segunda-feira, 4 de março de 2019

580 - HÁ HOMENS TESOS ! by Maria Luísa Baião *



Ricas férias passei, mas em abono da verdade vos digo que, se do Carnaval de Évora tivesse sabido, teria sido aqui por mim vivido, e não noutras paragens com tamanha antecedência marcado.

Não vale a pena chorar no molhado, até porque molhados estiveram quase todos os galegos dias que em férias andei. Mas valeu a pena, descomprimi, descansei e ri, remédios essenciais a um bom arbítrio dos humores, já que de amores me quer parecer, nunca padecerei.

Ginguei e passeei p’las bandas de Finisterra, lá onde o mar começa e se acaba a terra, palmilhei os “caminhos de Santiago”, o tal que volveu santo, de apelido Compostela, por alcunha o “Mata Mouros”, e que, decerto não por milagre, me poupou a aziagos dias, apesar do tenebroso frio que por todas aquelas cidades se sentia.

Muitos tesouros vi nem todos brilhando de fulgor, alguns, bem poucos com pena o digo, tendo mais a ver com honor e perigo, audácia, coragem, visão, castigo e recompensa, cuja riqueza está mais no que exemplificam e se pensa, que na falácia de quem muito e em vão grita.

Vim contrita, contrita e meditabunda, revendo planos, projectos e, de forma rotunda revendo e reinventado, reinventando e revendo o que nos separa dessas gentes, tão formigas, tão contentes, tão amigas, alegres, nunca displicentes. Hereges não são por certo, visto existir sempre por perto lugar de recolhimento, meditação ou oração, seja monumento ou não que lhes permita sentir, pensar e melhor agir.

Foi em Vigo que espantada,vi uma estrutura criada, melhor, uma escultura moldada por quem dessas coisas sabe. Vigo, cidade entalada entre o mar e a serra, cujas gentes, num truísmo, renegaram o determinismo que esse fado lhes traçava, roubando ao céu o espaço que a terra lhes negava. Testemunha-o essa escultura, que apontando para a altura, dá conta do querer e saber de quem procura a fortuna com seus braços e mister.

Quatro garanhões pujantes, trepando impantes por base que a escultura ergue às alturas em espiral mais do que instável, subindo com virtual ímpeto e quase se atropelando, num equilíbrio precário, parecendo quererem ultrapassar-se na estreita faixa que pisam. Tal milagre termina com o primeiro, o que conduz essa tão destemida quão desabrida corrida, sem chão debaixo dos pés, empinado no precipício que lhe serve de edifício, só lhe faltando ganhar nessa corrida imparável, céu e espaço adjacentes. Que imponentes, que lindos, que vivos, que impressionantes os traços desse artista que a tal beleza deu vista.
 
         Claro, logo ali quis saber o querer de tão nobre gesto em ferro e aço tornado. Pois há pouco que dizer, simboliza tal delícia a vontade de um autarca, de um povo que em terras da Galícia ousou pensar e fazer, ousou trabalhar e querer. 

Simboliza essa expressão, que fado algum parará quem em si mesmo acredite. Que mesmo faltando o chão, nada, nada fará parar quem recuse ouvir um não. Vigo recuperou numa década o atraso que a separava do desenvolvimento de muitíssimos anos que a afastava do resto de Espanha e da Europa. Por cá, muita gente se prepara já para apostar ou penhorar o capital de crédito, o muito ou pouco que lhe resta e quase em cima de eleições.

A ninguém parecemos querer dar nem o beneplácito da dúvida, nem tempo para galgar o precipício, parecemos mesmo mais seduzidas (os) por nos atirarmos dele abaixo que em saltá-lo. Não nos precipitemos, saibamos aguardar………….….………
.
* Por María Luisa Baião, escrito el jueves 26 de Febrero de 2004, a las 17:50 horas y publicado en el Diario del Sur, rúbrica "KOTA DE MUJER" en los días siguientes.


domingo, 3 de março de 2019

579 - PARABÉNS MARIANA, by Maria Luísa Baião *


Mãe babosa me enviou notícias de prisão afectuosa e nesse preciso instante me lembrou momentos que, quando o vagar permite, por distantes, saudosa e de rompante acodem ao meu espirito. É um bem-estar infinito e prolongado este mister, de, sendo mãe se prolongar o querer, se amar por vezes calando fundo a dor, de não regatear nunca nem a ambição nem o amor. É isto ser mulher.

Incontida força de vida nos assalta. A cada momento traçar metas mais altas nos leva esse milagre, porque alimentamos nos peitos ufanos chama que arde desde os primeiros instantes, até que Deus nos guarde. A cada dia que passa lutamos mais e mais por essa nova razão que carregamos nos braços, nos enche o coração, nos envolve como mago manto que tantas e tantas vezes nos serve igualmente p’ra esconder o pranto.

Sim, é verdade que a vida nos tornou mais sorridentes, que a toda a gente mostramos vaidosas esse torrão bonito que nos prolonga o sorriso deixando ver os dentes. Receosas o guardamos mesmo quando a brisa do amor nos pinta o lar e, rodopiando à nossa volta, etérea e volátil do perfume das rosas nos esparge.

É nesses momentos que, cavalgando delirantes sonhos de tudo e para tudo nos sentimos prontas, nos tornamos capazes. Como esta menina que sua mãe envaidece outras houve já que mulheres audazes se tornaram. Uma, vinda de Espanha se casou em Elvas e nossa rainha veio a ser, pois quis a tradição que de D. José viesse a ser mulher. Que tempos esses em que não a razão mas o interesse ditava cartas, calava lamúrias, forçava ao dever. Foi essa espanhola trocada pela nossa D. Maria Bárbara quem, nesse mesmo dia hora e local desposou D. Fernando, Príncipe das Astúrias, para onde foi viver.
Ganhámos nessa troca que na história não foi única, D. Vitória Mariana de Espanha veio e nos trouxe qual tesouro de filigrana o amor ao Teatro, às Artes e à Música.

Mas Mariana não é nem nome nem caso isolado no passado. Já Fernão de Magalhães jovem dotado, com esse nome baptizara por motivos que não sei, um arquipélago de ilhas no Pacífico e que resolveu oferecer ao nosso rei. Homem de guerra, imagino-o, com saudades de Portugal e de alguém mais que não confessa pois poder-lhe-ia ser fatal. Consta que ao avistar no mar esperança de terra e, antes provavelmente que a razão se sobrepusesse ao coração, logo se apressa a dar-lhe tão querido nome que levaria pregado na lembrança.

No mesmo mar oceano cujo fundo é de certeza abismal, alguém pôs ao sítio em que a maior profundeza registou, o nome de alguma Mariana que por certo uma vez na vida amou. Amar amar amou Soror Mariana Alcoforado, a um oficial estrangeiro afrancesado, Marquês de Chamilly, que por nós lutou nas guerras da Restauração. A ele dirigiu cartas de amor cujas palavras, por terem saído da sua própria mão, a levaram a tornar famoso o Convento da Encarnação, em Beja, em terras aqui tão perto e que ela por amor nunca viu como um deserto.

Que a esta Mariana que ora aqui chamo, porque ainda não há uma semana fez um ano e sua mãe por certo embala embevecida Deus conceda muitos e muitos anos de vida, tenha tantos motivos para ser amada como as outras de que reza a história e atrás foram chamadas. Que nunca sobre ela caiam as suspeitas que tornaram mártir uma outra Mariana, esta esposa do tão odiado rei Herodes “ o Grande “, da Judeia, o qual por razões com mais de dois mil anos conhecidas o tornaram tristemente grande e célebre entre os grandes homicidas.

Que a nossa Mariana possa ter quem a ame e estime com grandezas tais que dela se possa dizer o mesmo de “Mariana”, decerto por amor tornado nome de cidade brasileira em Minas Gerais, cuja história não conheço, mas a quem por ter nome de mulher dou grande apreço.


* By Luísa Baião,‎ escrito ‎ terça-feira, ‎27‎ de ‎maio‎ de ‎2003, pelas ‏‎15:09h e provavelmente publicado no Diário do Sul, rubrica "KOTA DE MULHER" nos dias seguintes.

** https://pt.wikipedia.org/wiki/Mariana#Funda%C3%A7%C3%A3o

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

QUIS OFERECER-TE UM RAMO DE CAMÉLIAS*

Pintura de Fátima Magalhães

Eu quis oferecer-te uma flor amor, uma flor que cantasse um anseio, um receio de te perder, uma flor que encerrasse intimidades, lembranças de ti, que te levasse puras e quentes, palavras ardentes.

Eu queria viver sempre em melodia, eu queria que não tivesse fim o dia, eu queria estar contigo agora e sempre, quero ser teu confidente, eu sou alegria, gente. E não esqueço esses teus olhos, o sorriso, o peito ufano, porque te amo. Cobicei há muito teu ventre materno, que venero. Ser mãe é sortilégio, foi dádiva dos deuses, mais te quero.

Eu quis oferecer-te um ramo de camélias e corri doido por floristas, campos e revistas, sem que em parte alguma o alcançasse, por isso te abracei e te beijei. Talvez pensasse que pétalas pudessem florir de meus braços e cobrir-te, que o seu aroma preenchesse espaços, fazendo-te sorrir. Ver-te sorrir apesar desse teu cabelo em desalinho que a tentação me leva a querer domar só porque não quero que esconda um rosto lindo, cujo sorriso sempre me fez sentir bem vindo e ao pé de ti ficar.

Sou aquele que mente, pensavas tu, mas era já crescido, gente, em que vivia e vive um coração que sente, alma temente, sonho persistente, atrevido e consciente, que o tempo ensinou a ser sincero, porque te queria e quero.

Voo por cima dos meus pensamentos, sonho acordado, monto o cavalinho, parto à desfilada delirante, e só tu acalmas meu caminho errante, me tornas à terra de mansinho. Queria saber-te a meu lado a vida inteira e que ela fosse festa, bebedeira, ter-te sempre comigo p’ra me consolar, para conspirar, guiar na cegueira, sossegar em mim esta canseira.

Canseira de incertezas e temores, de não poder sonhar-te eternamente, receios e pesadelos de perder-te, medo de procurar-te em vão e não te achar, olhar, não te ver e te chorar. Vivo inquieto, E recordando-te tudo me parece um sonho lindo, céus multicores, cheirinhos a mil flores, e irrequieto temo o sonhar findo. Febril, em alvoroço me ergo do sono desvairado, procuro-te a meu lado, sento-me à beira da cama angustiado, a noite profanada novamente me enleia no seu seio deixando uma lágrima, um esboço. Um esboço que sonhei e se sumiu, que horrorizado vi fugir do meu alcance, que temi perder, ficar distante e foi essa saudade que aquela lágrima traiu.

Não te esqueço, não te abandono, não quero ficar sozinho neste mundo, foste tanto para mim, meu doce amor, não deixes que estoire no meu peito um grito agudo, porque para mim tu és vida, tu foste sempre tudo !

   * versão 2

Foto roubada a Luísa Castro




sábado, 9 de fevereiro de 2019

578 - MUNDO VIRTUAL, by Maria Luísa Baião * ...


Entrei apressada e com fome no restaurante. Escolhi uma mesa bem afastada do bulício, pois queria aproveitar os poucos minutos de que dispunha naquele dia atribulado, para comer e ler alguns mails que acumulara, além de pretender planear a minha próxima viagem de férias, coisa que há tempos ando para fazer. Pedi um filé de salmão com batatas a murro em molho de manteiga, uma salada e um sumo de laranja, afinal de contas fome é fome, mas regime é regime não é ? E dieta é dieta não ?

Abri o meu caderno de apontamentos e levei um susto com aquela voz baixinha atrás de mim:

- Tia, dá-me uns trocos ?

 - Não tenho, menino.

- Só uma moedinha para comprar um pão.

- Está bem, eu compro-te um pão.

Para variar as páginas de e-mails eram mais que muitas. Fico distraída lendo-as; poesias, fotos lindas, soltando gargalhadas com as piadas malucas. Ai aquelas imagens de Londres e boas lembranças de outros tempos e de outras viagens. Calhava bem ir até lá, não conheço.

- Tia, pede para colocarem margarina e queijo também.

Percebi que o menino tinha ficado ali.

- Ok. Vou pedir, mas depois deixa-me trabalhar, estou muito ocupada, está bem ?

Chega a minha refeição e juntamente com ela o meu constrangimento. Faço o pedido para o menino e o empregado pergunta-me se quero que mande o garoto embora. Os meus resquícios de consciência impedem-me de aprovar tal. Digo que está tudo bem. Que o deixe ficar. Que traga o pão e mais uma refeição decente para ele. Sentou-se então à minha frente e perguntou:

- Tia o que está fazendo ?

- Estou lendo uns e-mails.

             - O que são e-mails ?

 - São mensagens electrónicas mandadas por pessoas via Internet (sabia que ele não ia entender nada), mas, a título de livrar-me de maiores interrogatórios ainda acrescentei:

- É como se fosse uma carta, só que via Internet.

- Tia você tem Internet?

-Tenho sim, é essencial ao mundo de hoje.

- O que é Internet ? (volveu ele).

- É um meio através do computador, através do qual podemos ver, ler e ouvir muitas coisas, notícias, músicas, conhecer pessoas, ler, escrever, sonhar, trabalhar, aprender. Há de tudo no mundo virtual.

- E o que é o virtual ?

Resolvo dar-lhe uma explicação simplificada, novamente na certeza que ele pouco vai entender e me vai deixar em paz para comer a minha refeição sem culpas.

- Virtual é um local que imaginamos, algo em que não podemos pegar, tocar. É lá que criamos um monte de coisas que gostaríamos de fazer e fazemos. Criamos as nossas fantasias, transformamos o mundo em quase como queríamos que fosse.

 – Boa tia, dessa Gostei !

- Menino, entendeste o que é o virtual ?

- Sim, também vivo nesse mundo virtual.

- Tu tens computador ?

- Não, mas o meu mundo também é desse jeito... Virtual. A minha mãe fica fora todo o dia, só chega muito tarde, quase não a vejo, eu fico cuidando do meu irmão pequeno que vive chorando de fome e eu dou-lhe água para ele pensar que é sopa, a minha irmã mais velha sai o dia todo, diz que vai vender o corpo, mas não entendo, pois ela volta sempre com o mesmo corpo, o meu pai está na cadeia há muito tempo, mas sempre imagino a nossa família toda junta em casa, muita comida, muitos brinquedos, de natal, e eu indo ao colégio para um dia ser médico.

- Isso é virtual não é tia ?

Fechei o meu caderno e o portátil, não sem que antes as lágrimas caíssem sobre os papéis. Esperei que o menino terminasse de, literalmente "devorar" o prato dele, paguei a conta e dei-lhe o troco que me retribuiu com um dos mais belos e sinceros sorrisos que já recebi na vida e com um:

- Obrigado tia você é boa pessoa !

Ali, naquela instante, tive a maior prova do virtualismo insensato em que vivemos todos os dias, enquanto a realidade cruel nos rodeia de verdade e fazemos de conta que não percebemos !

Menino Chorando, pintura de Giovanni Bragolin, 1940


* By Maria Luísa Baião,‎ ‎escrita quarta-feira, ‎15‎ de ‎Março‎ de ‎2006, pelas ‏‎16:40h e provavelmente publicado no Diário do Sul, rubrica "KOTA DE MULHER" nos dias seguintes. A escrita deste texto foi motivada por troca de conversa cibernáutica 
com o meu amigo Carlos Magalhães.


577 - AGRADECIDA, MUI, by Maria Luísa Baião *…



Prezo muito a amizade. Se sincera, sólida, desinteressada, é do melhor que podemos dar e fruir. Recebo frequente e felizmente muitas provas e testemunhos nesta órbita. A todas e todos agradeço as palavras, solidariedade e consideração, mas sobretudo o gesto de simpatia e empatia, retribuo-vos declarando-vos, como não poderia deixar de ser, a minha pública amizade.

Toda a minha vida tem beneficiado desse vosso conforto, tudo tenho feito para que não vos fique devedora ou vos desiluda. Sem querer minimamente ferir susceptibilidades, da amizade mais chegada ao simples conhecimento ou simpatia que me dedicam, desejo hoje prestar um vero agradecimento a uma pessoa especial que, embora ultrapasse o que legitimamente devo esperar, abertamente me admira e considera, e o afirma, coisa que várias vezes me fez ruborescer, deixar pouco à vontade e julgar imerecidos, quando não despropositados ou exagerados os seus elogios.

Surpreendentemente trata-se de uma amizade com a qual a propósito dos mais díspares assuntos nem sempre me encontro de acordo. Contudo, valha a verdade que tal só nos tem trazido proveito, pois é da discussão que nasce a luz e tantas vezes o reconhecimento de uma ou outra posição, encerrando e enriquecendo o capítulo, a razão.

Nacionalista e regionalista convicto, tem contribuído para o meu esclarecimento e formação em domínios nem sempre por mim compreendidos na sua particular dimensão. Autodidacta e homem de longa vivência e experiência, é, como eu, socialista empedernido, se não mesmo lícito afirmar-se sermos ambos mais socialistas que o socialismo admitiria nas suas balizas, tantas vezes redutoras quanto o podem ser os limites de qualquer ideologia, já que vertemos opiniões regidas pelo próprio pensamento e fruto da avaliação da evolução do “homem” na nossa sociedade.

“Urbana”, como tantas vezes me apelida, tem sido através das suas teorias e explanações que melhor tenho entendido a estrutura agro-rural do Alentejo e do país, tanto quantas as implicações da estrutura fundiária que mantemos e a imbricada relação com o nosso bem-estar, qualidade de vida e em última análise a estrutura social que desde o 25 de Abril temos produzido.

Tanto devo a esse rural rústico, todavia como vêem, não será impunemente que me apelida de “urbana”. Chegou o momento da vingança. E não espere que lhe peça perdão por isso porque não tenho intenção de o fazer. Fica avisado. Não o quero só para mim, podem lê-lo aqui nas páginas deste diário ou numa simples ida ao Google, digitando “alentejoagrorural” e reconhecerão com quanta dedicação e paixão deixa transparecer aspectos por tantos considerados prosaicos, contudo oferecendo-nos veras lições de história, sociologia, agricultura, e, pasme-se, até de gastronomia da nossa terra, o que, juro, é do melhor que Portugal tem.

Pois esse meu amigo, que se vai mantendo jovem apesar dos muitos anos que tem, com este exercício para o espírito, a escrita, cada vez mais me convence das razões da sua razão, se com esta afirmação consigo ser específica. A sua “doutrina das especificidades” como lhe chamarei, aliada a outras vozes e leituras que capto, levam-me hoje a crer que, a par de algumas vozes que se vão ouvindo já, a nível mundial, não estar provado que a para tanta gente famigerada globalização, fruto de um liberalismo selvagem que virou moda nas últimas décadas um pouco por todo o mundo, seja um elemento positivo para o equilíbrio social e económico dos países do mundo, do globo.

África, América latina, oriente asiático, têm beneficiado com tal moda ? Adquirimos-lhes mais produtos ? Produzem mais ? Ou viram crescer o desemprego e a miséria ? Vendemos-lhes, nós, países ricos, mais produtos e serviços ? Conseguimos ou estamos em vias de conseguir um maior alcance que as intenções, pois disso não passaram, que se anteviam no moribundo ou já enterrado diálogo Note Sul ? Há menos fome e menos pobres, menos excluídos no país e no mundo, agora que antes ? Por que não advogam tanta democracia e liberdade propaladas pelos países ricos, a liberdade de circulação das pessoas ? E a Turquia ? E a queda demográfica europeia ?

Cobiçamos-lhes as matérias-primas, fixamos os preços dos seus produtos nas nossas bolsas, de Tóquio a Nova Iorque, enchemo-los dos nossos produtos acabados e arrecadamos as respectivas mais-valias. Enriquecemos com a pobreza que espalhamos. Ganhamos tanto menos quanto mais deslocalizamos, e alegremente vamos hipotecando o nosso equilíbrio e harmonia social. Até quando ?

Virá o dia, como diz o Francisco Pândega, em que a miséria será tanta que nada mais nos restará que voltar à ruralidade de subsistência e de impotência que nos mina ? Oxalá esse pesadelo nunca vire realidade, oxalá. O tempo o dirá, acredito que a nossa amizade durará para além da constância com que tal pesadelo sub-repticiamente se instala e contra o qual tanto se bate.


* By Maria Luísa Baião,‎ escrito ‎ quinta-feira, ‎29‎ de ‎março‎ de ‎2007 pelas ‏‎10:24 horas e provavelmente publicado no Diário do Sul, rubrica "KOTA DE MULHER" nos dias seguintes. Homenagem ao meu amigo Francisco Pândega que alimenta com a sua sapiência o bloguealentejoagrorural”, link  http://alentejoagrorural.blogspot.com/