terça-feira, 4 de agosto de 2015

263 - MUROS .................................................................

MUROS ...
I
A brincar alguém ergueu em 1907 um muro de 2.000 quilómetros
Que quase quase de uma ponta à outra da Austrália se estendeu
Por causa da cegueira, do sexo imparável, da reprodução inimaginável
Porém outros muros vieram a erguer-se e bem piores que este
Diria Catroga em seu português venal; Coelhos, mera pentelhice afinal…
                                                                         II
Em muros a sério pensaram Maginot e Siegfried
Porque primeiro foram as valas e só depois outras valas...
E o arame farpado, enovelado, quase quase 1.400 quilómetros contados
Depois destas graças os famosos ninhos de metralhadoras
Que duraram e duraram
Inté se chegar aos automatismos mal fadados
                                                                        III
Então, como se aqueles muros não bastassem
Chegara a hora bendita e desdita da economia
E propagando baixá-las se ergueram por todo lado barreiras monetárias
Cercando as economias galopantes, arbitrárias
Protegendo-as dos furores cegos das forças libertárias
                                                                       IV
Foi então que outro muro intransponível se ergueu
Mas cautela, credo ! Desta vez felizmente em louvor a Deus
Faz lá ao menos uma tentativa… sim, foi aí, foi na Palestina
Como se a sorte fosse uma casa de meninas e
Forçada a dita a rodar de mão em mão, sorte canina
                                                                       V
E por entre o tráfego e o tráfico do México
Demos por ela entalada entre infortúnio e outro muro
Cedo mudou de poiso, abandonou  Tijuana e Conchita
Ora sendo o mal uma firma de investimento em comandita
Cercaram-lhes de redes Ceuta & Melilla, coitaditas
                                                                       VI
P’ra proxenetar uma hungarazita magiar desnataram
Travando a paixão a sírios e a sérvios que, afinal
Para que siervem os siervos dos sérvios ?
P’ra nada servem no final, nem prestam, que desandem…
                                                                     VII
E assim chegámos a Calais, via Lampedusa
Que isto das muertes é destino, e musa
É o espanto de quem tira sortes
É o esperanto a quem sorriu a morte
                                                                     VIII
E, antes c’o horror se espalhe p’los países do norte
Mais muros, mais novelos, mais arames
Estão ameaçados o turismo, os vinhos, os salames
Está apavorada a Europa da temperança
Da idolatria, da idiotia, da tia…
                                                                     IX
Os sobrinhos  Schäuble, Juncker, Dijsselbloem,
Gaspares, Moedas, Marias, Maçães…
Largando caganitas por Portas e travessas não,
Fechai-me esse mar agora ! Fechai-o já !
Virá de imediato, e sem demora a BlackWater de triste memória
Para nos salvar ,   ra ta ta      ra ta ta      ra ta ta      ra ta ta      ra ta ta 
                                                                      X
Que deixem metade deles viva
A esses sortudos deixai ir embora
Levarão choque & terror aos que lá estão
Pregá-los-ão ao mesmo chão que os devora
O medo guarda a vinha, nunca ouviste, e então ?
                                                                     XI
Agora sim, descansa que não dormiste
Aqui não entram drones, nem mirones…
Aqui a história será igualzinha aos nossos informes…
- - - não, à civil, fato de banho, sem uniformes, fim de transmissão, stop- - -

Évora, Humberto Baião, em 04-08-2015
   
                         

sexta-feira, 31 de julho de 2015

262 - THE DECAMERON .............................................

                        

            A linguagem tirou o homem da pré historia, quero dizer, da barbárie, passámos de grunhidos e monossílabos a um pensamento estruturado, passámos a comunicar uns aos outros necessidades, estados de alma, estratégias e tácticas, passámos a comer melhor, mais carne, mais proteínas, mais vitaminas e sais minerais.

Passámos a expressar tudo e mais alguma coisa, a expressar e a dar corpo, a corporizar os sentimentos, quero dizer a amar e a sussurrar-lhes aos ouvidos ao mesmo tempo. Hoje todos entendemos mais ou menos isso, mais ou menos o alcance e a comodidade da linguagem, seja ela conotativa seja denotativa, seja directo ou indirecto o discurso, inda que eu tenha demorado séculos a entender por que razão a Hermengarda ruborizava e se desfazia em risinhos quando no palheiro da quinta do Menino de Oiro eu lhe segredava ao ouvido,

- Ai filha não sei porquê mas enlouqueces-me minha querida santa.

Loucuras de jovens, a verdade é que durante uma hora ou duas regressávamos ao passado como alguns mergulham no futuro, e quem nos ouvisse ouviria os neandertais grunhindo e afogando-se em monossílabos.

Não é presente a que queira regressar, mas não era mau de todo e deixou gratas recordações. A alergia ao pó da palha é que nunca mais me passou e ainda hoje me despoleta a asma, quase me sufocando por vezes.

Não, felizmente ou infelizmente nunca tivemos filhos, ela sim, um lindo casal que o Aurélio lhe deu, por sinal padrinho do meu mais novo e um dos meus melhores amigos embora em termos políticos estejamos nos antípodas, ele na última era glaciar e eu já em Marte… A Hermengarda sim, é fixe, e foi a primeira convidar-me há muitos anos para padrinho da, agora mais velha, a Milinha, que muito me orgulha pois tirou uma licenciatura em Físico-química, um mestrado em Biologia, concorreu a uma bolsa de estudo para fazer nos states um doutoramento em Bioquímica e preparava-se para ganhar um concurso a que concorrera, ela e mais dezassete mil e quinhentos eborenses, aqui em Évora, para vendedora balconista da rede de padarias da Panificadora Eborense, quando me remeteu um sms muito estranho:

- Padrinho ! Eu não disse sempre que Évora seria o meu futuro ? Está garantido ! Não caibo em mim de contente temos que falar !

Já o Aurélio e a Milinha, muito excitados, me tinham telefonado quase de seguida para eu aparecer lá em casa, pois a minha afilhada estaria com um super dilema, acabara de ganhar um concurso para balconista, recebera um e-mail esquisito e agora hesitava entre uma padaria e a NASA…

E falámos todos, do e-mail que ela sem esperanças enviara com o currículo, anexando uma solicitação de concurso à vaga para o doutoramento em Bioquímica, e da mirabolante volta que o correio lhe trouxera. A realidade é que a Milinha recebera em menos de dois dias uma resposta de espantar, era convidada a trabalhar no Astrophysics Research Projects of NASA, sendo-lhe em simultâneo concedido tempo para efectuar o doutoramento. Alegando modéstia ofereciam-lhe ainda um vencimento de 12.500 dólares, sujeito a contestação ou a discussão. Mas a surpresa das surpresas surgiu quando passadas horas e devido a uma melhor tradução da Katia reparou que o vencimento era mensal e não anual como ela inicialmente pensara. Benditos 26 aninhos….

Contudo, todavia, mas porém a minha retórica de hoje vem a propósito de amigas e amigos and familiares que tenho espalhados por essa Europa fora, Londres, Suíça, Suécia, Noruega e Allgarve, e because as palavras, sempre a palavras. A linguagem, ainda que sem palavras pode perder-nos, como aconteceu há dias com o jogador Nuno Silva ao chegar ao Jaén Futrebol Real Clube que o contratara, todo orgulhoso e envergando uma camisola onde estava estampada toda a sua ignorância, quero dizer a carinha laroca del caudillo Francisco Franco, figura senão odiada pelo menos abominada em toda a Espanha. Estes percalços são fruto da estupidez, não basta a um jogador de topo saber dar chutos numa bola, um pouco de cultura, um mínimo de história ter-lhe-ia evitado o infeliz deslize e a assumpção televisionada de uma ignorância maior que o número que calça…

E já que vem à baila a Tv direi eu também não basta aos nossos políticos abrir a boca ou tomar atitudes que lhes denunciam essa tal de ignorância com maior clamor que os sinos do Carmo e da Trindade, e o mesmo poderemos dizer de David Cameron, sobre quem recai a agravante de ser Prime Minister e ter supostamente sido educado nos melhores colégios protestantes e nas melhores universidades laicas. O modo como se expressou em relação aos emigrantes foi o mesmo com que Hitler anos atrás começara a sua saga contra os judeus, e todos sabemos como essa coisa acabou…

Doravante todo o grupelho neonazi ou nacionalista por essa Europa fora sentir-se-á moralmente autorizado a malhar nos emigrantes, muitos verão as suas casas, barracas, rulotes ou contentores incendiados, muitos serão simplesmente linchados por hordas de fanáticos, todos se sentirão perseguidos e até algum policia mais confiante e ortodoxo, encorajado pelo pensamento liberal de Cameron nem pensará duas vezes antes de enfiar uns balázios ou fazer cair o cacete sobre o crânio desprotegido de um qualquer desgraçado cuja culpa não é maior que os pecados que também esta Europa tem deixado pelo mundo.

Por este andar não demorará muito que regressemos aos monossílabos e aos grunhidos e arrastemos as Hermengardas pelos cabelos para que possamos fazê-las nossas, a qualquer preço enquanto a Europa há mais de dez anos que se atasca em contradições, não resolve problema nenhum mas todos os dias nos arranja novos…




quinta-feira, 30 de julho de 2015

261 - CUTILEIRO ..........................................................


Afinal quem vai ganhar ? O ambiente que já se vive na pré campanha mais parece de festa, e claro que nós melhor até que no reino da Dinamarca, pelo que acho ser impossível desgraça maior, contudo confiemos, inda que seja de toda a prudência manter um olho no burro e outro no cigano, ou no árabe, ou no romeno, no ucraniano, no vadio, no drogado, no desempregado, no preto, and so on…

O céu está limpo, as nuvens negras desapareceram, a manhã aqueceu e a esplanada ficou agradável, bebo uma bica para me reconfortar da Exposição do amigo João Cutileiro, “Árvores do Conhecimento Com Alguns Frutos”, à Igreja de S. Vicente, de onde acabei de sair e na qual nem cinco minutos me demorei, espera o artista  que o fruto da dita lhe vá parar às mãos, está bem está ...

Cinco ou seis árvores de pedra, coisa pequena, coisa miúda, e tal qual o publicitado, produto de mãos hábeis e da mente rica criativa e lúcida de Cutileiro, por aí nada a dizer, nem da montagem, cuidada como sempre, nem sei se alguém faria melhor com o pouco que lhe meteram nas mãos, parabéns portanto à organização, pois o que me deixou meditando no artístico Cutileiro foi o seu estado de espirito, o que me conduz a outro desvio colateral nesta conversa, os parabéns à Associação Cultural Colecção B, que o soube cooptar, sabido ser Cutileiro um artista de peso, e de regime, um artista que sempre fez trabalhos essencialmente para determinado partido, obras grandes e melhor pagas. Lembro o designado “Falo”, um amontoado de pedregulhos ao cimo do Parque Eduardo VII e que um tal partido alegadamente terá pago bem, perdão, um partido não, supostamente a CML pagou, suponho que bem e a tempo e horas. Bem mais próximo de nós, temos o “Arco do Triunfo” ali às Portas do Raimundo, que deve ter sido pago a peso, sendo precisamente a questão do peso, peso institucional enquanto mandatário de campanhas e não só, o que verdadeiramente me atira para uma outra vereda colateral…

Os tempos vão maus, só cortes, as instituições públicas contam os tostões e o artístico amigo Cutileiro tem um estaleiro para gerir, armazéns, matérias-primas, gruas, monta-cargas, energia, combustíveis, rendas, provavelmente vencimentos já que acolhe lá uma catrefada de vocações que não acredito vivam somente do ar, portanto há que diversificar a oferta, descobrir-lhe novos nichos, torná-la acessível a outros espaços, a outras bolsas mais moderadas que os cofres ou contas bancárias de quaisquer municípios amigos, torna-la menos volumosa, e pesada, a fim de caber numa entrada, numa sala, na caixa de uma carrinha, na mala de um carro, ou até capaz de ser levada embrulhada debaixo do braço. Um novo conceito de arte ao portador e ao domicílio, um impulso no binómio da produtividade versus rentabilidade.

Portanto parabéns às produções Colecção B, que o cooptaram e parabéns ao amigo Cutileiro que teve visão para prever a quebra no mercado da arte e soube magistralmente delinear com a antecedência necessária e exigida uma estratégia salvífica (peditório para o qual já dei), de que a exposição que visitei é um genial instrumento, multiplicado em S. Bento de Cástris e a multiplicar em centos de sítios, assim os Deuses lhe propiciem longa vida, inspiração e compradores porque é aí que bate o galho, já que falávamos de árvores e jardins e todos sabemos que a cavalo dado não se olha o dente.

E por falar em cavalos, o amigo Cutileiro, e outros, que tirem o cavalinho da chuva pois os tempos estão mudando e não voltarão atrás, se bem que continuemos promovendo, homenageando, louvando e premiando precisamente os mesmos, precisamente aqueles que nos trouxeram até aqui, até este buraco onde soçobramos com merda até ao pescoço, lamento muito o amigo Cutileiro e outros, mas as pessoas não comem pedras, tal como não comem TGV’s disse o outro, que hora a hora se contradiz e nem sabe o que diz…







quarta-feira, 29 de julho de 2015

260 - ALL THE ALLENTEJO .......................................

               
              No momento em que, sem hesitações lhe espetaram o facalhão na garganta eu arrepiei-me, e, ainda que a faca não tenha sido enfiada até ao cabo o sangue jorrava em golfadas, e arrepiei-me de novo ao sentir rodarem a faca, como se fosse em mim que a forçavam, arrepiei-me uma terceira vez quando a faca, digo o facalhão, foi retirado e atrás dele mais sangue jorrou ainda, esguichava-lhe e escorria-lhe pelo pescoço quando o meu pai lhe procurou o buraco da primeira facada com os dedos aí introduzindo outro facalhão, de lâmina brilhante e muito mais larga que a primeira, havia que alargar o golpe e sangrá-la depressa.

A tudo isto eu assistia encostado à parede, melhor, colado à parede, enquanto ela gemia, já só gemia, estrebuchara imenso, mas dois homens fortes tinham-lhe colocado os joelhos na barriga para se firmarem e agarraram-lhe com denodo os membros bem atados. O pior tinha sido a atrapalhação do meu pai, mangas arregaçadas, o suor ensopando-lhe a testa, fácies tenso deixando antever os dentes, pequeninos, as mãos pingando sangue, escorrendo sangue, gritando aos homens, ordens curtas, precisas, um último grunhido, minha mãe aparando o sangue num alguidar de barro, a avó Inácia doseando o sal para que não coagulasse, coalhasse ou a rechina não sairia boa, a tia Aia picando a salsa e os alhos para a parte destinada a coalhar e a ser cortada em cubos miudinhos e transformada num petisco.

Homens acudiram à forquilha e aos tojos que, ardendo musgariam a marrã a fim de, com raspadeiras improvisadas lhe retirarem as cerdas, o lume foi chegado às patas e os cascos arrancados fumegantes, eu e outros miúdos lutámos por eles para lhes roermos o sabugo, a marrã inteiriçada, depois lavada até ficar luzidia, dependurada em dois postes atados em X e aberta, os intestinos caindo no chão, as miudezas aventadas para outro alguidar e
repentinamente perdem-se-me as recordações, por que raio não sou capaz de lembrar quem eram os outros gaiatos se era com eles que eu brincava, e tanto que eu brinquei, sumiram-se-me as lembranças, só as recupero em casa, a salgadeira aberta, mantas de toucinho, a perna para presunto pintada com pimentão e colorau, punhados de sal, cheiro a pimentão, muito pimentão na carne, e lá vou eu com a tia Aia p’ra casa da avó Inácia pois em dias assim só atrapalharia e nem vagar havia, nem vagar nem ninguém para tomar conta de mim.

Um dia seria destemido como o meu pai, destemido e convencido, o melhor e mais rápido a matar e abrir porcos no Alentejo, onde por enquanto somente brincava mas a cuja magia me estava habituando, descobrindo e deslumbrando, até com os mimos que me prodigalizavam todos quantos me rodeavam, especialmente a avó Inácia e a tia Aia.

Tantas vezes me disseram ser o Alentejo impar que acabei acreditando, os pais, os avós, tias e tios, até a avó Inácia, com quem em miúdo passava longos períodos de férias na aldeia. A tia Aia também me fizera acreditar em tal, e seria injusto esquecê-la.

Sou extrovertido, e confiante, diria que demasiado confiante (até há quem diga que sou um convencido), talvez por ter nascido aqui, nesta terra de xisto e fragas lascadas, de espaços abertos e campos extraordinariamente iluminados, amplos, resplandecentes, melhor dizer reverberantes se quiser ser fiel à memória da tia Aia, ela chamava-lhe a marca da terra.

A tia Aia colocava marcas em tudo, desconhecia a gramática, nunca ouvira falar de adjectivos, tinha contudo um modo muito próprio de catalogar o mundo, eu, por exemplo, nunca fui só Berto, eu era o Bertinho querido umas vezes e o Bertinho lindo outras, tal como as flores das giestas no campo não eram somente bonitas, eram celestialmente bonitas pois Deus decerto as quisera diferentes de todas as outras, e para melhor.

Já provaram vocês o mel alentejano de abelhas que sobretudo se alimentem destas flores de giesta e esteva ? E já repararam como em relação aos demais o gosto é desigual, para melhor ? Repararam como nem coalha no inverno ? O único que não coalha ? A tia Aia tinha razão, Deus colocou uma marca no Alentejo, aliás várias marcas, até o perfume dessa flor não se limitava a ser agradável, ele era, na tabela da tia Aia, indelevelmente agradável e inesquecivelmente inolvidável.

Custa-nos crer como neste cenário de horizontes largos o homem se deixou aprisionar durante séculos, custa-me aceitar que não tenham partido daqui todas as revoluções, não aceito que a submissão, que o cante alentejano tão bem exprime seja ainda hoje uma das nossas marcas, porque aqui, nestes campos lindos e que, como adjectivaria a tia Aia, luxuriantes, onde a ausência de solidariedade campeia, a única coisa que, mau grado o paredão de Alqueva parece não se deixar submeter é a natureza, que, alheia à luta dos homens se renova em cada primavera e, ao contrário de nós, gente, humanos, prima por manter ainda a diferenciação do carácter das suas estações bem marcado, ao invés do indígena, que aos poucos e em quarenta anos se transformou num camaleão gelatinoso, ou, como diria a tia Aia, em lindíssimos e gelatinosos camaleões, inda que sendo bichinhos que ela, que jamais saíra daqui, vez alguma tivesse visto.

Visto ou ouvido, estas vastas terras aplanam a alma e injectam nos seres vírus de bonomia, estado anímico que a tia Aia, sempre mexendo, adjectivaria de letargia, no que pacificamente lhe concedo toda a razão. Aqui o tempo não anda para a frente, não avança, regride, olhemos as nossas vilas aldeias e cidades e comprovemo-lo, um paraíso perdido, um vazio no tempo que nem Einstein previra mas que agora, mentes brilhantes, vendem aos turistas em pacotinhos de fins de semana, disso se encarregarão os operadores turísticos e para tal a GenuineLand preparou os nativos alentejanos cujo céu, livre de poeiras e fumos, vendemos em pastilhas  de noites de breu com um sabor estrelado através da Dark Sky Alqueva.

A novidade aqui passa só e somente por essas adjectivadas e exageradas promoções, os publicitários sempre foram excessivos, e não o foram ou são somente com este Alentejo, lugar onde procuram, ou alguém força, estabelecer novas tradições com mais rapidez que aquela com que enterram as velhas. Pôr em pé o misticismo Endovélico no Alandroal, obrigar-nos a todos a olhar o balão como pategos no Dark Sky, ou tentar tapar o buraco que a desertificação abriu na peneira com o projecto GenuineLand, embasbacando perante as centenas de empregos, milhares de empregos que estas coisas geram, tá-se mesmo vendo, é andar brincando com o Alentejo.

Brinca-se no Alentejo e no país, agora até promovem e homenageiam quem mais brinca.

Brincalhões …

Foto 1 – A arma usada na matança.
Foto 2 – Monsaraz no horizonte.
Foto 3 - O horizonte visto de Monsaraz.
Foto 3 – Afloramentos de xisto perto da ribeira de Lucefecit.







                      

domingo, 26 de julho de 2015

259 - ARRANJA-SE EMPREGO * Parte 5 …….......…

              
Parte 5 e última O CONTRATO SOCIAL

Entremos de cabeça na quinta e última explanação sobre a área de formação que temos vindo abordando nos textos anteriores com um pedido de desculpas meu. Este verão, o calor e as temperaturas, que não se faziam sentir tão ásperas desde há 85 anos atrás, especialmente aqui no Alentejo, ou a cerveja, com muita saída e provavelmente sujeita a menos tempo de fermentação podem estar na origem do meu esquecimento e consequente descuido.

Seja como for ainda vamos a tempo de acudir à coisa, até por não se tratar de nenhuma desgraça irrevogável, ao indicar-vos a bibliografia esqueci-me citar e recomendar-vos como leitura deveras imprescindível (aliás, como a primeira), um livrinho já com uns anos mas que toda a gente parece ter esquecido, esquecido o livrinho e o assunto, desde governantes a deputados, ex-governantes e ex-deputados de vários quadrantes, políticos em geral, jotas e jotinhas em particular. Logo um livrinho que para eles deveria funcionar como uma Bíblia, trata-se da obra ímpar de Jean-Jacques Rousseau, “O Contrato Social”, no fim do texto deixo um link de um ficheiro em PDF e poderás colher a obra para leitura sem gastares um tusta.

Sim, porque há que ter em conta que o Contrato Social, um direito natural, funciona como um direito adquirido, e não pode ser sobrecarregado com obrigações que este povo tem cumprido sem contrapartidas. Respeitar compromissos não pode ser uma via de sentido único, só de cá para lá, de lá p’ra cá exige-se no mínimo reciprocidade. Até porque só chegámos onde chegámos por também tu seres um camelo, tu e a cáfila de dez milhões que anda por aí pavoneando a ignorância, quer sejam da situação quer sejam da oposição. Admito que por estar resguardado de ti no conforto deste mundo virtual posso arriar-te a valer não é meu artolas ? E já agora dou igualmente razões à tal recalcitrante de merda, que as aproveita todas para me tratar abaixo de besta, tratar e lá no íntimo chamar…

Deves lê-lo com atenção porque, se não sabes deverias saber que há muito tempo todos falham em relação a ti, o que te autorizará (não sou eu quem concede nem tem que conceder autorizações), a que possas tomar, confiada e justamente, com perfeito conhecimento de causa as opções que entenderes. Por mim torná-lo-ia leitura obrigatória nas fantochadas das universidades de verão que os partidos promovem, ao menos sempre aproveitariam alguma coisita. Colocada que está a questão, e as desculpas, importa não deixarmos arrefecer a vaca…

Para hoje ficáramos de abordar a questão crucial das relações sociais e humanas, portanto limitemo-nos à matéria de reflexão, ás amizades, e para despachar o assunto e arrumar de vez a questão terás que saber distinguir as amizades umas das outras e, concomitantemente (mais uma palavra cara ó Xarabaneka, por vezes tenho que te dar razões para teres razão nas tuas cóleras né ?) as suas subtis implicações e articulações, já que neste particular a subtileza conta, e muito. Vamos, para facilitar, dividir as humanas relações em quatro items, não esqueças estarmos a fazê-lo de um ponto de vista profissional e tendo em atenção sobretudo os resultados e os rendimentos, faço questão que comeces por aqui a pôr à prova o teu sangue frio. Deste modo teremos:

Amizades pessoais,
Amizades por interesse,
Amizades que são contactos,
Amizades profissionais,
E as amizades que não interessam a ninguém…

Pois comecemos precisamente por estas já que só passados alguns anos maioritariamente as reconhecemos, convindo estar atento desde já. Claro que existem sempre aquelas que, de tão evidentes podemos logo evitar de início, ou colocar à parte, à margem, logo à partida. Contudo é geralmente somente após alguns anos que bem as conhecemos, classificamos e arrumamos na prateleira das desinteressantes, das inconvenientes, das prejudiciais ou das incómodas ou até mesmo perigosas. Deves agir em conformidade mas sem dar cavaco, isto é sem fazeres alarde da atitude tomada para com tal pessoa (s), não esqueças que quanto menos souberem a teu respeito melhor para ti, “o segredo sempre foi a alma do negócio”. E quem sabe se não será vantajoso fazer-lhes uma visitinha anónima e secreta ? Quem sabe se não nos poderão ser úteis mais tarde ? Infelizmente haverá sempre quem apesar de tudo para nada disso interesse, ou compense…

As amizades por interesse podem ser piores que uma lapa e não te largarem. Confio que saberás lidar com elas, porque eu queria referir-me às outras, àquelas que, por teu interesse deves manter ou fazer, entre essas não faças distinções, em especial no campo politico, mantém-te neutro (a) e aproveita todos os convites e festas e tudo que te permita entrar, observar alvos potenciais a fim de ponderares se poderão um dia valer a pena… Esses amigos podem apresentar-te a outros amigos e assim ingenuamente manter-te num circuito interessante do ponto de vista profissional e da rentabilidade. Apenas uma nota breve, amigos à direita têm tendência a habitar casas mais recheadas e mais ricas, ainda que também melhor protegidas. Amigos à esquerda acumulam mais tralha e livros e menos valores, mas atenção, entre esses alguns há a quem a vida permitiu ser tão nababos quanto os anteriores e, por vezes, até acumulam mais que os primeiros, mais valor e mais exibicionismo, e por norma descuram muitíssimo a segurança, é gente que faz parte de uma certa elite caviar, de uma determinada nomenclatura, e que vale muitíssimo a pena visitar…

Quanto às amizades que são contactos, são um tipo de amizades que devem ser cultivadas, procuradas e mantidas por razões profissionais. (razões profissionais serão amizades profissionais). São das mais difíceis de obter e como tal devem ser tratadas com lealdade e jamais lhes deves dar a mínima razão para pensarem o contrário. Neste mundo confiança e lealdade são valores inestimáveis, insubstituíveis, terás isso sempre em conta. Nunca procures saber pormenores sobre essas amizades, contenta-te com o que te disserem ou que que souberes, jamais faças perguntas desnecessárias, inconvenientes ou impertinentes, jamais as confrontes com o que quer que seja. Se não confias não lhes apareças, não as solicites. De igual modo mantem, tanto quanto possível ante elas a tua privacidade e os teus segredos. São necessárias e úteis estas amizades, mas também podem ser denunciantes ou bufos, informadores, o “seguro morreu de velho”, fala pouco e ouve muito, cinge-te ao assunto que a elas te levar e mostra-te sempre agradecido. Se o resultado desse contacto for de louvar, se for bem sucedido, demonstra quanto ficas agradecido, faz-lhe uma oferta surpresa, um ramo de flores, ou um perfume (as mulheres adoram), uma garrafa de bom vinho, ou de bom uísque, são lembranças que têm muito significado para quem as recebe.

O grande problema deste tipo de amizades é arranjá-las, serve-te de todos os meios e de toda a gente, simula se necessário seres voluntário de uma qualquer organização de paz e visita-as nas cadeias, leva-lhes cigarros, ganha a confiança dessas amizades, oferece-te para porta-voz delas para a família e amigos que estejam “cá fora”, desse modo ganharás a sua amizade e confiança, o novelo desenrolar-se-á a partir daí, e tu tens necessidade de contactos, de receptadores, de informadores do meio, quem para os quadros ? Para o ouro, a prata, o estanho, as porcelanas, os automóveis ? Existe uma economia paralela e um mundo subterrâneo que vale a pena explorar, fica atento aos jornais, aos programas de Tv, às reportagens, e concluirás que, ao contrário do que dizem o crime compensa, nem precisarás licenciatura, nem licença, nem subsídios de desemprego, nem esmolas, nem cunhas, nem padrinhos, só precisarás ser esperto, inteligente, diligente, observador, calmo, paciente, cuidadoso, simpático, popular q.b. e comprar uma pata de coelho para porta-chaves… Muita sorte meu amigo, e não esqueças que a sorte protege os audazes…

Aproveitarei este parágrafo para te falar das amizades profissionais ou cúmplices. É verdade que podem projectar e potenciar os negócios, multiplicá-los imenso, por dez, por cem, ou por mil, poderão ajudar bastante, mas também podem ceder num momento de fraqueza e fazerem com que te atirem cinco, dez ou quinze anos para fora de circulação… Tudo tem um preço, pondera bem antes… Idem para namoradas ou até esposas, que considerarei amizades pessoais e quanto menos souberem de ti mais vantagens acumularás. O seguro morreu de velho não esqueças. Alega fazeres parte de uma brigada de agentes descaracterizados das forças paramilitares ou da nossa secreta, e habitua-te a fazer cair na conta dela, ou na comum, mensalmente, uma importância certa, à guisa de salário, tens que construir e manter uma fachada, fá-lo de modo profissional e convincente… Mantém as amizades pessoais tanto quanto possível a leste da tua vida, é um favor que lhes farás, a elas e a ti mesmo… 

Boa sorte.