domingo, 10 de novembro de 2013

169 - DEI UMA VOLTA QUADRADA* por Maria Luísa Baião...


Dei uma volta quadrada pelas ruas da cidade para pensar em liberdade nas voltas que o mundo dá. Não me canso de pensar, e sei por norma aprendida, quantas vezes é perdida e até andando parada, que se faz luz luminosa que até mim tráz as respostas ao que me transtorna a lida do meditar em tudo e nada como é tão comum na vida.

É forçoso produzir, imperativo não dormir e sobretudo pensar no que podemos fazer, para ninguém nos acusar de andar por cá sem bulir. O país precisa de mim, o país precisa de ti, o país precisa de vós, o país precisa de todas, o país precisa de nós. Vai daí e p’ra ajudar, há que pensar e agir, que reformar e decidir, não vá um grego apanhar-nos, como é hábito ancestral, a pedir ou a dormir.

Sendo forçoso progredir, nada melhor que acudir a este país que se esvai, em colóquios, seminários, conferências e debates, congressos universitários, pós graduações e mestrados, doutoramentos e cátedras. E já esquecia a formação, tão útil e necessária, quão premeditada e hereditária, que em perfeita simbiose com a pomada para os calos até evita a urticária a quem se encontre com micose.

Por desígnio nacional descobrimos afinal que é preciso produzir, não só produzir mui mais, mas muito mais e melhor, já que a paródia se acabou e há que dar contas contadas a quem tanto nos ajudou. Acordar é sempre chato, p’ra mais no preciso momento, em que nos tolhe um desalento de quem não queria acordar de um sonho de regalar cujo sono estava a pesar no nosso contentamento.

Fez-me bem o ar na cara, a marcha pausada e sã, já que encontrei as respostas para tanta coisa vã que me picava o cogito. E se bem o entendi, o esforço exige-se a todos, por isso fizeram bicha p’rá reforma não perderem, os que ameaçados estavam de cair na prateleira dos supranumerários em excesso, tementes de ir p’rá rua, engrossar o rol estatístico dos muitos desempregados.

Só ficou por entender, porque houve tantos lamentos.

Por acautelarem proventos os que ameaçados estavam de à rua ser despejados ? Se é forçoso produzir, que diferença existirá do desempregado ao reformado ? Um vai dar voltas na cama para ver se desengana o engano em que  caiu, o outro vai dormir bem, verá a vida a sorrir, pois o dele já está certo, buliu o que tinha a bulir,  quem vier que acerte o devir.

Não fará grande diferença, quer se pague uma reforma ou um subsídio de esmola o resultado é o mesmo. O país vai progredir e a produção subir, já que qualquer deles por certo, se encarregará se for esperto, de impar, para que quem cá fica, se esforce e dê bom aperto.

Desta vez é que vai ser, desta vez é que vai dar, deixem passar alguns meses, e pelo que estou a ver, não demorará muito tempo, que tudo que é fábrica feche, tudo que é lerdo deserte. Se me é permitido falar, deixem-me recomendar com prazer, que o façam em fila ordenada, e o último a saír que feche a porta bem fechada,  já agora sem a bater.

Todo o povo a uma só voz, irado e arregaçando mangas, levantará um clamor, que imagino ensurdecedor, exigindo que o sol pare, dias e dias seguidos, para que possa produzir té lhe doerem os sentidos e para o lado cair. E quanto mais baixos salários maior a precariedade, enorme a subserviência e gritante a dependência,  mais se agigantará a revolta, mais força lhe virá aos braços, disparando a produção, resolvendo a bem de todos o problema da nação.

Mau grado idílico cenário, gente há decerto impenitente, boicotando tudo e todos, num desaforo indecente chateando o zé povinho. Pois quando tudo prometia, ministros há que por magia estragam todo o arranjinho, parecendo mesmo apostados, e disso bem convencidos, que a produção só resulta, quando fizerem de todos declarados inimigos.

São ministros de arrepio, não se cansarão de fastio senão quando o circulo for quadrado e exista um só português que não tenham chateado. 

* " por Maria Luísa Baião in Diário do Sul, Kota De Mulher, Évora, publicado em 21-10-2002. "