domingo, 16 de agosto de 2015

267 - PAF ! TRUZ CATRAPUZ !! * ...........................


PAF !  TRUZ  CATRAPUZ  !!

Oh ! como é linda aqui a vida para qualquer janota
ou idiota…
facilitaram-te as coisas não foi meu zelota  ?

Grande idiota, sem chumbos, sem notas
que só cresceram em ti como no feijoeiro
o tal, o da história de pirlimpimpim
uma ignorância sem fim numa lembrança sem memórias

Agora  cresceste meu artolas e são outras as histórias
histórias escritas por quem  sabe contar, por quem vence e pode
mas que sabes tu disso agora ?
agora que nem sabes o que não sabes?
que nem sabes metade do que devias saber

Depois queixas-te e dizes ser enguiço
ou nervosismo dos últimos minutos
porque o teu clube perdeu aos penaltis
e tu já nada tens  a perder, aliás já não tens nada

Nem nunca tiveste, nem neurónios nem axónios
tens um lombo para a canga
calejado desde o primário, fortalecido no secundário
ao consolidares o caracter, a personalidade
aí começaras descurando as matérias

Apontaste então a vida às asneiras
a traçar uma carreira, de contratado
de precário, de desempregado
de parvo, de parvalhão, eu sou Baião, e tu ?
meu morcão, meu sabichão
sabichão das dúzias
só desconheces como não levar na fúcias
nas trombas

Só não sabes como sacudir o jugo,
a canga que aguentas de cara alegre
de pateta alegre
podia ser Porto Alegre, ou Portalegre
não, para aí não, é lugar sem poesia
e a emenda pior que o soneto sairia
pena não  bazares sei lá pra onde…
nem saberes quando nem quem nem onde
nem  onde fica a Quinta do Conde, ou Vila do Conde

Foi aí que começaste, mas abre os olhos mula
interioriza, relativiza, radicaliza,
aqui não tens futuro nem salvação
nem pão, nem paz, nem habitação,
porque aqui jaz, jazz & bombo
sempre em festa, aqui e em S. Mamede de Infesta
onde também não presta a ementa, o menu
nem tu, mesmo que leves no cu
tu, primo exemplar do homem analógico digital
ou transexual

Sim, nesta democracia podes ser tudo e coiso e tal
mas preferem-te menos lógico meu animal

* Humberto Baião , Évora, 15 de Agosto de 2015 (num guardanapo de café)

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

266 - O QUE DISSE MOLERO *.................................

              

             
Todo o mistério se resumia a um pequeno raminho de hortelã encontrado sobre o banco traseiro da W Kombi dos biscates. A história tem destas peculiaridades, tão aparentemente insignificantes quanto inofensivas ou desinteressantes, contudo todavia mas porém, são elas muitas vezes a ponta do fio que se enrola ou desenrola como um novelo por toda a meada.

À excepção de um insuspeito, ou suspeito raminho de hortelã entalado entre as costas e o banco corrido da W Kombi e que Molero não sabia justificar, nada mais havia a acrescentar, assim terminava o relatório.

Tinha sido arquivado claro, determinara-se após cuidada averiguação, conforme consta nos autos, que o arguido não passava de um pobre diabo, um gato-pingado, eu seria mais preciso e afirmaria tratar-se dum fura-vidas. Concluíra-se dessas mesmas averiguações ser pacífico que o arguido comummente vociferara contra o Estado, todavia menorizaram-se essas ilicitudes criminais em virtude (eu teria antes apelado à falta dela), da ausência de amor-próprio e patriotismo, já que contudo o sujeito em questão nos autos de averiguação;

Um; não possuía cadastro, cousa decididamente abonatória em seu favor e muito valorizada na sociedade corporativa em construção

Dois; vociferava por hábito e permanentemente contra tudo e contra todos, pior que aquilo só mascando tacaco

Três; sobrevivia de pequenos trabalhos ou ganchos, vulgo biscates, que a vizinhança com condescendência lhe atribuía, sendo que o café onde a atitude anómala se verificara e assinalado na denúncia era a única morada que se lhe conhecia, de resto incerta, constituindo aquele lugar poiso certo conhecido, tendo alguns dos indivíduos que lhe entregaram trabalhos a realizar confirmado terem pago os mesmos com notas de vinte escudos, não ficando todavia determinado se novas se usadas dado ter passado já algum tempo sobre o assalto ao Banco de Portugal e também sobre o dito e referido pagamento ao sujeito nomeado Molero, cuidando-se ser essa a razão pela qual pagaria diariamente as bicas com um nota de vinte escudos, inusual, concedemos, contudo em flagrante contraste com as afirmações constantes nas denúncias anónimas e que relacionam o individuo em questão com os acontecimentos ocorridos na agência do B.P. na Figueira da Foz em 17 - 5- 67.

Quatro; na completíssima inspecção e analise à citada camioneta dos biscates, veiculo registado na DGV sob o nº de matricula CE-56-02, de marca Volkswagen, modelo Type II flatbed, nada foi encontrado que permita intuir ou estabelecer qualquer ligação com base em prova legal, e juridicamente aceite , ou quaisquer outras razões que permitam ligar os factos ocorridos e que culminaram na sua apreensão,  como tal foi o dito e citado veiculo devolvido ao seu legal e comprovado proprietário, já que em momento algum era passível estabelecer-se uma relação de causa efeito entre o dito cujo raminho de hortelã e a discrepância de factos verificada. O veiculo estivera parado ou saíra no dia do assalto á dependência do banco de Portugal na Figueira da Foz ?

Esse era o busílis da questão, e os inspectores detestavam ser comidos por parvos, que é como quem diz, que lhes comessem as papas na cabeça. O citado Molero puxando de notas de vinte escudos todos os dias quando até ali mendigava a bica dia sim dia não e protelava o pagamento da mesma para depois do almoço ou logo ao jantar ? Ali havia gato. Que o deixassem ir mas mantivessem sorrateiramente aquele fura-vidas debaixo de olho, tanto mais que o facto de ele ter deixado de apresentar as vintenas para pagar as bicas desde que os interrogatórios destinados aos autos de averiguações tinham tido início, era a prova provada de que ele era culpado.

O inspector Bonifácio, inspector de terceira classe há quinze e chefe de brigada perfazendo vinte e dois anos no activo franziu o senho e ordenou:

- Dêem-lhe tempo, tempo e espaço, mas não lhe tirem os olhos de cima, esse bardamerda anda a gozar connosco e eu gozar só na cama e com mulheres mais novas que ele, a esperteza desse merdas vai ser a morte dele, pela boca morre o peixe. Há-de falar, ou eu não me chame Bonifácio.

Todavia, contudo, fiquem porém registadas as afirmações do que disse o arguido Molero quando mui exactamente afirmou não ter sido usado o referido veiculo na última semana, o que é contraditado pela prova nº 1, o tal raminho de hortelã, fresco, viçoso, isto é colhido há menos de um dia, que foi por nós encontrado (e citado atrás nos autos) entre as costas e os bancos corridos da viatura, o que contraria as alegações do suspeito, inda que não passe de uma prova circunstancial e como tal passível de ser rebatida por qualquer advogado de meia tigela ou até mesmo ignorada por qualquer douto e excelentíssimo juiz em quaisquer tribunais, portanto esta inspecção limitou-se a registar a prova, a qual no futuro poderá ou não vir a tornar-se importante e necessariamente utilizada, o que será consensual, quer como acusação quer como prova.

Nada mais havendo por agora, sublinho por agora, a acrescentar, aos dezassete de Junho do ano da graça de mil novecentos e sessenta e sete, pelas 22:30h é encerrada esta averiguação e inspecção e delas passados estes autos que vão superiormente assinados por mim, chefe de brigada da PIDE e inspector de terceira classe.

A marosca montada em segredo e em redor de Molero nem demorou duas semanas que não surtisse efeito. Um sujeito engomadinho, moreno, porte atlético, cabelo curto à escovinha, à rufia, e cujos modos diga-se de passagem contradiziam o fato e gravata esmerados, apareceu um dia no café, segredou qualquer coisa ao ouvido do Molero e este, sem largar um pio, passou-lhe as chaves da Kombi para as mãos. Evidentemente o nosso engravatadinho engomadinho não mais deixou de ser seguido.

Vimo-lo entrar e abalar aos solavancos de embraiagem debaixo do telheiro de onde o Molero afirmara a carripana nunca sair, parou demasiado tempo na bomba de gasolina e no café anexo à mesma, pelo que mal partiu um de nós foi averiguar enquanto os outros se lhe mantinham no encalço sem o perder de vista.

Metera dez litros de gasolina, (refira-se que de acordo com os catálogos do modelo Volkswagen, Type II flatbed teriam ficado com autonomia pra muito mais de cem quilómetros mesmo em circulação urbana) e fizera um telefonema (um nosso homem ficou encarregado de posterior visita aos CTT afim de averiguar o nº marcado e o destinatário, bem como a localização deste último), e tomara uma bica, totalizando a despesa vinte e dois escudos e cinquenta centavos, importância que quitara com uma nota de quinhentos escudos, pois o balconista lembra-se bem da dificuldade para lhe arranjar troco, UMA NOTA DE QUINHENTOS ESCUDOS ????????? Mas esta investigação só lida com notas demasiado grandes e demasiado novas para as despesas que pagam ?

O Asdrúbal ligou para a central, para o inspector de terceira classe e seu chefe de brigada a dar conta dessa estranha e peculiar ocorrência tendo ouvido de resposta:

- Eu sabia ! Eu tinha razão ! Não os percam de vista a esses dois ! Ali há gato ! Eu não me chame Bonifácio caralho !

O quê ? Que diz você Asdrúbal ? Repita lá isso homem !

- É como lhe disse senhor inspector, achei estranho apenas, o nosso homem levar colocado sobre a orelha direita, quero dizer entalado na aba da orelha um raminho de hortelã, ao principio ainda julguei que fosse manjerico embora não seja o tempo deles mas… A gente habitua-se a ver de tudo não é senhor inspector ? Depois quando me aproximei dele p’ra ver se bispava o nº que discara (ele tapou-se com as costas) cheirou-me a hortelã, olhei bem e lá estava um raminho fresquinho todo catita por cima da orelha do bicho, quero dizer do dito cujo sujeito engomadinho.

- Siga-o sem que ele dê por si Asdrúbal !

Chefe, eu fiquei a pé no café para lhe telefonar, quem o seguiu foi o agente novo, o Camilo, aquele agente novo do norte, acho que de Mortágua, ele e o Resende a dirigir as operações.

- Ah ! O Resende está com ele ? Está bem, temi que a sua juventude e inexperiência pudessem trair todo o trabalho que temos tido. Ok, vou já mandar alguém buscá-lo aí, onde é que você disse que estava ? Café Frango Assado  ? Samouco ? Ok vai já alguém, espere e tome qualquer coisa, hoje pago eu.

O engomadinho foi seguido, parou à saída de Alcochete pra deixar entrar uma engomadeira com barraca montada no mercado do Montijo, dirigiu-se à reserva natural do estuário do Tejo, como quem se mete a caminho de Samora Correia tendo a meio caminho metido pelo silvedo, o que fizeram exactamente às 18:37h, e onde permaneceram exactamente até às 19:42h.

O regresso executaram-no pelo inverso da ida. O nosso carro marcava exactamente 87 quilómetros percorridos, ida e volta, passando agora à enumeração de vários factores a assinalar neste relatório e de supino interesse para a investigação em curso.

Um; Ao observarmos a carrinha depois de novamente arrumada no telhal jazia sobre o tablier um viçoso e aromático raminho de hortelã.

Dois; Foram encontrados debaixo do banco traseiro vários lenços de papel e bocados de papel higiénico, recente e com resquícios de sémen, bem como um preservativo usado (bem cheio) de marca Durex, tamanho grande (juntámos a carteirinha prateada do dito às provas), e alguns outros marca Control,  já ressequidos indubitavelmente de encontros anteriores, provas que recolhemos num saco higienizado e foram entregues nos serviços de laboratório desta polícia, com o nº do processo apenso para posterior analise averiguação e identificação.

Três; A dita senhora, que mantém banca de engomadeira no Mercado do Montijo é a D. Clarinda Veiga Pires, Terá à volta de 45 a 50 anos, e vive maritalmente há mais de vinte com o senhor Herminio Palma Inácio, aproximadamente da mesma idade e com talho na rua de Cima, no Cacém.

Quatro; Conforme instruções recebidas nenhum dos intervenientes neste relatório foi detido ou travado nas suas actividades diárias.

Cinco; Toda a equipa está ciente que, quando da sua detenção para interrogatório deve ser evitado todo e qualquer contacto entre eles e enclausurados em celas separadas. Para além dos já nomeados foram detidos igualmente; Emídio Guerreiro, Camilo Mortágua, José Augusto Seabra, António Barracosa e Luís Benvindo, todos suspeitos de ligação e pertença à LUAR, Liga de Unidade e Acção Revolucionária.

Passaram-se alguns dias, triangulações, observações, após os quais as detenções permitiram em pouquissímo tempo esclarecer os factos, recuperar as quase trinta mil mocas e deter todos os intervenientes a fim de serem alvo de acusação, posterior julgamento e prisão.

 Esta brigada orgulha-se do seu laborioso sucesso em prol da Nação, eu, pessoalmente, dirigi todas as diligências que culminaram em mais um espectacular sucesso da PIDE. “ Tudo pela Nação, nada contra a Nação” !

Chiado, 16 de Agosto de 1967
Bonifácio António Maria Cardoso
Inspector, Chefe de Brigada

* todos os factos e nomes são veridicos e podem ser confirmados, existem actas, relatórios, processos, e, sendo mais cómodo o Google, introduza os factos, ou os nomes e dentro do contexto, confirme-os. Obrigado.
            




terça-feira, 11 de agosto de 2015

265 - PEÇA EM 3 ACTOS … Paulo & Esperança ...

                               

ACTO 1 Fala 1 em desespero

- Não há outro modo de lidar com aquela malta, só à bruta, não vão lá com paninhos quentes, para eles tudo é luta, tudo é acção, atitude, politica, até o respirar, nada conseguirás com pedidos, solicitações, boas maneiras. Só reconhecem a força, só temem a força.


Fala 2 com a calma que só o poder concede

- Então tens que lhes atirar com um exemplo de força se os quiseres dominar, senão nunca os terás na mão quanto mais virem-te comer à mão, foi o que eu fiz com os agricultores do regolfo, e foi remédio santo.


Fala 1 de novo e num modo lancinante 

- Já os conheço, e a alguns até conheço bem demais, como saberão, há ali um reviralho, não me parece que consiga levá-los com a força, aquilo cheira mais a coisa premeditada, a contestação silenciosa…           


Fala 3 à laia de quem manda bitates

- Nunca foi uma questão de força pá, estás enganado, é uma questão de votos, afinal em quem é que os eleitores votaram ? Afinal a quem é que o processo, ou a lei, entregou a autoridade ?


Fala 4 num tom de quem domina o hábito de mandar

- Pois, vocês falam muito bem e reconheço-vos razão, mas o senhor no seu departamento também tem problemas, não por acaso os mesmos problemas. Às vezes tenho pena de ser mulher, e não me ficaria bem tomar certas atitudes mas o senhor arquitecto e o senhor presidente sem darem dois murros na mesa e atirarem uns tantos às feras não irão lá.


Fala 5 com maneirismos, como se desenhasse algo no ar

- Ó minha cara amiga são funcionários públicos ! Não podem ser despedidos, além disso tem que se lhes levantar um inquérito, ter testemunhas e provas, e se arranjamos uma coisa já não arranjamos a outra, tapam-se uns aos outros !


Fala 6 com  a barriga e autoridade que só o poder concede

- Não podem. Não podem … Não podem é um modo de dizer, já passei por um ministério onde meti uma dúzia deles na rua e todo o ministério acalmou, acalmou é maneira de dizer, baixou a crista. É certo que mais tarde foram reintegrados, mas um ano e tal de susto e carência foi o melhor exemplo p’ra acalmá-los todos, desculpem-me a linguagem mas vocês dois não têm é tomates para os pegar pelos cornos, essa é que é essa, é aí que reside a questão. Amansavam logo ! Oh se amansavam ! Lá no ministério ficaram que nem cordeirinhos !


Fala 1 nova e tristemente

- Por mim já decidi, é deixar andar o barco, aquilo é um mar ingovernável, deixa andar ao sabor das ondas, ou isso ou uma guerra aberta e permanente e eu não estou p’ra isso. A gente dá-lhe uma ordem directa e ficam a olhar para nós como quem não entendeu, depois viram as costas e vão-se embora rindo, e não cumprem nem se incomodam tão pouco a fingir que irão cumprir. É demais, ando esgotado.

Fala 6 de novo com ar de quem repreende 

- Vocês dois têm que ter calma, calma e autoridade, vocês foram eleitos, não eles, por mim posso garantir-vos o apoio e cobertura da AG, o resto terá que ser convosco.


Fala 4 outra vez já bufando

- Metam na rua cada um que levante cabelo, e façam-no logo, de imediato, nem lhes dêem tempo, tal como disse o senhor presidente da AG, ai se eu não fosse mulher, haviam de ver como elas lhes mordiam… E esse arquitecto tem que aprender ! Esse e todos ! Têm que levar uma lição.


Fala 1 irritado, melhor, encolerizado

- E é que não fazem nada de nada ! Não mexem uma palha ! Passam os dias a conspirar e a fazer politica, a manobrar, a pensar em manobrismos, a pensarem como hão-de lixar cá o parceiro… E não lhes poderemos levantar processos por não fazerem nada ?


Fala 2 cauteloso

- Isso não ! Isso nunca ! Era coisa que acabaria por se virar contra nós, afinal todos precisamos de uma retaguarda, e com uma lebre dessas levantada deixaria de haver delegações, institutos, instituições, direcções gerais, regionais e locais, politécnicos e universidades que nos acolhessem, ficariam expostas ao receberem-nos quando não estamos exercendo cargos… Isso não, é melhor nem pensar ir por aí…

ACTO 2  Fala 7 impondo a ordem que o tempo esgotava-se


- Ok ! Ok ! Já chega por hoje ! Iremos acompanhando os casos. Que isto não fique em acta, se ninguém tem mais nada a dizer passemos então à ordem de trabalhos.

ACTO 3 
Fala o narrador, rindo da falta de visão e preparação dos personagens

            Constou-me, uns anos mais tarde, ter sido a peça levada à cena por mais duas vezes antes de se ter cerrado de vez o pano sobre ela, mas por essa altura já eu tinha abandonado o grupo de teatro, surpreendido e enojado com as práticas, os encenadores, os aderecistas e os guionistas. Tudo aquilo cheirava a ranço e a pré-cozinhado, ora o estômago fora sempre o meu ponto fraco... Eu inscrevera-me numa formação que me permitiria ser um ladrão honesto, pareceu-me ser profissão com futuro. 


                                      by    Luiza Caetano - Pintora e Escritora

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

264 - GANIMEDES E A CULTURA ...........................

                                 
Está em pleno a pré campanha, nas televisões, nos jornais, nas redes sociais, e inda que o verão e as férias mal tenham começado, cada palrador já encontrou ou preparou o seu registo de molde a impressionar-nos (como se fossemos uma chapa do negativo de uma foto à la minute), ou pelo menos a captar a nossa atenção, quiçá o nosso interesse, este último coisa cada vez mais discutível de obter. Cada um de nós criará uma imagem estereotipada de cada personagem, eu faço-o, pois facilita-me a sua arrumação em prateleiras mentais e sobretudo influi determinantemente na disponibilidade que concederei a cada uma dessas pseudo carismáticas figuras.

A alguns só tem a gente a ganhar nem os ouvindo, há partidos vivendo há quarenta anos em contradição, outros terão um piadão, pelo que a minha atenção oscilará como uma bolha de nível num nível (ri-me de mim mesmo com esta redundância). Mal as investidas se iniciaram e deu para ver de tudo, pelo que fiquei curioso quanto ao que espero ainda rir. O país está mal, muito mal, mas agora está muito melhor segundo uns, ou um tanto ou quanto pior, segundo outros. Quem assuma a trampa que fez e nos colocou na difícil situação em que nos encontramos é que não o admite nem aparece, com a agravante de, muitos dos que a este buracão nos trouxeram estarem aí de novo, prontos a dar-nos a mão e a salvação, como se nada do que se passou fosse com eles. Há partidos que com a sua inanidade e insanidade, em doze anos são capazes de atrasar uma cidade vinte e quatro.

Um destes dias até sonhei que Mussolini ressuscitara e se candidatava de novo a conduzir a nação à glória plena, e antevi nele o mesmo espírito de corpo, o corporativismo que tantos anos nos alimentou os dias e as vidas, “tudo pela nação, nada contra a nação”. O mesmo porte garboso apesar de ressuscitado, o mesmo ar descomprometido dos kosovares, esses sim, nada têm que ver com a fossa onde nos encontramos, o mesmo ar desinibido do tempo em que as vacas eram gordas e sorriam, a mesma desfaçatez que tão bem demonstrada foi por Bernardo Bertolucci no filme “1900, ou Novecento”, cujo link directo para o Youtube vos ofereço no fim do texto. (Mussolini morreu a 28 de Abril de 1945 às mãos do povo, juntamente com a amante Claretta Petacci na vila de Giulino di Mezzegra no Norte da Itália, fuzilados dois dias antes do suicídio de Hitler).

O meu amigo Ganimedes é que não concorda de todo comigo e está sempre:

- Não sejas parvalhão Baião… Deixa a politica para os políticos… Ainda não reparaste que por cada vez que tenhas razão perdes um amigo meu parvalhão ? …

O que me irrita é o seu ar de sabichão e as reticências, porque conhecendo-o como eu conheço sei o que implicitamente escondem, e ainda que ele se iniba numa mesa onde estamos meia dúzia, senão mais, adivinho-lhe a aspereza da observação e da crítica que implicitamente as reticências ocultam.

Involuntariamente vou observando os movimentos políticos dos personagens e das massas, já não involuntariamente vou anotando, catalogando, classificando, escrutinando, desde há uma dezena de anos a esta parte, a fim de mais tarde dar à estampa um estudo sociológico sobre movimentos de massas e personagens críticos ou cruciais, diria determinantes em cada caso, e faço-o criteriosamente, para ser mais preciso e explícito, desde o “movimento cultural” que arregimentou populações sob uma causa comum dirigida contra a única pessoa que parece não ter percebido a questão. 

            Pessoa que aliás nunca terá percebido nada de nada a não ser que um especifico e peculiar tubo com 20 cm de comprimento estaria coberto e submetido às agruras de um processo degenerativo de oxidação, vulgo ferrugem. Para ser franco, no estudo que elaboro e que pretendo submeter à apreciação dos sábios num futuro mestrado em Sociologia, e que me propus levar avante na nossa universidade, adianto várias pistas, ou hipóteses, todas viáveis, entre elas uma manifestada incompreensão pelo apoio do partido proponente, que reiterada e continuadamente apostou nessa figura, claramente deslocada do seu meio, incompreensivelmente incapaz de se assumir, de se relacionar com as massas, irrevogavelmente sem a mínima tendência ou capacidade de gestão de recursos, entre os quais os humanos, e de quem a história nem virá sequer a lembrar-se. Curiosamente lembrou-se Cavaco e Silva, desse e de um outro a quem são devidos trinta ou mais anos de imobilismo e obscurantismo.

Mas enfim, c’est la vie, parece que certas figuras por mais que se esforcem nunca farão história e rapidamente caiem no esquecimento, e antes que a vaca esfrie continuemos, onde íamos nós ? Na tese de mestrado e nos “movimentos culturais”, coisa que eu vi logo não ser o que parecia, até por, na história, jamais um movimento cultural ter conseguido o que queria, em Évora sim mas só o conseguiu nas suas reivindicações menos claras, quer porque não tivemos a nossa revolução cultural, (tivéramos simplesmente saneamentos), nessa época longínqua, como hoje, já éramos avessos à cultura, incluindo a cultura da tolerância, da aceitação, do respeito, do convívio e da partilha (ficou a da conivência, que como todos sabemos tem trazido imensas excursões a Évora), quer porque por cá a cultura enobrece mas dá de comer a poucos, coisa que Putin sabe melhor do que ninguém, pelo que lamentará não se ter insurgido mais cedo contra o revanchismo acoitado debaixo da perestroika e da glasnost que estraçalharam a mãe Rússia, levando-a a entregar as suas riquezas de mão beijada a uma direita oligopolista com a qual Putin agora se vê a braços.

Foi a fome, e não a cultura, quem despoletou a revolução russa de 1917, ainda que gente maledicente a atribua a uma monumental bebedeira que o exército popular, chamemos-lhe assim, terá apanhado nas caves do Palácio de Inverno em S. Petersburgo, cuja conquista significou um marco oficial na revolução. Bebedeira dizem, sem a qual não teriam sido capazes de quebrar as correntes culturais, cá está a cultura (da submissão) que os ligava à burguesia nobre a quem em estado normal seriam incapazes de desobedecer, tendo sido unicamente debaixo do efeito inebriante dos vinhos franceses e italianos, recheando as ditas caves, que ganharam coragem para fazer à realeza e seus muchachos o que nós deveríamos fazer à troika e seus acólitos. Isto da cultura tem muito que se lhe diga e serve para muita coisa, também na China fora a fome uma vez mais, não a cultura, que despoletou a revolução e a Grande Marcha, inda que mais tarde não tenham desdenhado e baptizado de “Revolução Cultural” tempos de vingança e inveja que ficarão eternamente escritos a negro na sua história. Revoluções culturais só me ocorrem a escrita e o Iluminismo.

Mas encontro-me em condições de garantir-vos, em Évora temos precisa e exactamente 372 pessoas cultas, trezentas e setenta e duas, ou 744, setecentas e quarenta e quatro se contarmos os pés e dividirmos por dois. Não me incluo a mim nestes números, eu era o que estava em cima do cavalo e confesso ter-me esquecido de mim próprio, até por nem ver razão para me incluir no universo em questão. Como disse tenho feito as minhas observações, anotações, catalogações e classificações, num escrutínio que já leva anos, a fim de não colocar em causa a exactidão dos números. Sim, contei-as e bem contadas. Trezentas e setenta e duas pessoas que possamos conotar à cultura tem a minha terra, demorei mas consegui ou penso ter conseguido, foram anos de trabalho de campo activo e exaustivo, anos em que uma completa e extensa metodologia empírica foi posta em prática e elevada à última potência toda a subjectividade permitida pela indução das mais rigorosas classificações e deduções, observadas a partir da enorme variedade que as amostragens obtidas em cada uma das múltiplas categorias analisadas consentiu.

Não me poupei, como seria lícito em minha defesa advogar, nem a esforços nem às premissas exigidas durante o dilatado período decorrido, em que examinei e diagnostiquei com honestidade o objecto desse trabalho, que curiosamente nem envolve , engloba será mais correcto, 80%, oitenta ou mais por cento dos que engrossaram os movimentos de massas “pela cultura” a que o trabalho alude. (será então caso para nos perguntarmos que estariam lá fazendo ?)

O meu amigo Ganimedes sabe-lo, por isso me diz reiteradamente que me cinja ao estudo e à tese, mais que isso é comprar inimigos gratuitamente, e di-lo-á certamente com alguma razão. Muitas vezes é ele quem por mim recolhe os dados, formula até hipóteses que posteriormente procuramos comprovar ou comparar com situações idênticas para aferirmos da sua validade, como é dele também, devemos fazer-lhe justiça, a hipótese de o 25 de Abril não ter resultado de um movimento cultural e sim de uma preocupação com o pré ($$$ para os mais novos e ignorantes), sendo que a prova de que nem sabiam o que faziam ou no que se estariam metendo é este resultado à vista de todos e que nem toda a cultura do mundo evitou nem resolverá nos próximos cinquenta anos.

Pena que não tenhamos alguém com a craveira de Putin, que restaure o orgulho pátrio como ele está restaurando o orgulho da mãe Rússia, sim, mesmo ordenando o esmagamento de todos os alimentos importados evitando a colonização da Federação russa pelas empresas imperialistas de fast food. Sim, por vezes é preciso que alguém pise forte inclusive a cultura, para que se possa acorrer a mais graves contingências. Ou era isso ou (assistir como nós), ao atrofiar e definhar da agricultura russa. Até porque não era o russo médio ou médio baixo quem tinha acesso a esses bens nas caras lojas e supermercados das grandes cidades, o russo de que falo e de quem Putin assumiu a defesa intransigente está condenado a uma dieta de batatas e até isso somente quando a neve e o gelo não o impedirem de esgaravatar o chão para as desenterrar.

Lá deixará de ser como aqui, em que tudo chega de fora pelo paquete como diria Eça, populista ou não Putin sabe haver só um caminho, e esse caminho é a cultura, na cultura é que reside a salvação, a cultura dos próprios bens de consumo em doses industriais, a agricultura. Era isso ou a fome, por cá escolhemos a fome.

Em relação ao trabalho em causa adiantarei somente que dos louros que me sejam devidos, somente aceitarei os que exclusiva e comprovadamente sejam fruto do resultado da metodologia usada, e claro, deverão ser-me igualmente creditados os provenientes da originalidade propiciada pela interdisciplinaridade das várias ciências envolvidas e de que me socorri. Tão poucos cultos, pensarão vocês, e estarão a cair no mesmíssimo e errado plano de observação de que ao princípio inquinei.

Lembrai pois a natureza subjectiva mas unívoca do que estava em observação.

         Obrigado parvalhões.



Sinopse:
O filme faz uma retrospectiva histórica da Itália desde o início do século XX até o término da Segunda Guerra Mundial, com base na vida de Olmo, filho bastardo de camponeses, e Alfredo, herdeiro de uma rica família de latifundiários. Apesar da amizade desde a infância, a origem social fala mais alto e os coloca em pólos política e ideologicamente antagónicos. Através da vida de Olmo e Alfredo, o filme retrata o intenso cenário político que marcou a Itália e o mundo nas primeiras décadas desse século, representado pelo fortalecimento das lutas trabalhistas ligadas ao socialismo em oposição à ascensão do fascismo. "Novecento" tornou-se um épico aclamado no mundo inteiro, sendo considerado pela crítica internacional como uma das principais obras do grande cineasta italiano Bernardo Bertolucci.


terça-feira, 4 de agosto de 2015

263 - MUROS .................................................................

MUROS ...
I
A brincar alguém ergueu em 1907 um muro de 2.000 quilómetros
Que quase quase de uma ponta à outra da Austrália se estendeu
Por causa da cegueira, do sexo imparável, da reprodução inimaginável
Porém outros muros vieram a erguer-se e bem piores que este
Diria Catroga em seu português venal; Coelhos, mera pentelhice afinal…
                                                                         II
Em muros a sério pensaram Maginot e Siegfried
Porque primeiro foram as valas e só depois outras valas...
E o arame farpado, enovelado, quase quase 1.400 quilómetros contados
Depois destas graças os famosos ninhos de metralhadoras
Que duraram e duraram
Inté se chegar aos automatismos mal fadados
                                                                        III
Então, como se aqueles muros não bastassem
Chegara a hora bendita e desdita da economia
E propagando baixá-las se ergueram por todo lado barreiras monetárias
Cercando as economias galopantes, arbitrárias
Protegendo-as dos furores cegos das forças libertárias
                                                                       IV
Foi então que outro muro intransponível se ergueu
Mas cautela, credo ! Desta vez felizmente em louvor a Deus
Faz lá ao menos uma tentativa… sim, foi aí, foi na Palestina
Como se a sorte fosse uma casa de meninas e
Forçada a dita a rodar de mão em mão, sorte canina
                                                                       V
E por entre o tráfego e o tráfico do México
Demos por ela entalada entre infortúnio e outro muro
Cedo mudou de poiso, abandonou  Tijuana e Conchita
Ora sendo o mal uma firma de investimento em comandita
Cercaram-lhes de redes Ceuta & Melilla, coitaditas
                                                                       VI
P’ra proxenetar uma hungarazita magiar desnataram
Travando a paixão a sírios e a sérvios que, afinal
Para que siervem os siervos dos sérvios ?
P’ra nada servem no final, nem prestam, que desandem…
                                                                     VII
E assim chegámos a Calais, via Lampedusa
Que isto das muertes é destino, e musa
É o espanto de quem tira sortes
É o esperanto a quem sorriu a morte
                                                                     VIII
E, antes c’o horror se espalhe p’los países do norte
Mais muros, mais novelos, mais arames
Estão ameaçados o turismo, os vinhos, os salames
Está apavorada a Europa da temperança
Da idolatria, da idiotia, da tia…
                                                                     IX
Os sobrinhos  Schäuble, Juncker, Dijsselbloem,
Gaspares, Moedas, Marias, Maçães…
Largando caganitas por Portas e travessas não,
Fechai-me esse mar agora ! Fechai-o já !
Virá de imediato, e sem demora a BlackWater de triste memória
Para nos salvar ,   ra ta ta      ra ta ta      ra ta ta      ra ta ta      ra ta ta 
                                                                      X
Que deixem metade deles viva
A esses sortudos deixai ir embora
Levarão choque & terror aos que lá estão
Pregá-los-ão ao mesmo chão que os devora
O medo guarda a vinha, nunca ouviste, e então ?
                                                                     XI
Agora sim, descansa que não dormiste
Aqui não entram drones, nem mirones…
Aqui a história será igualzinha aos nossos informes…
- - - não, à civil, fato de banho, sem uniformes, fim de transmissão, stop- - -

Évora, Humberto Baião, em 04-08-2015