évora não é minha nem a minha preferida. Se eu fosse Stendhal diria que Évora é uma dádiva de Deus, para que não tenhamos saudades do paraíso.

 

Évora não existe.

 

Não existe como existem outras cidades na minha vida e lembrança. Cidades belas, imensas, previsíveis, habitáveis.

Évora assusta e deslumbra, porque nos enfeitiça e nos sentimos esquecidos se nela vivemos, e com ela ficamos deslumbrados se a visitamos.

 

Os eborenses são dogmáticos e intolerantes, bairristas e seguidistas, cruéis e sofredores ou sadomasoquistas.


Nem parecem humanos.

Entre as mulheres algumas escapam.

 

A cidade divide-se, não em duas mas em sete, tantas quantas as colinas de Lisboa, ou de Roma. Sete, tantas quão os partidos com assento na AR.

 

Para além disso encolhe, e encolhe-se na vasta, bela e sublime planície sem fim, onde poderia ter tido lugar o começo de um futuro que nela nunca é presente.


Porque em Évora nunca houve, não há e jamais haverá lugar para oportunidades de sonho, aqui sonha-se com uma qualquer oportunidade.

 

É o nosso pesadelo…

 

https://pt.wikipedia.org/wiki/Sete_Colinas_de_Lisboa

https://pt.wikipedia.org/wiki/Sete_colinas_de_Roma




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740 - RECORDANDO PÚBLIO OVÍDIO NASO


 

001 /

Recordo Ovídio ;


«Recebe esta dor, 

porque aprenderás alguma coisa com ela»


É Natal, 

período que potencia a dor com a qual nada aprendi até hoje. 


Freud falava da melancolia, 

como luto e incapacidade de superação da perda.


Não é a melancolia que me mata, é a ausência ...


Bom Natal a todos.



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terça-feira, 30 de novembro de 2021

FERNANDO PESSOA, UM LIBERAL À DIREITA.

 


739 - FERNANDO PESSOA, UM LIBERAL À DIREITA
.


FERNANDO PESSOA - reflexões sobre estética e ética da sua obra  “PAGINAS DE ESTÉTICA E DE TEORIA E CRÍTICA LITERÁRIA”

 

Nesta obra que por milagre me veio parar às mãos num alfarrabista, de Fernando Pessoa estão reunidos alguns fragmentos dispersos do seu pensamento, por vezes escassos mas contudo autênticos e geralmente condensados de modo brilhante.

 

Pelas suas características e necessidade há muito procurava este livro, naturalmente esgotadíssimo pois é raro que sejam reeditadas obras que garantam pouca saída e ainda um menor lucro comercial. Uma pérola a cujo estudo me dediquei de imediato.

 

Trata-se de fragmentos esparsos do pensamento de Fernando Pessoa (F.P.), um pensamento que todavia parece nunca ter fim. Folhas soltas, agendas, cadernos, em tudo que tinha à mão o mestre F.P. escrevinhava e anotava o que lhe ia na alma. São esses fragmentos dispersos do seu pensamento, que agora, bem aglomerados ou condensados, que diria mais parecendo nunca terminarem.

 

Ainda que soltos, o trabalho dos feitores do livro foi precisamente juntarem-nos por temas, estão como disse brilhantemente interligados, constituindo uma torrente de pensamento, ou se quiserem uma corrente, quer dedutiva quer intuitiva, mas sempre tecendo uma tal rede de relações entre si que nos permitem sem qualquer margem de erro formular ou formatar a partir deles a sua concepção ética.

 

Ética por ser sobretudo de estética e crítica que a obra trata, e onde vimos críticas estéticas vimos análise, quantificação já que, quer a crítica quer a avaliação estética implicam uma escala de valores, uma apreciação, uma comparação com, uma medição a partir ou baseada em, sendo esse “em” o conjunto de valores ou regras, entre eles os éticos, os da moral, que enformam a apreciação crítica e acabam por sobressair numa obra não especificamente a eles dedicada.   

 

Fragmentos sim, mas que porém nos permitem formular acerca de si, dele, uma unidade, uma coerência, aliás consentida pela repetição obsessiva dos temas, de citações ou fórmulas que, inda que fragmentadas e tão esparsas quão escassas, nos desvendam contudo a unicidade, o rumo, a raiz do seu pensamento. São de tal ordem que poderei dizer estar F.P. a mostrar-nos a raiz escondida do seu pensamento mais íntimo que, ainda que abstracto, não se desvia do raciocínio puro, especulativo, abrindo-nos a alma, coisa a que parece anuir.

 

Foi o facto de parecer desejar que possamos observar o seu pensamento, ético e estético, mostrando-nos ou permitindo-nos reconhecer nele Fernando Pessoa a existência consciente que tem da importância do seu papel, dessa sua missão espiritual pois conhecia-se a si mesmo, sabia o seu próprio valor, sabendo como influenciar, tendo consciência de que influenciaria as gerações futuras, e como tal entendia que devia doar à humanidade o produto do seu génio, que me levou, primeiro inconscientemente, depois com acutilância a dar atenção a ele, pensamento, tanto quanto às expressões por ele tidas ou demonstradas, e que me levaram a compará-lo com uma outra personalidade ultimamente muito em voga, ultimamente muito reconhecida, diria que finalmente reconhecida e respeitada, tanto quanto o foi e é Fernando Pessoa.

 

Passaram quarenta e sete anos sobre o 25 de Abril, o qual não só se limitou a derrubar um regime e uma elite aos quais a maioria dos portugueses não dedicava apreço, para não dizer pior, quarenta e sete anos durante o qual se malhou nesse regime a despeito de tudo e de nada sem contudo o tentar perceber, estudar ou perceber. Os portugueses apercebem-se agora, lentamente é certo, que o dito regime tem as costas largas e tudo que é culpa lhe é atirada acima, em especial do elemento ou personagem que mais personifica (desculpem a redundância) esse regime e à frente do qual se manteve durante mais tempo, António de Oliveira Salazar.

 

Certamente de forma não inocente nem negligenciável A. O. Salazar ganhou há poucos anos um concurso da RTP destinado a premiar o português mais ilustre e competente da nossa história. Para surpresa de muita gente e apesar de tanto malharem nele António de Oliveira Salazar ganhou folgada e exuberantemente a contenda. Parece ter sido a partir daí que as consciências se abriram e procuraram analisá-lo de modo coerente, e em especial comparar a sua acção com os feitos da nossa recente democracia, pleito que uma vez mais António de Oliveira Salazar parece estar a vencer sem concorrência. Com efeito, se comparadas as realizações de trinta e seis anos de governo Salazarista com os quarenta e sete que esta democracia já leva ninguém poderá duvidar que fomos enganados. Esta democracia não presta, nem merece chamar-se democracia.

 

Fernando Pessoa conhecia o seu próprio valor, tinha consciência dele, pois sobre tudo reflectia conscientemente estando cônscio da sua superioridade intelectual e cultural, podendo com justiça aferir-se a partir desses “fragmentos” existir nele uma sede de imortalidade que aliás se encontra plasmada também nas páginas de “Erostratus” e de “Impermanence”.

 

E pergunto eu, não se tornou ele e imortal ? Ele e os seus heterónimos ? Ele e o seu pensamento ?

 

Prendeu-me a ele em especial um pensamento alusivo ao génio e ao talento citado na página oitava (XIII) da introdução, muito p’lo modo como ele admirava o génio, em especial os grandes génios da humanidade, ora vejamos;

 

A essência do génio é ficar incompreendido na própria época e ser descoberto pela época seguinte, prevendo assim o seu próprio destino.

Cada época reage, diz-nos Fernando Pessoa, contra as fórmulas mortas da época precedente e venera os génios que, nessa altura viveram em oposição ao seu tempo.

O que o génio pode esperar dos seus contemporâneos, é o desprezo: e quanto mais nobre o génio, menos nobre o destino.

 

E não foi assim com Salazar ? Não o ignorámos primeiro pra o desprezar depois ? Não foi ele, mais que incompreendido, escondido dos portugueses por outros portugueses ?

 

Fernando Pessoa era extraordinariamente dedutivo e perspicaz, e a sua exposição, a sua expressão escrita, o seu legado, é quanto a isso mais que suficientemente esclarecedor.

 

Segundo Fernando Pessoa o homem génio é aquele que supera a sua época por estar em oposição a ela, dividindo os homens em superiores e inferiores, com os génios acima da espécie enquanto os restantes são os ignotos, “meros componentes da massa ignara”, havendo que colocar entre os génios e o povo uma barreira que ele nunca possa transpor…

 

Não esteve Salazar sempre acima de tudo e todos ? Não estabeleceu ele uma barreira entra a massa ignara e o poder que representava, que exercia  ?

 

Certamente F. P. nos deu neste testemunho uma concepção mítica mas desumanizada do génio, porém outros escritos nos ajudam a conjugar esta sua concepção antidemocrática com a pouca fé por ele tida na democracia.

 

Todavia nunca existiu a mínima dúvida de que Fernando Pessoa era um patriota, definindo Portugal como criador de um elemento básico da civilização moderna, o universalismo, ou a universalidade, pois demos mundos ao mundo, mas de igual forma é capaz ou foi capaz de certeiramente acentuar a nossa pobreza cultural caracterizando exemplarmente o provincianismo mental português, mal de que infelizmente ainda padecemos.

 

 Quanto a ele seríamos e somos uma espécie de adjacência civilizada da Europa, e que somos não um país de poetas como dizem os idiotas (palavras dele), mas um país de mandriões. Neste item daremos igualmente razão a António Sérgio que de idêntico modo nos classificou, item que é corroborado pelos estudos que Hernâni Cidade nos deixou sobre nós enquanto povo.

 


O prefácio de Georg Rudolf Lind e a participação de Jacinto Prado Coelho e outros valoraram imenso esta obra, já de si muito hermética, como são muitos dos pensamentos de Fernando Pessoa, digamos que as suas colaborações são valiosíssimas no contexto e conteúdo que o livro aborda.

 

Despertou sobremaneira a minha curiosidade uma carta de Fernando Pessoa a Marinetti* (o futurista) em que afirma categoricamente;

Se houvesse que sacrificar um povo, isso significaria a perda para sempre de um aspecto multitudinário da existência e, por este motivo procuro o nacionalismo com um propósito puramente ultranacionalista” … (in a History Of a Dictatorship, Cap. VII nº 12)

 

Do que deduzi ser Fernando Pessoa um ultranacionalista nacionalista, classificação que sobre Salazar assenta maravilhosamente e metodicamente tem sido nas últimas décadas malhada sobre a sua memória.

 

A dado passo interroga-se Fernando Pessoa acerca das qualidades do homem competente enumerando-as;

Conhecimento

Espírito imparcial

Objectividade

Isenção

Competência

Responsabilidade

 

Ora basta compararmos estas qualidades com o perfil de Salazar e o de qualquer um dos nossos ilustres e democráticos políticos para formularmos um juízo de valor em que, sem qualquer dúvida Salazar sairá a ganhar

 

Definindo a injustiça como a justiça dos fortes e caracterizando o homem de hoje como diminuto, e que gradualmente cada vez mais governar é administrar, guiar, Fernando Pessoa reconhece contudo colocar-se-nos desde o século XX um problema fundamental, conciliar a ordem, de âmbito intelectual e impessoal, com emoção imaginativa dos tempos recentes, o que considerava de todo muito difícil, se não impossível. Todavia, numa época em que o mundo esteve conturbado como nunca aconteceu nos tempos recentes, o génio de Salazar soube conciliar esse problema, talvez não de forma magistral mas no mínimo satisfatória. Ao invés, em quarenta e sete anos de paz e bonança temos feito da vida do e no país uma tormenta…

 

Hoje, digo eu, o sonho de governar, administrar, guiar, está reservado a bem poucos eleitos, e como razão e emoção tendem a contrariar-se, a combater-se, arrogo-me nesse capítulo o direito de encaminhar os meus amigos e leitores para os livros do casal Damásio, António e Hanna Damásio, especialistas no item, certamente gostarão de saber a opinião deles. Fica o link **

 

Que preciosismos e ensinamentos extraí do livrinho ? Que a nossa direita andou cega e perdida durante quase cinquenta anos, tendo sido incapaz de alinhar entre as suas figuras históricas uma personalidade impar como foi Fernando Pessoa.

 

Não tenho a menor dúvida ter-se tratado de um nacionalista, liberal e politicamente alinhado à direita. Folgo com isso, tanto quanto me entristece confirmar que a inteligência e a cultura nunca foram preocupação dos nossos dirigentes ou figuras politicas alinhadas à direita.

 

Do pequeno CDS poderia até dizer-se nem saberem quantos por lá andam o que seja a práxis da democracia cristã. Certamente andarão, há quase meio século, com a preocupação centrada nas herdades que perderam durante o Prec, decerto não no futuro e muito menos nos outros como compete a qualquer bom cristão.

 

Razão tinha Fernando Pessoa que dividia os homens em superiores e inferiores … Massa ignara dizia ele… 


* https://pt.wikipedia.org/wiki/Filippo_Tommaso_Marinetti

 

** https://expresso.pt/premio-pessoa/laureados/2010-10-31-Laureado-Premio-Pessoa-1992---Antonio-e-Hanna-Damasio


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