JARDIM ERA PÚBLICO, E NÃO DA CELESTE
Estava rebentando de passarinhos e gentes
De árvores frondosas, cadelas no cio e Guys apaixonados
À entrada transeuntes, fotógrafos e indigentes
Foi aqui que escolhi sentar-me, pedir cafés gelados
O dia solarengo estava, os cisnes grasnando
A vontade imperando e, na esplanada quási deserta
Umas costas nuas em aberto vestido se estampando
A pele alva, os altos da coluna, a sede que desperta
Nessa mesa ao lado, sentada, essa mulher liberta,
Liberta feromonas que o vento p’lo jardim dispersa
Perfume que nas redondezas todos os cães alerta
E aos poucos se vai formando matilha, que a cerca
Um oferece primoroso licor, um outro linda flor
O terceiro, chá de limão, um quarto seu próprio coração
A senhorita sorri, e de tão cortejada se diz e desdiz,
por amor
Mas tanto ladrar incomoda, e se vai embora, dizendo a todos não
Jardim fica logo ali triste, o dia todo ele como breu
Metade do pessoal, como pardais, levantou, e debandou
E nós agora ? Disse entreolhando-se amigo meu
Embora também, dia ficou judeu e linda flor flor murchou
Montei no motão e engrenei mudança
Rumei à Billette, sempre ensolarada
Mandei vir mais café e bolo de abastança
Reclinei ao sol, meti pés na mesa, manhã acabada
Depois o almoço, e a sesta mexicana
O glúten ruminado, o colesterol guardado
Sacarose absorvida, energia armazenada
Amanhã a nova semana me apanhará preparado
Humberto
Baião – Évora, 30 de Agosto de 2015