A
minha amiga Fifi é uma autêntica coca-bichinhos, na gíria das redes sociais
chamar-lhe-iam cuscas. Não é defeito, é feitio, a verdade é que embora a léguas
dá por tudo que se passa num raio de 20.000 km em seu redor. Melhor, que me
lembre, só Júlio Verne pois a Fifi observa mas não regista, analisa mas não
verte em letra de forma, não escreve, não edita e provavelmente será uma pena.
Vem
esta arenga a propósito do cerco que me faz, nada escapando a um qualquer olho
pidesco que deve ter no meio da testa, como os Ciclopes. Anteontem perguntou-me
por que gosto eu tanto de música africana, pois notara que amiúde a partilho na
página do programa “Disco África” ou mesmo na minha, pois segundo ela nada o justifica, não sou africano nem preto, palavras da Fifi. Confesso ter sentido
uma enorme vontade de a mandar agarrar numa saca de cimento e ir àquela parte
que a gente sabe, mas comedido como sou respondi-lhe:
-
Meramente uma questão de empatia Fifi.
antegozando o fingido
agradecimento dela e antevendo-a atrapalhada de volta dos dicionário
averiguando o significado de empatia.
Fui mauzinho,
mas não menti, é mesmo uma questão de empatia que me leva a gostar imenso dos
ritmos e sons africanos.
Evidentemente
poder-lhe-ia ter dado outras explicações igualmente válidas, igualmente
verdadeiras, como o facto de não haver canais televisivos nacionais,
portugueses, destinados ou vocacionados para a história e divulgação da nossa
música, pelo que sendo o mais aproximado que tenho à mão sou ouvinte e telespectador
atento do canal RTP África e da morna música luso africana.
Sim sei haver outros canais, VH1, MTV, a Híper FM, excluindo propositadamente os de
música clássica com os quais me entretenho menos, para isso tenho o YouTube e
além destes canais outros há ainda que se guiam por outros propósitos, divulgam a música de outros países e sobretudo alimentam o negócio da música e das
vedetas ou estrelas, quantas vezes pré-fabricadas em estúdios músicais e de
marketing sendo lançadas como qualquer produto de consumo, um shampoo, um detergente,
afinando-lhes pernas e mamas, lábios e olhos, cus e pestanas, e Photoshop,
muito Photoshop.
Longe
vai o tempo em que as estrelas se afirmavam por si e pelo seu valor e se
submetiam a uma popular avaliação crítica mas que as escrutinava ao milímetro, em festivais que fizeram história como o inesquecível e irrepetível Woodstock,
onde tantas e tantos começaram as suas carreiras músicais de inesquecível
sucesso, como Jimi Hendrix, Bob Dylan, Bob Marley, Santana, Janis Joplin, Joan
Baez, e bué de gente que nem me lembra agora e espero me perdoem.
Hoje
é tudo pré-fabricado e a malta tudo come e tudo engole sem se interrogar, sem
meditar nem reclamar, contudo no mundo negro da música africana ainda conta
muito a qualidade se nele se quer vencer. Ali há muita originalidade e a música
é ainda feita com recurso a instrumentos musicais e não a sintetizadores ou
remisturadores, enfim, com tudo menos instrumentos como acontece com tanta
dessa fastfood miusic que nos querem enfiar pelas orelhas.
Sei
que também poderia ter dito à Fifi que os anos vividos em África antes de
retornar modelaram os meus gostos e preferências, de pequenino se torce o
pepino e eu não terei sido excepção à regra, o ritmo, a cadência, o batuque, a
naturalidade e originalidade de músicas e intérpretes marcaram-me e,
inadvertidamente afloram ao de cima quando me disponho à festa.
Outra
explicação não menos verdadeira que contudo não lhe daria, tem um cariz
sentimental mais aprofundado e gira em torno dos anos de militar e do tempo
que alguns acharão excessivo passado em Angola, Namíbia, Moçambique, Guiné e
Cabo Verde. Foram muitos anos ininterruptos, quantas vezes vivendo em
completa comunhão ou simbiose no seio de tribos indígenas, com direito a mulher
e tudo, tendo advindo também daí o prazer, o gosto pelo ritmo, pela cadência,
pela indolência mas igualmente pelo gingar das ancas e das danças negras, pelo
sedoso da pele, do encantamento da cor ao apelo do cheiro a catinga e a cio, à
dádiva da sua entrega, ao desprendimento das suas exigências, à resignação espartana
das suas existências e ao estoicismo do sentirem-se amadas.
Talvez
tenham sido demasiados anos, demasiada convivência, demasiada proximidade, mas
jamais coerência em excesso, integridade em falta, vivência abusiva, carência
contida, ou paixão travada, daí a saudade. Talvez demasiado amor pra um mundo
em guerra e sem esse amor, todavia decerto seriam respostas demais para a Fifi, por
isso me fiquei pela empatia. Sucinto e simples, curto e claro.
Infelizmente
alguma da música africana actual também está eivada de um fenómeno que aqui
designamos por “pimba”, não há nada que o preto mais goste que uns óculos de
sol espelhados ou vistosos, um carrão, preferencialmente branco metalizado,
discotecas com muitas luzinhas, cocktails, charutos, arranha céus, iates, anéis, pulseiras, fatos
caros, dinheiro, diamantes, choferes, telemóveis XPTO 15, e elas tornadas mulheres objecto, perdidas por cabelos loiros
e ou compridos e escorridos como os das brancas. Enfim, toda a panóplia de
gadgets que ao longo de décadas foram invejando ao branco decadente sem intuírem
quanta frivolidade encerravam enquanto reflexos de um status em queda livre.
Nesse
aspecto não são muito diferentes de nós, curiosamente nenhum negro se quer chamar
António, ou Anthony Johnson, o negro*, todos querem ser Zedu, é ver o triste espectáculo
nalguns vídeos pirosos com cenários como os que acabei de descrever,
cenografias com a mão em poses de boss, repletos duma vacuidade materialista,
consumista, próprias de ambientes propícios à venalidade, completamente
contaminados pelo que de pior o branco tem, e exemplos absolutamente desaconselháveis
e aberrantes para a juventude a quem são dirigidos…
Mas no
que toca ao pior nós vamos porém muitíssimo mais adiantados…
* http://www.buala.org/pt/a-ler/o-angolano-que-comecou-a-escravatura-nos-estados-unidos
http://mentcapto.blogspot.pt/2015/01/221-contratempo-em-xangongo.html
http://mentcapto.blogspot.pt/2015/01/223-farol-berlenga-grande.html
http://mentcapto.blogspot.pt/2013/09/160-de-braco-dado-com-ele-e-com-ela.html
http://mentcapto.blogspot.pt/2016/03/322-blonde-and-beautiful-cecile.html
http://mentcapto.blogspot.pt/2014/03/182-stressados-de-guerra.html
https://youtu.be/jpsszqJEVpM explo abominavel....